sábado, 9 de novembro de 2024

A Glória de Deus


     A Bíblia frequentemente cita a Glória de Deus, e por vezes difunde o significado dessa expressão nas mais diversas figuras. Mas é possível unificar estas referências, pois remetem ao esplendor do próprio Deus, como o Livro do Profeta Ezequiel descreveu: "Acima dessa abóbada, havia uma espécie de trono, semelhante a uma pedra de safira, e bem no alto dessa espécie de trono, uma Humana Silhueta. Vi que Ela possuía um vermelho fulgor, como se houvesse sido banhada no fogo, desde o que parecia ser Sua cintura, para cima, enquanto que, para baixo, vi algo como fogo que esparzia clarões por todos lados. Como o arco-íris que aparece nas nuvens em dias de chuva, assim era o resplendor que a envolvia. Era esta visão a imagem da Glória do Senhor." Ez 1,26-28
    Ou elas remetem, por reverente deflexão, ao Seu inconfundível poder, caso do registro do Livro do Êxodo, quando o povo de Deus rumava à Terra Santa: "Moisés disse a Aarão: 'Dize a toda assembleia dos israelitas: Apresentai-vos diante do Senhor, porque Ele ouviu vossas murmurações.' Enquanto Aarão falava a toda assembleia dos israelitas, olharam para o deserto e eis que na nuvem apareceu a Glória do Senhor! E o Senhor disse a Moisés: 'Ouvi as murmurações dos israelitas. Dize-lhes: Esta tarde, antes que escureça, comereis carne e, amanhã de manhã, fartar-vos-eis de pão. E sabereis que sou o Senhor, Vosso Deus.'" Êx 16,9-12
    É nessa condição que a Glória de Deus se tornará mais conhecida, como quando da entrega das Tábuas da Lei, também durante o Êxodo: "Moisés subiu ao monte. A nuvem cobriu o monte e a Glória do Senhor repousou sobre o Monte Sinai, que na nuvem ficou envolvido durante seis dias. No sétimo dia, o Senhor chamou Moisés do seio da nuvem. Aos olhos dos israelitas, a Glória do Senhor tinha o aspecto de um fogo consumidor sobre o cume do monte. Moisés penetrou na nuvem e subiu a montanha. Ali ficou quarenta dias e quarenta noites." Ex 24,15-18
    Tal deflexão é justificada por nossa impossibilidade de contemplar, durante a vida terrena, a face de Deus na plenitude de Sua Glória: "Moisés disse: 'Mostrai-me Vossa Glória.' E Deus respondeu: 'Vou fazer passar diante de ti todo Meu esplendor, e pronunciarei diante de ti o Nome de Javé. Dou Minha Graça a quem quero, e uso de Misericórdia com quem Me apraz. Mas,' ajuntou o Senhor, 'não poderás ver Minha face, pois o homem não poderia ver-Me e continuar a viver. Eis um lugar perto de Mim,' disse o Senhor; 'tu estarás sobre a rocha. Quando Minha Glória passar, pô-te-ei na fenda da rocha e cobri-te-ei com a mão até que Eu tenha passado. Depois retirarei a mão e Me verás por detrás. Quanto à Minha face, ela não pode ser vista.'" Êx 33,18-23
    Esse é o temor, propriamente o medo de morrer, de que fala o Livro do Profeta Isaías. Mas o que ele viu, certamente, também era apenas uma imagem da Glória de Deus: "No ano da morte do rei Ozias, eu vi o Senhor sentado num muito elevado trono. As franjas de Seu manto enchiam o Templo. Os serafins mantinham-se junto a Ele. 'Ai de mim', gritava eu. 'Estou perdido porque sou um homem de impuros lábios, e habito com um povo também de impuros lábios e, entretanto, meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!'" Is 6,5
    No Evangelho segundo São João, após multiplicar pães e peixes e oferecer o Pão do CéuJesus confirmou estas visões como deflexões, dizendo de Si mesmo: "Não que alguém tenha visto o Pai, pois só Aquele que vem de Deus, Esse é que viu o Pai." Jo 6,46
    No entanto, pela manifestação do Salvador e a retirada do véu, sabemos que Cristo é a própria Glória de Deus, como os seguidores da tradição de São Paulo apontaram na Carta aos Hebreus: "Esplendor de Sua Glória e imagem de Seu ser..." Hb 1,3
    Também o disse São João Apóstolo, ao referir-se à Encarnação de Cristo: "E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós. E vimos Sua Glória, a Glória que o Filho Único recebe de Seu Pai, cheio de Graça e de Verdade." Jo 1,14
    De fato, e mesmo que Jesus não a tenha manifestado em toda Sua plenitude, apenas de modo mais aproximado em Sua Transfiguração, este evangelista afirma: "Ninguém jamais viu Deus. O Filho Único, que está no seio do Pai, foi Quem O revelou." Jo 1,18
    Os milagres que Jesus realizou, por conseguinte, eram igualmente inefáveis sinais de Sua Onipotência, como quando transformou água em vinho nas Bodas de Caná. E aí se tem um segundo tipo de deflexão do que é a Glória de Deus: "Este foi o primeiro milagre de Jesus. Realizou-o em Caná da Galileia. Manifestou Sua Glória, e Seus discípulos creram n'Ele." Jo 2,11
    Pois Seus milagres permitem vislumbrar Sua extraordinária grandeza, como disse sobre São Lázaro, que Ele iria ressuscitar: "A estas palavras, disse-lhes Jesus: 'Esta enfermidade não causará a morte, mas tem por finalidade a Glória de Deus. Por ela, será glorificado o Filho de Deus.'" Jo 11,4
    Sua Transfiguração, como dissemos, foi o momento em que o esplendor dos Céus refulgiu, ainda que não tenha sido em sua totalidade. É da narrativa do Evangelho segundo São Lucas: "E eis que falavam com Ele dois personagens: eram Moisés e Elias, que apareceram envoltos em Glória, e falavam da morte d'Ele, que havia de cumprir-se em Jerusalém." Lc 9,30-32
    Contudo, em terceiro tipo de deflexão, não é difícil perceber que toda Criação é pura manifestação da Glória de Deus. Os serafins vistos por Isaías rezavam: "Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos. Sua Glória enche toda Terra!" Is 6,3b
    O Livro dos Salmos canta algo semelhante: "Vossa majestade estende-se, triunfante, por cima de todos Céus." Sl 8,2b
    Também diz o Livro do Eclesiástico: "Relembrarei agora as obras do Senhor, proclamarei o que vi. Pelas palavras do Senhor foram produzidas Suas obras. O sol contempla todas coisas que ilumina; a obra do Senhor está cheia de Sua Glória. Porventura não fez o Senhor com que Seus Santos proclamassem todas Suas maravilhas, maravilhas que Ele, o Senhor todo-poderoso, consolidou, a fim de que subsistam para Sua Glória? E todavia delas não podemos ver mais que uma centelha. Quem se saciará de ver a Glória do Senhor?" Eclo 42,15-17.23b.26b
    E aconselha: "Nunca te glories de tuas vestes, nem te engrandeças no dia em que fores homenageado, pois só as obras do Altíssimo são admiráveis, dignas de Glória, misteriosas e invisíveis." Eclo 11,4
    Para que vejamos um sinal de Seu sobrenatural poder, porém, como pouco antes da ressurreição de São Lázaro, Jesus pede em Sua Palavra, dizendo a Santa Marta: "Não te disse Eu: 'Se creres, verás a Glória de Deus?'" Jo 11,40
    Em contrapartida, Ele veementemente criticou os que buscam as mundanas glórias, apontando-as como intransponíveis empecilhos à fé. Foi perante os líderes religiosos em Jerusalém, que O acusavam de transgredir a Lei por haver curado um paralítico em dia de sábado: "Como podeis crer, vós que recebeis a glória uns dos outros, e não buscais a Glória que é só de Deus?" Jo 5,44
    Ora, Ele mesmo recusava-as, como lhes havia dito pouco antes: "Não recebo Minha Glória dos homens. Sei que não tendes em vós o amor de Deus." Jo 5,41-42
    São João Evangelista registrou, de fato, logo no início de Sua vida pública, em primeira visita à Cidade Santa: "Enquanto Jesus celebrava em Jerusalém a festa da Páscoa, muitos creram em Seu Nome, à vista dos milagres que fazia. Mas Jesus mesmo não Se fiava neles, porque a todos conhecia. Ele não necessitava que dessem testemunho de homem algum, pois Ele bem sabia o que havia no homem." Jo 2,23-25
    A Primeira Carta de São Paulo ao Tessalonicenses anotou idêntica postura: "Mas como Deus nos julgou dignos de confiar-nos o Evangelho, falamos não para agradar aos homens e sim a Deus, que sonda nossos corações. Com efeito, nunca usamos de adulação, como sabeis, nem fomos levados por espúrios interesses. Deus é testemunha. Não buscamos glórias humanas, nem de vós nem de outros. Na qualidade de Apóstolos de Cristo, poderíamos apresentar-nos como pessoas de autoridade. Entretanto, em meio a vós fizemo-nos discretos." 1 Ts 2,4-7
    Não por acaso, o Amado Discípulo expressou nestes termos a não aceitação do Cristo, ás vésperas de Sua Paixão, por vários religiosos de Jerusalém: "Assim preferiram a glória dos homens àquela que vem de Deus." Jo 12,43
    Por isso, e para bem demonstrar a essencialidade de Deus, exclusivo Senhor da Glória, Jesus, enquanto mero ser humano, aos líderes judeus havia-Se apresentado absolutamente dependente do Pai: "Se Me glorifico a Mim mesmo, Minha Glória não é nada. Meu Pai é Quem Me glorifica, Aquele que vós dizeis ser Vosso Deus." Jo 8,54
    Isso está em perfeita concordância com o ensinamento do Livro do Profeta Jeremias: "Quem se gloria, glorie-se no Senhor." Jr 9,23
    Por fim, o Sacrifício Pascal, o paradoxo do Deus morto, é a marca maior da Vitória e da Glória de Cristo, em um quarto tipo de deflexão, quando às últimas consequências levou Seu amor por nós. Depois do Domingo de Ramos, ao ser procurado em Jerusalém por judeus nascidos fora de Israel, Ele disse: "É chegada a hora para o Filho do Homem ser glorificado." Jo 12,23
    E por essa vitoriosa passagem para a Vida Eterna, Jesus rezou ao Pai ainda no cenáculo, na noite em que seria preso: "Pois agora, Pai, glorifica-Me junto a Ti, concedendo-Me a Glória que tive junto a Ti antes que o mundo fosse criado." Jo 17,5
    Pois foi por Sua Cruz que Ele chegou à perfeição, e só participando de Seu sofrimento é que nós alcançaremos a Glória de Deus, como os discípulos de São Paulo dizem: "Aquele para Quem e por Quem todas coisas existem, desejando conduzir à Glória numerosos filhos, deliberou elevar à perfeição, pelo sofrimento, o Autor da Salvação deles, para que Santificador e santificados formem um só todo. Por isso, Jesus não hesita em chamá-los Seus irmãos..." Hb 2,10-11
    Nosso Senhor mesmo explicou-o aos dois discípulos que partiram para Emaús, mesmo ouvindo grandes testemunhos, no Domingo da Ressurreição: "Jesus disse-lhes: 'Ó gente sem inteligência! Como sois tardos de coração para crerdes em tudo que anunciaram os Profetas! Porventura não era necessário que Cristo sofresse essas coisas e assim entrasse em Sua Glória?'" Lc 24,25-26
    Ora, São Pedro também glorificaria a Deus pela Cruz, como o próprio Jesus lhe avisou quando pela primeira vez apareceu na Galileia, em manifestação a ele e a outros quatro Apóstolos: "'Em Verdade, em Verdade, digo-te: quando eras mais moço, cingia-te e andavas aonde querias. Mas quando fores velho, estenderás tuas mãos e outro cingi-te-á e levá-te-á aonde não queres.' Por estas palavras, Ele indicava o gênero de morte com que havia de glorificar a Deus. E depois de assim ter falado, acrescentou: 'Segue-Me!'" Jo 21,18-19
    Mas não somente o Príncipe dos Apóstolos! Jesus dirigiu-Se nestes termos a todos Seus seguidores no Sermão da Montanha, ou seja, no começo de Seu ministério. É do Evangelho segundo São Mateus: "Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo mal contra vós por causa de Mim. Alegrai-vos e exultai, porque grande será vossa recompensa nos Céus, pois assim perseguiram os Profetas que vieram antes de vós." Mt 5,11-12
    Por isso, neste mesmo Sermão exortava-nos a refletir Sua Luz: "Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre uma montanha, nem se acende a vela para colocá-la debaixo do caixote, mas sim para colocá-la sobre o candeeiro, a fim de que brilhe para todos que estão em casa. Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam vossas boas obras e glorifiquem Vosso Pai que está nos Céus." Mt 5,14-16
    De plena inspiração, e sabendo ser a Cruz o caminho de todo fiel, a Carta de São Paulo aos Romanos assim atesta a obra do Divino Paráclito: "O Espírito mesmo dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. E se filhos, também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, contanto que com Ele soframos, para que com Ele também sejamos glorificados." Rm 8,16-17
    E a Carta de São Paulo aos Gálatas completa: "Quanto a mim, não pretendo jamais me gloriar. A não ser na Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo." Gl 5,14
    Ele bem assimilou a Virtude de resignadamente padecer diante das injustiças do mundo. É o que atestamos pelo texto da Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios: "Eis porque sinto alegria nas fraquezas, nas afrontas, nas necessidades, nas perseguições, no profundo desgosto sofrido por amor a Cristo. Porque quando me sinto fraco, então é que sou forte." 2 Cor 12,10
    Sem dúvida, esse sacrifício é o verdadeiro sentido do renascer em Cristo, de ser Igreja, como a Carta de São Paulo aos Colossenses ensina: "O que falta às tribulações de Cristo, completo em minha carne, por Seu Corpo que é a Igreja." Cl 1,24
    Em alusão à Santa Missa, ele conclama aos fiéis da igreja de Roma: "Eu exorto-vos, pois, irmãos, pelas Misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em vivo, santo e agradável sacrifício a Deus: é este vosso culto espiritual." Rm 12,1
    Referindo-se a essa autoimolação do corpo e da alma, que espiritual e liturgicamente na Santa Eucaristia revivemos e atualizamos, a Primeira Carta de São Pedro diz o mesmo: "... vós também vos tornais os materiais deste edifício espiritual, um santo sacerdócio, para oferecer vítimas espirituais, agradáveis a Deus, por Jesus Cristo." 1 Pd 2,5
    E foi dedicando toda Sua vida em silêncio e profunda devoção que Maria, Nossa Mãe, serviu a Deus, como cantou no Magnificat, diante de Santa Isabel, logo após conceber Jesus por ação do Espírito Santo: "E Maria disse: 'Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta de alegria em Deus, Meu Salvador...'" Lc 1,46-47
    Assim colaboramos para a 'transfiguração', para a Salvação uns dos outros como a Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios informa: "Cada dia, irmãos, exponho-me à morte, tão certo como vós sois minha Glória em Jesus Cristo Nosso Senhor." 1 Cor 15,31
    

NA IGREJA, À ESPERA DO CRISTO

    Jesus, contudo, quando pela primeira vez anunciou Sua Paixão, prometeu ainda mais esplendorosa manifestação para Sua Volta: a total Glória do Pai: "Porque o Filho do Homem há de vir na Glória de Seu Pai com Seus anjos, e então recompensará a cada um segundo suas obras." Mt 16,27
    E disse-o em mais de uma forma, como nesta, em Sua última Páscoa em Jerusalém: "Porque como o relâmpago parte do Oriente e ilumina até o Ocidente, assim será a Volta do Filho do Homem. Então no céu aparecerá o sinal do Filho do Homem. Todas tribos da Terra baterão no peito e vê-Lo-ão vir sobre as nuvens, cercado de Glória e de majestade." Mt 24,27.30
    Os Apóstolos bem entenderam. Tanto que São João Evangelista e São Tiago Maior pediram-Lhe os maiores privilégios enquanto subiam por derradeiro a Jerusalém, como anotado no Evangelho segundo São Marcos: "Concede-nos que nos sentemos na Tua Glória, um à Tua direita e outro à Tua esquerda." Mc 10,37
    De fato, Ele concederia sim Sua Glória, mas a todos Apóstolos e de outra maneira, como vimos acima. Foi Sua resposta a esses irmãos Apóstolos: "Vós bebereis o cálice que Eu devo beber, e sereis batizados no Batismo em que Eu devo ser batizado." Mc 10,39b
    E igualmente pelo poder de perdoar, dado através dos Onze à Igreja e celebrado no Sacramento da Penitência, para a completa remissão dos pecados. Não por acaso, Jesus tratou de instituí-lo logo em Sua Primeira aparição ao Colégio dos Apóstolos: "Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, sê-lhes-ão perdoados. Aqueles a quem os retiverdes, sê-lhes-ão retidos." Jo 20,22b-23
    Pois se confessar, isto é, reconhecer nossos pecados diante de Seus Sacerdotes, também é uma forma de reverenciar a Deus, como Ele mesmo disse através do salmista: "Quem Me oferece uma confissão, glorifica-Me, e ao íntegro homem mostrarei a Salvação de Deus." Sl 50,23
    Do contrário, diz São Paulo, a humanidade jamais poderia participar de Sua Glória: "... com efeito, todos pecaram e todos estão privados da Glória de Deus..." Rm 3,23
    Ora, embora muitos mostrem-se cegos, a Glória de Jesus expressa-se no mundo pela Unidade de Sua Igreja, como Ele fez quando a derramou sobre os Apóstolos. Ou seja, fora da Igreja não há como participar de Sua Glória, pois só por ela se constata que Jesus foi enviado pelo Pai, assim como Seu amor por nós: "Dei-lhes a Glória que Me deste, para que sejam Um, como Nós somos Um. Eu neles e Tu em Mim. Para que sejam perfeitos na Unidade, e o mundo reconheça que Me enviaste e os amaste, como amaste a Mim." Jo 17,22-23
    E Deus disse num salmo que a Comunhão representa, além da Glória, a Graça de Sua proteção sobre os fiéis: "Porque se uniu a Mim, Eu livrá-lo-ei. E protegê-lo-ei pois conhece Meu Nome. Quando Me invocar, Eu atendê-Lo-ei; na tribulação estarei com ele. Hei de livrá-lo e cobri-lo-ei de Glória. Será favorecido de longos dias, e mostrá-lhe-ei Minha Salvação." Sl 90,14-16
    Por isso, desde o princípio a Primeira Carta de São Paulo a São Timóteo denunciava os falsos mestres, que deturpam a Palavra e causam divisões na Igreja, ou seja, atentam contra a Unidade do Corpo Místico de Cristo: "Eu conjuro-te, diante de Deus e de Cristo Jesus e dos escolhidos anjos, a que guardes essas regras sem restrições, nada fazendo por espírito de parcialidade." 1 Tm 5,21
    E a Segunda Carta de São Pedro já via neles a difamação à Sã Doutrina, e assim à Igreja: "Assim como entre o povo houve falsos profetas, entre vós também haverá vós falsos doutores, que introduzirão perniciosas heresias. E renegando o Senhor, que os resgatou, sobre si atrairão uma repentina ruína. Muitos segui-los-ão em suas desordens, e deste modo serão a causa de o Caminho da Verdade ser caluniado." 2 Pd 2,1-2
    A Carta de São Tiago, por sua vez, explica qual é a verdadeira inspiração do Santo Paráclito para anunciar o Salvador, que mais uma vez é apresentada como avessa a qualquer divisão: "A Sabedoria, porém, que vem de cima, é primeiramente pura, depois pacífica, condescendente, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade nem fingimento." Tg 3,17
    Afirmativamente, não pode haver Glória sem o salvífico amor, sem a real união entre os filhos de Deus. O Último Apóstolo diz aos coríntios: "... como aliás já o tendes em parte reconhecido, que nós somos vossa Glória, exatamente como vós sereis a nossa, no Dia do Senhor Jesus." 2 Cor 1,14
    Pois foi o próprio Jesus, em despedida, que estabeleceu essa condição depois da Santa Ceia: "Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se vos amardes uns aos outros." Jo 13,35
    E como Ele mesmo afirmou em seguida, só por essa união glorificamos ao Pai: "Nisto é glorificado Meu Pai: que deis muito fruto e vos torneis Meus discípulos." Jo 15,8
    Essa é a razão da necessidade de reconhecermo-nos uns nos outros, como o Apóstolo dos Gentios ensina, pois só assim podemos ser Igreja: "Por isso, acolhei-vos uns aos outros, como Cristo nos acolheu para a Glória de Deus." Rm 15,7
    Havia muito o Eclesiástico já recomendava que sempre estivéssemos juntos aos verdadeiros adoradores de Deus, que desde a Vinda do Cristo se reúnem em Sua Igreja: "Anda na companhia do povo santo, com aqueles que vivem e proclamam a Glória de Deus." Eclo 17,25
    É nessa Comunhão que a Primeira Carta de São João vê a nossa purificação: "Se, porém, andamos na Luz como Ele mesmo está na Luz, temos Comunhão uns com os outros, e o Sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, purifica-nos de todo pecado." 1 Jo 1,7
    E com todas letras, a Cara de São Paulo aos Efésios afirma que é na Igreja que devemos dar Glória ao Criador: "... a Ele seja dada Glória na Igreja, e em Cristo Jesus, por todas gerações de eternidade. Amém." Ef 3,21
    Porque Deus mesmo declarou, falando pelo Profeta Isaías, que a missão da Igreja é reunir Seus filhos para Sua própria Glória: "Traze Meus filhos das longínquas paragens, e Minhas filhas dos confins da Terra. Todos aqueles que trazem Meu Nome, e que criei para Minha Glória." Is 43,6b-7
    E só Sua Glória pode conceder-nos a plena felicidade, como diz o Livro do Profeta Baruc: "Olha! Eis que voltam os filhos que viras partir. Chegam do Oriente e do Ocidente, à voz do Altíssimo, repletos da alegria que lhes dá a Glória de Deus." Br 4,37
    Pois o projeto de Deus é, através do amor de Salvação, fazer-nos participantes de Sua Glória, como São Paulo diz aos cristãos de Tessalônica: "... nós temo-vos exortado, estimulado, conjurado a comportardes de maneira digna de Deus, que vos chama ao Seu Reino e à Sua Glória." 1 Ts 2,12
    Com efeito, categoricamente afirma a Segunda Carta de São Paulo aos Tessalonicenses: "... desde o princípio, Deus escolheu-vos para dar a Salvação pela santificação do Espírito e pela fé na Verdade. E pelo anúncio de nosso Evangelho, chamou-vos para tomardes parte na Glória de Nosso Senhor Jesus Cristo." 2 Ts 2,13-14
    É exatamente isso que ele diz aos romanos sobre a Missão de Jesus: "Por Ele é que tivemos acesso a essa Graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos na esperança de um dia possuir a Glória de Deus." Rm 5,2
    Aliás, como morada do Espírito de Deus, de algum modo já refletimos essa Glória e assim devemos evoluir em santidade. Os Santos, no entanto, já a refletem em plenitude. Ele diz à igreja de Corinto: "Mas todos nós temos o rosto descoberto, refletimos como num espelho a Glória do Senhor e vemo-nos transformados nesta mesma imagem, sempre mais resplandecentes, pela ação do Espírito do Senhor." 2 Cor 3,18
    E como São Pedro arrematou, nós podemos estar certos que em Jesus já dispomos de tudo necessário para alcançá-la: "O divino poder deu-nos tudo que contribui para a Vida e a piedade, fazendo-nos conhecer Aquele que nos chamou por Sua Glória e Sua Virtude." 2 Pd 1,3
    De sua perfeita inspiração, como reconhecida por Nosso Senhor ao entregar-lhe as chaves do Céu (cf. Mt 16,19), São Pedro é o primeiro a glorificar a Deus na Pessoa de Jesus, o que segundo os judeus seria uma heresia, porque só a Deus devemos dar Glória. O Príncipe do Apóstolos, pois, adiantou-se em carta aos fiéis: "... a fim de que em todas coisas Deus seja glorificado por Jesus Cristo. A Ele seja dada a Glória e o poder por toda eternidade! Amém." 1 Pd 4,11


CRISTO, NOSSA GLÓRIA

    É por Cristo, portanto, e pela Graça incessantemente derramada sobre Sua Igreja, que conhecemos e nos chegamos à Glória de Deus Pai. Segue São Paulo: "Porque todas promessas de Deus são sim em Jesus. Por isso, é por Ele que nós dizemos Amém à Glória de Deus." 2 Cor 1,20
    E é o Sacramento do Batismo que nos abre essa porta: "Fomos, pois, sepultados com Ele em Sua Morte pelo Batismo, para que, como Cristo ressurgiu dos mortos pela Glória do Pai, assim nós também vivamos uma Nova Vida." Rm 6,4
    Precisamos, então, conhecer e abraçar Seu Evangelho: "Se nosso Evangelho ainda estiver encoberto, está encoberto para aqueles que se perdem, para os incrédulos, cujas inteligências o deus deste mundo obcecou a tal ponto que não percebem a Luz do Evangelho, onde resplandece a Glória de Cristo, que é a imagem de Deus." 2 Cor 4,3-4
    E assim, abraçando o Cristo como única chance, honrar o Pai, conforme a Carta de São Paulo aos Filipenses: "E toda língua confesse, para a Glória de Deus Pai, que Jesus Cristo é Senhor." Fl 2,11
    Jesus mesmo disse perante os judeus na Sua segunda festa em Jerusalém em vida pública: "Aquele que não honra o Filho, não honra o Pai, que O enviou." Jo 5,23b
    Ora, no Livro dos Atos dos Apóstolos, Santo Estevão, prestes a ser apedrejado, deu testemunho da magnífica visão que atesta a suprema majestade do Cristo: "Mas, cheio do Espírito Santo, Estêvão fitou o Céu e viu a Glória de Deus, e Jesus de pé à direita de Deus. 'Eis que vejo', disse ele, 'os Céus abertos e o Filho do Homem, de pé, à direita de Deus.'" At 7,55-56
    E se na Igreja nós somos a glória uns dos outros, como São Paulo disse, para nossa maior glória veio Jesus, como o religioso Simeão afirmou durante a Apresentação do Menino Jesus no Templo de Jerusalém: "Agora, Senhor, deixai ir em Paz Vosso servo, segundo Vossa Palavra. Porque meus olhos viram Vossa Salvação que preparastes diante de todos povos, como Luz para iluminar as nações e para a Glória de Vosso povo de Israel." Lc 2,29-33
    Ora, Ele é a própria Luz da Jerusalém Celestial, como nos foi revelado pelo Livro do Apocalipse de São João: "A cidade não necessita de sol nem de lua para iluminar, porque a Glória de Deus a ilumina, e Sua Luz é o Cordeiro." Ap 21,23
    Ademais, ainda temos a Glória de Deus nas manifestações dos anjos, como os pastores de Belém viram na noite do Natal de Jesus: "Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a Glória do Senhor refulgiu ao redor deles, e tiveram grande temor. O anjo disse-lhes: 'Não temais! Eis que vos anuncio uma Boa Nova que será alegria para todo povo: hoje vos nasceu na Cidade de Davi um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto servi-vos-á de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura.' E ao anjo subitamente juntou-se uma multidão do Celeste Exército, que louvava a Deus e dizia: 'Glória a Deus no mais alto dos Céus, e Paz na Terra aos homens, objetos da divina benevolência.'" Lc 2,9-14
    Aqui, ao decretar a queda da Grande Babilônia nas revelações a São João, um deles aparece como se tivesse glória própria: "Depois disso, vi descer do Céu outro anjo que tinha grande poder, e a Terra foi iluminada por sua Glória." Ap 18,1
    Portanto, que da fé não nos afastem os imponderáveis sofrimentos, e nosso estímulo sejam as promessas do Reino de Deus. São Paulo argumenta: "Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não têm proporção alguma com a futura Glória, que deve ser-nos manifestada." Rm 8,18
    Busquemos a Sabedoria, que é superior, distinta da 'sabedoria' desse mundo como ele diz: "Pregamos a Sabedoria de Deus, misteriosa e secreta, que Ele predeterminou antes de o tempo existir, para nossa Glória. Sabedoria que nenhuma autoridade deste mundo conheceu, pois se a houvessem conhecido, não teriam crucificado o Senhor da Glória." 1 Cor 2,7-8
    De fato, como dizem o Livro ds Provérbios, Deus age com sutileza: "A Glória de Deus é ocultar uma coisa; a glória dos reis é esquadrinhá-la." Pr 25,2
    E não podemos esquecer que vivemos sob o Ministério do Espírito Santo, que tudo perscruta. São Paulo afere: "Mas o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, pois para ele são loucuras. Nem pode compreendê-las, porque é pelo Espírito que devem ponderá-las." 1 Cor 2,14
    Seu Ministério é glorioso! "Ora, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, se revestiu de tal Glória que os filhos de Israel não podiam fitar os olhos no rosto de Moisés, por causa do resplendor de sua face (embora transitório), quanto mais glorioso não será o Ministério do Espírito?" 2 Cor 3,7-8
    A Glória de Deus, pois, não nos falta. Somos nós que precisamos reconhecê-la, desde as mais simples coisas até as mais grandiosas. O salmista canta: "Narram os céus a Glória de Deus, e o firmamento anuncia a obra de Suas mãos." Sl 18,2
    E promete: "Enquanto viver, cantarei à Glória do Senhor. Salmodiarei ao Meu Deus enquanto existir. Possam minhas palavras ser-Lhe agradáveis!" Sl 103,33-34

    "Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, assim como era no princípio, agora e sempre! Amém!"
    "A todos saciai com Vossa Glória!"