segunda-feira, 4 de novembro de 2024

São Carlos


    Era Cardeal, Arcebispo de Milão, e morreu em 1584, aos 46 anos, da peste que flagelava a cidade desde 1576, pois, em sua intensa vida pastoral, não deixava de visitar os enfermos, consolando-os e ministrando-lhes os Sacramentos.
    Homem de profunda espiritualidade e devoção, quis renunciar à arquidiocese e abraçar a vida contemplativa, mas foi aconselhado a continuar na vida secular pelo venerável Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, Bispo de Braga, pois a Igreja muito carecia de seu trabalho.
    Seu amigo estava certo: em pleno início do protestantismo, ele fundou os 6 primeiros seminários da Europa, além de 740 escolas de Catecismo com 3 mil catequistas e mais 40 mil alunos; também construiu igrejas e hospitais para socorro dos doentes e dos mais necessitados, o que lhe valeu o apelido de 'pai dos pobres'. Era filho de um conde e sua mãe era Margarida de Medici, poderosa família de Milão, cujo irmão mais tarde se tornaria o Papa Pio IV. Realmente vivendo a evangélica pobreza, São Carlos Borromeu aproveitou todos recursos de que dispôs para ajudar aos carentes.


    Conforme sua vontade desde criança, pois sempre brincava de celebrar Missa, fazer altares e imitar padres com irmãos e amigos, aos 12 anos sua família entregou-o para ser consagrado a Deus numa abadia beneditina. Era um costume àquele tempo, mas ele não mais se afastou da vida religiosa. De notável inteligência, estudou na Universidade de Pávia e tornou-se Doutor em Direito Canônico e Civil com apenas 21 anos. E um ano mais tarde fundou a primeira Academia, uma espécie de universidade de assuntos religiosos para a formação de Sacerdotes, que serviu de modelo para os seminários.
    Aos 25 anos São Carlos foi ordenado Sacerdote e, realmente vivendo sob a Luz do Espírito Santo, ainda aos 27 anos tomou posse como Arcebispo da Diocese de Milão. Assim motivou seu tio, então já eleito papa, a colocar em prática as resoluções do Concílio de Trento, do qual nosso Santo havia participado na fase final como bispo, pois eram excelentes decretos dogmáticos e disciplinares, o que sobremaneira revigorou a instituição da Igreja. Para tanto, rapidamente conquistou o apoio de jesuítas e capuchinhos, entre outros, e empreendeu uma profunda reforma administrativa na Igreja, apesar de enfrentar forte oposição de conservadores de várias ordens. Até chegou a sofrer um traiçoeiro atentado enquanto rezava: os chamados "Humilhados", ordem religiosa em desvios doutrinários, dispararam um tiro de mosquete às costas. Mas nem sequer se feriu, e logo tratou de perdoar seus agressores.


    Quanto às resoluções do Concílio, entretanto, ele simplesmente fazia o mesmo que São Paulo e São Timóteo em relação ao Concílio de Jerusalém, que foi o primeiro da Igreja: "Nas cidades pelas quais passavam, ensinavam que observassem as decisões que haviam sido tomadas pelos Apóstolos e Anciãos em Jerusalém. Assim as igrejas eram confirmadas na , e dia a dia cresciam em número." At 16,4-5
    Para fortalecer a Doutrina da Igreja, colaborou na redação do Catecismo Tridentino, promoveu 6 Sínodos Provinciais e 11 Diocesanos, foi orientador de muitas ordens, escreveu muitos documentos catequéticos e, para os seminários e as instituições que fundou, redigiu tão perfeitos e inspirados regulamentos que foram copiados por bispos do mundo inteiro. Também fundou uma nova congregação de Sacerdotes seculares, os Oblatos de Santo Ambrósio. Por sua grande estima pelo Santo Sudário, foi a Turim a pé em quatro dias de peregrinação, jejum e oração, quando os duques de Saboia, em 1578, o trasladaram do Castelo de Chambéry, na França.
    E tão bem aceito era pela sociedade e por largos segmentos do Corpo Místico de Cristo, que várias vezes serviu como um atual Secretário de Estado, tratando de importantes assuntos com chefes de nações. Contudo, vendo o sofrimento dos mais pobres, atingidos pela peste, fez duros discursos contra a insensibilidade dos nobres, o que lhe rendeu fortes protestos até mesmo entre os do clero. Num gesto de desagravo, em 1579 o Papa Gregório XIII calorosamente acolheu-o em Roma.
    Mas, ao retornar, o governador de Milão organizou um carnaval para perturbar a Santa Missa que ele celebrava do primeiro domingo de Quaresma, e não mais cessou de oferecer-lhe oposição. Em seu leito de morte, porém, arrependeu-se e pediu a presença de São Carlos, que o perdoou e ministrou-lhe os Sacramentos.
    A peste, no entanto, continuava assolando Milão e mais de 100 padres já haviam falecido por prestar socorro material e assistência espiritual aos enfermos, interiormente tocados pelo exemplo do nosso humilde Cardeal nascido em berço de ouro, que era um dos mais ativos nesse gesto de caridade. De fato, São Carlos Borromeu fazia longos e frequentes jejuns e penitenciava-se com rigor, inclusive veladamente autoflagelando-se em nome do povo nas procissões, implorando a Deus por clemência.
    Da profundidade de suas reflexões, nós temos:

    "Deus Todo-Poderoso, iluminai minha mente para conhecer esses mistérios que Vossa Igreja valoriza e ensina. Movei meu coração para amá-los e minha vontade de viver de acordo com eles. Dai-me a capacidade de ensinar esta fé aos outros sem orgulho, sem ostentação e sem ganho pessoal."
    "Ó Santa Mãe de Deus, rogai pelos Sacerdotes que Vosso Filho escolheu para servir a Igreja. Ajuda-os, pela tua intercessão, a serem santos, zelosos e castos. Faze deles modelos de virtude no serviço ao povo de Deus. Ajuda-os a serem orantes nas meditações, eficazes na pregação e entusiasmados na oferta diária do Santo Sacrifício da Missa. Ajuda-os a administrar os Sacramentos com alegria. Amém."
    "Meu bom anjo: não sei quando ou como morrerei. É possível que eu seja repentinamente levado e que, antes de meu último suspiro, seja privado de toda inteligência. No entanto, há muitas coisas que eu gostaria de dizer a Deus no limiar da eternidade. Hoje, na plena liberdade de minha vontade, venho encarregar-te para que fales por mim naquele momento terrível."
    "A oração é o princípio, o progresso e o complemento de todas virtudes."
    "O Rosário é a mais divina das devoções."
    "Se ao menos uma fagulha do divino amor se acendeu em ti, não a mostres logo, não a exponhas ao vento! Mantém encoberta a lâmpada para não se esfriar nem perder o calor. Isto é, foge tanto quanto possível das distrações. Fica recolhido junto a Deus, evita as vãs conversas."
    "Quem se queixa de que ao entrar no coro para a salmodia, ao ir celebrar a Missa, imediatamente mil pensamentos assaltam sua mente e o distraem de Deus, deve perguntar-se: Antes de ir ao coro ou à Missa, o que fazia na sacristia? Como tu te preparaste? Que meios tu escolheste e empregaste para chamar tua atenção?"
    "Se quisermos fazer algum progresso no serviço de Deus, devemos começar cada dia de nossa vida com novo entusiasmo. Devemos manter-nos na presença de Deus tanto quanto possível, e não ter outra visão ou fim em todas nossas ações além da honra divina."
    "É impossível que te conserves casto se continuamente não vigiares sobre ti mesmo, pois a negligência traz mui facilmente consigo a perda da castidade."
    "Somos todos fracos, confesso, mas o Senhor Deus entregou-nos meios com que, se quisermos, com facilidade poderemos ser fortalecidos."
    "Eis Jesus Cristo crucificado, que é o único fundamento de nossa esperança; Ele é Nosso Mediador e Advogado; a vítima e o sacrifício por nossos pecados. Ele é a própria bondade e paciência; Sua Misericórdia é movida pelas lágrimas dos pecadores, e Ele nunca recusa o perdão e a Graça a quem Lho pede com um coração verdadeiramente contrito e humilhado."
    "Jesus ensinou que sobretudo o amor deve ser o mestre de nosso apostolado, o amor que Ele quer exprimir, por nosso meio, aos fiéis a nós confiados, com a frequente pregação, com a salutar administração dos Sacramentos, com os exemplos de uma santa vida... e com o incessante zelo."
    "O Pai enviou Seu Único Filho a fim de libertar-nos da tirania e do poder do Demônio, convidar-nos para o Céu, revelar-nos os mistérios de Seu Celeste Reino, mostrar-nos a Luz da Verdade, ensinar-nos a honestidade dos costumes, comunicar-nos os germes das virtudes, enriquecer-nos com os tesouros de Sua Graça e, enfim, adotar-nos como Seus filhos e herdeiros da Vida Eterna."
    "A Vinda de Cristo não aproveitou apenas àqueles que viviam na época do Salvador, mas que Sua força deveria ser igualmente comunicada a todos nós; contanto que, por meio da fé e dos Sacramentos, queiramos acolher a Graça que Ele nos concedeu e conduzir a vida segundo essa Graça, obedecendo-Lhe."
    "A Igreja ainda ardentemente deseja fazer-nos compreender que o Cristo, assim como veio uma só vez a este mundo, revestido de nossa carne, também está disposto a vir de novo, a qualquer momento, para espiritualmente habitar em nossos corações com a profusão de Suas Graças, se não opusermos resistência."
    "A caridade é algo com o qual nenhum homem se perde, e sem o qual nenhum homem se salva."
    "Devemos meditar antes, durante e depois de tudo o que fazemos. O profeta diz: 'Vou orar e então entenderei.' É assim que conseguimos superar facilmente as inúmeras dificuldades que temos que enfrentar dia após dia, e que, afinal, fazem parte de nosso trabalho. Na meditação encontramos a força para fazer nascer Cristo em nós e nos outros."
    "Se administras os Sacramentos, ó irmão, medita no que fazes; se celebras a Missa, medita no que ofereces; se salmodias no coro, medita a quem e no que falas; se diriges as almas, medita no Sangue que as lavou e, assim, 'tudo que é vosso se faça na caridade (1 Cor 16,14).'"
    "São estas as almas, para cuja Salvação mandou Deus Seu Único Filho Jesus Cristo… Também indicou, a cada um de nós Bispos, que somos chamados a participar na obra de Salvação, o mais sublime motivo de nosso ministério."
    "Almas devem ser conquistadas de joelhos."
    "Exerces cura de almas? Não negligencies por isso o cuidado de ti mesmo, nem com tanta liberalidade dês aos outros que nada sobre para ti. Com efeito, é preciso lembrar-te das almas que diriges, sem que isto te faça esquecer da tua."
    "Tua missão é pregar e ensinar? Estuda e entrega-te ao necessário para bem exerceres este encargo. Faze, primeiro, por pregar com a vida e o comportamento. Não aconteça que, vendo-te dizer uma coisa e fazer outra, zombem de tuas palavras, abanando a cabeça."
    "Quanto mais o governo temporal se coordena com o espiritual, e mais o favorece e promove, tanto mais concorre para a conservação do Estado. Pois que, enquanto o superior eclesiástico procura formar um bom cristão com a autoridade e os meios espirituais, segundo seu fim, procura ao mesmo tempo e por necessária consequência formar um bom cidadão, como ele deve ser sob o governo político."

    Em constante contato com os enfermos, porém, não demorou até que ele também fosse contagiado, mas mostrava-se muito feliz por ter sido considerado digno de servir a Deus nas pessoas dos mais pobres. Pouco antes de morrer, disse: "Eis Senhor, eu venho. Vou já."
    Tão inspirador e cativante, na lista de seus pessoais amigos estão São Pio V, São Felipe Neri, São Félix de Cantalício, São Francisco de Borja e São André Avelino, entre outros Santos. Tinha a devoção de ninguém menos que São João Paulo II. São João Batista Scalabrini, Bispo de Placência, na Itália, fundou em 1887 uma ordem religiosa para cuidar dos migrantes, e entregou-a à proteção de São Carlos, de quem era profundamente devoto. Por isso, os Scalabrinianos também são chamados de Carlistas. Da mesma forma, muitas outras ordens têm -no como Patrono.
    É o Padroeiro dos bispos, catequistas e seminaristas. O saudoso Papa Bento XVI disse sobre ele: "Seu lema consistia em uma só palavra: 'Humilitas'. A humildade impulsionou-o, como ao Senhor Jesus, a renunciar a si mesmo para fazer-se servo de todos."
    Notoriamente Santo, teve rápido processo canônico: foi beatificado em 1602 por Clemente VIII, e canonizado em 1610 por Paulo V. Foi sepultado na Basílica de Santa Maria Nascente, em Milão, que data de 1386, onde suas relíquias são veneradas.


    São Carlos, rogai por nós!