quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

São Pedro Canísio


    Doutor em Filosofia com apenas 19 anos pela Universidade de Colônia, Alemanha, desde os 13 já catequizava crianças valendo-se de seus conhecimentos bíblicos. Mais gostava de ir à igreja e conhecer novas orações que de brincar com amigos. Por horas e horas entregava-se à leitura.
    Ainda em Colônia, teve maior contato com a religiosidade cristã ao conhecer dois místicos cartuxos de Santa Bárbara, Johann Lansperger e Nicolas van Hesch, que praticavam a espiritualidade chamada 'Devotio Moderna'. Em 1543, aos 23 anos, foi o primeiro alemão a entrar para a Companhia de Jesus, fato que se deu na cidade de Mainz, Alemanha, depois de submeter-se aos 'Exercícios Espirituais' que lhe foram propostos pelo Beato Pedro Fabro, um dos seis primeiros e mais próximos companheiros de Santo Inácio de Loyola, além de co-fundador da ordem jesuíta.
    O próprio Santo Inácio testou seu alcance espiritual e sua obediência, enviando-o ao Colégio de Messina, na Sicília, onde prestou os mais humildes serviços. Após concluir seu doutorado em Teologia na Universidade de Bolonha, no fim de 1549, voltando a Roma foi enviado por Santo Inácio e pelo Papa Paulo III para evangelizar na Alemanha, nação "pela qual desejo viver e morrer", como ele mesmo registrou.


    Como bem agradava ao fundador da ordem jesuíta, resolutamente recebeu tal missão. Mas, igualmente humilde, primeiro pediu para ir à Basílica de São Pedro, com intuito de suplicar a ajuda dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo em tão difícil tarefa. Anos mais tarde, ele escreveu sobre esse dia: "Lá senti um grande consolo e a presença da Graça, que me foram concedidos por meio desses intercessores (São Pedro e São Paulo)."
    De fato, era uma missão praticamente impossível, pois os protestantes tinham total apoio dos governantes nas nações do norte da Europa, que queriam as propriedades da Igreja para aumentar seus poderes financeiros e políticos, e assim avançavam sobre elas usando de violência. Porém, através de suas incomuns modéstia e inteligência, dos muitos colégios jesuítas que ia fundando graças a doações, e, mais que qualquer outra coisa, de suas fervorosas práticas de oração, obteve simplesmente miraculosos êxitos. Por esses feitos, foi cognominado o 'martelo dos hereges'.


    Escreveu o 'Catecismo' em alemão, livro que conquistou muitos leitores e foi traduzido para vários idiomas: foram mais de 200 edições enquanto era vivo. Essa obra atravessou séculos até a História Contemporânea, tanto que na Alemanha até recentemente o Catecismo ainda era chamado de 'Canísio'. Eram 3 livros: um com elementares noções de Teologia, outro para crianças em início de instrução religiosa, e o último para jovens com formação escolar. Fazia várias citações bíblicas e usava de muita clareza.
    Realmente piedoso, interferiu várias vezes para que Roma fosse mais flexível no trato com os alemães convertidos ao protestantismo, dizendo que eles teriam abandonado a 'sem ter culpa', por mera força das circunstâncias, e não por deliberada apostasia. Naquelas situações, graças à sua sensibilidade sabia que a pacífica convivência, os trabalhos em favor dos mais necessitados e os simples argumentos que justificam a fé católica surtiriam melhores resultados que repreensões morais ou ameaças de excomunhão.
    Também interferiu nos ataques que a Igreja dirigia a Calvino e Melanchton, querendo evitar confrontos diretos e infrutíferas discussões. Dizia: "Com palavras como estas, nós não curamos pacientes, nós tornamo-os incuráveis." Preferia tentar a aproximação e o convencimento pela força de doutrinárias explanações, pelos exemplos de caridade e pela devota e austera vida que levava.


    Claro, ele sabia que seus conhecimentos das Sagradas Escrituras e dos Padres da Igreja eram poderosos instrumentos. Mas, mais que tudo, sabia que sua missão era apenas a continuação dos trabalhos dos Apóstolos, e que, fazendo sua parte, tudo mais estava muito bem entregue nas mãos de Deus. 'Apenas' se esforçava para que ele mesmo, por nenhum instante, não viesse a contrariar Sua vontade! E por isso, com cada vez mais força retomava as orações.
    Assim, aos poucos, São Pedro Canísio foi cativando as principais autoridades germânicas e de outras nações. Por exemplo: era muito bem ouvido por Fernando I, imperador do Sacro Império Romano-Germânico, regime monárquico pelo qual a Europa se reorganizou como civilização e fez frente aos bárbaros, ao norte, e ao então crescente poderio militar das nações do Oriente.


    Por sua franca desenvoltura, a Igreja queria-o em mais elevados postos, intervindo nas mais importantes decisões. Com esse propósito, foi indicado Bispo de Viena, sede do Império, onde aceitou ficar na condição de administrador da diocese entre 1554 e 1555, sempre visitando hospitais e prisões, mas terminou recusando o bispado porque achava mais frutífero continuar seu trabalho de evangelização na Alemanha, onde frequentemente era requisitado.
    Sem fugir às missões que lhe delegavam o Papa e Santo Inácio, que por esses tempos em definitivo já se havia instalado em Roma, São Pedro Canísio sabia que conseguiria mais profundos e duradouros resultados trabalhando em meio à mais simples gente. Por isso, seguia fundando colégios jesuítas como fez em Viena e na Baviera, além de Colônia, Innsbruck e Dillingen. Também fundou o de Praga, em 1556.
    Foi um dos principais teólogos do Colóquio de Worms, em 1557, quando dialogou com os principais líderes protestantes. Ainda serviu como Núncio Apostólico na Polônia, em 1558, e era o principal pregador de Augsburgo, Alemanha, entre 1559 e 1568, quando surgiu o primeiro tratado de paz entre católicos e protestantes, que levava o nome desta cidade. Indicado por Santo Inácio, foi o primeiro superior da Província Jesuíta da Alta Alemanha.
    Em março de 1561, o Papa Pio IV escreveu-lhe: "Agradecemos a Deus Todo-Poderoso, que em Sua Misericórdia chamou de volta tantos hereges à Igreja Católica por meio de tua pregação ... Se existe algum favor que desejas de nós, que achas que ajudaria para a Salvação das almas, teremos prazer em aceitar tua petição."
    É de sua inspiração a frase na Ave Maria: "Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores." Ela foi oficialmente incorporada à oração no Concílio de Trento, em 1566, onde São Pedro Canísio esteve presente como teólogo, junto aos ilustres irmãos jesuítas Lainez e Salmeron, que aí tiveram grande destaque. Na sessão final do Concílio, ele fez uma belíssima explanação a respeito da Comunhão sob as duas espécies.


    Seu Livro, 'De Maria Virgine Incomparabili et Dei Genitrice Sacrosancta, Libri Quinque' é o mais significativo avanço no campo da Mariologia do século XVI. Assíduo e profícuo trabalhador, editou as obras completas de São Cirilo de Alexandria, de São Leão Magno e as cartas de São Jerônimo.
    Em 1590, aos 69 anos, definitivamente deixou a Alemanha e foi viver em Friburgo, na atual Suíça, onde fundou mais um colégio jesuíta, o de São Miguel. Não por acaso, após sua morte vários desses colégios pelo mundo passaram a levar seu nome. No início do século XX, na Holanda foi fundada a 'Associação Apologética Pedro Canísio', para fazer frente às deturpações perpetradas tanto pelo socialismo quanto pelo liberalismo.
    Apesar de ter reconvertido muitas almas para a Sã Doutrina, tinha uma meta bastante humilde: "Não discutam, não briguem, não desprezem aqueles que não compartilham de nossa fé, mas defendam essa mesma fé, com todos seus corações e com todas suas almas."
    São trechos de sua 'Oração Universal': "Todo-Poderoso, Eterno Deus, Senhor, Pai Celestial! Olhai com os olhos de Vossa Infinita Misericórdia nossos lamentos, misérias e necessidades. ... Por Esse Senhor Jesus, afastai, Misericordioso Pai, as bem merecidas punições, os presentes e futuros perigos, a danosa insurgência, os preparativos de guerra, a escassez, a doença, os aflitos e miseráveis tempos. Em toda bondade, iluminai e fortalecei também líderes e regentes, espirituais e mundanos, para que tudo promovam que possa fazer prosperar Vossa Divina Honra, nossa Salvação, a paz comum e o bem-estar de toda cristandade. Concedei-nos, ó Deus da Paz, uma verdadeira unidade na fé, fora de toda divisão e separação; convertei nosso coração ao genuíno arrependimento e à melhoria de nossa vida; acendei em nós o fogo do Vosso Amor; dai-nos fome e ânsia por toda justiça para que nós, como obedientes filhos, agrademo-vos e sejamos serenos na vida e na morte. Também rogamos, conforme Vossa vontade, ó Deus, por nossos amigos e inimigos, por sãos e por doentes, por todos cristãos em agonia e na pobreza, por vivos e por mortos. A Vós, ó Senhor, confiamos todos nossos atos, nossa vida e nossa morte. Permiti desfrutar de Vossa Graça aqui, e conseguir lá, com todos escolhidos, nas eternas Paz e felicidade, louvar-Vos, honrar-Vos e exaltar-Vos!"
    Aqui temos parte do sermão contra a corrupção do clero na Alemanha, quando modestamente dizia 'nós': "O Altar de Deus temos desonrado com impuras mãos e polutos lábios, com nossos incircuncisos corações, nossas escandalosas vidas e nossos graves abusos.´Tanto maior é nosso pecado quanto abusamos da dignidade que nos foi conferida. Assim, por nossa causa, o Nome de Deus é blasfemado. Com tais homens, nada há de honestidade em casa, de sobriedade à mesa, de continência no leito, nem de estudos nos livros, nem de devoção no coração."
    E está em sua Profissão de Fé, publicada na Summa Doctrinae Christianae em 1571 e replicada em vários de seus livros:

    "(...) A fim de que eu não vagasse, errando como as transviadas ovelhas que não têm pastor, Vós congregaste-me no seio de Vossa Igreja; colhido, educaste-me; educado, continuastes a ensinar-me com a voz daqueles Pastores nos quais Vós quereis ser ouvido e obedecido como em pessoa pelos vossos fiéis.
    (...) Também me professo filho daquela Igreja Romana que os ímpios blasfemos desprezam, perseguem e abominam como se fosse anticristã; em nenhum ponto me afasto de sua autoridade, nem me recuso a derramar meu sangue e dar a vida em sua defesa, e creio que somente na unidade desta mesma Igreja podem os méritos de Cristo obter minha Salvação e a de outros.
    (...) Se acontecer de eu vir a ser desprezado, maltratado e perseguido por causa desta minha profissão, considerá-lo-ei extraordinários Graça e favor, porque isso significará que Vós, Meu Deus, deste-me a ocasião de sofrer pela justiça e não quereis que me sejam benevolentes aqueles que, como declarados inimigos da Igreja e da Verdade Católica, não podem ser Vossos amigos.
    No entanto, perdoai-os, Senhor, porque, instigados pelo Diabo e cegos pelo brilho de uma falsa doutrina, não sabem o que fazem, ou não querem saber.
    Concedei-me, contudo, esta Graça: de que na vida e na morte eu sempre renda um autêntico testemunho de sinceridade e fidelidade que devo a Vós, à Igreja e à Verdade, que jamais me afaste do Vosso Santo Amor, e que esteja em comunhão com aqueles que Vos temem e na Santa Igreja Romana guardam vossos preceitos, a cujo juízo, com pronto e respeitoso ânimo, eu me submeto e toda minha obra."


    Ele também registrou:

    "Essas cerimônias que são usadas na administração dos Sacramentos, cada uma das quais recebemos como a nós entregues e confiadas pelas mãos dos Padres, devem ser especialmente mantidas e observadas com grande devoção."
    "Cabe-nos, de unânime e inviolável forma, observar as eclesiásticas tradições, sejam elas codificadas ou simplesmente conservadas pela habitual prática da Igreja."
    "Desejo despertar nos outros e em mim mesmo um maior fervor, a fim de que o depósito católico da fé, que o Apóstolo não nos confiou sem motivo e que é preferível a todos tesouros deste mundo, seja preciosamente conservado intacto e autêntico, pois dele dependem a Sabedoria cristã, a paz em geral e a santidade do homem."
    "Esta opinião é admitida há vários séculos e tão impressa na alma dos fiéis, é tão recomendada pela Igreja, que quem negasse a Assunção ao Céu do corpo de Maria Santíssima nem sequer seria ouvido com paciência, mas seria vaiado como pertinaz, ou mesmo temerário, e imbuído mais de espírito herético que católico."
    "Os mistérios da Graça que Deus operou na Virgem Maria não se devem medir por ordinárias leis, senão pela divina onipotência, suposta a conveniência do fato e a não contradição ou repugnância às Escrituras."
    "Se entre os mortais existe algum tão belo nome, cheio de Graça, que mereça ser escrito, lido, louvado, pintado e esculpido, é o de Maria, já que sempre é digno de estar diante dos olhos, nos ouvidos e nas mentes de todos homens, e de ser pronunciado em particular e publicamente com imensa reverência."
    "Que o fruto da Paixão e Morte do Redentor do mundo se aplique à remissão de todos pecados por mim já designados, e à consecução e aumento dos mais necessários dons espirituais."
    "O que todo mundo ama e busca é a moderação, unida à seriedade da linguagem e à força dos argumentos. Abramos os olhos dos extraviados, mas sem jamais lhes causar irritação."
    "Melhor que fiquem apenas alguns católicos, mas firmes e sinceros em sua religião, que permanecessem muitos, desejável que fosse, para estar em conluio com os inimigos da Igreja e em conformidade com os declarados inimigos de nossa fé."
    "Outros podem tomar como pretexto o próprio trabalho, podem ter em vista mais altos cargos, que prestam à Igreja máximos serviços. (…) Também podem justificar-se, afirmando não quererem tornar-se crianças entre as crianças. Cristo, a Sabedoria do próprio Deus, não voltou atrás e com confiança tratou as crianças."
    "Oh! Se pudessem os puros adolescentes bem conhecer seus bens, como os rodeariam de cuidado e esforço para guardar inteiro esse verdadeiramente áureo tesouro da castidade."
    "Sua morte seja minha vida! Seu Sangue e Suas chagas lavem meus males! Como minha carne frequentemente me seduziu para a culpa, assim a Carne de tão amado e inocente Filho e Irmão refaça-me para o perdão, e dobre-Te para a Misericórdia!"
    "Tu, Senhor, 'preveniste-me com Tua Misericórdia', de muitos modos arredaste-me de mais graves pecados e precedeste meus pés para não entrarem pelo largo caminho, que à perdição conduz os amadores do mundo."
    "Tu, afinal, como se pudesses abrir o Coração do Santíssimo Corpo, que à minha frente eu parecia ver, mandaste-me beber dessa fonte, convidando-me, por assim dizer, a tirar as Águas da minha Salvação de Tuas fontes, ó Meu Salvador."
    "Se tu muito tens a fazer, com a ajuda de Deus encontrarás tempo para tudo fazer."
    "Persevera diante de qualquer situação, por mais difícil que seja, persevera na confiança e na fé em Deus."


    Morreu em 1597, na santa serenidade que praticou por toda vida. Merecidamente foi reconhecido como Doutor da Igreja. É o Padroeiro da Imprensa Católica e da Alemanha.
    Suas relíquias são veneradas sob o altar da igreja de São Miguel, do colégio de mesmo nome em Friburgo, na Suíça.


    Também há relíquias suas, fragmento de uma costela e um par de sapatos, expostas na igreja erguida em sua homenagem em Nijmegen, sua cidade natal, atualmente em terras da Holanda.


    São Pedro Canísio, rogai por nós!