segunda-feira, 14 de abril de 2025

O Sagrado


    Teríamos todos nós o senso do sagrado? Ele precisaria ser estimulado? Todo ser humano, por si mesmo, é capaz de ativá-lo? Embora sejam sim as respostas, com algumas ligeiras ressalvas, claro, olhando para o mundo a sensação que se tem é justamente o contrário: estaríamos perdendo-o cada vez mais. Pudera: diante de tanto relativismo, hedonismomaterialismo e consumismo, não haveria como ser diferente.
    Ora, isso já acontecia com Jerusalém, enquanto grande cidade à época, a ponto de não acolherem o Cristo. Foi quando Ele profetizou sua segunda destruição, no Evangelho segundo São Lucas: "Aproximando-Se ainda mais, Jesus contemplou Jerusalém e chorou sobre ela, dizendo: 'Oh! Se tu, ao menos neste dia que te é dado, também conhecesses Aquele que pode trazer-te a Paz!... Mas não... Isso está oculto a teus olhos. Sobre ti virão dias em que teus inimigos te cercarão de trincheiras, te sitiarão e te atacarão por todos lados. Destruí-te-ão a ti e a teus filhos que estiverem dentro de ti, e não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não conheceste o tempo em que foste visitada." Lc 19,41-44
    E há vários registros bíblicos de que as coisas nem sempre estiveram bem. 700 anos antes de Cristo, Deus já Se queixava de Seu povo no Livro do Profeta Isaías: "Eu criei filhos e eduquei-os. Eles, porém, revoltaram-se contra Mim. O boi conhece seu possuidor, e o asno, o estábulo de seu dono, mas Israel não conhece nada, e Meu povo não tem entendimento." Is 1,3
    O próprio Isaías atestava: "Abandonaram o Senhor, desprezaram o Santo de Israel e voltaram-Lhe as costas." Is 1,4
    Contudo, não é absurdo que vejamos em cada ser humano a capacidade de reconhecer o sagrado. Está no Livro de Gênesis: "Então Deus disse: 'Façamos o homem à Nossa imagem e semelhança.'" Gn 1,26a
    O Livro de Eclesiástico já observava as habilidades de Sua mais nobre criação: "Neles criou a ciência do espírito, encheu-lhes o coração de Sabedoria e mostrou-lhes o bem e o mal. Pôs Seu olhar em seus corações para mostrar-lhes a majestade de Suas obras, a fim de que celebrassem a santidade de Seu Nome e O glorificassem por Suas maravilhas, apregoando a magnificência de Suas obras." Eclo 17,6-8
    E com a Vinda do Espírito Santo, nosso Pentecostes, a Revelação já é plena entre o povo de Deus, como Ele mesmo prometeu no Livro do Profeta Jeremias: "Mas esta é a Aliança que estabelecerei com a Casa de Israel depois daqueles dias: imprimirei Minhas leis em seu espírito e grava-las-ei em seu coração. Eu serei Seu Deus, e eles serão Meu povo. Ninguém mais terá que ensinar a seu concidadão, ninguém a seu irmão, dizendo: 'Conhece o Senhor', porque todos Me conhecerão, desde o menor até o maior." Jr 31,33-34
    Nossa atitude, no entanto, não pode ser nem de acomodação nem de presunção. Pelo contrário, comentando sobre o agir de Deus, o próprio Jesus dizia no Sermão da Montanha, apontado no Evangelho segundo São Mateus: "Portanto, sede perfeitos, assim como Vosso Pai Celeste é perfeito." Mt 5,48
    A Carta de São Paulo aos Romanos, no mesmo sentido, exorta que cresçamos espiritualmente: "Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação de vosso espírito para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que Lhe agrada e o que é perfeito." Rm 12,2
    E a Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses diz da efetividade da Sã Doutrina: "No mais, irmãos, de nós aprendestes a maneira como deveis proceder para agradar a Deus, e já o fazeis. Rogamo-vos, pois, e exortamo-vos no Senhor Jesus a que progridais sempre mais. Pois conheceis que preceitos vos demos da parte do Senhor Jesus. Esta é a vontade de Deus: vossa santificação!" 1 Ts 4,1-3a
    Ora, mesmo garantindo os auxílios da Divina Graça para não nos iludirmos com vaidades, as quais sempre nos afastam de Deus, Jesus recomendou a vigília e a oração. Foi no Horto das Oliveiras, quando já iniciara Sua Paixão: "Vigiai e orai para que não entreis em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca." Mt 26,41
    E nosso crescimento espiritual é a principal função da Santa Madre Igreja, através da qual Jesus pessoalmente educa cada um de nós, tal qual prometeu a São Pedro: "... tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei Minha Igreja." Mt 16,18b
    Essa edificação é o que garantem seguidores da tradição de São Paulo na Carta aos Hebreus: "Guardai-vos, pois, de recusar ouvir Aquele que fala. Porque, se não escaparam do castigo aqueles que d'Ele se desviaram, quando lhes falava na Terra, muito menos escaparemos nós se O repelirmos quando nos fala desde o Céu." Hb 12,25
    Exatamente por isso, Jesus mesmo vai repetir por sete vezes, falando do Santo Paráclito às sete igrejas da Ásia no Livro de Apocalipse de São João: "Quem tiver ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas..." Ap 2,7.11.17.29;3,6.13.22
    Já no Evangelho segundo São João, Ele explicitou a intensa atividade do Pai neste projeto: "Eu sou a verdadeira videira, e Meu Pai é o agricultor. Todo ramo que não der fruto em Mim, Ele cortá-lo-á. E podará todo aquele que der fruto, para que produza mais fruto." Jo 15,1-2
    E também explicitou que Ele mesmo, como Deus, nos é essencial: "Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanecer em Mim e Eu nele, esse dará muito fruto. Porque sem Mim nada podeis fazer." Jo 15,5
    Pois é através da Unidade da fé, isto é, da Comunhão do Espírito Santo, e tão somente por ela, que podemos alcançar a maturidade do Cristo. A Carta de São Paulo aos Efésios explicou: "A uns Ele (Jesus) constituiu Apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores, doutores, para o aperfeiçoamento dos cristãos, para o desempenho da tarefa que visa à construção do Corpo de Cristo, até que todos tenhamos chegado à Unidade da e do conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado de homem feito, a estatura da maturidade de Cristo. Para que não continuemos crianças ao sabor das ondas, agitados por qualquer sopro de doutrina, ao capricho da malignidade dos homens e de seus enganadores artifícios." Ef 4,11-14
    De fato, a Comunhão é a razão de ser da Igreja Católica, como Nosso Senhor mesmo sentenciou: "Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se vos amardes uns aos outros." Jo 13,35
    Referindo-Se aos Apóstolos, Ele rezou ao Pai por nós, que os ouvimos, pois na Comunhão, que só a Santa Eucaristia pode efetivar, está a Glória de Deus, e é a prova do Advento do Messias e do amor do Pai por nós: "Não rogo somente por eles, mas por aqueles que por sua palavra também hão de crer em Mim. Para que todos sejam Um, assim como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti, para que eles também estejam em Nós e o mundo creia que Tu Me enviaste. Dei-lhes a Glória que Me deste, para que sejam Um, como Nós somos Um: Eu neles e Tu em Mim, para que sejam perfeitos na Unidade e o mundo reconheça que Me enviaste e os amaste, como amaste a Mim." Jo 17,20-23
    E só há verdadeira purificação de pecados e Comunhão se buscarmos a Luz do Mundo. Só assim se dissipam as trevas, corrigindo-nos uns aos outros como a Primeira Carta de São João ensina: "Se, porém, andamos na Luz como Ele mesmo está na Luz, temos Comunhão uns com os outros, e o Sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, purifica-nos de todo pecado." 1 Jo 1,7
    Essa era uma constante na pregação do Apóstolo dos Gentios, como está na Carta de São Paulo aos Colossenses. Pois a multiforme Sabedoria de Deus (cf. Ef 3,10) se expressa nas experiências de nossos irmãos, espelhando as Escrituras. Eis a importância dos testemunhos, hoje tão largamente usados: "A Palavra de Cristo permaneça entre vós em toda sua riqueza, de sorte que com toda Sabedoria possais mutuamente instruir-vos e exortar-vos." Cl 3,16
    Ele escreveu aos cristãos da cidade de Éfeso: "Exorto-vos, pois, prisioneiro que sou pela causa do Senhor, que leveis uma vida digna da vocação à qual fostes chamados, com toda humildade e amabilidade, com grandeza de alma, mutuamente suportando-vos com caridade. Sede solícitos em conservar a Unidade do Espírito no vínculo da Paz. Sede um só Corpo e um só espírito, assim como por vossa vocação fostes chamados a uma só esperança." Ef 4,1-4
    Exaltou a Misericórdia falando aos da cidade de Colosso: "Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura, paciência. Suportai-vos uns aos outros e mutuamente perdoai-vos todas vezes que tiverdes queixa contra outrem. Como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós." Cl 3,12-13
    E lembrando a Paixão de Cristo, pedia aos cristãos da cidade de Tessalônica: "Ele morreu por nós, a fim de que nós, quer em estado de vigília, quer de sono, vivamos em união com Ele. Assim, pois, mutuamente consolai-vos e edificai-vos como já o fazeis." 1 Ts 5,10-11
    Sem dúvida, não é dada a opção de abraçar a Cristo sem abraçar Sua Igreja: "Este mistério é grande, quero dizer, com referência a Cristo e à Igreja." Ef 5,32
    Porque tal maturidade, que deve ser cultuada por seus membros, é nosso renascer. A Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios diz: "Todo aquele que está em Cristo é uma nova criatura. Passou o que era velho, eis que tudo se fez novo!" 2 Cor 5,17
    Jesus, com efeito, disse a Nicodemos, um notável fariseu que reconheceu que Deus estava n'Ele: "Em Verdade, em Verdade, digo-te: quem não nascer de novo não poderá ver o Reino de Deus." Jo 3,3
    E prometeu aos religiosos judeus: "Se guardardes Minha Palavra, sereis de fato Meus discípulos. Conhecereis a Verdade e a Verdade libertá-vos-á." Jo 8,31-32
    Porque, fora Jesus, não há caminho para verdadeiramente achegar-nos a Deus. Ele disse: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai senão por Mim." Jo 14,6
    Mas a quantos de nós ainda falta a humildade para reconhecer o valor e o poder da Palavra de Jesus? Para nosso exemplo, disse-Lhe o oficial romano de Cafarnaum: "Senhor, não Te incomodes, pois não sou digno de que entres em minha casa. Nem sequer me atrevi a ir pessoalmente ao Teu encontro. Mas diz uma palavra e meu empregado ficará curado." Lc 7,6-7
    Ainda estaríamos raciocinando sob aspectos materiais, conforme as palavras da Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios: "... o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, pois para ele são loucuras. Nem pode compreendê-las, porque é pelo Espírito que devem ponderá-las. O homem espiritual, ao contrário, julga todas coisas e não é julgado por ninguém." 1 Cor 2,14-15
    Ele denuncia abjetos arranjos sociais que levam à irreligiosidade e à loucura da autoadoração: "A ira de Deus manifesta-se do alto do Céu contra toda impiedade e perversidade dos homens, que pela injustiça aprisionam a Verdade. Pretendendo-se sábios, tornaram-se estultos. Trocaram a Verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram à criatura em vez do Criador, que é bendito pelos séculos. Amém!" Rm 1,18.22.25
    E a Carta de São Tiago pedia prostração: "Aproximai-vos de Deus, e Ele aproximar-Se-á de vós. Lavai as mãos, pecadores, e purificai vossos corações, ó homens de dupla atitude. Reconhecei vossa miséria, afligi-vos e chorai. Converta-se vosso riso em pranto e vossa alegria em tristeza. Humilhai-vos na presença do Senhor, e Ele exaltá-vos-á." Tg 4,8-10
    Na verdade, existem sutis detalhes a serem observados, como Jesus mesmo apontou: "Entrai pela estreita porta, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que leva à perdição, e muitos são os que por ela entram!" Mt 7,13
    Determinou prudência no compartilhamento das coisas de Deus: "Não lanceis as santas coisas aos cães nem atireis vossas pérolas aos porcos, para que não as calquem com seus pés e, voltando-se contra vós, vos estraçalhem." Mt 7,6
    Pois o motivo do embrutecimento dos sentidos, Ele avisa, tem nome e ronda a todos: "Todo aquele que ouve a Palavra do Reino, e não a compreende, é como a semente que caiu à beira do caminho: vem o Maligno e rouba o que foi semeado em seu coração." Mt 13,19
    E o final de muitas histórias é simplesmente a insensatez: "Mas aquele que ouve Minhas palavras e não as põe em prática é semelhante a um insensato homem, que construiu sua casa na areia. Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa. Ela caiu e grande foi sua ruína." Mt 7,26-27
    Ele alertou os fariseus, que cinicamente eram avarentos: "Vós procurais parecer justos aos olhos dos homens, mas Deus conhece vossos corações..." Lc 16,15
    Esbravejou contra a malícia de falsos religiosos, que se portam como donos da Revelação e a distorcem: "Ai de vós, hipócritas escribas e fariseus! Vós fechais aos homens o Reino dos Céus. Vós mesmos não entrais e nem deixais que entrem os que querem entrar." Mt 23,13
    Denunciou suas 'criaturas': "Ai de vós, hipócritas escribas e fariseus! Percorreis mares e terras para fazer um prosélito e, quando o conseguis, dele fazeis um filho do inferno duas vezes pior que vós mesmos." Mt 23,15
    Até admitia que pecassem contra Ele, por conta de Sua paradoxal condição humana, mas disse que o pecado contra o Espírito Santo, sem o devido arrependimento, não terá o perdão de Deus: "Por isso, Eu digo-vos: todo pecado e toda blasfêmia serão perdoados aos homens, mas a blasfêmia contra o Espírito não lhes será perdoada. Todo aquele que tiver falado contra o Filho do Homem será perdoado. Se, porém, falar contra o Espírito Santo, não alcançará perdão nem neste nem no vindouro século." Mt 12,31-32
    De fato, os religiosos faziam a Jesus as mais absurdas acusações: "Responderam então os judeus: 'Não dizemos com razão que és samaritano, e que estás possesso de um demônio?'" Jo 8,48
    Acusaram-nO de ser o próprio inimigo, como Ele mesmo atestou aos Apóstolos: "Se chamaram de Beelzebul ao Pai de família, quanto mais o farão às pessoas de Sua Casa!" Mt 10,25b
    No entanto, desafiava-os: "Quem de vós Me acusará de pecado?" Jo 8,46a
    Usou de todos artifícios para convencê-los de Sua manifestação como o Messias: "Se Eu não faço as obras de Meu Pai, não Me creiais. Mas se as faço, e se não quiserdes crer em Mim, crede em Minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em Mim e Eu no Pai." Jo 10,37-38
    Mas Seus milagres e prodígios não foram em vão: "Depois Jesus começou a censurar as cidades, onde tinha feito grande número de Seus milagres, por terem recusado arrepender-se: 'Ai de ti, Corozaim! Ai de ti, Betsaida! Porque se em Tiro e Sidônia tivessem sido feitos os milagres que em vosso meio foram feitos, há muito tempo elas teriam-se arrependido sob o cilício e a cinza. Por isso, digo-vos: no Dia do Juízo, haverá menor rigor para Tiro e para Sidônia que para vós! E tu, Cafarnaum, serás elevada até o Céu? Não! Serás atirada até o inferno! Porque se Sodoma tivesse visto os milagres que dentro de teus muros foram feitos, subsistiria até este dia. Por isso, digo-te: no Dia do Juízo, haverá menor rigor para Sodoma que para ti!'" Mt 11,20-24
    Também disse aos fariseus de Jerusalém, sobre a cura do cego de nascença: "Respondeu-lhes Jesus: 'Se fôsseis cegos, não teríeis pecado. Mas como pretendeis ver, vosso pecado permanece.'" Jo 9,41
    E a todos que ouviram Sua pregação: "... porque se não crerdes que EU SOU, morrereis em vosso pecado." Jo 8,24b
    Quanto à mera insensibilidade religiosa, típica de embrutecidos e que leva à exploração da fé alheia, Seu remédio foi até mais simples: improvisando um chicote, Ele lançou mão de força bruta contra os vendilhões do Templo. É do Evangelho segundo São Marcos: "Porventura não está escrito: 'Minha Casa chamar-se-á Casa de Oração para todas nações (Is 56,7)'? Mas vós dela fizestes um 'covil de ladrões (Jr 7,11).' Mc 11,17

"CRESCEI NA GRAÇA"

    Afirmativamente, Jesus pedia sincera conversão: "... os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e Verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e Seus adoradores devem adorá-Lo em espírito e Verdade." Jo 4,23-24
    Ele estimulava o culto às sagradas coisas, praticado em absoluta confiança na Divina Providência, referindo-Se a bens materiais como a própria comida e as vestes: "Antes buscai o Reino de Deus e Sua justiça, e todas estas coisas sê-vos-ão dadas em acréscimo." Mt 6,33
    E nomeou as sagradas coisas, ao criticar alguns religiosos de então: "Ai de vós, hipócritas escribas e fariseus ! Pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e desprezais os mais importantes preceitos da Lei: a justiça, a misericórdia, a fidelidade." Mt 23,23a
    Buscar o Reino dos Céus representa aplicar todas nossas capacidades para bem conhecer a Deus. Nosso Salvador fez questão de reafirmar o amor a Deus, expresso no primeiro Mandamento: "Jesus respondeu-lhe: 'O primeiro de todos Mandamentos é este: Ouve, Israel, o Senhor Nosso Deus é o único Senhor. Amarás ao Senhor Teu Deus com todo teu coração, com toda tua alma, com todo teu entendimento e com toda tuas forças.'" Mc 12,29-30
    E para tanto contamos com os auxílios do Espírito Santo. São Paulo não tem dúvida: "Porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado." Rm 5,5b
    Ele reza ao Pai "... para que vos conceda, segundo Seu glorioso tesouro, que sejais poderosamente robustecidos por Seu Espírito em vista do crescimento de vosso homem interior." Ef 2,16
    Por isso pedia sempre mais orações, por Seu intermédio: "Intensificai vossas invocações e súplicas. Orai em toda circunstância, pelo Espírito, no Qual perseverai em intensa vigília de súplica por todos cristãos. E também orai por mim, para que me seja dado corajosamente anunciar o mistério do Evangelho, do qual eu sou embaixador, prisioneiro. E que eu saiba publicamente e com desassombro apregoá-lo, como é meu dever!" Ef 6,18-20
    É Ele Quem conduz a Santa Igreja e provoca autênticas conversões, como Jesus prometeu: "Entretanto, digo-vos a Verdade: a vós convém que Eu vá! Porque se Eu não for, o Paráclito não virá a vós. Mas se Eu for, enviá-Lo-ei a vós. E quando Ele vier, convencerá o mundo a respeito do pecado, da justiça e do Juízo. Convencerá o mundo a respeito do pecado, que consiste em não crer em Mim. Convencê-lo-á a respeito da justiça, porque Eu vou para junto do Meu Pai e vós já não Me vereis. Ele convencê-lo-á a respeito do Juízo, que consiste em que o príncipe deste mundo já está julgado e condenado." Jo 16,7-11
    E se há mistérios não revelados, como São Paulo argumentou sobre os não judeus, a Revelação da qual somos testemunhas é divina e suficiente para alcançarmos a Salvação: "Porquanto o que se pode conhecer de Deus, eles leem-no em si mesmos, pois Deus lhes revelou. Desde a criação do mundo, as invisíveis perfeições de Deus, isto é, Seu sempiterno poder e divindade, tornam-se visíveis à inteligência por Suas obras, de modo que não podem escusar-se." Rm 1,19-20
    São João Evangelista, oportunamente, foi enfático ao confirmar a Divina Manifestação de Jesus: "Sabemos que o Filho de Deus veio e que Ele nos deu entendimento para conhecermos o Verdadeiro." 1 Jo 5,20
    Não por acaso, ao citar as sutilezas da RevelaçãoSão Paulo escreveu: "Por meio do Sangue de Cristo é que fomos libertos, e n'Ele nossas faltas foram perdoadas, conforme a riqueza de Sua Graça. Deus derramou-a sobre nós, abrindo-nos para toda Sabedoria e inteligência. Ele fez-nos conhecer o mistério da Sua vontade..." Ef 1,7-9
    Também disse das obras que são exclusivas de Suas mãos: "Assim, nem o que planta nem o que rega é alguma coisa, mas só Deus, que faz crescer." 1 Cor 3,7
    E como a Segunda Carta de São Pedro ensinou, através de Jesus podemos contar com os extraordinários auxílios que nos levam, não só ao senso do sagrado, mas propriamente à Sua Glória, a participar de Sua natureza divina: "O divino poder deu-nos tudo que contribui para a Vida e a piedade, fazendo-nos conhecer Aquele que nos chamou por Sua Glória e Sua virtude. Por elas, temos entrado na posse das maiores e mais preciosas promessas, a fim de tornar-vos por este meio participantes da natureza divina, subtraindo-vos à corrupção que a concupiscência gerou no mundo." 2 Pd 1,3-4
    Pois Deus é sutil, e Seu projeto é a Vida Eterna. Citando o Livro de Salmos, diz a Primeira Carta de São Pedro: "Como recém-nascidas crianças, com ardor desejai o leite espiritual que vos fará crescer para a Salvação, se é que tendes saboreado quão suave é o Senhor (Sl 33,9)." 1 Pd 2,2-3
    Assim, para que realmente comunguemos do sagrado, devemos buscar a Deus na Comunhão Eucarística, o Perfeito Sacrifício oferecido por Jesus: "Quem come Minha Carne e bebe Meu Sangue permanece em Mim e Eu nele." Jo 6,56
    Por ela temos a Salvação: "Eu sou o Pão Vivo que desceu do Céu. Quem comer deste Pão viverá eternamente. E o Pão, que Eu hei de dar, é Minha Carne para a Salvação do mundo." Jo 6,51
    Mas como São Paulo insistiu, repetidamente falando sobre a Unidade da Igreja, devemos saber que só há uma Comunhão: "Uma vez que há um único Pão, nós, embora sendo muitos, formamos um só Corpo, porque todos nós comungamos do mesmo Pão." 1 Cor 10,17
    Ou seja, só há estes sagrados Pão e Vinho. Ele corrigia: "Não podeis beber ao mesmo tempo o Cálice do Senhor e o cálice dos demônios. Não podeis participar ao mesmo tempo da mesa do Senhor e da mesa dos demônios." 1 Cor 10,21
    Tal entendimento, no entanto, requer oração, sinceridade e perseverança, como o próprio Jesus disse: "Como o Pai Me ama, assim Eu também vos amo. Perseverai em Meu amor." Jo 15,9
    E também requer verdadeira fé, na lição de São Paulo: "A fé é um modo de já possuir aquilo que se espera, é um meio de conhecer realidades que não se veem." Rm 11,1
    Em sua profunda inspiração, ele usou de todos recursos para fazer com que os povos chegassem ao conhecimento de Deus, como diante dos gregos em Atenas, no Areópago, ao falar do 'Deus desconhecido'. É leitura do Livro de Atos dos Apóstolos: "Pois bem, esse Deus que adorais sem conhecer, é exatamente Aquele que eu vos anuncio." At 17,23
    Pregou aos cristãos da cidade de Corinto, visando multiplicar a evangelização: "Empenhai-vos em procurar a caridade. Igualmente aspirai aos dons espirituais, mas sobretudo ao de profecia." 1 Cor 14,1
    Tal Qual Jesus, recomendou santidade aos colossenses: "Se, portanto, ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas lá de cima, e não às da Terra." Cl 3,1-2
    Rezou a Jesus pela caridade dos tessalonicenses: "Que o Senhor vos faça crescer e avantajar em mútua caridade e para com todos homens, como é nosso amor para convosco." 1 Ts 3,12
    A Segunda Carta de São Paulo aos Tessalonicenses reconheceu: "Sentimo-nos na obrigação de incessantemente dar graças a Deus a respeito de vós, irmãos. Aliás, com muita razão, visto que vossa fé vai progredindo sempre mais e desenvolvendo-se a caridade que tendes uns para com os outros." 2 Ts 1,3
    A Primeira Carta de São Paulo a São Timóteo pediu-lhe empenho: "Porque a raiz de todos males é o amor ao dinheiro. Acossados pela cobiça, alguns desviaram-se da fé e enredaram-se em muitas aflições. Mas tu, ó homem de Deus, foge desses vícios e com todo empenho procura a piedade, a fé, a caridade, a paciência, a mansidão. Combate o bom combate da fé." 1 Tm 6,10-12a
    A Segunda Carta de São Paulo a São Timóteo aconselha a todos: "Antes é preciso que o lavrador trabalhe com afinco, se quer boa colheita." 2 Tm 2,6
    Sempre pensando em edificar a Igreja, ele diz-lhe: "Portanto, tu, meu filho, procura progredir na Graça de Jesus Cristo. O que de mim ouviste em presença de muitas testemunhas, confia-o a fiéis homens que, por sua vez, sejam capazes de instruir a outros." 2 Tm 2,1-2
    Lembrou, pois, a Paixão de Cristo aos efésios: "Como amados filhos, pois, sede imitadores de Deus. Progredi na caridade segundo o exemplo de Cristo, que nos amou e por nós Se entregou a Deus como oferenda e sacrifício de agradável odor." Ef 5,1-2
    E evocando a Missão de Jesus, exortou-os: "Veio para anunciar a Paz a vós que estáveis longe, e a Paz também àqueles que estavam perto, porquanto é por Ele que ambos temos acesso junto ao Pai pelo mesmo Espírito. Consequentemente, já não sois hóspedes nem peregrinos, mas sois concidadãos dos Santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos Apóstolos e Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. É n'Ele que todo edifício se levanta, harmonicamente disposto, até formar um santo templo no Senhor. É n'Ele que vós também entrais, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a habitação de Deus." Ef 2,17-22
    Disse a Carta de São Paulo aos Filipenses: "Contudo, seja qual for o grau a que chegamos, o que importa é decididamente prosseguir. Irmãos, sede meus imitadores, e atentamente olhai para os que vivem segundo o exemplo que nós vos damos." Fl 3,16-17
    Seus discípulos também advertiam das heresias, recomendando os Sacramentos da Igreja: "Não vos deixeis desviar pela diversidade de estranhas doutrinas. É muito melhor fortificar a alma pela Graça..." Hb 13,9
    O próprio São Paulo pedia respeito aos Sacramentos: "Na qualidade de colaboradores Seus, exortamo-vos a que não recebais a Graça de Deus em vão." 2 Cor 1,6
    Antes, portanto, de deixar-nos levar pela presunção de conhecermos suficientemente o sagrado, ouçamos o que o próprio Príncipe dos Apóstolos diz. Ele que tanto amou a Jesus: "... crescei na Graça e no conhecimento de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo." 2 Pd 3,18
    Como alguém que realmente chegou à intimidade com Deus, ele deixou um valoroso método, uma sequência de valores que devemos cultuar para um verdadeiro amadurecimento espiritual: "... esforçai-vos quanto possível por unir à vossa fé a virtude, à virtude a ciência, à ciência a temperança, à temperança a paciência, à paciência a piedade, à piedade o fraterno amor, e ao fraterno amor a caridade. Se estas virtudes abundantemente se acharem em vós, elas não vos deixarão inativos nem infrutuosos no conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. Portanto, irmãos, cada vez mais cuidai em assegurar vossa vocação e eleição. Procedendo deste modo, jamais tropeçareis." 2 Pd 1,5-8.10
    E restringindo-se ao amor, São Paulo arremata: "A respeito da fraterna caridade, não temos necessidade de escrever-vos, porquanto vós mesmos aprendestes de Deus a amar-vos uns aos outros. Mas ainda vos rogamos, irmãos, que vos aperfeiçoeis mais e mais." 1 Ts 4,9-10b


    "Conservai Vossa Igreja sempre unida!"

domingo, 13 de abril de 2025

O Domingo de Ramos


    A última chegada de Jesus a Jerusalém ficou conhecida como o Domingo de Ramos, pela saudação que Ele recebeu de peregrinos na estrada, na entrada da cidade e pelas ruas. O Evangelho segundo São Mateus assim narrou:

    "Subindo a Jerusalém, durante o caminho, Jesus tomou à parte os Doze e disse-lhes:
    - Eis que subimos a Jerusalém, e o Filho do Homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas. Eles condená-Lo-ão à morte e entregá-Lo-ão aos pagãos para ser exposto a suas zombarias, açoitado e crucificado. Mas ao terceiro dia ressuscitará.
    Ao sair de Jericó, uma grande multidão seguiu-O.
    Dois cegos, sentados à beira do caminho, ouvindo dizer que Jesus passava, começaram a gritar:
    - Senhor, Filho de Davi, tem Misericórdia de nós!
    A multidão, porém, repreendia-os para que se calassem. Mas eles gritavam ainda mais forte:
    - Senhor, Filho de Davi, tem Misericórdia de nós!
    Jesus parou, chamou-os e perguntou-lhes:
    - Que quereis que Eu vos faça?
    - Senhor, que nossos olhos se abram!
    Jesus, cheio de compaixão, tocou-lhes os olhos. Instantaneamente recobraram a vista e puseram-se a segui-Lo.
    Aproximavam-se de Jerusalém. Quando chegaram a Betfagé, perto do monte das Oliveiras, Jesus enviou dois de Seus discípulos, dizendo-lhes:
    - Ide à aldeia que está à frente. Logo encontrareis uma jumenta amarrada e com ela seu jumentinho. Desamarrai-os e trazei-Mos. Se alguém vos disser qualquer coisa, respondei-lhe que o Senhor necessita deles e que sem demora Ele os devolverá.
    Assim se cumpria, neste acontecimento, o oráculo do Profeta: "Dizei à filha de Sião: 'Eis que Teu Rei vem a ti, cheio de doçura, montado numa jumenta, num jumentinho, filho de um animal de carga.'" (Zc 9,9)
    Os discípulos foram e executaram a ordem de Jesus. Trouxeram a jumenta e o jumentinho, cobriram-nos com seus mantos e fizeram-nO montar. Então a multidão estendia os mantos pelo caminho, cortava ramos de árvores e espalhava-os pela estrada. E toda aquela multidão, que O precedia e que O seguia, clamava:
    - Hosana ao Filho de Davi! Bendito seja Aquele que vem em Nome do Senhor! Hosana no mais alto dos Céus!
    Quando Ele entrou em Jerusalém, toda cidade alvoroçou-se, perguntando:
    - Quem é Este?
    A multidão respondia:
    - É Jesus, o Profeta de Nazaré de Galileia."
                                  Mt 20,17-19.29-34;21,1-11


    Nos registros do Evangelho segundo São Marcos, em diferencial, essa multidão expressamente aclamou a chegada do Reino dos Céus, o que teria contrariado ainda mais a Herodes:

    "Tanto os que precediam como os que iam atrás clamavam:
    - Hosana! Bendito Aquele que vem em Nome do Senhor! O Bendito o Reino que vai começar, o Reino de nosso pai Davi! Hosana no mais alto dos Céus!'"
                                              Mc 11,9-10

    Ainda conforme este evangelista, após essa triunfal entrada Jesus não teria pernoitado em Jerusalém, nem se recolheu no monte das Oliveiras, como era de Seu costume, mas retornou para um vilarejo próximo. Contudo, logo teria tratado de 'inspecionar' o Templo: "Jesus entrou em Jerusalém e dirigiu-Se ao Templo. Aí lançou olhos a tudo. Depois, como já fosse tarde, voltou para Betânia com os Doze." Mc 11,11
    E só na seguinte manhã Ele expulsaria os vendilhões do Templo, citando o Livro do Profeta Isaías e o Livro do Profeta Jeremias, tornando a retirar-Se ao cair da tarde:

    "Chegaram a Jerusalém e Jesus entrou no Templo. E começou a expulsar aqueles que no Templo vendiam e compravam. Derrubou as mesas dos trocadores de moedas e as cadeiras dos que vendiam pombas. Não consentia que ninguém transportasse objeto algum pelo Templo. E ensinava-lhes nestes termos:
    - Porventura não está escrito: 'Minha Casa chamar-se-á Casa de Oração para todas nações (Is 56,7)'? Mas dela vós fizestes um 'covil de ladrões (Jr 7,11).'
    Os príncipes dos sacerdotes e os escribas ouviram-nO e procuravam um modo de matá-Lo. Realmente temiam-nO, porque todo povo se admirava da Sua Doutrina. Quando já era tarde, saíram da cidade." 
                                              Mc 11,15-19

    A narrativa de São Mateus, porém, em conformidade com o Evangelho segundo São Lucas, dá a entender que a expulsão dos vendilhões teria acontecido no próprio Domingo de Ramos, quando Ele seria louvado pelas crianças e citaria o Livro de Salmos, cumprindo mais uma profecia:

    "Jesus entrou no Templo e dali expulsou todos aqueles que se entregavam ao comércio. Derrubou as mesas dos cambistas e os bancos dos negociantes de pombas, e disse-lhes:
    - Está escrito: Minha Casa chamar-se-á Casa de Oração (Is 56,7), mas dela vós fizestes um covil de ladrões (Jr 7,11)!'
    Os cegos e os coxos vieram a Ele no Templo e Ele curou-os, com grande indignação dos príncipes dos sacerdotes e dos escribas que assistiam a Seus milagres e ouviam os meninos gritar no Templo:
    - Hosana ao Filho de Davi!
    Disseram-Lhe eles:
    - Ouves o que dizem eles?
    Respondeu-lhes jesus:
    - Perfeitamente. Nunca lestes estas palavras: 'Da boca de meninos e de crianças de peito tirastes Vosso louvor (Sl 8,3)'?" 
    Depois os deixou e saiu da cidade para hospedar-Se em Betânia.
                                              Mt 21,12-17

    No Evangelho segundo São João, Jesus havia sido ungido com o caro perfume no dia anterior ao Domingo de Ramos, quando recitou uma triste profecia sobre os pobres (cf. Dt 15,11):

    "Seis dias antes da Páscoa, foi Jesus a Betânia, onde vivia Lázaro, que Ele ressuscitara. Ali deram uma ceia em Sua honra. Marta servia e Lázaro era um dos convivas. Tomando Maria uma libra de bálsamo de puro nardo, de grande preço, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa encheu-se do perfume do bálsamo.
    Mas Judas Iscariotes, um de Seus discípulos, aquele que havia de traí-Lo, disse:
    - Por que não se vendeu este bálsamo por trezentos denários e não se deu o dinheiro aos pobres?
    Dizia isso não porque se interessasse pelos pobres, mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, furtava o que nela lançavam. Jesus disse:
    - Deixai-a! Ela guardou este perfume para o dia de Minha sepultura. Pois sempre tereis convosco os pobres, mas nem sempre tereis a Mim.
    Uma grande multidão de judeus veio a saber que Jesus lá estava. E chegou, não somente por causa de Jesus, mas ainda para ver Lázaro, que Ele ressuscitara. Os príncipes dos sacerdotes, porém, também resolveram tirar a vida de Lázaro, porque muitos judeus, por causa dele, se afastavam e acreditavam em Jesus."
                                              Jo 12,1-11

    E conforme o Amado Médico, antes de começarem a descer o monte das Oliveiras para entrar na Cidade Santa, deu-se outro marcante episódio: a profecia da destruição de Jerusalém:

    "Aproximando-Se ainda mais, Jesus contemplou Jerusalém e chorou sobre ela, dizendo:
    - Oh! Se tu, ao menos neste dia que te é dado, também conhecesses Aquele que pode trazer-te a Paz!... Mas não. Isso está oculto a teus olhos. Sobre ti virão dias em que teus inimigos te cercarão de trincheiras, te sitiarão e te atacarão por todos lados. Destruí-te-ão a ti e a teus filhos que estiverem dentro de ti, e em ti não deixarão pedra sobre pedra, porque não conheceste o tempo em que foste visitada."
                                              Lc 19,41-44

    Ainda conforme São João Evangelista, também participaram desta acolhida judeus peregrinos que já estavam na cidade para celebrar a Páscoa, certamente das regiões por onde Ele havia pregado: 

    "No dia seguinte, uma grande multidão que tinha vindo à festa em Jerusalém, ouviu dizer que Jesus ia aproximando-Se. Saíram-Lhe ao encontro com ramos de palmas, exclamando:
    - Hosana! Bendito O que vem em Nome do Senhor, o Rei de Israel!"
                                              Jo 12,12-13

    São Lucas registra que havia até fariseus, nem sempre opositores de Jesus (cf. Lc 13,31), entre os que chegavam a Jerusalém. E Ele vai adverti-los de outra profecia, citando o Livro do Profeta Habacuc:

    "Quando já ia aproximando-Se da descida do monte das Oliveiras, toda multidão dos discípulos, tomada de alegria, começou a louvar a Deus em altas vozes, por todas maravilhas que tinha visto. E dizia:
    - Bendito o Rei, que vem em Nome do Senhor! Paz no Céu e Glória no mais alto dos Céus! 
    Neste momento, alguns fariseus interpelaram a Jesus em meio à multidão:
    - Mestre, repreende Teus discípulos.
    Ele respondeu:
    - Digo-vos: se estes se calarem, as pedras clamarão (Hab 2,11)!'"
                                              Lc 19,37-40

    E não só peregrinos, como o Amado Discípulo atesta, mas muitos judeus de Jerusalém juntaram-se a esse cortejo, pois testemunharam a ressurreição de São Lázaro e por isso acreditavam em Jesus:        

    "Todos, pois, que se achavam com Ele quando chamara Lázaro do sepulcro e o ressuscitara, aclamavam-nO. Por isso, o povo saía-Lhe ao encontro, porque tinha ouvido que Jesus fizera aquele milagre. Mas os fariseus disseram entre si:
    - Vede! Nada adiantamos! Reparai que todo mundo corre a Ele!'" 
                                              Jo 12,17-19

    Os líderes religiosos já estavam desnorteados desde as primeiras notícias deste milagre, mas só se preocupavam com o pacto que tinham com o Império Romano, que lhes garantia seus cargos:

    "Muitos dos judeus, que tinham vindo a Marta e Maria e viram o que Jesus fizera, creram n'Ele. Alguns deles, porém, foram aos fariseus e contaram-lhes o que Jesus realizara. Os pontífices e os fariseus convocaram o Sinédrio e disseram:
    - Que faremos? Esse homem multiplica os milagres. Se O deixarmos assim proceder, todos crerão n'Ele, e os romanos virão e arruinarão nossa cidade e toda nação.'" 
                                              Jo 11,45-48

    É quando o líder religioso de então vai profetizar Sua Paixão pela Redenção da humanidade e pela Unidade da Igreja:

    "Um deles, chamado Caifás, que era o sumo sacerdote daquele ano, disse-lhes:
    - Vós nada entendeis! Nem considerais que vos convém que morra um só Homem pelo povo, e que não pereça toda nação.
    E ele não disse isso por si mesmo, mas, como era o sumo sacerdote daquele ano, profetizava que Jesus havia de morrer pela nação, e não somente pela nação, mas também para que fossem reconduzidos à Unidade os dispersos filhos de Deus. E desde aquele momento resolveram tirar-Lhe a vida. Em consequência disso, Jesus já não andava em público entre os judeus. Retirou-Se para uma região vizinha ao deserto, a uma cidade chamada Efraim, e ali Se detinha com Seus discípulos." 
                                             Jo 11,49-54

    Ora, assim havia sido o pedido de Jesus em oração ao Pai, pouco antes do início de Sua Paixão: "Para que todos sejam Um, assim como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti. Para que eles também estejam em Nós: Eu neles e Tu em Mim. Para que sejam perfeitos na Unidade..." Jo 17,21.23a
    E para tanto Ele derramou o distintivo sinal de Sua Glória sobre a Santa Igreja Católica, pois a Unidade é a prova da Vinda do Messias e do amor de Deus: "Dei-lhes a Glória que Me deste, para que sejam Um, como Nós somos Um. ... e o mundo reconheça que Me enviaste e os amaste, como amaste a Mim." Jo 17,22.23b
    Enfim, em oposição à multidão que acolheu Jesus neste dia, a multidão que através de Pilatos vai condená-Lo e libertar Barrabás só era composta, segundo São Paulo, de gente de Jerusalém, que não conhecia Nosso Senhor (cf. Mt 21,11). Aliás, tal rejeição havia sido profetizada pelo próprio Jesus, como vimos acima, quando chorou pela Cidade Santa (cf. Lc 19,41-42). Os peregrinos, pois, menos envolvidos e mais refratários à dominação estrangeira, nada viam nesse arremedo de caridade que era o 'indulto pascal' oferecido pelos romanos. Conforme o Livro de Atos dos Apóstolos, o Apóstolo dos Gentios pregou aos judeus na sinagoga de Antioquia da Pisídia: "Com efeito, os habitantes de Jerusalém e seus magistrados não conheceram Jesus, e, sentenciando-O, cumpriram os oráculos dos Profetas, que cada sábado são lidos." At 13,27
    E ainda assim, como São Mateus registrou, eles só tomaram essa decisão porque foram incitados pelos líderes religiosos: "Mas os príncipes dos sacerdotes e os anciãos persuadiram o povo para que pedisse a libertação de Barrabás, e fizesse morrer Jesus." Mt 27,20

    "Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do universo! O Céu e a Terra proclamam Vossa Glória. Hosana nas alturas! Bendito o que vem em Nome do Senhor! Hosana nas alturas!"

São Martinho I


    Eleito em 649, nosso Santo não admitia a submissão do Papa aos poderes do imperador, e fez questão de tomar posse antes que sua eleição fosse referendada por Constante II. Com isso, abertamente declarou a independência da Igreja Católica diante de toda e qualquer autoridade humana.
    Natural de Itália, de Todi, em Toscana, nasceu em 590. São Martinho foi padre em Roma e Núncio Apostólico em Constantinopla, então capital do Império Romano do Oriente.
    Em 648, o imperador Constante II havia publicado o documento 'Tipo', no qual se juntava aos monotelistas, uma herética corrente que afirmava apenas a natureza divina de Jesus, renegando Sua natureza humana.
    Flagrante e grosseiro erro, esta tese colide com os ensinamentos dos seguidores da tradição de São Paulo na Carta aos Hebreus. Está escrito: "Porquanto os filhos participam da mesma natureza, da mesma carne e do sangue, Ele também participou, a fim de pela morte destruir aquele que tinha o império da morte, isto é, o Demônio, e libertar aqueles que, pelo medo da morte, estavam toda vida sujeitos a uma verdadeira escravidão. Veio em socorro, não dos anjos, e sim da raça de Abraão, e por isso convinha que Ele em tudo se tornasse semelhante a Seus irmãos, para ser um compassivo e fiel Pontífice no serviço de Deus, capaz de expiar os pecados do povo." Hb 2,14-17
    E também colide com os ensinamentos da própria Carta de São Paulo aos Romanos: "Enviando, por causa do pecado, Seu próprio Filho numa carne semelhante à do pecado, condenou o pecado na carne, a fim de que a justiça prescrita na Lei fosse realizada em nós que vivemos não segundo a carne, mas segundo o Espírito." Rm 8,3b-4
    Ora, o Evangelho segundo São João registrou logo em primeiras linhas: "E o Verbo fez-Se Carne e habitou entre nós, e vimos Sua Glória, a Glória que o Único Filho recebe de Seu Pai, cheio de Graça e de Verdade." Jo 1,14
    São Martinho, pois, foi fidelíssimo defensor da Unidade da Igreja e da Sã Doutrina, a qual vem sendo expressamente confirmada ao longo dos séculos pelos concílios. Era essa reverência às decisões da cúpula da Santa Igreja que São Paulo e São Timóteo defendiam e divulgavam após o Concílio de Jerusalém, e por isso a Igreja estabeleceu-se. Está no Livro de Atos dos Apóstolos: "Nas cidades pelas quais passavam, ensinavam que observassem as decisões que haviam sido tomadas pelos Apóstolos e Anciãos em Jerusalém. Assim as igrejas eram confirmadas na , e dia a dia cresciam em número." At 16,4-5
    Logo após eleito, ainda em 649 São Martinho convocou o que seria o Primeiro Concílio de Latrão, na verdade apenas um Sínodo, onde foi totalmente dispensada a palavra do imperador em quaisquer dos assuntos da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
    Realizado na Basílica de São João de Latrão, esse foi um dos maiores sínodos de todos tempos, pois foi aberto a todos bispos do Ocidente. Como o Patriarca, ou Bispo, de Constantinopla era monotelista, e muitos bispos do Oriente apoiavam-no, não foram convocados porque o intuito de São Martinho era justamente abolir por completo essa heresia. E foi isso que o sínodo resolveu por absoluta maioria. Poucas décadas mais tarde. essa decisão também seria ratificada pelo Terceiro Concílio de Constantinopla, terminado em 681.
    Ele sabia, no entanto, qual seria a consequência de sua postura. Defendia a Doutrina, e assim a Igreja de Cristo, mas também atraía para si todo ódio do imperador. E, de fato, sua resposta foi imediata: ele ordenou que o exarca Olímpio, seu representante em Ravena, prendesse o Papa. Olímpio, porém, foi mais longe: prontificou-se a matá-lo.
    Foi à Santa Missa na Basílica de Santa Maria Maior na companhia de um escudeiro e, durante a Liturgia Eucarística, mandou que ele se aproximasse de São Martinho e o executasse com um punhal. Mas ao aproximar-se, a Hóstia Santa cegou-o, e ele fugiu desesperado. Realmente assustado, Olímpio tomou o lado de São Martinho, ainda que de modo não declarado, e prometeu defender-lhe do imperador, que, por castigo de Deus, foi acometido de várias enfermidades.
    Contudo, Olímpio logo morreu, contagiado por uma peste, e o imperador conseguiu prender nosso Papa, levando-o para Constantinopla. A viagem foi bastante sofrida e muito debilitou sua saúde. Durante três meses e meio não lhe foi permitido tomar banho, pois, para que não fosse reconhecido pela população, não podia deixar o barco aportado. Ao chegar, já estava preso em isolamento havia 93 dias, num imundo calabouço. Assim aguardou o julgamento, que se revelou uma grande farsa, feito de falsos testemunhos e às pressas.
    Depois de condenado à morte, foi destituído de suas vestes eclesiásticas e surrado, e depois, quase sem poder andar, conduzido exausto e ensanguentado pelas ruas até o pretório, para ser hostilizado e humilhado pela população local, que, por influência da corrente do patriarca, passou a mostrar-se avessa à Sede da Igreja em Roma. No mesmo dia, porém, obteve a comutação de sua pena em prisão perpétua pela intercessão do próprio patriarca de Constantinopla, Paulo II, que estava muito doente e, vendo aproximar-se a hora da morte, arrependeu-se e fez o que ele mesmo chamou de seu último pedido ao imperador.
    Diante de sua patente santidade, fácil de reconhecer em uma simples visita, parte do clero local tentava amenizar, na verdade distorcer, sua forte opinião contra o monotelismo, para conseguir um novo julgamento, mas ele não aceitava tal defesa: corajosamente resistia, condenando essa heresia. E assim esteve preso por mais 85 dias. E para evitar novos apelos em seu favor, pois a população já estava comovida com sua história, oito dias depois de ser enviado secretamente para cidade de Cherson, às margens do Mar Negro, hoje chamada de Sebastopol, em terras de atual Crimeia, em Ucrânia, o imperador emitiu o veredito: exílio. Ou seja, outra arbitrariedade: primeiro foi exilado, e só depois saiu a sentença. E era mais um ardil: aí havia uma grande fome e assim vai faltar-lhe o essencial da alimentação à época: pão, cereais, vinho e azeite. Nosso Santo vai morrer de inanição em 655.


    Foi o último Papa a ser martirizado.
    Verdadeiro devoto da Santíssima Mãe, durante seu papado foi celebrada pela primeira vez a festa da Virgem Imaculada, num dia 25 de março.
    Cristãos que sabiam de sua desventura sepultaram-no diante das muralhas da cidade, mas, com os relatos de milagres que aconteciam junto a sua tumba, tempos mais tarde seus restos mortais foram levados para a igreja de Santa Maria de Blachernas, um distrito de Constantinopla que logo se tornou um santuário, lastimavelmente destruído por muçulmanos de origem otomana, em 1434.
    Suas relíquias, porém, aí já não mais estavam: por precaução, semanas antes foram levadas para Roma e depositadas na Basílica de São Silvestre, que em acréscimo recebeu o nome 'e de São Martinho aos Montes', uma construção localizada no centro histórico e que remonta o século IV. A cripta foi dedicada a ele.


    São Martinho, rogai por nós!