sábado, 31 de agosto de 2024

São Raimundo Nonato


    Nonato quer dizer 'não nascido', pois São Raimundo foi tirado do ventre da mãe quando ela já havia falecido. Por esse fato, foi eleito patrono das mulheres que desejam engravidar, das grávidas, dos recém-nascidos, das parteiras e dos obstetras.
    Sua família era espanhola, catalã de Portell. Nobre mas de poucas propriedades, seu pai, logo que percebeu suas inclinações religiosas, quis fazê-lo administrador na corte real de Aragon, no nordeste da Espanha, e depois entregou-lhe as fazendas ao seu gerenciamento. No entanto, nosso Santo dava-se a exercer os ofícios dos trabalhadores e pastores, conforme suas necessidades de ajuda, e o tempo restante gastava entre o silêncio e a oração, que só confirmavam sua forte vocação para a .
     À época, um jovem francês, que viria a ser São Pedro Nolasco, mudou-se de sua pequena cidade, Mas-des-Saintes-Puelles, no sul da França, para Barcelona, com a finalidade de fazer frente à heresia divulgada pelos albigenses. Contudo, em 1218 terminou fundando a Ordem Real e Militar de Nossa Senhora das Mercês da Redenção dos Cativos, a pedido da própria Maria Santíssima que lhe apareceu em sonho, cujo carisma era libertar os cristãos que estavam sendo capturados pelos muçulmanos, então impiedosos dominadores de quase toda Península Ibérica, para serem vendidos como escravos na Argélia, no norte da África. Não por acaso, desde 1203 ele já arrecadava a 'esmola dos cativos' nas igrejas e nos ambientes cristãos, que para eles era a única chance de libertação.
    Diante desta aterradora realidade, e ali mesmo, em terras europeias, se por seu nascimento São Raimundo foi resgatado da morte, vai dedicar sua vida ao resgate da escravidão. Em 1224, aos 24 anos, recebe do próprio São Pedro Nolasco o hábito da Ordem dos Mercedários. Tornou-se Sacerdote e, após anos libertando cristãos na Espanha, o que fez até gastar toda sua herança, foi enviado a África, para onde já haviam sido enviados muitos cristãos escravizados. Tamanho era seu ardor e devoção pela Salvação das almas que, um dia, após exauridos todos recursos com os quais negociava, nosso Santo se ofereceu em troca de um escravo cristão.


    Como tal situação de calamidade que não retrocedia, sua esperança era dedicar os anos que lhe restavam para alimentar a fé dos escravizados permanecendo em sua companhia, tomando confissões e animando-os pela oração e adoração ao Santíssimo Sacramento


    Das inspiradas pregações que fazia, e conseguia converter até mesmo os muçulmanos, logo se tornou vítima da ira dos donos de escravos. Foi sentenciado à morte por empalamento, mas acabou poupado por seu valor em possível resgate. Sofreu várias e frequentes torturas, e como não parava de pregar pessoa a pessoa ou às ocultas, convertendo inclusive seus guardas, teve seus lábios perfurados com um ferro em brasa e fechados com um cadeado.


    Nessa condição, padeceu 8 meses até ser libertado mediante resgate em 1239, de coletas feitas pelo próprio São Pedro Nolasco, após saber que ele ainda estava vivo, e, realmente muito doente, foi levado de volta a Espanha.
    Ao saber de sua libertação, o Papa Gregório IX nomeou-o cardeal, pois por seus conhecimentos e oratória queria-o como conselheiro em Roma. Ele, no entanto, continuou vivendo como monge mendicante, pois era muito requisitado lá mesmo na Espanha. Em 1240, enfim, mesmo sem ter recuperado a plena saúde, resolveu atender ao chamado do papa, porém, ao iniciar a viagem, morreu tomado por fortes febres ainda em Cardona, bem próximo a Barcelona.
    Seu corpo foi enterrado na capela de São Nicolau, onde havia servido como Sacerdote. Em volta dela, entre 1597 e 1625, em sua homenagem foi construído o Monastério de São Raimundo de Portell, também conhecido como o Escorial de Segarra.




    São Raimundo Nonato, rogai por nós!

sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Igreja Viva


    A Igreja não existiria sem o Espírito Santo. Através da Comunhão da Santíssima Trindade, podemos dizer ela é obra Sua, pois São Lucas registra que até a comunicação entre Jesus e os Apóstolos se dava através d'Ele: "... contei toda sequência das ações e dos ensinamentos de Jesus, desde o princípio até o dia em que, depois de ter dado pelo Espírito Santo Suas instruções aos Apóstolos que escolhera, foi arrebatado ao Céu." At 1,1-2
    Este evangelista também anotou que Jesus disse que, para testemunhá-Lo, os Apóstolos primeiro precisariam receber o Espirito Santo: "... descerá sobre vós o Espírito Santo e dá-vos-á força. E sereis Minhas testemunhas em Jerusalém, em toda Judeia e Samaria e até os confins do mundo." At 1,8
    A Igreja nasceu, portanto, com a Vinda do Espírito de Deus, e católica, quer dizer, falando ao mundo, como Jesus disse de Suas testemunhas e o Amado Médico descreveu: "Todos eles unanimemente perseveravam em oração, junto às mulheres, entre elas Maria, Mãe de Jesus, e os irmãos d'Ele. Chegando o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente, veio do céu um ruído, como se soprasse um impetuoso vento, e encheu toda casa onde estavam sentados. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem." At 1,14:2,1-4
    Ora, ser movido pelo Espírito de Deus é a condição de ser de todo cristão, como o próprio Jesus afirmou e São João Evangelista explica: "Quem crê em Mim, como diz a Escritura: 'Do seu interior manarão rios de Água Viva (Zc 14,8; Is 58,11).' Dizia isso, referindo-Se ao Espírito que haviam de receber os que n'Ele cressem, pois ainda não fora dado o Espírito, visto que Jesus ainda não tinha sido glorificado." Jo 7,38-39
    Por isso, para salvar almas e para formar o Corpo Místico de Cristo, desde sua primeira pregação São Pedro já convocava o povo à Confissão a ao Batismo, e prometia-lhes: "Arrependei-vos e cada um de vós seja batizado em Nome de Jesus Cristo para remissão de vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo." At 2,38
    E São Paulo diz com todas letras que vivemos sob o Ministério do Santo Paráclito: "Ora, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, se revestiu de tal glória que os filhos de Israel não podiam fitar os olhos no rosto de Moisés, por causa do resplendor de sua face, embora transitório, quanto mais glorioso não será o Ministério do Espírito?" 2 Cor 3,7
    Também deixou claro que a Palavra de Deus não pode ser corretamente interpretada sem a ajuda do Divino Paráclito: "Não que sejamos capazes por nós mesmos de ter algum pensamento, como de nós mesmos. Nossa capacidade vem de Deus. Ele é que nos fez aptos para ser Ministros da Nova Aliança, não a da letra, e sim a do Espírito. Porque a letra mata, mas o Espírito vivifica." 2 Cor 3,5-6
    O Príncipe dos Apóstolos diz o mesmo, afirmando que a Palavra de Deus não pode ser interpretada de pessoal modo: "Antes de tudo, sabei que nenhuma profecia da Escritura é de pessoal interpretação. Porque profecia alguma jamais foi proferida por efeito de vontade humana. Homens inspirados pelo Espírito Santo, falaram da parte de Deus." 2 Pd 1,20-21
    Ou seja, longe de meramente literais ou pessoais interpretações, temos que buscar o que tem sido revelado pelo Espírito Santo, pois Jesus prometeu à Igreja Sua especialíssima assistência, que nunca a abandona, por um instante sequer: "E Eu rogarei ao Pai, e Ele dá-vos-á outro Consolador, para que convosco fique eternamente. É o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber, porque não O vê nem O conhece. Mas vós conhecê-Lo-eis, porque convosco permanecerá e em vós estará." Jo 14,16-17
    E quanto aos verdadeiros cristãos, Ele disse à samaritana quando estava no poço de Jacó: "Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e Verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e Seus adoradores devem adorá-Lo em espírito e Verdade." Jo 4,23-24
    Ora, Jesus identificou-O como Aquele que vinha para ensinar todas coisas de que precisamos saber, e fazer-nos recordar tudo que Ele já havia dito: "Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em Meu Nome, ensiná-vos-á todas coisas e recordá-vos-á tudo que vos tenho dito." Jo 14,26
     É Ele, pois, que tem acompanhado a Igreja através dos tempos, levando-nos a compreender as Revelações de Deus em Sua Palavra e na Encarnação do Cristo, bem como nos demais assuntos que surgem através dos séculos. Nosso Senhor acrescentou: "Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, ensiná-vos-á toda a Verdade, porque não falará por Si mesmo, mas dirá o que ouvir, e anunciá-vos-á as coisas que virão." Jo 16,13
    De fato, os Apóstolos não podiam, em tão breve período, compreender tudo que Jesus tinha para ensinar. Ele mesmo disse-lhes: "Muitas coisas ainda tenho a dizer-vos, mas agora não podeis suportá-las." Jo 16,12
    Por isso, como visto, Ele enviou o Santo Espírito para que permanecesse para sempre com Sua Igreja, Cuja função é exatamente apascentar Seu rebanho: "E Eu rogarei ao Pai, e Ele dá-vos-á outro Consolador, para que convosco fique eternamente." Jo 14,16
    Pois Ele é o maior e melhor presente que Deus tem para oferecer-nos, ainda segundo Nosso Salvador: "Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas coisas a vossos filhos, quanto mais Vosso Pai Celestial dará o Espírito Santo aos que LhO pedirem." Lc 11,13


DONS ESPIRITUAIS

    São Pedro, assumindo sua posição de primaz da Igreja, num de seus primeiros sermões foi movido pelo Espírito de Deus para destemidamente falar aos sacerdotes judeus. Isso deu-se no Sinédrio, quando ele e o Amado Discípulo foram presos pela primeira vez: "Então Pedro, cheio do Espírito Santo, respondeu-lhes: 'Chefes do povo e anciãos, ouvi-me...'" At 4,8
    Aliás, tal e qual Jesus havia predito: "Porém, quando vos levarem às sinagogas, perante os magistrados e as autoridades, não vos preocupeis com o que haveis de falar em vossa defesa, porque o Espírito Santo vos inspirará naquela hora o que deveis dizer." Lc 12,11-12
    Assim, quem mentia a São Pedro, representante máximo da nascente comunidade cristã, mentia ao Espírito Santo, ou seja, ao próprio Deus: "Pedro, porém, disse: 'Ananias, por que Satanás tomou conta de teu coração, para mentires ao Espírito Santo e enganares acerca do valor do campo? Não foi aos homens que mentiste, mas a Deus!'" At 5,3.4b
    Os sete primeiros Diáconos da Igreja, que seriam auxiliares dos Apóstolos, da mesma forma foram escolhidos exatamente por serem movidos pelo Espirito de Deus, como o Colégio dos Apóstolos determinou: "Portanto, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de Sabedoria, aos quais encarregaremos este ofício." At 6,3
    E como bem expressou Santo Estevão, um desses sete, contrariar a Igreja é contrariar o Divino Espírito. Ele condenou os chefes dos judeus reunidos no Sinédrio para julgá-lo: "Homens de dura cerviz, e de incircuncisos corações e ouvidos! Vós sempre resistis ao Espírito Santo. Como procederam vossos pais, assim também procedeis vós!" At 7,51
    Ora, os Apóstolos, colunas da Igreja, batizavam e crismavam pela unção do Espírito de Deus, como vemos no 'Pentecostes dos Samaritanos': "Os Apóstolos que se achavam em Jerusalém, tendo ouvido que a Samaria recebera a Palavra de Deus, enviaram-lhe Pedro e João. Estes, assim que chegaram, fizeram oração pelos novos fiéis, a fim de receberem o Espírito Santo, visto que ainda não havia descido sobre nenhum deles, mas tinham sido somente batizados em Nome do Senhor Jesus. Então os dois Apóstolos impuseram-lhes as mãos, e receberam o Espírito Santo." At 8,14-17
    Era, pois, pela ação do Divino Paráclito que a Igreja crescia: "A Igreja então gozava de Paz por toda Judeia, Galileia e Samaria. Estabelecia-se caminhando no temor do Senhor, e a assistência do Espírito Santo fazia-a crescer em número." At 9,31
    Foi Ele mesmo Quem decidiu, pela pregação de São Pedro, descer sobre os não judeus, pois quer agregar todos povos em Sua Igreja. Era o 'Pentecostes dos não judeus': "Estando Pedro ainda a falar, o Espírito Santo desceu sobre todos que ouviam a Palavra. Os fiéis da circuncisão, que tinham vindo com Pedro, profundamente admiraram-se vendo que o dom do Espírito Santo também era derramado sobre os não judeus..." At 10,44-45
    São Barnabé, igualmente, só conseguia atrair tanta gente para a Igreja porque o Espírito de Deus agia por seu intermédio: "A notícia dessas coisas chegou aos ouvidos da igreja de Jerusalém. Enviaram então Barnabé até Antioquia. Ao chegar lá, alegrou-se, vendo a Graça de Deus, e a todos exortava a perseverar no Senhor com firmeza de coração, pois era um homem de bem, cheio do Espírito Santo e de . Assim uma grande multidão uniu-se ao Senhor." At 11,22-24
    É o Espírito de Cristo, portanto, Quem decide quais missões são mais importantes para a divulgação do Evangelho. Aconteceu ainda na Antioquia: "Enquanto celebravam o culto do Senhor, depois de terem jejuado, disse-lhes o Espírito Santo: 'Separai-Me Barnabé e Saulo para a obra a que os tenho destinado.'" At 13,2
    Foi Ele Quem decidiu o Primeiro Concílio da Igreja, como afirmou São Tiago Menor, já Bispo de Jerusalém: "Com efeito, bem pareceu ao Espírito Santo e a nós não vos impor outro peso além do indispensável seguinte..." At 15,28
    Também decidia as áreas de atuação, como determinou a São Paulo e São Timóteo: "Atravessando em seguida a Frígia e a província da Galácia, foram impedidos pelo Espírito Santo de anunciar a Palavra de Deus na província da Ásia." At 16,6
    E até mesmo o destino das apostólicas viagens: "Ao chegarem aos confins da Mísia, tencionavam seguir para a Bitínia, mas o Espírito de Jesus não o permitiu." At 16,7
    É Ele Quem investe os Bispos da Igreja, como São Paulo disse aos Anciãos de Éfeso, implicitamente afirmando a Divindade de Jesus: "Cuidai de vós mesmos e de todo rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu Bispos, para pastorear a Igreja de Deus, que Ele adquiriu com Seu próprio Sangue." At 20,28
    É Ele Quem nos leva a amar a Deus e ao próximo, como o Último Apóstolo ensinou aos romanos: "E a esperança não engana. Porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado." Rm 5,5
    É Ele Quem nos dá a esperança que conduz à Vida Eterna: "O Deus da esperança encha-vos de toda alegria e de toda Paz na vossa fé, para que pela virtude do Espírito Santo transbordeis de esperança!" Rm 15,13
    Pois desde o Batismo ministrado pela Igreja de Jesus, o Espírito de Deus vem habitar em nós. Ele argumenta perante os coríntios: "Ou não sabeis que vosso corpo é Templo do Espírito Santo, que habita em vós, o Qual recebestes de Deus e que, por isso mesmo, já não vos pertenceis?" 1 Cor 6,19
    É Ele Quem constantemente intercede pelos 'santos', como ele genericamente chamava os membros expoentes da Igreja: "E Aquele que perscruta os corações sabe o que deseja o Espírito, o Qual intercede pelos santos, segundo Deus." Rm 8,27
    E socorre-nos em nossas maiores fragilidades: "Outrossim, o Espírito vem em auxílio à nossa fraqueza. Porque não sabemos o que devemos pedir, nem orar como convém, mas o Espírito mesmo intercede por nós com inexprimíveis gemidos." Rm 8,26
    Assim, não há como fazer parte da Igreja, que é o Corpo Místico de Cristo, a habitação de Deus, sem Ele, que nos faz participar da Comunhão dos Santos: "Consequentemente, já não sois hóspedes nem peregrinos, mas sois concidadãos dos Santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos Apóstolos e profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. É n'Ele que todo edifício, harmonicamente disposto, levanta-se até formar um Templo Santo no Senhor. É n'Ele que vós também entrais, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a habitação de Deus." Ef 2,19-22
    Com efeito, é Ele Quem distribui os divinos dons, e sempre visando o bem da comunidade eclesial, nunca para atacá-la: "A cada um é dada a manifestação do Espírito para comum proveito. Mas é um e o mesmo Espírito que distribui todos estes dons, repartindo a cada um como Lhe apraz." 1 Cor 12,7.11
    Pois a exclusiva razão de ser desses dons é servir à Igreja, que é o Reino de Sacerdotes de Cristo, ou seja, o próprio Reino de Deus: "Assim, uma vez que aspirais aos dons espirituais, procurai tê-los em abundância para edificação da Igreja." 1 Cor 14,12
    Enfim, só com Sua ajuda somos capazes de compreender a Missão de Jesus e reconhecê-Lo como Deus, e Nosso Salvador: "... ninguém pode dizer: 'Jesus é o Senhor', senão sob a ação do Espírito Santo." 1 Cor 12,3


ESPÍRITO DE COMUNHÃO

    Devemos ajudar uns aos outros, portanto, unidos pelo Espírito em oração, como São Judas Tadeu diz: "Mas vós, caríssimos, mutuamente edificai-vos sobre o fundamento da vossa santíssima fé. Orai no Espírito Santo." Jd 1,20
    De fato, segundo São Paulo não temos como fugir desses compromissos: "Pois os dons e o chamado de Deus são irrevogáveis." Rm 11,29
    E: "... quem se une ao Senhor, com Ele torna-se um só Espírito." 1 Cor 6,17
    Também diz da Paixão de Cristo, que devemos abraçar como nosso caminho: "Se com Ele fomos feitos o mesmo Ser..." Rm 6,5
    Pois a Unção do Espírito de Deus nos conduz a Verdade, como Jesus disse e São João Evangelista vai repetir: "Vós, porém, tendes a Unção do Santo e sabeis todas coisas. ... a Unção que d'Ele recebestes permanece em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine. Mas como Sua Unção vos ensina todas coisas, assim é ela verdadeira e não mentira. Permanecei n'Ele, como ela vos ensinou." 1 Jo 2,20.27
    Por isso, desde os Apóstolos a Igreja conta com o testemunho humano instituído por Jesus: "Aceitamos o testemunho dos homens." 1 Jo 5,9a
    De fato, Ele mesmo defendeu este precioso recurso, e ainda no Domingo da Ressurreição: "Por fim, apareceu (Jesus) aos Onze, quando estavam sentados à mesa, e censurou-lhes a incredulidade e dureza de coração, por não acreditarem nos que O tinham visto ressuscitado." Mc 16,14
    E também repreendeu a São Tomé, pelo mesmo motivo, no marcante mas egocentrista episódio do 'ver para crer': "Não sejas incrédulo, mas homem de fé." Jo 20,27b
    Tais dons, pois, têm por inarredável fim conduzir-nos à Unidade da fé, pois para isso somos inspirados por um só Espírito, como São Paulo prega: "Há diversidade de dons, mas um só Espírito. Em um só Espírito fomos batizados todos nós, para formar um só Corpo, judeus ou gregos, escravos ou livres. E todos fomos impregnados do mesmo Espírito." 1 Cor 12,4.13
    Unidade que assim ele explicita: "Aquele que desceu também é Aquele que subiu acima de todos Céus, para levar à plenitude todas coisas. A uns Ele constituiu Apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores, doutores, para o aperfeiçoamento dos cristãos, para o desempenho da tarefa que visa à construção do Corpo de Cristo, até que todos tenhamos chegado à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado de homem feito, a estatura da maturidade de Cristo. Para que não continuemos crianças ao sabor das ondas, agitados por qualquer sopro de doutrina, ao capricho da malignidade dos homens e de seus enganadores artifícios. Mas pela sincera prática da caridade cresçamos em todos sentidos, n'Aquele que é a Cabeça, Cristo. É por Ele que todo Corpo, coordenado e unido por conexões que estão ao Seu dispor, trabalhando cada um conforme a atividade que lhe é própria, efetua esse crescimento, visando sua plena edificação na caridade." Ef 4,10-16
    Porque a missão da Igreja é a iluminação e elevação dos filhos de Deus, como os seguidores da tradição de São Paulo atestaram: "Porque aqueles que uma vez foram iluminados saborearam o dom celestial, participaram dos dons do Espírito Santo..." Hb 6,4
    São Paulo mesmo afirma o diferencial que se estabeleceu no Pentecostes: "A Lei do Espírito de Vida libertou-me, em Jesus Cristo, da lei do pecado e da morte. ... pois todos aqueles que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus." Rm 8,2.14
    Porque testemunhar Jesus é uma questão de obediência, a Deus e à Verdade. Apontando Jesus como o Salvador, São Pedro afirmou perante o Sinédrio como se recebe o Divino Paráclito: "Deste fato nós somos testemunhas, nós e o Espírito Santo, que Deus deu a todos aqueles que Lhe obedecem." At 5,32
    É Ele, pois, Quem promove a Unidade da Igreja através da Eucaristia: "A Graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a Comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós!" 2 Cor 13,13
    E a Igreja vive porque se alimenta do Pão da Vida Eterna, como Jesus prometeu: "Como vive o Pai que Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, assim aquele que comer Minha Carne também viverá por Mim." Jo 6,57
    Vida que se prorrogará pela eternidade, ainda segundo Ele: "Eu sou o Pão Vivo que desceu do Céu. Quem comer deste Pão viverá eternamente." Jo 6,51a
    Mas também advertiu: "Em Verdade, em Verdade, digo-vos: se não comerdes a Carne do Filho do Homem, e não beberdes Seu Sangue, não tereis a Vida em vós mesmos." Jo 6,53b
    Nestes mesmos termos explicava Sua Palavra, rejeitada pelos judeus: "E vós não quereis vir a Mim, para que tenhais a Vida..." Jo 5,40
    Explicava Sua própria Vida: "Pois como o Pai tem a Vida em Si mesmo, assim também deu ao Filho ter a Vida em Si mesmo..." Jo 5,26
    E assim Sua morte na Cruz: "Ainda um pouco de tempo e o mundo já não Me verá. Vós, porém, tornareis a ver-Me, porque Eu vivo e vós vivereis." Jo 14,19
    Sua Ressurreição: "Naquele dia, conhecereis que estou em Meu Pai, e vós em Mim e Eu em vós." Jo 14,20
    Seu poder: "O Pai ama-Me porque dou Minha Vida para retomá-la. Ninguém a tira de Mim, mas dou-a por Mim mesmo, pois tenho poder para dá-la como tenho poder para reassumi-la." Jo 10,17-18a
    Sua Divindade, apresentando-Se como igual a Deus: "Com efeito, como o Pai ressuscita os mortos e dá-lhes Vida, assim o Filho também dá Vida a quem Ele quer." Jo 5,21
    E o próprio Pai, de Quem já estão afastadas as almas condenadas ao inferno: "Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, porque para Ele todos vivem." Lc 20,38
    São João Evangelista vai dizer de Jesus: "N'Ele havia a Vida, e a Vida era a Luz dos homens." Jo 1,4
    E mais: "... porque a Vida se manifestou, e nós temo-la visto..." 1 Jo 1,2a
    Ele completa: "E o testemunho é este: Deus deu-nos a Vida Eterna, e esta Vida está em Seu Filho. Quem possui o Filho possui a Vida, quem não tem o Filho de Deus não tem a Vida." 1 Jo 5,11-12
    Aliás, assim arrematou seu Evangelho: "Jesus fez diante dos discípulos muitos outros sinais, que não estão escritos neste Livro. Estes, porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a Vida em Seu Nome." Jo 20,30-31
    E diz do Salvífico Amor: "Nisto se manifestou o amor de Deus para conosco: em ter-nos enviado ao mundo Seu único Filho, para que por Ele vivamos." 1 Jo 4,9
    É o que conclui São Paulo: "Eu vivo, mas já não sou eu, é Cristo que vive em mim." Gl 2,20a
    Ele questiona os coríntios: "Examinai a vós mesmos, se estais na fé. Provai-vos a vós mesmos. Acaso não reconheceis que Cristo Jesus está em vós?" 2 Cor 13,5a
    Exorta os colossenses: "Como (de nossa pregação) recebestes o Senhor Jesus Cristo, n'Ele vivei, n'Ele enraizados e edificados, inabaláveis na fé em que fostes instruídos, com o coração a transbordar de gratidão!" Cl 2,6-7
    Tinha isso por missão, como se apresenta na Segunda Carta a São Timóteo: "Paulo, Apóstolo de Jesus Cristo pela vontade de Deus, para anunciar a promessa da Vida que está em Jesus Cristo..." 2 Tm 1,1
    Fala, no entanto, de uma vida de tribulações neste mundo: "Trazemos sempre em nosso corpo os traços da morte de Jesus, para que a Vida de Jesus também se manifeste em nosso corpo. Embora estando vivos, somos a toda hora entregues à morte por causa de Jesus, para que a Vida de Jesus também apareça em nossa carne mortal." 2 Cor 4,10-11
    E exorta-nos: "Porque estais mortos, e vossa vida está escondida com Cristo em Deus." Cl 3,3
    Ele aponta Jesus como o Novo Adão, de absolutamente nova condição: "Como está escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito vivente alma (Gn 2,7); o Segundo Adão é Vivificante Espírito." 1 Cor 15,22.45
    Por isso, aos romanos trata de assegurar do Purgatório: "Para isso é que Cristo morreu e retomou a Vida, para ser o Senhor tanto dos mortos como dos vivos." Rm 14,9
    Também aos tessalonicenses: "Ele morreu por nós, a fim de que nós, quer em estado de vigília, quer de sono, vivamos em união com Ele." 1 Ts 5,10
    Bem como do poder de Sua Vida: "Se quando ainda éramos inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de Seu Filho, com muito mais razão, já estando reconciliados, seremos salvos por Sua Vida." Rm 5,10
    E garante: "Se o Espírito d'Aquele que ressuscitou Jesus dos mortos habita em vós, Ele, que ressuscitou Jesus Cristo dos mortos, também dará a Vida a vossos corpos mortais pelo Seu Espírito que habita em vós. De fato, se viverdes segundo a carne, haveis de morrer. Mas, se pelo Espírito mortificardes as obras da carne, vivereis..." Rm 8,11.13
    Numa assertiva, porém, também adverte: "Vós, porém, não viveis segundo a carne, mas segundo o Espírito, se realmente o Espírito de Deus habita em vós. Se alguém não possui o Espírito de Cristo, este não é d'Ele." Rm 8,9
    Temendo pelo pior, ele clama aos tessalonicenses alertando desse incrível poder que temos de, pelo livre arbítrio, virarmos as costas para Deus: "Não extingais o Espírito." 1 Ts 5,19
    Sem dúvida, é a Ele que ofendemos com nossos pecados, pois Ele é o Selo que nos garante a Salvação: "Não contristeis o Espírito Santo de Deus, com o Qual estais selados para o Dia da Redenção." Ef 4,30
    Assim como é por Seu poder que os Sacerdotes da Igreja têm o poder de perdoar os pecados, pois para tanto Nosso Salvador tratou de ungir os Dez Apóstolos, logo em Sua primeira aparição após ressuscitar: "Depois dessas palavras, Jesus soprou sobre eles dizendo-lhes: 'Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, sê-lhes-ão perdoados. Àqueles a quem os retiverdes, sê-lhes-ão retidos.'" Jo 20,22-23
    O próprio Evangelho, enfim, só pode ser anunciado através de Seu poder, conforme as palavras de São Paulo: "Nosso Evangelho foi-vos pregado não somente por palavra, mas também com poder, com o Espírito Santo e com plena convicção. Sabeis o que entre vós temos sido para vossa Salvação." 1 Ts 1,5
    Pois as palavras da Bíblia, segundo São Pedro, são "... revelações que agora vos têm sido anunciadas por aqueles que vos pregaram o Evangelho da parte do Espírito Santo, enviado do Céu." 1 Pd 1,12
    E essas revelações atingem em cheio nossa alma: "Porque a Palavra de Deus é viva, eficaz, mais penetrante do que uma espada de dois gumes e atinge até a divisão da alma e do corpo, das juntas e medulas, e discerne os pensamentos e intenções do coração." Hb 4,12
    A Igreja, portanto, guarda a Sã Doutrina por Sua virtude, que age em Seus Sacerdotes e fiéis. Referindo-se à Revelação, São Paulo recomenda a São Timóteo: "Guarda o Precioso Depósito, pela virtude do Espírito Santo que em nós habita." 2 Tm 1,14
    Também diz aos coríntios: "Não há dúvida de que vós sois uma carta de Cristo, redigida por nosso ministério e escrita, não com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, em vossos corações." 2 Cor 3,3
    Os seguidores deste grande Apóstolo deixaram fortes argumentos sobre a importância da Palavra que pelos séculos é guardada e divulgada pela Igreja: "Por isso, é necessário prestarmos a maior atenção à mensagem que temos recebido, para não acontecer que nos desviemos do reto caminho. A Palavra anunciada por intermédio dos anjos era a tal ponto válida, que toda transgressão ou desobediência recebeu o justo castigo. Como, então, escaparemos nós se agora desprezarmos a mensagem da Salvação, tão sublime, primeiro anunciada pelo Senhor e depois confirmada pelos que a ouviram, comprovando-a o próprio Deus por sinais, prodígios, milagres e pelos dons do Espírito Santo, repartidos segundo Sua vontade?" Hb 2,1-4
    Como a São Timóteo afirmou o Apóstolo dos Gentios, a Igreja, instantemente inspirada pelo Espírito de Cristo, é viva, é a guardiã da Verdade: "Todavia, se eu tardar, quero que saibas como deves portar-te na Casa de Deus, que é a Igreja de Deus Vivo, coluna e sustentáculo da Verdade." 1 Tm 3,15
    E como São João Evangelista argumenta, a Verdade sempre permanecerá com a Igreja: "O Ancião à Eleita Senhora e a seus filhos, que amo na Verdade. Não somente eu, mas todos que também conheceram a Verdade, por causa da Verdade que em nós permanece e que conosco eternamente ficará." 2 Jo 1,1-2
    Por tudo isso, imaginar a Igreja 'afastada da Palavra' ou vencida por Satanás é grande engano. Antes ela é um pedaço do Céu, o Reino de Sacerdotes de Deus pelo qual a Santa Missa se torna possível: "Sim, possuindo nós um Inabalável Reino, dediquemos a Deus um reconhecimento que Lhe torne agradável nosso culto com temor e respeito, porque Nosso Deus é um fogo devorador (Dt 4,24)." Hb 12,28
    Pois, como visto, ela é plenamente animada pelo "... Espírito Santo, Autor da Graça!" Hb 10,29
    Assim, movida pelo próprio Deus, em assuntos de fé a Igreja é infalível. A Palavra que ela divulga é a própria Vida, como todos Apóstolos ouviram após serem presos pelo Sinédrio: "Mas, de noite, um anjo do Senhor abriu as portas do cárcere e, conduzindo-os para fora, disse-lhes: 'Ide e apresentai-vos no Templo, e pregai ao povo as Palavras desta Vida.'" At 5,19-20
    É o que tem acontecido desde o Antigo Testamento, como Santo Estevão disse sobre Moisés: "Este é aquele que esteve entre o povo congregado no deserto, com o anjo que lhe falara no monte Sinai e com nossos pais. Aquele que recebeu Palavras de Vida para transmitir-nos." At 7,38
    Vida esta que é o próprio Jesus, Único Caminho para Deus: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai senão por Mim." Jo 14,6b
    Assim a Igreja jamais vai sucumbir às seduções do inimigo, como Ele mesmo garantiu: "As portas do inferno não prevalecerão contra ela." Mt 16,18b
    Isso já havia sido revelado no Livro de Daniel, séculos antes, como ele registrou sobre Nosso Salvador: "... Seu Reino jamais será destruído." Dn 7,14b
    Também disse São Gabriel Arcanjo à Nossa Senhora, no dia da Anunciação do Senhor: "... e Seu Reino não terá fim." Lc 1,33
    E não podia ser de outra forma, pois ela é de Jesus e por Ele é pessoalmente edificada: "E Eu declaro-te: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei Minha Igreja." Mt 16,18a
    Ele alimenta e cuida da Igreja, como São Paulo diz: "Ninguém jamais odiou sua própria carne. Ao contrário, alimenta-a e cerca-a de cuidados, como Cristo faz com Sua Igreja." Ef 5,29
    Enfim, é Ele mesmo Quem escolhe Seus Sacerdotes, para ministrar Sacramentos que são eternos: "Não fostes vós que Me escolhestes, mas Eu escolhi-vos e constituí-vos para que vades e produzais fruto, e vosso fruto permaneça." Jo 15,16a

    "Lembrai-Vos, ó Pai, de Vossa Igreja!"

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Martírio de São João Batista


    A exemplo da Crucificação de Jesus, o cruel destino que teve São João Batista também ficou para sempre gravado na memória da humanidade: a história do Profeta do Altíssimo, mártir defensor do Sacramento do Matrimônio. Nosso Santo ousou levantar a voz para denunciar o adultério do rei, e ironicamente acabou assassinado não por sua vontade, pois ele o temia, mas por astúcia de sua côrte, lugar costumeiramente constituído, frequentado e assediado por pessoas da pior espécie. A 'nobreza', muitas vezes, representa o que um povo tem de pior.
    Levita como São Mateus, Profeta de primeiríssima grandeza, ele foi o arauto da Vinda do Salvador, como anunciou seu pai, o sacerdote Zacarias, no dia em que nasceu: "E tu, menino, serás chamado Profeta do Altíssimo, porque precederás o Senhor e prepará-Lhe-ás o Caminho, para dar a Seu povo conhecer a Salvação, pelo perdão dos pecados." Lc 1,76-77
    Isso havia sido previsto por São Gabriel Ado Senhor, que o descreveu como um reorientador dos pais para o bem das famílias, um dissuasor de vãs rebeldias e o preparador do povo para o encontro com o Messias. Ele disse a Zacarias quando anunciou miraculosa gravidez de Santa Isabel, pois era idosa e estéril: "... irá adiante de Deus com o Espírito e poder de Elias, para reconduzir os corações dos pais aos filhos e os rebeldes à Sabedoria dos justos, para preparar ao Senhor um bem disposto povo." Lc 1,17
    São João Batista, pois, não 'conseguia' calar-se, não se permitia deixar de proclamar as Verdades de Deus. E não fazia projetos para permanecer por muito tempo nesse mundo, como São Paulo também afirmava: "Mas se o viver no corpo é útil para meu trabalho, então não sei o que devo preferir. Sinto-me pressionado dos dois lados: por uma parte, desejaria desprender-me para estar com Cristo, o que seria imensamente melhor. Mas, de outra parte, continuar a viver é mais necessário, por causa de vós..." Fl 1,22-24
    E completou, em lúcido ensinamento: "Se é só para esta vida que temos colocado nossa esperança em Cristo, somos, de todos os homens, os mais dignos de lástima." 1 Cor 15,19
    São João Batista vivia 'outra' realidade, ou melhor, a verdadeira realidade: o Reino dos Céus, como Jesus anunciava: "Mas se expulso os demônios pelo dedo de Deus, certamente a vós é chegado o Reino de Deus." Lc 11,20
    Como escolheu o deserto, e o povo é que ia até ele, à sua volta a Verdade tinha que prevalecer, a qualquer custo. Não por acaso, Jesus vai questionar aqueles que por ele foram batizados: "Tendo eles partido, disse Jesus à multidão a respeito de João: 'Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Que fostes ver, então? Um homem vestido com luxuosas roupas? Mas os que estão revestidos de tais roupas vivem nos palácios dos reis. Então, por que fostes lá? Para ver um Profeta? Sim, digo-vos Eu, mais que um Profeta. É dele que está escrito: 'Eis que Eu envio Meu mensageiro diante de Ti, para preparar-te o Caminho (Ml 3,1).' E se quereis compreender, ele é o Elias que devia voltar. Quem tem ouvidos, ouça." Mt 11,7-10.14-15
    Sua missão custou-lhe a vida, mas, podemos ter certeza, ele faria tudo de novo, pois sua missão estava em perfeita sintonia com a Boa Nova anunciada por Jesus, que pregou: "Não temais àqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Antes temei Àquele que pode precipitar a alma e o corpo na geena." Mt 10,28
    Ele não se arrependeria de ter condenado, portanto, nem a devassidão do rei nem a corrupção dos costumes, que imperava na côrte e na sociedade judaica à época, inclusive entre religiosos. Sua pregação era tão contundente quanto clara: "Ao ver, porém, que muitos dos fariseus e dos saduceus vinham ao seu batismo, disse-lhes: 'Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da vindoura cólera? Dai, pois, frutos de verdadeira penitência. Não digais dentro de vós: 'Nós temos a Abraão por pai!' Pois eu vos digo: Deus é poderoso para destas pedras suscitar filhos a Abraão.'" Mt 3,7-9
    Ora, o próprio São João Batista era um permanente penitente: "João usava uma vestimenta de pelos de camelo e um cinto de couro em volta dos rins. Alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre." Mt 3,4
    Assim, silêncio ou desfaçatez perante a crescente degeneração moral eram-lhe uma grande ofensa a Deus, porque se viviam os tempos da espera do Messias. Por isso, sua 'rebeldia' era santa, sua profunda indignação impedia-lhe de viver na indiferença. 'Aqueles tempos' eram por demais sérios. Nosso Salvador instruía em mesmo sentido: "Desde então Jesus começou a pregar: 'Fazei penitência, pois o Reino dos Céus está próximo.'" Mt 4,17
     Ele arguia as multidões: "Dizia ainda ao povo: 'Quando vedes levantar-se uma nuvem no poente, logo dizeis: 'Aí vem chuva.' E assim sucede. Quando vedes soprar o vento do sul, dizeis: 'Haverá calor.' E assim acontece. Hipócritas! Sabeis distinguir os aspectos do céu e da Terra. Como, pois, não sabeis reconhecer o presente tempo?'" Lc 12,54-56
    E acusou: "Porque se nesta adúltera e pecadora geração alguém envergonhar-se de Mim e das Minhas palavras, o Filho do Homem também Se envergonhará dele, quando vier na Glória de Seu Pai com Seus santos anjos." Mc 8,38
    As mais altas classes e as autoridades religiosas judaicas, de fato, curvavam-se não só à 'sabedoria' de estrangeiros como também à indecência, aos desmandos e às profanações perpetradas pela corte romana. O bacanal de Herodes era só um exemplo. Muitos judeus tomavam parte ativa em seus 'cultos', pois para eles Herodes seria o próprio Messias, e, de tão pervertidos, até conspirariam contra Jesus: "Saindo dali os fariseus, logo deliberaram com os herodianos como haviam de matá-Lo." Mc 3,6
    Por isso, Jesus exigiu de todos esses falsos religiosos que 'devolvessem' o povo a Deus: "Reuniram-se, então, os fariseus para deliberar entre si sobre a maneira de surpreender Jesus em Suas próprias palavras. Enviaram seus discípulos com os herodianos, que Lhe disseram: 'Mestre, sabemos que és verdadeiro e ensinas o Caminho de Deus em toda a Verdade, sem Te preocupares com ninguém, porque não olhas para a aparência dos homens. Dize-nos, pois, o que Te parece: É permitido ou não pagar o imposto a César?' Jesus, percebendo sua malícia, respondeu: 'Por que Me tentais, hipócritas? Mostrai-Me a moeda com que se paga o imposto!' Apresentaram-Lhe um denário. Perguntou Jesus: 'De quem é esta imagem e esta inscrição?' 'De César', responderam-Lhe. Disse-lhes então Jesus: 'Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.'" Mt 22,16-21
    Mas tudo isso era demais, inaceitável para São João Batista. Cioso das maiores responsabilidades, após anunciar o Cristo não lhe restava outra coisa senão continuar vivendo o que pregava: negar-se a si mesmo: "Importa que Ele cresça e que eu diminua." Jo 3,30
    Para que entendamos o que ele queria dizer com essa frase, um misto de dever cumprido e resignação quanto à vontade de Deus, basta lembrar o que o próprio Jesus disse: "Eu vim lançar fogo à Terra, e que tenho Eu a desejar se ele já está aceso?" Lc 12,49
    Significativamente, para alguém que veio batizar, o brutal martírio de nosso Santo foi também um batismo, tal qual Jesus havia previsto para Si mesmo e para São João Evangelista e São Tiago Maior, mas terminou valendo para os demais Apóstolos e para tantos outros Seus seguidores: "Vós bebereis o cálice que Eu devo beber, e sereis batizados no batismo em que Eu devo ser batizado." Mc 10,39


    Vemos, então, que o Batista não poderia simplesmente passar por esse mundo, como muitos de nós pretendemos. E seu destino, que não nos enganemos, não foi a desgraça de uma horrível morte, mas a Eterna Glória. Não lhe importava a violência ou a humilhação desse batismo, mas seu compromisso com a Verdade, com Deus. É Jesus Quem faz a melhor síntese de sua missão, ao falar aos religiosos da época: "Vós enviastes mensageiros a João, e ele deu testemunho da Verdade." Jo 5,33
    Essa era muito cara questão a Jesus, a essência de Sua própria Missão. Ele disse diante de Pilatos: "É para dar testemunho da Verdade que nasci e vim ao mundo. Todo aquele que é da Verdade ouve Minha voz." Jo 18,37b
    E tão horrenda passagem também foi a de Cristo, como Ele disse ao aproximar-se o momento de Seu Martírio: "Respondeu-lhes Jesus: 'É chegada a hora para o Filho do Homem ser glorificado. Presentemente, Minha alma está perturbada. Mas que direi?... Pai, salva-Me desta hora... Mas é exatamente para isso que vim a esta hora.'" Jo 12,23.27
    Aliás, é, em certo sentido, o que Ele determinou a todos nós: "Porque aquele que quiser salvar sua vida, perdê-la-á. Mas aquele que perder sua vida por amor a Mim e ao Evangelho, salvá-la-á." Mc 8,35
    De fato, São João Batista cumpriu muito bem sua missão. Primeiro, pregando o arrependimento dos pecados, e assim preparava o povo de Israel para encontrar-se com Deus Jesus, antecipando Seu próprio anúncio: "Naqueles dias, apareceu João Batista, pregando no deserto da Judeia. Dizia ele: 'Fazei penitência, porque o Reino dos Céus está próximo.'" Mt 3,1-2
    Em seguida, tomando Confissões e batizando, para purificar-lhes os pecados: "Pessoas de Jerusalém, de toda Judeia e de toda circunvizinhança do Jordão vinham a ele. Confessavam seus pecados e por ele eram batizados nas águas do Jordão." Mt 3,5-6
    Com efeito, esse era o sentido do seu batismo, como vai dizer São Lucas: "Ele percorria toda região do Jordão, pregando o batismo de arrependimento para remissão dos pecados..." Lc 3,3
    Por fim, após batizar Jesus, passou a anunciá-Lo como o Redentor: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo." Jo 1,29
    Deu esse testemunho: "É Este de Quem eu disse: 'Depois de mim virá um Homem, que me é superior, porque existe antes de mim.' Eu não O conhecia, mas, se vim batizar em água, é para que Ele Se torne conhecido em Israel.'" Jo 1,30-31
    Ora, logo após batizar Jesus ele já tinha afirmado, segundo São João Evangelista, testemunha ocular do fato: "João havia declarado: 'Vi o Espírito descer do Céu em forma de uma pomba e repousar sobre Ele.'" Jo 1,32
    E revelou que recebera de Deus esta missão (e certamente não foi a única!): "Eu não O conhecia, mas Aquele que me mandou batizar em água disse-me: 'Sobre Quem vires descer e repousar o Espírito, Este é Quem batiza no Espírito Santo.'" Jo 1,33
    Em seu louvor, portanto, Jesus declarou que o Batista era o maior dentre os homens até então. Contudo, antes de Sua Ressurreição, era inferior às celestiais criaturas: "Pois digo-vos: entre os nascidos de mulher não há maior que João. Entretanto, o menor no Reino de Deus é maior que ele." Lc 7,28
    De fato, o sagrado autor da Carta aos Hebreus vai invocar esse interlóquio entre o salmista e Deus: "Alguém em certa passagem afirmou: 'Que é o homem para que dele Te lembres, ou o filho do homem, para que o visites? Fizeste-o, por pouco, menor que os anjos... (Sl 8,5-6a)." Hb 2,6-7a
    Por sua grandeza, pois, embora haja evidências em contrário, ele poderia muito bem ser um dos Santos que ressurgiram logo após a Ressurreição de Jesus, como São Mateus registrou: "Os sepulcros abriram-se e os corpos de muitos justos ressuscitaram. Saindo de suas sepulturas, entraram na Cidade Santa depois da Ressurreição de Jesus e apareceram a muitas pessoas." Mt 27,52-53
    E falando sobre Jesus aos principais dos judeus, São João Batista disse uma frase que ainda hoje ecoa nos ouvidos de muitos de nós: "Este foi o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram sacerdotes e levitas de Jerusalém para perguntar-lhe: 'Quem és tu?' João respondeu: 'Eu batizo com água, mas no meio de vós está Alguém que vós não conheceis.'" Jo 1,19.26
    Assim, pelo exemplo desse eremita, um legítimo essênio, devemos ser mais conscientes de nosso compromisso com a Verdade, isto é, a obrigação de testemunhar o Cristo. Não podemos simplesmente admirar sua coragem: seria muito pouco! Foi o que Jesus disse: "João era uma lâmpada que ardia e iluminava. Vós, porém, só por uma hora quisestes alegrar-vos com sua Luz." Jo 5,35
    Jesus, portanto, está no meio de nós, como o Batista disse. Não desprezemos esse anúncio que tão caro lhe custou. Não nos alegremos com a Luz do último grande Profeta só por uma hora. Seu martírio é um sinal da força do Espírito Santo que o movia, assim como da Glória que lhe esperava. E apesar de destemido, ele tudo fez na mais perfeita humildade: "Eu batizo-vos com água, em sinal de penitência, mas Aquele que virá depois de mim é mais poderoso que eu, e nem sou digno de tirar-Lhe as sandálias. Ele batizá-vos-á no Espírito Santo e em fogo." Mt 3,11
    Isso bem explica sua reação ao ver o Cristo: "Da Galileia foi Jesus ao Jordão ter com João, a fim de ser batizado por ele. João recusava-se: 'Eu devo ser batizado por Ti e Tu vens a mim?'" Mt 3,13-14
    De fato, diferentemente dos grandes Profetas que lhe antecederam, o Batista não realizou nenhuma maravilha sequer. O próprio povo testemunhou sobre ele: "João não fez milagre algum... " Jo 10,41
    Sua autoridade vinha exclusivamente da realidade que ele com franqueza vivia, desde a infância: "O menino foi crescendo e fortificava-se em espírito. E viveu nos desertos até o dia em que se apresentou diante de Israel." Lc 1,80
    E por isso tinha autoridade para pregar: "Perguntava-lhe a multidão: 'Que devemos fazer?' Ele respondia: 'Quem tem duas túnicas, dê uma ao que não tem. E quem tem o que comer, faça o mesmo.'" Lc 3,10-11
    Deixou, enfim, uma ruidosa recomendação que vale para todos funcionários públicos, especificamente no que concerne ao salário: "Do mesmo modo, os soldados perguntavam-lhe: 'E nós, que devemos fazer?' Respondeu-lhes: 'Não pratiqueis violência nem defraudeis a ninguém, e contentai-vos com vosso soldo.'" Lc 3,14


SEU MARTÍRIO, SEGUNDO SÃO MARCOS

    "Pois o próprio Herodes mandara prender João e o acorrentar no cárcere, por causa de Herodíades, mulher de seu irmão Filipe, com a qual ele se tinha casado. João tinha dito a Herodes:
    - Não te é permitido ter a mulher de teu irmão.
    Por isso, Herodíades odiava-o e queria matá-lo, não o conseguindo, porém. Porque Herodes respeitava João, sabendo que era um justo e santo homem. Protegia-o e, quando o ouvia, sentia-se embaraçado. Mas, mesmo assim, de boa mente ouvia-o.
    Chegou, no entanto, um favorável dia em que Herodes, por ocasião do seu natalício, deu um banquete aos grandes de sua corte, aos seus oficiais e aos principais da Galileia. A filha de Herodíades apresentou-se e pôs-se a dançar, com grande satisfação de Herodes e de seus convivas. Disse o rei à moça:
    - Pede-me o que quiseres, e eu dá-te-ei.
    E jurou-lhe:
    - Tudo que me pedires, dá-te-ei, ainda que seja a metade de meu reino.
    Ela saiu e perguntou à sua mãe:
    - Que hei de pedir?
    E a mãe respondeu:
    - A cabeça de João Batista.
    Apressadamente tornando a entrar à presença do rei, exprimiu-lhe seu desejo:
    - Quero que me dês, sem demora, a cabeça de João Batista.
    O rei entristeceu-se. Todavia, por causa de sua promessa e dos convivas, não quis recusar. Sem tardar, enviou um carrasco com a ordem de trazer a cabeça de João. Ele foi, decapitou João no cárcere, trouxe sua cabeça num prato e deu-a à moça, e esta entregou-a à sua mãe.
    Ouvindo isto, seus discípulos foram tomar seu corpo e depositaram-no num sepulcro." 
                                                 Mc 6,17-29

    São Mateus complementa: "Depois foram dar a notícia a Jesus." Mt 14,12

    "São João Batista, rogai por nós!"