quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Santo Hipólito


    Por seu exaltado amor à Sã Doutrina, teve bastante conturbada vida: maior teólogo do século III, frequentemente entrava em conflito com os próprios cristãos, e chegou a ser aclamado Papa por um grupo de dissidentes, que eram seus seguidores. Foi o primeiro antipapa, portanto, mas iria reconhecer seus erros e morreu como Santo.
    Nasceu em Roma no ano de 170 de nossa era. De reconhecidas erudição e eloquência, foi discípulo de Santo Irineu, que havia sido discípulo de São Policarpo, o que lhe assegurou mais que sólida formação doutrinária por grande força da Sagrada Tradição. Ora, São Policarpo, bispo e mártir, foi discípulo de ninguém menos que São João Evangelista, o Amado Discípulo, maior teólogo entre os Apóstolos, o que lhe conferiu o título de Padre Apostólico. E Santo Irineu é Doutor da Igreja, grande teólogo que debelou as primeiras heresias, nomeadamente o gnosticismo, que ameaçavam a Sã Doutrina no segundo século da Santa Igreja Católica.
    Assim nosso Santo profundamente influenciou Orígenes, teólogo e filósofo da Patrística, que ouviu suas aclamadas pregações e cuidou de registrar as memoráveis. Santo Hipólito escreveu obras de Cristologia, Escatologia, exegese, homilética, apologética, polêmica, cronografia e direito canônico. Seu livros ainda hoje são lidos, como 'Teorias Filosóficas', o 'Livro de Daniel' e, a mais importante, por retratar os primeiros anos da Igreja, 'A Tradição Apostólica'. Nela vemos registros dos primeiros ritos da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo sob o bispado de São Pedro em Roma. É igualmente o autor da memorável 'Refutação de todas heresias (Philosophumena)', obra em que seguiu dando combate ao gnosticismo e deixou a melhor descrição do que esta heresia e as sociedades secretas da época representavam, provando ser grande conhecedor da filosofia grega.
    Era presbítero em Roma durante o papado de Zeferino, entre 199 e 217, e rebelou-se contra ele, injustamente acusando-o de modalismo, uma heresia que considerava Deus e Jesus a mesma Pessoa, apenas teriam diferentes Nomes. Não pôde, porém, sustentar essa acusação, pois na verdade o Papa Zeferino com maestria pregava o entendimento que levaria à compreensão da Santíssima Trindade, sustentando que Deus é simultaneamente Pai, Filho e Espírito Santo, mas em Três diferentes Pessoas.
    Em suas críticas, Santo Hipólito achava que Zeferino não possuía conhecimento suficiente para ser Papa, e que seria manipulado por Calisto, seu diácono. Contudo, por seus agressivos pronunciamentos, ele afetava cada vez mais a autoridade papal e a Unidade da Igreja, ainda que cuidasse estar apenas defendendo a Doutrina e a Disciplina.
    Impulsivo e temperamental, chegou ao extremo de romper declaradamente com o papado quando São Calisto I foi aclamado sucessor de Zeferino, em 217, e estendeu a absolvição também em casos de arrependimento por reincidência em graves pecados, como adultério, homicídio e apostasia. Demasiadamente rigoroso, Santo Hipólito achava um escândalo que o perdão fosse concedido mais de uma vez nesses casos. Em tempos que a Santa Igreja ainda não exigia o celibato, ele também condenava São Calisto por admitir como Sacerdote homens que tivessem sido casados duas ou três vezes, e reconhecer o Matrimônio entre escravos e mulheres livres, que as leis civis romanas proibiam.


    Como era muito admirado por seus conhecimentos, seus seguidores aclamaram-no Bispo de Ostia, uma cidade costeira próxima a Roma, e em seguida, em paralelo à eleição de São Calisto I, para o papado, o que causou divisão tanto entre Sacerdotes como entre os fiéis da região. A maior parte do clero, entretanto, não cedeu a suas contestações, e continuou fiel a São Calisto I.
    O 'Cisma de Santo Hipólito' durou quase 20 anos, pois ele ainda fez oposição aos Papas Urbano, que liderou a Igreja Católica de 222 a 230, e São Ponciano, de 230 a 235. Alexandro Severo, imperador até então, era condescendente com todas religiões e preferiu não interferir. Mas quando Maximino Trácio assumiu, iniciou-se um novo período de perseguições aos cristãos, e Santo Hipólito e São Ponciano foram condenados a trabalhos forçados numa mina de pedra na ilha de Sardenha, a oeste da Península Itálica.
    O gesto que teria convertido Santo Hipólito foi a humildade com que São Ponciano renunciou ao papado, para que a Igreja não ficasse sem o Sumo Pontífice, a ponte entre os Céus e a Terra. O primeiro Papa deportado, portanto, também foi o primeiro a usar o extremo recurso da renúncia, pensando sempre e exclusivamente no bem da Igreja. Santo Hipólito, profundamente tocado em seu ríspido e intolerante coração, pediu perdão a São Ponciano que, além não lhe ter raiva, com frequência rezava pela conversão de sua alma, e assim lhe deu o Sacramento da Reconciliação com Deus.


    Expostos a intensos maus tratos, açoites e até torturas, Santo Hipólito veio a falecer, e pouco depois também São Ponciano, ainda no mesmo ano em que foram exilados, 235. Após a permissão para a prática do Catolicismo em todo Império Romano, no dia 13 de agosto de 354 seus restos mortais foram transportados juntos para Roma, onde tiveram recepção com a devida solenidade, pois os cristãos bem cultuavam suas memórias. Tendo vivido entre 347 e 420, São Jerônimo, Doutor da Igreja e tradutor da Bíblia para o latim, conhecida como Vulgata, sob sua autoridade de grande historiador chamava Santo Hipólito de o 'mais Santo e eloquente homem'. Muito zeloso da Sagrada Tradição, igualmente foi nosso Santo que preservou a primeira liturgia escrita sobre a Virgem Maria, que era usada na cerimônia de ordenação dos bispos. Ele é o Santo Padroeiro dos carcereiros, e também venerado como Santo pela igreja ortodoxa e anglicana.
    Santo Hipólito foi enterrado na Via Tiburtina e São Ponciano nas Catacumbas chamadas de São Calisto, que na verdade haviam sido criadas pelo Papa Zeferino, para dar digno destino e local de veneração aos restos mortais dos Santos e Papas durante os períodos de perseguição romana. Aí também está a Cripta dos Papas, a mais importante área das Catacumbas de São Calisto, também chamada de 'O Pequeno Vaticano', à qual São Damásio mandou afixar uma bem conhecida lápide. Tão preservado segredo, essa cripta só foi redescoberta em 1854.


    Contra os saques e profanações dos inimigos do Império Romano, as relíquias dos santos foram transferidas para as igrejas do centro de Roma, e assim as de Santo Hipólito. No século VIII, elas foram doadas pelo Papa Paulo I ao renomado abade Fulrado, importante conselheiro do rei de França, Pepino, o breve, e levadas à abadia beneditina da comuna de São Dionísio, nos arredores de Paris, onde tinha uma capela em sua homenagem. Essa abadia, porém, seria substituída pela atual Catedral de São Dionísio, no ano de 1137.
    Esse abade também doou partes das relíquias ao mosteiro por ele fundado em sua comuna natal, Fulradovillare, na Alsácia, centro-leste de França, que por isso passou a chamar-se Santo Hipólito. Aí elas estão expostas num relicário de vidro sob o altar.


    Santo Hipólito, rogai por nós!