domingo, 30 de junho de 2024

Primeiros Santos Mártires de Roma


    No quente verão do ano de 64 da nossa era, abrindo espaço para seus megalômanos projetos urbanísticos, criminosamente Nero mandou atear fogo em algumas construções no centro de Roma, que eram em maioria de madeira e palha, e acabou queimando até às cinzas boa parte do centro da cidade durante seis dias. Para eximir-se das acusações, que logo vazariam por revoltados inconfidentes, ele culpou os cristãos, a maior e mais transformadora novidade que se dava na capital do Império Romano, aos quais cultuava ódio por não lhe reverenciarem como deus.
    Assim ele deflagrou a primeira grande perseguição à Igreja, ordenando o massacre de todos seguidores com maior emprego de crueldade possível, e apressou-se em assassinar São Pedro, por inveja de seu carisma e por ser o representante máximo de Cristo, e pouco depois também São Paulo.
    Milhares de cristãos entregaram suas almas a Deus nesse período, e padecendo bestiais brutalidades: as mulheres eram ultrajadas dos mais infames modos; nem mesmo crianças e idosos tiveram suas vidas poupadas. Para tornar o 'espetáculo' ainda mais apelativo, todas formas de execução foram permitidas.
    Mas todos morriam sem renegar a em Cristo, fato que, em favor dos argumentos de Nero, ajudou a difundir entre os romanos que os cristãos 'não gostavam de viver' e 'odiavam o ser humano'.
    Essa fervorosa fé dos romanos, porém, não era exatamente uma novidade no mundo cristão. São Paulo mesmo deixou um precioso registro em sua Carta aos Romanos, escrita uns 7 anos antes do início dos martírios, do fogo do Espírito Santo que já os abrasava havia anos: "Primeiramente, dou graças a Meu Deus, por meio de Jesus Cristo, por todos vós, porque em todo mundo é celebrada vossa fé." Rm 1,8
    E os fiéis eram muitos, ou não teriam incomodado o imperador, e certamente formavam várias comunidades, ainda segundo registro deste Apóstolo: "... a todos vós que estais em Roma..." Rm 1,7a
    Tão expressivo rebando que o próprio São Paulo, mesmo sabendo ser domínio de São Pedro, se programava para ir lá. E mais uma vez ele ressalta a fé que eles tinha: "Ardentemente desejo ver-vos, a fim de comunicar-vos alguma Graça espiritual, com que sejais confirmados, ou melhor, para juntamente convosco encorajar-me naquela vossa e minha fé que nos é comum. Pois não quero que ignoreis, irmãos, como muitas vezes me tenho proposto ir ter convosco. Eu queria recolher algum fruto entre vós, como entre outros pagãos, mas até agora tenho sido impedido. Sou devedor a gregos e a bárbaros, a sábios e a simples. Daí o ardente desejo que sinto de também anunciar Evangelho a vós, que habitais em Roma." Rm 1,11-15
    De fato, ele mesmo divulgava o respeito às dioceses de outros Apóstolos, como escreveu aos próprios romanos: "E empenhei-me por anunciar o Evangelho onde ainda não havia sido anunciado o Nome de Cristo, pois não queria edificar sobre fundamento lançado por outro." Rm 15,20
    Também o disse aos coríntios, expressamente falando em domínio: "Assim esperamos levar o Evangelho aos países que ficam além de vós, sem nos gloriarmos das obras realizadas por outros dentro do domínio reservado a eles." 2 Cor 10,16
    E por isso, ao fim da Carta aos Romanos, ele deixou claro que aí estaria apenas 'de passagem': "... espero ver-vos de passagem, quando eu for à Espanha. Também espero ser conduzido por vós até lá, depois que tiver satisfeito, ao menos em parte, meu desejo de estar convosco." Rm 15,24
    Contudo, poucos anos mais tarde, o próprio Jesus determinou que ele fosse a Roma, quando ele foi preso em Jerusalém: "Na noite seguinte, apareceu-lhe o Senhor e disse-lhe: 'Coragem! Deste testemunho de Mim em Jerusalém, assim também importa que o dês em Roma.'" At 23,11


    Os jardins, pois, onde o imperador Calígula havia construído um 'circo', também passaram a ser usados por Nero para um espetáculo 'circense' com os mais horrendos sacrifícios, mas agora como uma 'festa' popular de massivas execuções que se estenderiam por três tenebrosos anos: flecha após flecha os cristãos eram alvejados deixando por último artérias e órgãos vitais; eram dilacerados e mutilados a golpes de espadas para lentamente morrerem, ou simplesmente decapitados; feridos e esmagados com bizarras armas letais; destroçados por cavalos e bigas de guerra em alta velocidade; soltos na arena para o ataque de furiosos touros, famintos leões e outros grandes felinos; mortos na fogueira ou por armas em brasa; hediondas torturas, crucificações e as insanas 'tochas humanas', quando eram untados com piche para arder em chamas 'iluminando' a noite.
    À luz do dia, as vítimas eram banhadas em sangue e revestidos com peles de animais para o escárnio e espancamento pelos cidadãos romanos, e depois serem atacadas por cachorros nas ruas. Para presenciar e incitar tais atrocidades, o próprio Nero misturava-se ao povo, disfarçado, ou ensandecidamente conduzindo sua própria biga, dando voltas na arena dos jardins.


    Em seus últimos anos, São Paulo deixou na Segunda Carta a São Timóteo um registro do medo e da resignação entre os cristãos, por força dos tristes espetáculos que estavam em curso: "Em minha primeira defesa, ninguém me assistiu, todos me abandonaram. Que isto não lhes seja levado em conta. Mas o Senhor veio em meu auxílio e deu-me forças. Assim, pude completar a proclamação da mensagem, para que todas nações a ouçam. E eu fui libertado da boca do leão." 2 Tm 4,17
    Ora, São João Evangelista menciona esses mártires no Livro do Apocalipse, que foi escrito ao fim do século I: "Então um dos Anciãos (querubins?) falou comigo e perguntou-me: 'Esses, que estão revestidos de brancas vestes, quem são e de onde vêm?' Respondi-lhe: 'Meu Senhor, tu o sabes!' E ele disse-me: 'Esses são os sobreviventes da grande tribulação. Lavaram suas vestes e alvejaram-nas no Sangue do Cordeiro.'" Ap 7,13-14
    Mas como escrevia por volta do ano 100, foi-lhes dito que a perseguição não se encerraria por aí, apesar da intercessão deles: "Quando abriu o quinto selo, debaixo do Altar vi as almas dos homens imolados por causa da Palavra de Deus, e por causa do testemunho de que eram depositários. E clamavam em alta voz, dizendo: 'Até quando Tu, que és o Senhor, o Santo, o Verdadeiro, ficarás sem fazer justiça e sem vingar nosso sangue contra os habitantes da Terra?' Então foi dada a cada um deles uma branca veste, e foi-lhes dito que aguardassem ainda um pouco, até que se completasse o número dos companheiros de serviço e irmãos que com eles estavam para serem mortos." Ap 6,9-10
    Ficou evidente, contudo, que pelo martírio muitos deles atingiram a santidade, o que fez de Roma a cidade da cristandade por excelência: "Também vi tronos, sobre os quais se assentaram aqueles que receberam o poder de julgar: eram as almas dos que foram decapitados por causa do testemunho de Jesus e da Palavra de Deus, e todos aqueles que não tinham adorado a Fera ou sua imagem, que não tinham recebido seu sinal na fronte nem nas mãos. Eles viveram uma Nova Vida e com Cristo reinaram por mil anos." Ap 20,4
    O Amado Discípulo também mencionou os sacrifícios de São Pedro e São Paulo, porém usando termos codificados, como fez em todo Livro do Apocalipse para que não fosse censurado e destruído, pois as perseguições continuavam. Jesus disse-lhe: "Mas incumbirei às Minhas duas testemunhas, vestidas de saco, de profetizarem por mil duzentos e sessenta dias. São eles as duas oliveiras e os dois candelabros que se mantêm diante do Senhor da Terra. Entretanto, depois de terem terminado integralmente seu testemunho, a Fera que sobe do abismo fá-lhes-á guerra, vencê-los-á e matá-los-á. Seus cadáveres jazerão na rua da grande cidade que espiritualmente se chama Sodoma e Egito, onde Seu Senhor foi crucificado. Muitos dentre os povos, tribos, línguas e nações virão para vê-los por três dias e meio, e não permitirão que sejam sepultados. Os habitantes da Terra alegrar-se-ão por causa deles, mutuamente felicitar-se-ão e mandarão presentes uns aos outros, porque esses dois Profetas tinham sido seu tormento." Ap 11,3-4.7-10


    O termo 'protomártires', em grego, designa esses primeiros mártires cristãos, sacrifícios que séculos mais tarde muitas nações também viriam a padecer, como durante a invasão da Terra Santa, pelos muçulmanos, a 'Reforma Protestante', patrocinada por príncipes e senhores feudais, e ainda pelas mãos de alguns movimentos ditos 'humanistas' como a torpe Revolução Francesa, a abjeta Guerra Civil Espanhola, a praga do Socialismo pelo mundo e a aberração do Comunismo, iniciada na Rússia mas amplamente replicada, todas levadas a cabo pelo ateísmo militante.
    E todos esses mártires têm no diácono Santo Estevão o primeiríssimo exemplo, cujo sacrifício se deu ainda no tempo dos Apóstolos, pouco depois do Pentecostes, e que em breve seria seguido por São Tiago Maior, primeiro Apóstolo a ser martirizado, assim como mais tarde foram todos demais, à exceção de São João Evangelista, exatamente como profetizou Jesus. De fato, diante dos questionamentos de São Pedro sobre o destino do Amado Discípulo, Ele também o interrogou: "Respondeu-lhe Jesus: 'Que te importa se Eu quero que ele fique até que Eu venha? Segue-Me tu.' Correu, por isso, o boato entre os irmãos de que aquele discípulo não morreria. Mas Jesus não lhe disse: 'Não morrerá', mas: 'Que te importa se quero que ele fique assim até que Eu venha?'" Jo 21,22-23
    Essa carnificina perpetrada por Nero, em específico, que durou de 64 até sua morte, em 67, explica, pelo absoluto caos que instalou entre os cristãos, os poucos registros que atestam Roma como a sede da Igreja, a Primazia de Pedro como líder de todos cristãos, além dos próprios sacrifícios dele e de São Paulo. Com efeito, como prova de um desmonte quase total do cerne da Comunidade Messiânica, o Livro dos Atos dos Apóstolos, escrito por São Lucas, simplesmente para no tempo, é uma obra inacabada.
    Eis porque São Clemente, que foi o quarto Papa entre os anos de 88 e 97, vai atestar o 'martírio', que é o sentido original da palavra 'testemunho', como autêntico destino de um cristão, a inspiração da nossa Santa Missa: "Encontramo-nos na mesma arena e combatemos o mesmo combate. Deixemos as inúteis preocupações e os vãos cuidados e voltemo-nos para a gloriosa e venerável regra de nossa tradição: consideremos o que é belo, o que é bom e o que é agradável ao Nosso Criador."
    Ora, Santo Inácio de Antioquia, terceiro bispo desta diocese depois de São Pedro e Evódio, e que seria martirizado no ano de 100 ou 107 da nossa era, cujas cartas são preciosos registros da História da Igreja, atestou a continuação dessas perseguições ainda a seu tempo: "Agora começo a ser discípulo. Nenhuma visível ou invisível criatura me atrai para si, até que eu esteja em Jesus Cristo. Fogo e cruz, fileiras de feras, lacerações, esquartejamento, ruptura dos ossos, mutilação dos membros, trituração de todo corpo, todos cruéis tormentos do Diabo caiam sobre mim, desde que eu chegue à posse de Jesus Cristo."
    Autêntico mártir, ele não aceitou ser poupado da boca dos leões, e, como bispo, deu exemplo aos que iriam ser sacrificados no mesmo dia, para que morressem na fé. Assim se despediu: "Adeus! Sejam fortes até o fim no sofrer por Cristo."
    É a partir dos primeiros santos mártires, portanto, que surgem as catacumbas subterrâneas de Roma, muitas delas atribuídas a São Calisto, que eram construídas ao longo dos lados das estradas com objetivo de secretamente, com os devidos cerimoniais, sepultar os cristãos e mais tarde possibilitar as rezas e os cultos junto a seus túmulos, prática esta que se perpetrou até as primeiras décadas do século IV, quando o Catolicismo finalmente foi permitido no Império Romano. Algumas dessas catacumbas chegam a ter cinco andares e dezenas de quilômetros. São evidências de um costume judeu, que depositavam os corpos de seus mortos em largos sepulcros escavados em rochas ou encostas, com espaço para entes de toda família. Aliás, como foi o próprio sepulcro de Jesus.


    Inversamente, porém, tamanha era a crueldade de Nero associada ao destemor e ao exemplo de fé dos cristãos ao longo daqueles anos, que terminaram por conquistar a compaixão e a alma da grande maioria dos romanos, que vieram a conhecer o Evangelho e se maravilharam com a resignação e o amor a Deus demonstrados pelos fiéis. Sem dúvida, só Deus e a firme convicção da Vida Eterna poderiam consolar e animar aquelas almas.
    Por isso, concluiu Tertuliano, historiador que viveu entre os anos de 160 e 220: "O sangue dos mártires é a semente dos cristãos."
    E o próprio Jesus havia anunciado esse 'testemunho', que se iniciaria ainda em Israel: "Cuidai-vos dos homens. Eles levá-vos-ão a seus tribunais e açoitá-vos-ão com varas em suas sinagogas. Sereis por Minha causa levados diante dos governadores e dos reis: servireis assim de testemunho para eles e para os pagãos." Mt 10,17-18
    Eram patentes sacrifícios, como se veem ainda hoje: "Então sereis entregues aos tormentos, matá-vos-ão e sereis por Minha causa objeto de ódio para todas nações." Mt 24,9
    E chegaria ao seio familiar, como flagrantemente se viu no Comunismo: "Sereis entregues até por vossos pais, vossos irmãos, vossos parentes e vossos amigos, e matarão muitos de vós. Por todos sereis odiados por causa do Meu Nome." Lc 21,16-17
    Esse era o 'batismo' que Jesus havia profetizado aos Apóstolos São Tiago Maior e São João Evangelista, quando estes Lhe pediram o privilégio de sentarem-se à Sua direita e à Sua esquerda em Sua Glória: "Vós bebereis o cálice que Eu devo beber, e sereis batizados no batismo em que Eu devo ser batizado." Mc 10,39
    Toda essa horrenda perseguição dos primeiros séculos, no entanto, sinalizava, como Jesus sentenciou, o rompimento do Cristianismo com o Judaísmo, perante o qual os Apóstolos cumpriram missão tentando reformá-lo, bem como os últimos sacrifícios das pagãs e politeístas religiões da Europa, além de, através dos séculos, o ódio perpetrado pelos muçulmanos: "Expulsá-vos-ão das sinagogas, e virá a hora em que todo aquele que vos tirar a vida julgará prestar culto a Deus. Procederão deste modo porque não conheceram o Pai, nem a Mim." Jo 16,2-3
    Nascia assim, ao modo do próprio Sacrifício de Cristo, por esse batismo e pelo sangue dos primeiros mártires, a gloriosa Igreja Católica Apostólica Romana.

    Santos Protomártires, rogai por nós!

sábado, 29 de junho de 2024

São Pedro


    São Pedro é o único dos 12 Apóstolos de quem se tem uma história nos Evangelhos. Só de Jesus e de São João Batista têm-se mais completos relatos ou informações. Considerando todo Novo Testamento, São Paulo, só convocado após a Ressurreição, acompanha-o de perto graças aos registros dos Atos dos Apóstolos, e seu perfil é sobejamente complementado por suas próprias cartas. Entre os Doze, no entanto, a São Pedro é dado um lugar de incomparável destaque, enquanto os demais apenas recebem circunstanciais citações.
    São Mateus, o mais judeu e conservador dos Apóstolos, da tribo que trouxera no sangue a tradição de sacerdotes e da indicação do sumo sacerdote, a dos levitas, ao mencionar a lista dos Apóstolos não hesita em declarar que São Pedro era o primeiro: "Eis os nomes dos Doze Apóstolos: o primeiro, Simão, chamado Pedro; depois André, seu irmão. Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão. Filipe e Bartolomeu. Tomé e Mateus, o publicano. Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu. Simão, o cananeu, e Judas Iscariotes, que foi o traidor." Mt 10,2-4
    Nosso Santo foi o único Apóstolo a quem Jesus atribuiu um novo nome, uma tradição iniciada por Deus para com Abrão, a quem deu o nome de Abraão, passou por Jacó, que se tornou Israel, perpetuou-se entre os rabinos e inclui o próprio São Paulo, que antes de converter-se se chamava Saulo. E, vale notar, o novo nome de São Pedro, segundo São João Evangelista, privilegiada testemunha ocular, foi dado já no primeiro encontro com Jesus, dois dias após o Batismo do Senhor por São João Batista, quando Ele lhe disse: "Tu és Simão, filho de João. Serás chamado Cefas (que quer dizer pedra)." Jo 1,42
    Além do nome de seu pai, por especial deferência mencionado por Jesus, sabemos que ele era um fiel cumpridor das Sagradas Escrituras, como vemos em sua declaração sobre a estrita alimentação dos judeus, dada durante a visão que teve em Jope, pouco antes do 'Pentecostes dos Gentios': "De nenhum modo, Senhor, pois em minha boca nunca entrou coisa profana ou impura." At 11,8
     Ele também era sempre o primeiro do pequeno grupo mais próximo de Jesus, que se compunha com São Tiago Maior e São João Evangelista. Assim, em sua Segunda Carta faz especial citação à Transfiguração vista por eles, um indizível privilégio, pois antecipadamente Cristo lhes revelava Sua Glória: "Na realidade, não é baseando-nos em hábeis fábulas que nós vos temos feito conhecer o poder e a Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas por termos visto Sua Majestade com nossos próprios olhos. Porque Ele recebeu de Deus Pai honra e Glória, quando do seio da magnífica Glória Lhe foi dirigida esta voz: 'Este é Meu Amado Filho, em Quem tenho posto todo Meu afeto.' Esta mesma voz, que vinha do Céu, nós ouvimo-la quando com Ele estávamos no Monte Santo." 2 Pd 1,16-18
    Ou seja, no último dia 'útil' da semana em que declarou Jesus como o Messias, São Pedro obteve essa confirmação. Já não dependia de um milagre, de um testemunho ou das Escrituras para atestá-lo, pois ele mesmo O tinha visto: "Seis dias depois, Jesus tomou Consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e conduziu-os à parte a uma alta montanha. Lá Se transfigurou na presença deles: Seu rosto brilhou como o sol, Suas vestes tornaram-se resplandecentes de brancura. E eis que apareceram Moisés e Elias, conversando com Ele." Mt 17,1-3
    Como parte deste seleto grupo, São Pedro também viu a ressurreição da filha de Jairo: "Ainda falava, quando chegaram alguns da casa do chefe da sinagoga, dizendo: 'Tua filha morreu. Por que ainda perturbas o Mestre?' Jesus, porém, tendo ouvido a palavra que acabava de ser pronunciada, disse ao chefe da sinagoga: 'Não temas! Crê somente.' E não permitiu que ninguém O acompanhasse, senão Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago." Mc 5,35-37
    De tamanha intimidade com Jesus, dos Apóstolos é São Pedro, e só ele, que vai tentar andar sobre as águas: "Pedro tomou a palavra e falou: 'Senhor, se és Tu, manda-me ir sobre as águas até junto a Ti!' Ele disse-lhe: 'Vem!' Pedro saiu da barca e caminhava sobre as águas ao encontro de Jesus." Mt 14,28-29
    E enquanto líder natural entre os Doze, é ele que vai advogar pelos Apóstolos quando Jesus perguntou se também eles não gostariam de abandoná-Lo, pois muitos se escandalizaram quando Ele ofereceu Sua Carne e Seu Sangue como alimento da Vida Eterna. E ainda mais forte que a declaração descrita por São Mateus, como veremos, nessa cena São João relata São Pedro chamando Jesus de 'Santo de Deus'! Com efeito, as Escrituras dizem que só Deus é Santo: "Então Jesus perguntou aos Doze: 'Quereis vós também vos retirar?' Respondeu-Lhe Simão Pedro: 'Senhor, a quem iríamos nós? Tu tens as palavras da Vida Eterna. E nós cremos e sabemos que Tu és o Santo de Deus!'" Jo 6,67-69
    Aliás, tão clara era sua ciência da santidade de Jesus desde os primeiríssimos dias, que, mais uma vez antes dos Apóstolos e de todos, nosso Santo vai ser o primeiro a lançar mão da Confissão perante Ele, atitude que se tornaria Sacramento. Foi logo em seguida à primeira pesca miraculosa: "Vendo isso, Simão Pedro caiu aos pés de Jesus e exclamou: 'Retira-Te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador." Lc 5,8
    Com a mesma desenvoltura de protagonista, sempre muito cioso de cada detalhe dos ensinamentos de Jesus, interrogou-O, ao d'Ele ouvir a profecia sobre a destruição do Templo de Jerusalém: "E estando sentado no monte das Oliveiras, defronte do Templo, perguntaram-Lhe à parte Pedro, Tiago, João e André: 'Dize-nos, quando hão de suceder essas coisas? E por qual sinal se saberá que tudo isso vai realizar-se?'" Mc 13,3-4
    E ainda enquanto membro do pequeno grupo mais próximo do Mestre, não poderia estar ausente num dos mais difíceis momentos, durante a agonia de Jesus no Monte das Oliveiras, na última noite antes da Crucificação: "Levou Consigo Pedro, Tiago e João, e começou a ter pavor e a angustiar-Se. Disse-lhes: 'Minha alma está numa tristeza mortal. Ficai aqui e vigiai.'" Mc 14,33
    Foi exclusivamente dele, aliás, que Jesus cobrou vigília nesta noite: "Então foi ter com os discípulos e os encontrou dormindo. E disse a Pedro: 'Então não pudestes vigiar uma hora Comigo?'" Mt 26,40
    Dos Apóstolos, ele é único mencionado pelo anjo que mandou um recado através de Santa Maria Madalena, quando ela encontrou o túmulo vazio: "Entrando no sepulcro, viram, sentado do lado direito, um jovem, vestido de brancas vestes, e assustaram-se. Ele falou-lhes: 'Não tenhais medo. Buscais Jesus de Nazaré, que foi crucificado. Ele ressuscitou, já não está aqui. Eis o lugar onde O depositaram. Mas ide, dizei a Seus discípulos e a Pedro que Ele vos precede na Galileia. Lá O vereis, como vos disse.'" Mc 16,5-7
     E na versão de São João Evangelista, que não fala de anjo, também é a ele que Santa Maria Madalena primeiro vai avisar: "Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: 'Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde O puseram!'" Jo 20,2

AS CHAVES DO REINO DOS CÉUS

    Realmente inspirado por Deus Pai, São Pedro foi o primeiro a afirmar com plena convicção Quem era Jesus: "Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo!" Mt 16,16
    Inspiração, aliás, que o próprio Jesus confirmou: "Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas Meu Pai que está nos Céus." Mt 16,17
    Como portador de divinas revelações, São Pedro ouviu de Jesus a declaração de sua Primazia como pedra fundamental da Igreja, que o próprio Cristo constrói e lhe garante a vitória contra o Maligno: "E Eu declaro-te: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei Minha Igreja. As portas do inferno não prevalecerão contra ela." Mt 16,18
    Essa liderança e destaque desde sempre foi respeitada pelos demais Apóstolos, como São Mateus atestou acima. Mas, humildemente, em sua Primeira Carta ele partilha com todos nós a responsabilidade de ser Igreja: "... e quais outras vivas pedras, vós também vos tornais os materiais deste espiritual edifício, um santo sacerdócio..." 1 Pd 2,5
    São Paulo, reverente a essa hierarquia, também convidava os fiéis a tomar parte nessa edificação, mas deixava evidente que a Igreja tem os Apóstolos como alicerce: "Consequentemente, já não sois hóspedes nem peregrinos, mas sois concidadãos dos Santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos Apóstolos e Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus." Ef 2,19-20
    É São Pedro, portanto, o fiel administrador a quem Jesus confiou Sua Igreja, o solícito encarregado de distribuir o Pão da Vida ao povo de Deus: "'Estai, pois, preparados, porque, à hora em que não pensais, virá o Filho do Homem.' Disse-Lhe Pedro: 'Senhor, propões esta parábola só a nós ou também a todos?' O Senhor replicou: 'Qual é o sábio e fiel administrador que o Senhor estabelecerá sobre Seus operários, para a seu tempo dar-lhes sua medida de trigo? Feliz daquele servo que o Senhor achar procedendo assim, quando vier! Em Verdade, digo-vos: confiá-lhe-á todos Seus bens.'" Lc 12,40-44
    Pois, desde os tempos de Moisés, Deus havia instituído um sumo sacerdote entre os israelitas, a quem cabia fazer a oferta do sacrifício no altar. Este posto inicialmente coube a Aarão, bisneto de Levi, e daí o termo 'levita', cuja tradição foi mantida até a destruição de Jerusalém, no ano 70 de nossa era: "Este será um perpétuo direito devido a Aarão e seus filhos pelos israelitas. Esta é uma reservada oferta, aquela que os israelitas terão de tomar de seus pacíficos sacrifícios, uma reserva que devem ao Senhor. Os sagrados ornamentos de Aarão, depois dele, servirão para seus filhos, que os vestirão quando se lhes der a unção e forem empossados. Aquele que dentre seus filhos for sumo sacerdote em seu lugar, e que penetrar na Tenda de Reunião para o serviço do santuário, levá-los-á durante sete dias." Ex 29,28-30
    E como também prescrito por Deus, a primazia do sumo sacerdote é perfeitamente clara: "O sumo sacerdote, superior a seus irmãos, sobre cuja cabeça se derramou o óleo de unção, e que foi estabelecido para revestir as sagradas vestes, não descobrirá sua cabeça, e não rasgará suas vestes." Lv 21,10
    Ainda nos primeiros séculos do cristianismo, a favor da Primazia de São Pedro na Igreja testemunharam inspirações da grandeza de São Clemente, Santo Irineu e São Nicolau Magno, além de, pouco mais tarde, excepcionais teólogos como Santo Ambrósio, Santo Atanásio, São João Crisóstomo e Santo Agostinho. Quem seria mais estudioso, mais inspirado ou mais Santo que eles, para contestá-los?
    E a clara prova de sua vital importância para a Igreja é que Jesus, prevendo as tentações do inimigo aos Apóstolos, e assim à Igreja, optou por reforçar a de São Pedro. Ora, como mais próximo Apóstolo, ele não podia falhar: a própria credibilidade do Evangelho estava em suas mãos. Por isso, Jesus expressamente rezou ao Pai por ele, e pediu-lhe que servisse de fortaleza para os demais Apóstolos, bem como para discípulos e seguidores: 'Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para peneirar-vos como o trigo. Mas Eu roguei por ti, para que tua confiança não desfaleça. E tu, por tua vez, confirma teus irmãos.'" Lc 22,32
    Note-se: São Pedro foi o primeiro Apóstolo a quem Jesus apareceu após ressuscitar. Do que trataram, porém, nada sabemos. Mas está registrado: "Todos diziam: 'O Senhor verdadeiramente ressuscitou, e apareceu a Simão.'" Lc 24,34
    Por Sua Divina Sabedoria, Jesus escolhia-o com perfeição, pois era São Pedro o Apóstolo que mais O amava. É o que vemos quando Jesus o inqueriu, mais uma vez e pertinentemente invocando a pessoa de seu pai, como um sinal de juramento: "... 'Simão, filho de João, amas-Me mais que estes?' Ele respondeu-Lhe: "Sim, Senhor, Tu sabes que Te amo.'" Jo 21,15


    Assim, pois, ele recebeu a missão de apascentar todo Seu rebanho, de cordeiros a ovelhas, ou seja, de fiéis a Sacerdotes: "Apascenta Meus cordeiros... Apascenta Minhas ovelhas." Jo 21,15.17
    Esta cena foi presenciada por ninguém menos que dois estudiosos Apóstolos, São Tomé e São Bartolomeu, além dos dois outros, não menos letrados, que faziam parte do grupo mais íntimo do Mestre, ou seja, São Tiago Maior e São João, que por isso tratou de registrá-la em seu Evangelho. Tal fato bem explica porque nenhum Apóstolos jamais contestou a liderança do pescador da Galileia: "Depois disso, tornou Jesus a manifestar-Se a Seus discípulos junto ao lago de Tiberíades. Manifestou-Se deste modo: Estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu e outros dois de Seus discípulos." Jo 21,1-2
    E o poder dado por Jesus a São Pedro aqui na terra, para decidir a respeito de assuntos de Doutrina e de Comunhão, era total. Ele disse-lhe: "... tudo que ligares na terra será ligado nos Céus, e tudo que desligares na terra será desligado nos Céus." Mt 16,19b
    Não por acaso, ele foi o único Apóstolo a receber de Jesus as Chaves dos Céus, ou seja, a inspiração para nas Escrituras reconhecer as palavras-chaves que indicam a verdadeira vontade de Deus: "Eu dá-te-ei as Chaves do Reino dos Céus..." Mt 16,19a
    Chaves, aliás, que estiveram nas mãos dos doutores da Lei, ainda que não integralmente, pois lhes faltava o Advento do Cristo, que não acolheriam. Mas eles pervertidamente usaram-nas para manter o povo refém de suas consultas, não franqueando a si mesmos a entrada nos Céus nem deixando os demais entrarem. Jesus acusou-os: "Ai de vós, doutores da Lei, que tomastes a chave da ciência, e vós mesmos não entrastes e impedistes aos que vinham para entrar." Lc 11,52
    Mas chaves não só para as Escrituras, senão também para nos fatos do dia-a-dia ler a Moção do Espírito de Deus. De fato, Jesus falou em 'toda a Verdade' e nas 'coisas que virão': "Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, ensiná-vos-á toda a Verdade, porque não falará por Si mesmo, mas dirá o que ouvir, e anunciá-vos-á as coisas que virão." Jo 16,13
    São Paulo vai exaltar esse divino diferencial: "Ora, se o ministério da morte, gravado com letras em pedras, se revestiu de tal Glória que os filhos de Israel não podiam fitar os olhos no rosto de Moisés, por causa do resplendor de sua face, embora transitório, quanto mais glorioso não será o Ministério do Espírito?" 2 Cor 3,7
    Desde o Pentecostes, portanto, o Espírito de Deus tem permanentemente estado com a Igreja, e, lógico, em especial esteve com São Pedro, assim como com seus sucessores, dando plena vida à Sagrada Tradição, como Jesus prometeu: "E Eu rogarei ao Pai, e Ele dá-vos-á outro Paráclito, para que eternamente fique convosco. É o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber porque não O vê nem O conhece. Mas vós conhecê-Lo-eis, porque convosco permanecerá e em vós estará." Jo 14,16-17
    Abrindo caminho para a sucessão apostólica, ademais, e para sua própria como Papa, foi nosso Santo que propôs e liderou a substituição de Judas Iscariotes para recompor o Colégio dos Doze. Para isso, ele inspiradamente evocou as Escrituras: "Num daqueles dias, levantou-se Pedro no meio de seus irmãos, na assembleia reunida que constava de umas cento e vinte pessoas, e disse: 'Irmãos, convinha que se cumprisse o que o Espírito Santo predisse na Escritura pela boca de Davi, acerca de Judas, que foi o guia daqueles que prenderam Jesus. Pois está escrito no livro dos Salmos: 'Fique deserta sua habitação, e não haja quem nela habite'; e ainda mais: 'Que outro receba seu cargo.' (Sl 68,26; 108,8). Convém que destes homens que têm estado em nossa companhia todo tempo em que o Senhor Jesus viveu entre nós, a começar do Batismo de João até o dia em que de nosso meio foi arrebatado, um deles se torne conosco testemunha de Sua Ressurreição.'" At 1,15-16.20-22
    E desde então vamos ver São Pedro sempre tomando a palavra, à frente do Colégio dos Apóstolos. É ele quem preside a assembleia quando se deu o Pentecostes, momento em Deus Espírito Santo instituiu a Igreja: "Pedro, então, pondo-se de pé em companhia dos Onze, com forte voz disse-lhes: 'Homens da Judeia e vós todos que habitais em Jerusalém: seja-vos isto conhecido e prestai atenção às minhas palavras. Estes homens não estão embriagados, como vós pensais, visto não ser ainda a hora terceira do dia. Mas cumpre-se o que foi dito pelo Profeta Joel: Acontecerá nos últimos dias, é Deus Quem fala, que derramarei de Meu Espírito sobre todo ser vivo! Profetizarão vossos filhos e vossas filhas. Vossos jovens terão visões, e vossos anciãos sonharão.'" At 2,14-17
    É ele quem fala ao coxo de nascença à porta do Templo de Jerusalém, onde sempre se reuniam para rezar, quando realizou um estrondoso milagre que inflamou o povo da cidade: "Pedro, porém, disse: 'Não tenho nem ouro nem prata, mas o que tenho eu dou-te: em Nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda!' E tomando-o pela mão direita, levantou-o. Imediatamente, os pés e os tornozelos firmaram-se-lhe. De um salto pôs-se de pé, e andava. Todo povo viu-o andar e louvar a Deus. Reconheceram ser o mesmo coxo que se sentava para mendigar à porta Formosa do Templo, e encheram-se de espanto e pasmo pelo que lhe tinha acontecido." At 3,6-7.9-10
    É ele quem responde com autoridade aos principais dos judeus em todas ocasiões. Ao justificar o milagre do paralítico, por exemplo: "Então Pedro, cheio do Espírito Santo, respondeu-lhes: 'Chefes do povo e Anciãos, ouvi-me: se hoje somos interrogados a respeito do benefício feito a um enfermo, e em que Nome foi ele curado, ficai sabendo todos vós e todo povo de Israel: foi em Nome de Jesus Cristo Nazareno, que vós crucificastes, mas que Deus ressuscitou dos mortos. Por Ele é que esse homem se acha são, em pé, diante de vós.'" At 4,8-10
    O mesmo acontece quando eles questionaram as ordens que receberam do Sinédrio: "Responderam-lhes Pedro e João: 'Julgai-o vós mesmos, se diante de Deus é justo obedecermos a vós mais que a Deus. Não podemos deixar de falar das coisas que temos visto e ouvido.'" At 4,19-20
    E após serem capturados no Templo, enquanto anunciavam o Cristo, de novo ele contesta os superiores dos judeus, e enuncia como se pode receber o Santo Paráclito: "Pedro e os Apóstolos replicaram: 'Importa obedecer antes a Deus que aos homens. O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus, que vós matastes, suspendendo-O num madeiro. Deus elevou-O pela mão direita como Príncipe e Salvador, a fim de dar a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados. Deste fato nós somos testemunhas, nós e o Espírito Santo, que Deus deu a todos aqueles que Lhe obedecem.'" At 5,29-32
    É ele quem, sempre notoriamente estando à frente dos Apóstolos, defende os bens da Igreja quando os cristãos já possuíam tudo em comum, e em mais essa ocasião revela-se em perfeita unidade com o Divino Espírito Santo: "Então Pedro disse: 'Ananias, por que Satanás tomou conta de teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo e enganasses acerca do valor do campo? Acaso não o podias conservar sem vendê-lo? E depois de vendido, não podias livremente dispor dessa quantia? Por que imaginaste isso em teu coração? Não foi aos homens que mentiste, mas a Deus.'" At 5,3-4
    E é ele quem o Espírito Santo instrui para a conversão dos não judeus: "Enquanto Pedro refletia sobre a visão, disse-lhe o Espírito: 'Eis aí três homens que te procuram. Levanta-te! Desce e vai com eles sem hesitar, porque sou Eu Quem os enviou.'" At 10,19-20


UNGIDO COM PODER

    Como sabemos, os Apóstolos foram ungidos com poder: "Jesus reuniu Seus Doze discípulos. Conferiu-lhes poder de expulsar os espíritos imundos, e de curar todo mal e toda enfermidade." Mt 10,1
    E pouco antes de Sua Ascensão, Ele prometeu outros dons: "... falarão novas línguas, manusearão serpentes, e se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal." Mc 16,17b
    Mas o caso de São Pedro realmente ia além: vivendo em verdadeira santidade, bastava sua sombra para curar enfermos: "Cada vez mais aumentava a multidão dos homens e mulheres que acreditavam no Senhor. De maneira que traziam os doentes para as ruas e os punham em leitos e macas, a fim de que, quando Pedro passasse, ao menos sua sombra cobrisse alguns deles. Também das cidades vizinhas de Jerusalém afluía muita gente, trazendo os enfermos e os atormentados por imundos espíritos, e todos eles eram curados." At 5,14-16
    Ele tinha plena consciência da missionária função da Igreja, e por isso deixou a comunidade de Jerusalém aos cuidados de São Tiago Menor, partindo para crismar os primeiros cristãos na Samaria. Era o 'Pentecostes dos Samaritanos': "Os Apóstolos que se achavam em Jerusalém, tendo ouvido que a Samaria recebera a Palavra de Deus, enviaram-lhe Pedro e João. Estes, assim que chegaram, fizeram oração pelos novos fiéis, a fim de receberem o Espírito Santo, visto que não havia descido ainda sobre nenhum deles, mas somente tinham sido batizados em Nome do Senhor Jesus. Então os dois Apóstolos lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo." At 8,14-17
    E foi aonde pôde para instaurar a Igreja: "A Igreja gozava então de Paz por toda Judeia, Galileia e Samaria. Estabelecia-se ela caminhando no temor do Senhor, e a assistência do Espírito Santo fazia-a crescer em número. Pedro, que caminhava por toda parte, de cidade em cidade, desceu também aos fiéis que habitavam em Lida." At 9,31-32
    Nesta cidade ele curou Eneias, que também estava paralítico: "Ali achou um homem chamado Eneias, que havia oito anos jazia paralítico num leito. Disse-lhe Pedro: 'Eneias, Jesus Cristo te cura! Levanta-te e faze tua cama.' E levantou-se imediatamente. Viram-no todos que habitavam em Lida e em Sarona, e converteram-se ao Senhor." At 9,33-35
    E por grande Graça operou uma ressurreição. Foi Tabita, também chamada de Dorcas, uma caridosa cristã: "Ora, como Lida fica perto de Jope, os discípulos, ouvindo dizer que Pedro aí se encontrava, enviaram-lhe dois homens, rogando-lhe: 'Não te demores em vir ter conosco.' Pedro imediatamente levantou-se e foi com eles. Logo que chegou, conduziram-no ao quarto de cima. Cercavam-no todas viúvas, chorando e mostrando-lhe as túnicas e os vestidos que Dorcas lhes fazia enquanto viva. Pedro, então tendo feito todos sair, pôs-se de joelhos e orou. Voltando-se para o corpo, disse: 'Tabita, levanta-te!' Ela abriu os olhos e, vendo Pedro, sentou-se. Ele fê-la levantar-se, estendendo-lhe a mão. Chamando os irmãos e as viúvas, entregou-lha viva. Este fato espalhou-se por toda Jope, e muitos creram no Senhor." At 9,38-42
    Ele também esteve em Antioquia quando de sua primeira viagem a Roma, pois junto a esta capital e a Alexandria eram as maiores cidades do Império, embora aí tenha pregado apenas aos judeus. Isso ocorreu durante a primeira dispersão dos cristãos, que massivamente tiveram que partir de Jerusalém: "Entretanto, aqueles que foram dispersados pela perseguição que houve no tempo de Estêvão chegaram até a Fenícia, Chipre e Antioquia, pregando a Palavra só aos judeus." At 11,19
    E em Roma ficou até a expulsão pelo imperador Cláudio no ano de 49, fato registrado por São Lucas: "Depois disso, saindo de Atenas, Paulo dirigiu-se a Corinto. Ali encontrou um judeu chamado Áquila, natural do Ponto, e sua mulher Priscila. Pouco antes, eles haviam chegado da Itália, por Cláudio ter decretado que todos judeus saíssem de Roma." At 18,1-2a
    A caminho de Roma, também se deteve por bom tempo em Corinto, outra importante cidade, e fez muitos fiéis bem antes de São Paulo, que registrou a preferência de alguns por seu carisma: "Pois acerca de vós, irmãos meus, fui informado pelos que são da casa de Cloé, que há contendas entre vós. Refiro-me ao fato de que entre vós se usa esta linguagem: 'Eu sou discípulo de Paulo. Eu, de Apolo. Eu, de Cefas. Eu, de Cristo.'" 1 Cor 1,11-12
    Não é justa, portanto, a rudeza que se atribui à sua pessoa, como se assim fossem todos pescadores apenas por força do ofício. A inspiração de São Pedro, como atestou o próprio Jesus, era absolutamente invulgar. E sua santidade, já como líder da Igreja, era amplamente reconhecida. Suas reflexões e mística, por tudo que viu e ouviu do Cristo, alçaram dos mais altos voos, coisas de sábio e grande Santo. Ora, ele foi o escolhido por Jesus! E, como visto, aclamado pelos cristãos. Não deve restar dúvida!
    Em outra carta, temos um registro do que seria o caminho ascético por ele descoberto, cujos graus de espiritualidade, de cada dom, são mesmo impreteríveis. Ele exorta: "Por estes motivos, esforçai-vos quanto possível por unir à vossa fé a virtude, à virtude a ciência, à ciência a temperança, à temperança a paciência, à paciência a piedade, à piedade o fraterno amor, e ao fraterno amor a caridade. Se estas virtudes se acharem abundantemente em vós, não vos deixarão inativos nem infrutuosos no conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. Porque quem não tiver estas coisas é míope, cego: esqueceu-se da purificação de seus antigos pecados." 2 Pd 1,5-9
    Foi São Pedro, enfim, o primeiro a levar o Espírito Santo a uma comunidade de gentios, no caso Cornélio, família e amigos, fato que também o faz fundador da Igreja 'Católica', que em grego significa 'Universal': "Ainda estando Pedro a falar, o Espírito Santo desceu sobre todos que ouviam a Palavra. Os fiéis da circuncisão, que tinham vindo com Pedro, profundamente admiraram-se, vendo que o dom do Espírito Santo também era derramado sobre os não judeus." At 10,44-45
     Ora, São Paulo respeitosamente cita-o pelo nome de ofício, como ele era chamado na Igreja, conforme o nome que lhe atribuiu o próprio Jesus: "Tiago, Cefas e João, que são considerados as colunas..." Gl 2,9
    Após sua conversão, aliás, logo que pôde São Paulo fez questão de ir conhecer e estar com São Pedro. Para tanto, expôs-se a risco de morte indo a Jerusalém, pois era procurado pelos judeus: "Três anos depois subi a Jerusalém para conhecer Cefas, e com ele fiquei quinze dias." Gl 1,18
    Buscou-o outra vez para tirar dúvidas sobre a Sã Doutrina, fato que também confirma que a Igreja sempre teve uma sede: inicialmente Jerusalém, até sua destruição, depois Roma: "Catorze anos mais tarde, subi outra vez a Jerusalém com Barnabé, comigo levando também Tito. E subi em conseqüência de uma revelação. Expus-lhes o Evangelho que prego entre os pagãos, e isso particularmente aos que eram de maior consideração, a fim de não correr ou de não ter corrido em vão." Gl 2,1-2
    E enxergando um 'ministério' entre os cristãos advindos do paganismo, abertamente reconhecia a São Pedro a chefia sobre os demais Apóstolos, isto é, sobre a Igreja originária: "Ao contrário, viram que a evangelização dos incircuncisos me era confiada, como a dos circuncisos a Pedro, porque Aquele Cuja ação fez de Pedro o Apóstolo dos circuncisos, também fez de mim o dos pagãos." Gl 2,7-8
    Ele buscou seu apoio em Jerusalém, confiante que era em sua inspiração, para dirimir a primeira grande controvérsia doutrinária da Igreja: a questão da circuncisão, ocorrida em Antioquia. Fato que mais uma vez revela que a Igreja sempre teve um centro de decisões: "Alguns homens, descendo da Judeia, puseram-se a ensinar aos irmãos o seguinte: 'Se não vos circuncidais, segundo o rito de Moisés, não podeis ser salvos.' Originou-se, então, grande discussão de Paulo e Barnabé com eles, e resolveu-se que estes dois, com alguns outros irmãos, fossem tratar desta questão com os Apóstolos e os Anciãos em Jerusalém." At 15,1-2
    São Pedro, que já havia batizado não judeus, como vimos,de fato não o desapontou, e seu voto decidiu o Primeiro Concílio da Igreja. Nesta fala, apontando sua vida missionária até 'os confins do mundo', como Jesus pediu (cf. At 1,8), outra vez revela seu protagonismo ao relatar ser 'escolhido por Deus' dentre os Apóstolos para abrir a Igreja aos não judeus, segmento que Paulo 'assumiria': "Ao fim de uma grande discussão, Pedro levantou-se e disse-lhes: 'Irmãos, vós sabeis que já há muito tempo Deus me escolheu dentre vós, para que de minha boca os pagãos ouvissem a Palavra do Evangelho e cressem. Ora, Deus, que conhece os corações, testemunhou a seu respeito, dando-lhes o Espírito Santo da mesma forma que a nós. Nem fez distinção alguma entre nós e eles, pela fé purificando seus corações. Por que, pois, agora provocais a Deus, impondo aos discípulos um jugo que nem nossos pais nem nós pudemos suportar? Nós cremos que pela Graça do Senhor Jesus seremos salvos, exatamente como eles.' Toda a assembleia ouviu-o silenciosamente." At 15,7-12
    Em seguida, São Tiago Menor, que já era o Bispo de Jerusalém pois nosso Santo 'caminhava por toda parte' (cf. At 9,32), vai corroborar seu voto: "Depois de terminarem, Tiago tomou a palavra: 'Irmãos, ouvi-me', disse ele. 'Simão narrou como Deus começou a olhar para as pagãs nações, para delas tirar um povo que trouxesse Seu Nome." At 15,13-14
    E ao decidirem escrever uma carta ao antioquenos, São Tiago Menor menciona o Espírito Santo como inspirador de São Pedro e da Igreja: "Com efeito, bem pareceu ao Espírito Santo e a nós não vos impor outro peso além do indispensável seguinte..." At 15,28
    Pouco depois, ele retornou em segunda viagem a Roma, e agora vai ratificar a fundação do mais importante bispado, que se tornaria a Sede da Igreja. Ele cita esse bispado em sua carta: "A igreja escolhida de Babilônia saúda-vos, como também Marcos, meu filho." 1 Pd 5,13
    E de lá preparou a Igreja para seguir através dos tempos, sempre contando com a luminosa instrução do próprio Jesus. Ele registrou em carta a revelação de seu martírio: "Portanto, irmãos, cada vez mais cuidai em assegurar vossa vocação e eleição. Procedendo deste modo, jamais tropeçareis. Assim vos será largamente aberta a entrada no Reino Eterno de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Eis porque não cessarei de trazer-vos à memória essas coisas, embora estejais instruídos e confirmados na presente Verdade. Tenho por meu dever, enquanto estiver neste tabernáculo, manter-vos vigilantes com minhas admoestações. Porque sei que em breve terei que deixá-lo, assim como Nosso Senhor Jesus Cristo me fez conhecer. Mas cuidarei para que, ainda depois de meu falecimento, possais sempre conservar a lembrança dessas coisas." 2 Pd 1,10-15
    Igreja que é sua barca, a nova Arca de Noé, escolhida pelo próprio Jesus para a Salvação das almas: "Estando Jesus um dia à margem do lago de Genesaré, o povo comprimia-se em redor d'Ele para ouvir a Palavra de Deus. Vendo duas barcas estacionadas à beira do lago, pois os pescadores haviam descido delas para consertar as redes, subiu a uma das barcas, que era a de Simão, e pediu-lhe que a afastasse um pouco da terra. E sentado, ensinava da barca o povo." Lc 5,1-3
    Barca cuja rede, apesar da tempestade, do revolto mar e da grande quantidade de almas, não se arrebenta, como na miraculosa pesca: "Subiu Simão Pedro e puxou a rede para a terra, cheia de cento e cinqüenta e três peixes grandes. Apesar de serem tantos, a rede não se rompeu." Jo 21,11

UM FIEL PESCADOR DE ALMAS

    Nosso Santo exercia o ofício de pescador, como São Marcos relata: "E, passando à beira do mar da Galileia, Jesus viu Simão e André, seu irmão, que lançavam a rede ao mar, pois eram pescadores." Mc 1,16
    Como seu irmão, era da Betsaida, povoado no norte de Israel, também próximo à margem do mar da Galileia, cujo nome significa 'casa da pesca': "Filipe era natural de Betsaida, cidade de André e Pedro." Jo 1,44
    Em Cafarnaum, cidade vizinha mais próxima ao Mar da Galileia, fazia parte de uma cooperativa de pesca com Zebedeu e seus filhos: "Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão..." Lc 5,10a
    E desde a primeira pesca miraculosa, quando nosso Santo também foi o primeiro a confessar-se diante de Jesus, Nosso Senhor fez dele, perante os religiosos São Tiago Maior e São João, um pescador de almas: "Então Jesus disse a Simão: 'Não temas! De hoje em diante, tu serás pescador de homens.'" Lc 5,10b
    Mas depois de contrair Matrimônio tinha ido morar em Cafarnaum, assumindo o dote e levando consigo seu irmão. Não se tem registro, contudo, de sua esposa ou de possíveis filhos após começar a seguir Jesus, apenas de sua sogra: "Dirigiram-se para Cafarnaum. Assim que saíram da sinagoga, dirigiram-se com Tiago e João à casa de Simão e André. A sogra de Simão estava de cama, com febre, e sem tardar Lhe falaram a respeito dela. Aproximando-Se Jesus, tomou-a pela mão e levantou-a. Imediatamente a febre deixou-a, e ela pôs-se a servi-Los." Mc 1,21a.29-31
    São Paulo relata que uma mulher o acompanhava em suas missões, embora não se saiba se se tratava de sua esposa, de sua filha ou simplesmente de uma mera ajudante, como tantas que seguiram Jesus, pois o Último Apóstolo argumentava tão somente sobre custos das comunidades que recebiam missões: "Acaso não temos nós direito de deixar que nos acompanhe uma mulher cristã, a exemplo dos outros Apóstolos e dos irmãos do Senhor e de Cefas?" 1 Cor 9,5
    Pode ter sido apenas uma ajudante, pois logo após Jesus desafiar o rico jovem a deixar tudo para segui-Lo, nosso Santo, sempre falando em nome dos Apóstolos, vai alegar: "Pedro começou a dizer-Lhe: 'Eis que deixamos tudo e Te seguimos.'" Mc 10,28
    Segundo São Lucas, esta demonstração de fidelidade deu-se logo após a primeira e miraculosa pesca: "E atracando as barcas à terra, deixaram tudo e seguiram-nO." Lc 5,11
    Ou, ainda que fosse sua esposa, talvez com ela mantivesse uma relação de irmãos, como São Paulo recomendava: "O que importa é que os que têm mulher vivam como se a não tivessem..." 1 Cor 7,29b
    Pois é simplesmente impossível que o Príncipe dos Apóstolos não tenha observado uma das mais importantes recomendações de vida espiritual dada por Jesus. De fato, ao desaprovar a carta de divórcio tolerada por Moisés, e reafirmar a indissolubilidade do Matrimônio, Nosso Salvador vai exaltar o celibato entre os que se dedicam às coisas de Deus: "Seus discípulos disseram-Lhe: 'Se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar!' Respondeu Ele: 'Nem todos são capazes de compreender o sentido desta Palavra, mas somente aqueles a quem foi dado. Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos Céus. Quem puder compreender, compreenda.'" Mt 19,10-12
    Por fim, muito se fala de que ele tenha negado Jesus, afetadamente até usam dizer que ele 'O traiu', mas quase não se observa as circunstâncias em que tudo se deu, nem a real motivação com que agia. De fato, se O negou com palavras, com atitudes expressava exatamente o contrário: todo seu incondicional amor pelo Mestre. Que dizer de sua coragem para entrar no pátio da casa sumo sacerdote naquela fatídica noite? E ele havia recém-decepado a orelha de um de seus guardas! Em sua estratégia, portanto, não O teria negado, mas apenas usava de dissimulação para aproximar-se do Palácio e assim acompanhar o que se passava com Jesus.
    E ainda maior é a desinformação, ou a maldade, dos que o acusam de covardia, pois, com a mesma prontidão com que prometia seguir Jesus até a morte, ele reagiu no Horto das Oliveiras, e só se deteve porque Jesus assim o ordenou: "Simão Pedro, que tinha uma espada, puxou dela e feriu o servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha direita. (O servo chamava-se Malco.) Mas Jesus disse a Pedro: 'Enfia tua espada na bainha! Não hei de beber Eu o cálice que o Pai Me deu?'" Jo 18,10-11
    Aliás, instantes antes, o próprio Jesus já havia pedido aos guardas que O prendiam para que dispensassem os Apóstolos: "'Se é, pois, a Mim que buscais, deixai ir estes.' Assim se cumpriu a Palavra que Ele mesmo havia dito: 'Dos que Me deste não perdi nenhum' (Jo 17,12)." Jo 18,8b-9
    Mais: fora São João Evangelista, que sabidamente não corria nenhum perigo, talvez por ser filho de um sacerdote, São Pedro foi o único Apóstolo a acompanhar de perto o pré-julgamento de Jesus feito pelos membros do Sinédrio, quando o galo cantou três vezes: "Simão Pedro seguia Jesus, e mais outro discípulo. Este discípulo era conhecido do sumo sacerdote e entrou com Jesus no pátio da casa do sumo sacerdote, porém Pedro ficou de fora, à porta. Mas o outro discípulo, que era conhecido do sumo sacerdote, saiu e falou à porteira, e esta deixou Pedro entrar." Jo 18,15-16
    São Mateus assim explicou porque ele usava desta artimanha: "Entrou e sentou-se junto aos criados, para ver como terminaria aquilo." Mt 26,58b
    Mas tão ligado era ele à figura do Mestre, como talvez não suspeitasse, que facilmente foi reconhecido! E por humilde gente: pela própria porteira do pátio: "A porteira perguntou a Pedro: 'Não és acaso também tu dos discípulos desse Homem?'" Jo 18,17a
    E por uma criada: "Acenderam um fogo no meio do pátio, e sentaram-se em redor. Pedro veio sentar-se com eles. Uma criada percebeu-o sentado junto ao fogo, encarou-o de perto e disse: 'Também este homem estava com Ele.'" Lc 22,55-56 
    Ademais, Jesus bem sabia que seria 'abandonado', e não apenas por São Pedro, mas por todos Apóstolos. Assim eram planos de Deus, embora nosso Santo relutasse: "Disse-lhes então Jesus: 'Esta noite serei para todos vós uma ocasião de queda. Porque está escrito: Ferirei o Pastor, e as ovelhas do rebanho serão dispersadas (Zc 13,7). Mas, depois da Minha Ressurreição, Eu precedê-vos-ei na Galileia.' Pedro interveio: 'Mesmo que sejas para todos uma ocasião de queda, para mim jamais o serás.'" Mt 26,31-33
    O Evangelho de São Marcos, em conclusão, pode ser considerado o Evangelho de São Pedro, como afirmou Santo Irineu, pois em grande parte se compõe de seus relatos. Sua extrema simplicidade e objetividade são tocantes retratos da pureza da alma do pescador da Galileia. E se São Marcos não lhe atribuiu nenhum especial destaque, foi justamente porque São Pedro nunca o suscitou entre conversas com ele e São Silvano, nem o permitiria.
    E também certamente por instrução sua, é neste Evangelho, que muito provavelmente serviu de base para o de São Mateus, onde temos a cena em que Jesus o chamou de 'Satanás', logo após sua inspirada declaração de que Ele era o Messias. De fato, nosso Santo ingenuamente refutou o anúncio que Jesus fez, em sequência, de Sua Paixão: "Então Pedro tomou Jesus à parte e começou a recriminá-Lo. Ele, porém, voltou-Se, olhou para os discípulos e repreendeu a Pedro, dizendo: 'Afasta-te de Mim, Satanás! Tu não pensas as coisas de Deus, e sim as dos homens.'" Mc 8,32b-33
    Ademais, assim como Jesus, São Pedro morreu de forma brutal. A Sagrada Tradição conta que, ao saber que ia ser crucificado, em sua sincera humildade não se permitiu morrer como Jesus. Não se achava digno. Pediu que o crucificassem de cabeça para baixo! E tão sangrenta foi a perseguição iniciada por Nero nestes tempos, e tão desnorteada ficou toda a comunidade cristã pelo amor que tinha ao Príncipe dos Apóstolos, que nenhum registro escrito foi feito logo após seu martírio. É um vácuo, um gritante silêncio da História! O próprio São Lucas bruscamente para seus relatos nos Atos dos Apóstolos, sem adicionar nenhuma linha sobre esse fato. Esperariam, já então, o fim dos tempos?
    Mas não é necessário recorrer a Sagrada Tradição para ter certeza desses acontecimentos. Basta lembrar que sua crucificação foi predita pelo próprio Jesus, após Sua Paixão, quando recebe mais uma distinção entre os Apóstolos: foi o único chamado a segui-Lo por uma segunda vez. E significativamente após Sua Ressurreição: "'Em Verdade, em Verdade, digo-te: quando eras mais moço, cingias-te e andavas aonde querias. Mas quando fores velho, estenderás tuas mãos, e outro cingi-te-á e levá-te-á aonde não queres.' Por estas palavras, Ele indicava o gênero de morte com que havia de glorificar a Deus. E depois de assim ter falado, acrescentou: 'Segue-Me!'" Jo 21,18-19
    E São Pedro bem sabia do que Jesus estava falando. Eles já haviam conversado sobre isso na noite da Santa Ceia: "Perguntou-Lhe Simão Pedro: 'Senhor, para onde vais?' Jesus respondeu-lhe: 'Para onde vou, não podes seguir-Me agora. Mas, mais tarde, seguir-Me-ás.' Jo 13,36
    Inclusive foi informado, e também pelo próprio Jesus, como vimos, da proximidade de sua hora. Ele registrou em sua carta esta revelação particular: "Tenho por meu dever, enquanto estiver neste tabernáculo, manter-vos vigilantes com minhas admoestações. Porque sei que em breve terei que deixá-lo, assim como Nosso Senhor Jesus Cristo me fez conhecer." 2 Pd 1,13-14


    Tão amado era nosso Santo, e já desde Jerusalém, que foram preservadas as correntes com que o prenderam por ordem de Herodes. Claro, o fato de ter sido miraculosamente libertado por seu Anjo da Guarda estarreceu a guarda romana em Jerusalém, o que muito concorreu para que elas fossem veneradas como relíquias. E assim para elas foi erguida um Basílica em Roma, que tem o nome de São Pedro Acorrentado.
    O episódio, em si, é bastante conhecido: "Ora, quando Herodes estava para apresentá-lo, naquela mesma noite dormia Pedro entre dois soldados, ligado com duas cadeias. Os guardas, à porta, vigiavam o cárcere. De repente, apresentou-se um anjo do Senhor, e uma luz brilhou no recinto. Tocando no lado de Pedro, o anjo despertou-o: 'Levanta-te depressa', disse ele. Caíram-lhe as cadeias das mãos. O anjo ordenou: 'Cinge-te, e calça tuas sandálias. Ele assim fez. O anjo acrescentou: 'Cobre-te com tua capa e segue-me.' Pedro saiu e seguiu-o, sem saber se era real o que se fazia por meio do anjo. Julgava estar sonhando. Passaram o primeiro e o segundo postos da guarda. Chegaram ao portão de ferro, que dá para a cidade, o qual se lhes abriu por si mesmo. Saíram e tomaram juntos uma rua. Em seguida, de súbito, o anjo desapareceu. Então Pedro tornou a si e disse: 'Agora vejo que o Senhor verdadeiramente mandou Seu anjo, e livrou-me da mão de Herodes e de tudo que esperava o povo dos judeus.'" At 12,6-11
    E pela punição dada aos guardas, como se fazia em caso de fuga do prisioneiro, sabemos qual a sentença que Herodes reservava para São Pedro, pois já havia mandado matar São Tiago Maior: "Logo que amanheceu, houve um pouco comum sobressalto entre os soldados a respeito do que acontecera a Pedro. Herodes, procurando-o e não o achando, instaurou um processo contra os guardas e mandou supliciá-los." At 12,18-19


    Na rádio-mensagem de Natal de 1950, após minuciosos exames científicos, o venerável Papa Pio XII anunciou a confirmação de que o túmulo de São Pedro, assim como alguns de seus ossos, realmente estão sob o Altar da Basílica de São Pedro, diante de sua Cátedra. De fato, entre outros antiquíssimos escritos na lápide, consta: "Pedro está aqui."


    São Pedro, rogai por nós!