sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Obrigação de Conhecer e de Quem conhece


    Como argumento que confirma o Purgatório, único 'lugar', ou melhor, estado, no qual podem dar-se as menores e maiores punições, pois no Céu não haverá nenhuma e no inferno ela é total, Jesus deixou claro que são bem mais sérias as obrigações de quem teve oportunidade de conhecer as coisas de Deus: "O servo que, apesar de conhecer a vontade de Seu Senhor, nada preparou e Lhe desobedeceu, será açoitado com numerosos golpes. Mas aquele que, ignorando a vontade de Seu Senhor, fizer coisas repreensíveis, será açoitado com poucos golpes. Porque a quem muito se deu, muito exigir-se-á. Quanto mais se confiar a alguém, mais exigir-se-á dele." Lc 12,47-48
    Ora, a profecia de Jesus sobre a destruição de Cafarnaum deu-se exatamente por isso. Esta cidade calou-se, ao invés de testemunhar os milagres por Ele realizados: "E tu, Cafarnaum, serás elevada ao Céu? Não! Serás atirada no inferno! Porque se Sodoma tivesse visto os milagres que foram feitos dentro de teus muros, subsistiria até este dia. Por isso, digo-te: no Dia do Juízo haverá menor rigor para Sodoma que para ti!" Mt 11,23-24
    Assim como a condenação de Judas Iscariotes: "O Filho do Homem vai, segundo o que d'Ele está escrito, mas ai daquele por quem o Filho do Homem for traído! Melhor lhe seria que nunca tivesse nascido..." Mc 14,21
    Isso significa que os fariseus e os chefes dos sacerdotes também estavam errados quanto a humilde e 'analfabetizada' gente que acreditava em Jesus. Eles diziam: "Este poviléu que não conhece a Lei é amaldiçoado!..." Jo 7,49
    A rejeição que sacerdotes, chefes do Templo e saduceus tinham para com os Apóstolos era de mesma natureza: "Vendo eles a coragem de Pedro e de João, e considerando que eram homens sem estudo e sem instrução, admiravam-se. Reconheciam-nos como companheiros de Jesus." At 4,13
    Os ensinamentos de Jesus, de fato, mostram que quem dispõe de mais recursos tem maiores obrigações. Ele foi categórico ao dizer que a mera riqueza não é sinal das Graças de Deus, mas automática perdição se não contar com a Divina Misericórdia, pois ser alfabetizado, uma benesse dos ricos de então, o que representava ter acesso às Escrituras e assim à Salvação, é um indeclinável compromisso com Deus: "'Eu repito-vos: é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha que um rico entrar no Reino de Deus.' A estas palavras Seus discípulos, pasmados, perguntaram: 'Quem então poderá salvar-se?'" Mt 19,24-25
    Sem dúvida, Ele exaltava a divina inspiração que via entre os mais humildes, jamais a mundana sabedoria ou o vazio racionalismo: "Naquele mesma hora, Jesus exultou de alegria no Espírito Santo e disse: 'Pai, Senhor do Céu e da Terra, Eu dou-Te graças porque escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, bendigo-Te porque assim foi de Teu agrado.'" Lc 10,21
    O Livro do Eclesiástico já havia anotado: "Muitos são altaneiros e ilustres, mas é aos humildes que Ele revela Seus mistérios." Eclo 3,20b
    São Tiago Menor, citando o Livro dos Provérbios, mais amplamente fala em Graça: "Deus, porém, dá uma ainda mais abundante Graça. Por isso, a Escritura diz: 'Deus resiste aos soberbos, mas dá Sua Graça aos humildes (Pr 3,34).'" Tg 4,6
    Foi isso que se deu com uma samaritana e sua gente, que religiosamente eram ferrenhos opositores dos judeus, como o era Jesus: "A mulher deixou seu cântaro, foi à cidade e disse àqueles homens: 'Vinde e vede um Homem que me contou tudo que tenho feito. Não seria Ele, porventura, o Cristo?' Eles saíram da cidade e vieram ter com Jesus. E diziam à mulher: 'Já não é por causa de tua declaração que cremos, mas nós mesmos ouvimos e sabemos ser verdadeiramente Este o Salvador do mundo.'" Jo 4,28-30.42
    Ora, desde o início São João Batista já avisava das sutilezas das manifestações de Deus, das quais Jesus é o perfeito exemplo: "Eu batizo com água, mas em meio a vós está Quem vós não conheceis." Jo 1,26


A SABEDORIA ENTRE OS HUMILDES

    A São Pedro, pois, um humilde pescador, Jesus entregou as 'Chaves de Seu Reino', que significa a mais pura inspiração para saber o que é o certo e o errado quanto à Revelação, ou seja, quanto às Escrituras e quanto à vontade de Deus: "Eu dá-te-ei as Chaves do Reino dos Céus. Tudo que ligares na Terra, será ligado nos Céus, e tudo que desligares na Terra, será desligado nos Céus." Mt 16,19
    Porque instantes antes, ao reconhecê-Lo como o Cristo, o Príncipe dos Apóstolos claramente mostrou Qual a Fonte que lhe inspirava: "Disse-lhe então Jesus: 'Feliz és, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne nem o sangue que te revelou isto, mas Meu Pai que está nos Céus.'" Mt 16,17
    Essas 'Chaves', porém, representam bem mais que conhecer as 'palavras chaves' das Escrituras. Envolvem o dom da ciência, que permite, através da Comunhão dos Santos, andar passo-a-passo com os desígnios de Deus. Jesus advertia os falsos mestres, manipuladores das Escrituras e rebeldes à Verdade, exatamente por não divulgarem esse conhecimento para a Salvação do povo de Deus: "Ai de vós, doutores da Lei, que tomastes a chave da ciência! Vós mesmos não entrastes e impedistes de entrar os que vinham!" Lc 11,52
    Portanto, o diferencial da Santa Igreja, a nova comunidade fundada por Nosso Salvador, é a Luz do Espírito Santo, que não pode ser conhecido por aqueles que vivem para o mundo, como Jesus mesmo disse: "É o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber porque não O vê nem O conhece. Mas vós conhecê-Lo-eis, porque convosco permanecerá e em vós estará." Jo 14,17
    São João Evangelista assegura aos irmãos essa divina assistência: "Vós, porém, tendes a Unção do Santo, e sabeis todas coisas." 1 Jo 2,20
    E errado está quem pensa que por algum instante a Igreja esteve desassistida de Sua Luz. Jesus afirmou: "E Eu rogarei ao Pai e Ele dá-vos-á outro Paráclito, para que convosco fique eternamente." Jo 14,16
    O sagrado autor do Livro da Sabedoria até já exultava com seus lampejos de revelação: "Tudo que está escondido e tudo que está aparente eu conheço, porque foi a Sabedoria, criadora de todas coisas, que mo ensinou." Sb 7,21
    Muito mais gloriosos com o Pentecostes, portanto, isso radicalmente mudou a condição dos Apóstolos diante das dificuldades dessa vida, pois a Antiga Aliança e a literal interpretação das Escrituras foram superadas pela plena manifestação de Deus, nas Pessoas de Jesus e do Espírito Santo. São Paulo vai afirmar: "Ele (Deus) é que nos fez aptos para ser Ministros da Nova Aliança, não a da letra, e sim a do Espírito. Porque a letra mata, mas o Espírito vivifica." 2 Cor 3,6
    Por isso, coberto de razão, ele reclama a autoridade da Igreja quanto à Sã Doutrina: "Por conseguinte, desprezar estes preceitos é desprezar não a um homem, mas a Deus, que nos infundiu Seu Santo Espírito." 1 Ts 4,8
    Ora, a Unção do Espírito Santo, que é exclusivamente concedida por Seus Sacerdotes, eleva o ser humano a uma nova dimensão, dando-lhe um novo e soberano dom, como São Paulo explica: "Mas o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, pois para ele são loucuras. Nem pode compreendê-las, porque é pelo Espírito que se devem ponderar. O homem espiritual, ao contrário, julga todas coisas e não é julgado por ninguém." 1 Cor 2,14-15
    Ele até fez uma confissão: "Por isso, daqui em diante a ninguém conhecemos de um humano modo. Muito embora tenhamos considerado Cristo dessa maneira, agora já não O julgamos assim." 2 Cor 5,16
    E afirmou: "Na verdade, julgo como perda todas coisas em comparação a esse supremo bem: o conhecimento de Jesus Cristo, Meu Senhor. Por Ele tudo desprezei e tenho em conta de esterco, a fim de ganhar Cristo e estar com Ele." Fl 3,8-9a
    O próprio Jesus indicou essa condição de Seus Sacerdotes, que realmente já conheceram a Revelação, porque suas reais necessidades se tornaram outras: "Assim, pois, qualquer um de vós que não renuncia a tudo que possui, não pode ser Meu discípulo." Lc 14,33
    Porque quem encontrou a Deus não precisa de mais nada, como Ele afirmou: "Quem vem a Mim não terá mais fome, e quem crê em Mim nunca mais terá sede." Jo 6,35b
    E só pela Unção do Santo Paráclito podemos ser Igreja, o Corpo Místico de Cristo, como o Último Apóstolo diz: "É n'Ele (Cristo) que vós conjuntamente também entrais, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a morada de Deus." Ef 2,22
    Falando do Nome de Jesus, São João Evangelista aponta esse sinal dos cristãos: "Quem observa Seus Mandamentos permanece em Deus e Deus nele. É nisto que reconhecemos que Ele permanece em nós: pelo Espírito que nos deu." 1 Jo 3,24
    E constata o mesmo efeito desse diferencial: "Considerai com que amor nos amou o Pai, para que sejamos chamados filhos de Deus. E nós o somos de fato. Por isso, o mundo não nos conhece, porque não O conheceu." 1 Jo 3,1
    Era essa acusação que Jesus fazia aos religiosos judeus: "Não conheceis nem a Mim nem a Meu Pai. Se Me conhecêsseis, certamente também conheceríeis a Meu Pai." Jo 8,19b
    Assim, através dos Apóstolos somos chamados a fazer parte da família de Deus. São Paulo diz: "... sois concidadãos dos Santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos Apóstolos e Profetas..." Ef 2,19-20
    Porque mais que fundamentos da Igreja, eles são os fundamentos da própria celeste morada, conforme as revelações testemunhadas por São João Evangelista: "A muralha da cidade tinha doze fundamentos com os nomes dos Doze Apóstolos do Cordeiro." Ap 21,14


A MATURIDADE DE CRISTO

    Todo católico, pois, deve viver pela Unidade da Igreja, que só é factível quando se busca a santidade, a maturidade de Cristo. São Paulo ensina: "A uns Ele constituiu Apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores, doutores, para o aperfeiçoamento dos cristãos, para o desempenho da tarefa que visa à construção do Corpo de Cristo, até que todos tenhamos chegado à Unidade da e do conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado de homem feito, a estatura da maturidade de Cristo." Ef 4,11-13
    Isso nada mais é que nossa restauração enquanto imagem e semelhança de Deus: "Agora, porém, deixai de lado todas estas coisas: ira, animosidade, maledicência, maldade, torpes palavras de vossa boca, nem vos enganeis uns aos outros. Vós despiste-vos do velho homem com seus vícios e revestiste-vos do novo, que constantemente vai restaurando-se à imagem d'Aquele que o criou, até atingir o perfeito conhecimento." Cl 3,8-10
    Segundo palavras do próprio Jesus, só o prático conhecimento da Divina Revelação pode realmente libertar-nos das trevas e do vazio da mera existência: "Se permanecerdes em Minha Palavra, sereis Meus verdadeiros discípulos. Conhecereis a Verdade, e a Verdade libertá-vos-á." Jo 8,31-32
    Ele havia rezado ao Pai, na oração pela unidade: "Ora, a Vida Eterna consiste em que conheçam a Ti, um só Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, que enviaste." Jo 17,3
    Pois entre outros dons, tal conhecimento representa a efetiva elevação da Igreja, como São Paulo pede aos coríntios: "Assim, uma vez que aspirais aos dons espirituais, procurai tê-los em abundância para edificação da Igreja." 1 Cor 14,12
    Ele repetia: "A cada um é dada a manifestação do Espírito para comum proveito." 1 Cor 12,7
    Rezava: "Mas graças sejam dadas a Deus, que nos concede sempre triunfar em Cristo, e que por nosso meio difunde em todo lugar o perfume de Seu conhecimento." 2 Cor 2,14
    Reconhecia, portanto, a absoluta carência dos divinos auxílios: "Não que por nós mesmos sejamos capazes de ter algum pensamento, como de nós mesmos. Nossa capacidade vem de Deus." 2 Cor 3,5
    Por isso não via limites, e heroicamente demonstrava total disposição: "Anseio pelo conhecimento de Cristo e do poder de Sua Ressurreição, através da participação em Seus sofrimentos, tornando-me semelhante a Ele na morte..." Fl 3,10
    Essa consagração às coisas de Deus, porém, é a própria obra da Salvação: "Mas pela sincera prática da caridade, cresçamos em todos sentidos n'Aquele que é a Cabeça, Cristo. É por Ele que todo Corpo, coordenado e unido por conexões que estão a Seu dispor, trabalhando cada um conforme a atividade que lhe é própria, efetua esse crescimento, visando Sua plena edificação na caridade." Ef 4,15-16
    E tudo deve começar por acreditar na Missão do Salvador: "Respondeu-lhes Jesus: 'A obra de Deus é esta: que creiais n'Aquele que Ele enviou.'" Jo 6, 29
    Foi assim que São João justificou os milagres que narrou em seu Evangelho: "Mas estes foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a Vida em Seu Nome." Jo 20,31
    Ora, diante do estranhamento perante Sua Pessoa, porque faticamente revelava desconcertantes realidades, em conversa com os judeus Jesus chegou a apelar tão somente para Seus milagres: "Se Eu não faço as obras de Meu Pai, não Me creiais. Mas se as faço, e se não quiserdes crer em Mim, crede em Minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em Mim e Eu no Pai." Jo 10,37-38
     Com razão, Deus dá mais que bastantes sinais para que saiamos da ignorância. No saber do Apóstolo dos Gentios, dizendo dos ímpios e dos perversos, nada pode justificar tanta teimosia e insensibilidade: "Desde a Criação do mundo, as invisíveis perfeições de Deus, Seu sempiterno poder e divindade, tornam-se visíveis à inteligência por Suas obras, de modo que não podem escusar-se." 1 Rm 1,20
    De fato, o Livro da Sabedoria já indicava que pela Criação se pode perceber o Criador: "Pela grandeza e beleza das criaturas, pode-se, por analogia, chegar ao conhecimento de Seu Autor." Sb 13,5
    A indiferença em face de tão sublime realidade, ainda segundo São Paulo, necessariamente corresponde a cair nas tentações do inimigo: "Ele usará de todas seduções do mal com aqueles que se perdem, por não terem cultivado o amor à Verdade que poderia salvá-los." 2 Ts 2,10
    Ele cravou: "Se nosso Evangelho ainda estiver encoberto, está encoberto para aqueles que se perdem, para os incrédulos, cujas inteligências o deus deste mundo obcecou a tal ponto que não percebem a Luz do Evangelho, onde resplandece a Glória de Cristo, que é a imagem de Deus." 2 Cor 4,3-4
    Diz dos judeus, que ainda se atêm à Antiga Aliança: "Em consequência, a inteligência deles permaneceu obscurecida. Ainda agora, quando leem o Antigo Testamento, esse mesmo véu permanece abaixado, porque só em Cristo deve ser levantado." 2 Cor 3,14
    Escreveu a São Tito: "Para os puros, todas coisas são puras. Para os corruptos e descrentes, nada é puro, até sua mente e consciência são corrompidas. Proclamam que conhecem a Deus, mas na prática renegam-nO, detestáveis que são, rebeldes e incapazes de qualquer boa obra." Tt 1,15-16
    Pregou que a Igreja, pessoalmente edificada por Jesus, serve "Para que não continuemos crianças ao sabor das ondas, agitados por qualquer sopro de doutrina, ao capricho da malignidade dos homens e de seus enganadores artifícios. Portanto, eis o que digo e conjuro no Senhor: não persistais em viver como os pagãos, que andam à mercê de suas frívolas idéias. Têm o entendimento obscurecido. Sua ignorância e o endurecimento de seu coração mantêm-nos afastados da Vida de Deus. Indolentes, entregaram-se à dissolução, à apaixonada prática de toda espécie de impureza. Vós, porém, não foi para isto que vos tornastes discípulos de Cristo, se é que O ouvistes e d'Ele aprendestes como convém à Verdade em Jesus." Ef 4,14.17-21
    E exortava: "Despertai, como convém, e não pequeis! Porque alguns vivem na total ignorância de Deus, para vossa vergonha digo-o." 1 Cor 15,34
    Já a prática das virtudes leva a indizíveis tesouros, como São Pedro recomenda: "Por estes motivos, esforçai-vos quanto possível por unir à vossa fé a virtude, à virtude o conhecimento, ao conhecimento a temperança, à temperança a paciência, à paciência a piedade, à piedade o fraterno amor, e ao fraterno amor a caridade. Se estas virtudes abundantemente se acharem em vós, não vos deixarão inativos nem infrutuosos no conhecimento de Nosso Senhor Jesus Cristo." 2 Pd 1,5-8
    Ele saúda em sua Segunda Carta: "Que haja abundância de Graça e Paz, mediante o conhecimento de Deus e de Jesus Cristo Nosso Senhor." 2 Pd 1,2
    Sugeria o crescimento espiritual como meta de vida, como remédio contra a recaída no pecado: "Vós, pois, caríssimos, advertidos de antemão, tomai cuidado para que não caiais de vossa firmeza, levados pelo erro destes ímpios homens. Mas crescei na Graça e no conhecimento de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo." 2 Pd 3,17-18
    Pois como as consequências dos milagres realizados em Cafarnaum, conhecer a Graça de Deus e tornar a afastar-se é desastroso: "Com efeito, se aqueles que renunciaram às corrupções do mundo pelo conhecimento de Jesus Cristo Nosso Senhor e Salvador, nelas novamente deixam-se enredar e vencer, seu último estado torna-se pior que o primeiro. Melhor fora não terem conhecido o Caminho da justiça que, depois de tê-lo conhecido, tornarem atrás abandonando a Lei Santa que lhes foi ensinada. Aconteceu-lhes o que com razão diz o provérbio: 'O cão voltou ao seu vômito (Pr 26,11)'; e: 'A porca lavada volta a revolver-se no lamaçal.'" 2 Pd 2,20-22
    Ora, sem a Divina Luz, de infrutífero modo a alma humana teima em querer ser dona do próprio destino. E assim é desde os tempos de Eva, que seguindo suas próprias ideias desprezou os ensinamentos de Deus, pelo pecado da soberba: "'Oh, não!', tornou a serpente. 'Vós não morrereis! Mas Deus bem sabe que, no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão, e sereis como deuses, conhecedores do bem e do mal.'" Gn 3,4-5
    Jesus, de fato, ensina: "Eu sou a videira. Vós, os ramos. Quem permanecer em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto. Porque sem Mim nada podeis fazer." Jo 15,5
    Diz que sequer podemos conhecer a Deus sem Sua ajuda: "Ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelá-Lo." Mt 11,27b
    Deu mostra deste poder perante os Apóstolos, após Sua Ressurreição: "Então Ele lhes abriu o espírito para que compreendessem as Escrituras..." Lc 24,45a
    Também perante uma mulher em Filipos, que ouvia o Último Apóstolo: "O Senhor abriu-lhe o coração, para atender às coisas que Paulo dizia." At 16,14b
    E Jesus havia garantido aos religiosos judeus, falando da profunda e verdadeira forma de conhecer: "Conheço Minhas ovelhas e Minhas ovelhas conhecem a Mim, como Meu Pai Me conhece e Eu conheço o Pai." Jo 10,14b-15
    Enquanto verdadeiro judeu, Ele apontava o erro dos samaritanos: "Vós adorais o que não conheceis. Nós adoramos o que conhecemos, porque a Salvação vem dos judeus." Jo 4,22
    Por vezes deixou de fora a multidão: "Respondeu Jesus: 'Porque a vós é dado compreender os mistérios do Reino dos Céus, mas não a eles.'" Mt 13,11
    Realmente tinha mais sérios assuntos a tratar: "Tendo partido dali, atravessaram a Galileia. Ele não queria, porém, que ninguém o soubesse, pois ensinava Seus discípulos..." Mc 9,30-31a
    E não Se apresentou a todos depois de ressuscitar, como São Pedro explicou: "Mas Deus ressuscitou-O no terceiro dia, concedendo-Lhe manifestar-Se não a todo povo, mas às testemunhas que Deus havia escolhido..." At 10,40-41a
    Mas, ao final, em Sua Igreja tudo seria abertamente revelado, e ainda disse dos ocultistas: "Não os temais! Porque nada há de escondido que não venha à Luz, nada de secreto que não se venha a saber. O que vos digo na escuridão, dizei-o às claras. O que vos é dito ao ouvido, publicai-o de cima dos telhados." Mt 1026-27
    Era o que todos esperavam do Cristo, como disse a samaritana à beira do poço de Jacó: "Respondeu a mulher: 'Sei que deve vir o Messias, que Se chama Cristo. Pois quando vier, Ele fá-nos-á conhecer todas coisas.'" Jo 4,25
    São Pedro vai confirmar que recebemos bem mais que necessitamos: "O divino poder deu-nos tudo que contribui para a Vida e a piedade, fazendo-nos conhecer Aquele que nos chamou por Sua Glória e Sua Virtude. Por elas, temos entrado na posse das maiores e mais preciosas promessas, a fim de tornar-vos por este meio participantes da natureza divina, subtraindo-vos à corrupção que a concupiscência gerou no mundo." 2 Pd 1,3-4
    O próprio Jesus vai atestar: "Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz Seu Senhor. Mas chamei-vos amigos, pois vos dei a conhecer tudo quanto ouvi de Meu Pai." Jo 15,15
    E São Paulo, perante os Anciãos de Éfeso, vai alegar a integral transmissão: "Vós sabeis como não tenho negligenciado, como não tenho ocultado coisa alguma que vos podia ser útil. Preguei e instruí-vos publicamente e dentro de vossas casas. Portanto, hoje eu protesto diante de vós que sou inocente do sangue de todos, porque nada omiti no anúncio que vos fiz dos desígnios de Deus." At 20,20.26-27
    Jesus, contudo, sabia da grande apostasia que tomaria conta do mundo: "Mas quando vier o Filho do Homem, acaso achará fé sobre a Terra?" Lc 18,8b
    Mas mesmo assim não deixou de encarregá-los de tudo ensinar, garantindo Sua assistência: "Ide, pois, e ensinai a todas nações. Batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo que vos prescrevi. Eis que convosco estou todos dias, até o fim do mundo." Mt 28,19-20
    É óbvio, porém, que não temos o poder da Onisciência, como argumenta um amigo de Jó: "Ah, se Deus pudesse falar e abrir Seus lábios para responder-te, revelar-te os mistérios da Sabedoria que são ambíguos para o espírito... Pretendes sondar as divinas profundezas, atingir a perfeição do Todo-poderoso? Ela é mais alta do que o Céu, que farás? É mais profunda que os infernos, como a conhecerás? É mais longa que a Terra, mais larga que o mar." Jó 11,5-6a.7-9
    No entanto, por tudo que havia revelado, Deus já dizia através do Profeta Isaías: "O boi conhece seu dono, e o asno, o estábulo de seu proprietário. Mas Israel não conhece nada, e Meu povo não tem entendimento." Is 1,3
    Este Profeta advertia: "Buscai o Senhor, enquanto pode ser achado. Invocai-O, enquanto Ele está perto." Is 55, 6
    O Profeta Oseias, por sua vez, preparava o povo de Israel para a Vinda de Jesus: "Apliquemo-nos a conhecer o Senhor. Sua vinda é certa como a da aurora. Ele virá a nós como a chuva, como a chuva da primavera que irriga a terra." Os 6,3
    E o salmista assegura: "O Senhor aproxima-Se dos que O invocam, daqueles que O invocam com sinceridade." Sl 144,18


COMUNGAR DO AMOR

    Na verdade, como respondeu Nossa Senhora ao Arcanjo Gabriel, basta que acolhamos o chamado de Nosso Salvador: "Então disse Maria: 'Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo tua palavra.'" Lc 1,38a
    Concebida sem pecado, Nossa Mãe Celeste é modelo de estrito respeito aos divinos ensinamentos: "Maria conservava todas estas palavras, meditando-as em seu coração." Lc 2,19
    Jesus mais exaltava essa atitude, por toda vida posta em prática pela Santíssima Virgem, que a própria Divina Maternidade: "Enquanto Ele assim falava, uma mulher levantou a voz do meio do povo e disse-Lhe: 'Bem-aventurado o ventre que Te trouxe, e os seios que Te amamentaram!' Mas Jesus replicou: 'Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a observam!'" Lc 11,27-28
    Era o que Maria fazia desde o Nascimento de Jesus, como vimos, e tornou a fazer quando Jesus tinha apenas 12 anos, e por três dias esteve 'perdido' em Jerusalém: "Quando eles O viram, ficaram admirados. E Sua mãe disse-Lhe: 'Meu filho, que nos fizeste?! Eis que Teu pai e eu andávamos à Tua procura, cheios de aflição.' Respondeu-lhes Ele: 'Por que Me procuráveis? Não sabíeis que devo estar na Casa de Meu Pai?' Eles, porém, não compreenderam o que Ele lhes dissera. Em seguida, desceu com eles a Nazaré e era-lhes submisso. Sua mãe guardava todas estas coisas em seu coração." Lc 2,48-51
    Segundo São João Evangelista, é exatamente esse o mais claro sinal de um cristão: "Eis como sabemos que O conhecemos: se guardamos Seus Mandamentos. Aquele que diz conhecê-Lo e não guarda Seus Mandamentos, é mentiroso e nele não está a Verdade." 1 Jo 2,4
    Com efeito, é por não conhecer a Deus que o mundo não respeita a Igreja, mesmo tendo sido tão bem representada pelos Apóstolos, a grande maioria deles martirizados. Como vimos, o Amado Discípulo disse: "Por isso, o mundo não nos conhece, porque não O conheceu." 1 Jo 3,1b
    Pois, podemos estar certos, não precisamos de muito esforço para chegar a Comunhão com o Pai: basta-nos seguir o Caminho, a despeito das objeções de nossa consciência: "Meus filhinhos, não amemos com palavras nem da boca para fora, mas por atos e em Verdade. Nisto é que conheceremos se somos da Verdade, e tranquilizaremos nossa consciência diante de Deus caso ela nos censure, porque Deus é maior do que nossa consciência e conhece todas coisas." 1 Jo 3,18-20
    E diz mais: "É nisto que se conhece quais são os filhos de Deus e quais os do Demônio: todo aquele que não pratica a justiça, não é de Deus, como também aquele que não ama seu irmão." 1 Jo 3,10
    A 'modernidade', segundo São Paulo, é pródiga em falsos mestres, um verdadeiro supermercado de religiões para todas vertentes de individualismo e hedonismo: "Porque virá tempo em que os homens já não suportarão a Sã Doutrina da Salvação. Levados pelas próprias paixões e pelo prurido de escutar novidades, ajustarão mestres para si. Apartarão os ouvidos da Verdade e atirar-se-ão às fábulas." 2 Tm 4,3-4
    Por Suas próprias manifestações e revelações, porém, bem como para nossa mais sensível percepção, Deus foi-nos descrito com os mais singelos conceitos. São João Evangelista sintetizou: "Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor." 1 Jo 4,8
     Jesus resumiu no amor salvífico tudo que Deus quer de nós: "'Mestre, qual é o maior Mandamento da Lei?' Respondeu Jesus: 'Amarás o Senhor Teu Deus de todo teu coração, de toda tua alma e de todo teu entendimento (Dt 6,5). Este é o maior e o primeiro Mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás teu próximo como a ti mesmo (Lv 19,18). Nestes dois Mandamentos resumem-se toda a Lei e os Profetas.'" Mt 22,36-40
    E num gesto de extrema condescendência com nossa insensata falta de atenção, Ele foi ainda mais longe em simplicidade e exemplo: "Este é Meu Mandamento: amai-vos uns aos outros, como Eu vos amo." Jo 15,12
    Pouco antes de Sua Paixão, por fim, Ele deixou claro que a caridade, aqui mais exaltada em seu aspecto material, seria o principal critério para justificar a Salvação: "Vinde, benditos de Meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo, porque tive fome e deste-Me de comer, tive sede e deste-Me de beber, era peregrino e acolheste-Me, nu e vestiste-Me, enfermo e visitaste-Me, estava na prisão e viestes a Mim. ... todas vezes que fizestes isto a um destes pequeninos Meus irmãos, foi a Mim mesmo que o fizestes." Mt 25,34-36.40b
    Não por acaso, a Nova Aliança, consumada pelo Sacrifício da Cruz, fez de Seu projeto algo universalmente conhecido. Boa parte da humanidade pode até não guardar Seus ensinamentos, mas intimamente tem muito precisa ideia do que eles significam. Firmaram os seguidores da tradição de São Paulo: "Ninguém mais terá que ensinar a seu concidadão, ninguém a seu irmão, dizendo: 'Conhece o Senhor', porque todos Me conhecerão, desde o menor até o maior (Jr 31,34)." Hb 8,11
    O pleno conhecimento de Deus, contudo, só será alcançado quando de nossa entrada nos Céus. O próprio São Paulo apontou: "Pois nosso conhecimento é limitado, limitada também é nossa profecia. Mas quando vier a perfeição, desaparecerá o que é limitado. Hoje vemos como por um espelho, confusamente, mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte, mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido." 1 Cor 13,9-10.12
    São João Evangelista, no mesmo sentido, garantiu aos que Lhe obedecem: "Verão Sua face..." Ap 22,4

    "A todos saciai com Vossa Glória!"