sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Nossa Senhora das Candeias


    Esse título da Mãe de Deus tem algumas sutis variações como Nossa Senhora da Candelária e Nossa Senhora da Luz, ou ainda Nossa Senhora da Apresentação e Nossa Senhora da Purificação. Fora esse último, que diz respeito ao ritual cumprido pela Santíssima Virgem, todos são referências ao Cristo, Luz do mundo, como no Templo de Jerusalém testemunharia o religioso Simeão, no dia da Apresentação do Menino Jesus: "Agora, Senhor, deixai ir em Paz Vosso servo, segundo Vossa Palavra. Porque meus olhos viram Vossa Salvação que preparastes diante de todos povos, como Luz para iluminar as nações, e para a Glória de Vosso povo de Israel." Lc 2,29-32
    De fato, ao iniciar Sua vida pública, Jesus mesmo iria dizer: "Eu sou a Luz do mundo. Aquele que Me segue não andará em trevas, mas terá a Luz da Vida." Jo 8,12
    E como Seus representantes, logo filhos de Maria, Ele deu-nos idêntica missão: "Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre uma montanha, nem se acende uma luz para colocá-la debaixo de um caixote, mas sim para colocá-la sobre o candeeiro, a fim de que brilhe para todos que estão em casa. Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam vossas boas obras e glorifiquem Vosso Pai que está nos Céus." Mt 5,14-16
    Além da Apresentação do Senhor, portanto, nesse dia também celebramos a 'purificação' de Nossa Mãe Celeste, que, assim como Jesus Se deixou batizar mesmo sem precisar, cumpriu as prescrições da Lei, constantes no Livro de Levíticos:

    "O Senhor disse a Moisés:
    - Dize aos israelitas o seguinte: quando uma mulher der à luz um menino, será impura durante sete dias, como nos dias de sua menstruação. No oitavo dia, far-se-á a circuncisão do menino. Ela ainda ficará trinta e três dias no sangue de sua purificação. Não tocará santa coisa alguma, e não irá ao Santuário até que se acabem os dias de sua purificação.
    Se ela der á luz uma menina, será impura durante duas semanas, como nos dias de sua menstruação, e ficará sessenta e seis dias no sangue de sua purificação.
    Cumpridos esses dias, por um filho ou por uma filha, apresentará ao sacerdote, à entrada da Tenda de Reunião, um cordeiro de um ano em holocausto, e um pombinho ou uma rola em sacrifícios pelo pecado. O sacerdote oferecê-los-á ao Senhor, e fará a expiação por ela, que será purificada do fluxo de seu sangue.
    Tal é a Lei relativa à mulher que dá à luz um menino ou uma menina.
    Se suas posses não lhe permitirem trazer um cordeiro, tomará duas rolas ou dois pombinhos, uma para o holocausto e outro para o sacrifício pelo pecado. O sacerdote fará por ela a expiação, e será purificada." 
                                                  Lv 12,1-8

    Foi estritamente como mandava a Lei, pois, que Nossa Senhora e São José cumpriram suas obrigações para com Deus. Ora, São Mateus atestou a religiosidade do glorioso São José: "José, seu esposo, era justo." Mt 1,19a
    E pelo sacrifício que ofereceram no Templo, porque não quiseram tocar nos presentes dados pelos Reis Magos ao Menino, muito úteis para a fuga e para os tempos que estiveram no Egito, percebe-se a humilde condição em que viviam. São Lucas registrou: "Concluídos os dias de Sua purificação segundo a Lei de Moisés, levaram-nO a Jerusalém para apresentá-Lo ao Senhor, conforme o que está escrito na Lei do Senhor: 'Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor' (Ex 13,2); e para oferecerem o sacrifício prescrito pela Lei do Senhor, um par de rolas ou dois pombinhos." Lc 2,21-24


    É Nossa Senhora das Candeias, pois, que é invocada pelos cegos, como Padre Vieira afirmou: "Perguntai aos cegos para que nasce esta Celestial Menina, di-vos-ão que nasce para Senhora da Luz..."


    Quanto à história dessa devoção, remonta os anos de 1400, quando se deu uma aparição de Maria Santíssima na Ilha de Tenerife, no Arquipélago das Canárias, situado à costa oeste do Continente Africano. Foi escrita pelo frei dominicano Alonso de Espinosa, em 1594, e, assim como a Aparição de Guadalupe, atesta a Virgem Celeste antecipando-se entre povos nativos como Grande Embaixatriz da Igreja de Seu Filho.
    Dois pastores aborígenes, levando suas cabras para pernoitar numa caverna do barranco de Chimisay, ao aproximarem-se do penhasco notaram uma estranha resistência do rebanho, que se recusava a entrar. Foi quando sobre a rocha viram uma mulher com uma Criança no braço e uma vela na mão esquerda, que lhes pareceram gente local. Como eram proibidos de falar ou aproximar-se de mulheres, ao gritar e fazer gestos para que ela dali saísse, um deles subitamente não conseguiu mais mover o braço, pois ficara enrijecido. Enraivecido, o outro pastor foi até lá esbravejando, e, como ela não se retirava do lugar, para assustar tentou estocá-la com a ponta de sua faca, mas acabou ferindo a si mesmo no mesmo lugar onde a tocou.
    Espantados, e como ela não lhes respondia e ninguém mais se atreveu a aproximar-se, os pastores guanches foram a Chinguaro para aconselhar-se com Acaymo, chefe e sacerdote de seu povo, que primeiro lá mandou seus conselheiros, mas como ela nada respondia, sugeriu-lhes que os próprios pastores voltassem ao local e respeitosamente convidassem-na para vir à sua presença. Quando retornaram ao local, no entanto, eles tiveram o ímpeto de tocá-la, e foram instantaneamente curados. Então se perceberam diante de apenas uma imagem, de aproximadamente um metro, e, perplexos, voltaram ao sacerdote. Percebendo o caráter sobrenatural de tudo aquilo, o idoso guanche foi até o penhasco e tentou levá-la nos braços a seu palácio, porém, como não suportou o peso, pediu ajuda para acomodá-la dentro da caverna, onde acabou ficando.
    Tempos depois, Antón Guanche, um jovem aborígene que havia sido escravizado pelos castelhanos, e em viagem de volta a Tenerife conseguira fugir, ao saber dos relatos e ter o primeiro contato com a imagem, logo a reconheceu como de Nossa Senhora.
    Com efeito, portugueses e castelhanos haviam chegado a este arquipélago por volta de 1336, quando fizeram contato com os nativos, e em seguida capturaram alguns deles para trabalhar como escravos. Levado a Espanha no início da adolescência, Antón Guanche aceitou ser batizado e abraçar a fé cristã.
    Assim os nativos mantiveram a imagem de 'La Morenita' por quase um século na caverna de Achbinico.


    Com o início da colonização, em 1497, logo os espanhóis tentaram roubar a imagem. Mas, como foram repentinamente acometidos de uma peste, os envolvidos no assalto resolveram devolvê-la. E com a definitiva conquista da ilha, em 1526 construíram uma capela em sua devoção. Aí, em 1534 nasceria São José de Anchieta, que recebeu o título de Apóstolo do Brasil. Em 1668, enfim, como sua história e devoção já havia se espalhado pelo mundo cristão, iniciou-se a edificação do primeiro grande santuário, que mais tarde se tornaria a atual Basílica Real da Candelária.
    Na noite de 6 para 7 de novembro de 1826, porém, deu-se uma grande inundação que arrasou o então Castelo de São Pedro, que abrigava a santa imagem, e acredita-se que ela tenha sido arrastada para o mar, pois desapareceu. Muitas e detalhadas buscas foram feitas, mas todas resultaram infrutíferas.
    A imagem que hoje se tem, portanto, é apenas uma cópia. As letras inscritas em seu manto, ademais, apesar de cuidadosamente registradas pelo frei Alonso e estudadas por todos esses séculos, continuam indecifradas. E como muito especial sinal, na imagem o Menino Jesus traz às mãos uma pomba, representando tanto o Santo Espírito, que Ele nos oferece, como a oferta feita por Nossa Senhora e São José no dia da Apresentação do Senhor, celebrada nesta data.


    Nossa Senhora das Candeias, rogai por nós!