quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus


    Nas Escrituras, Santa Isabel é a primeira a afirmar Nossa Senhora como Mãe de Deus. Aconteceu por ocasião da visita que a Santíssima Virgem lhe fez, logo após a Anunciação do Arcanjo São Gabriel, quando o Espírito Santo demonstrou que sempre está com ela. É leitura do Evangelho segundo São Lucas: "Ora, Isabel apenas ouviu a saudação de Maria e a criança estremeceu em seu seio. E Isabel ficou cheia do Espírito Santo, exclamando em alta voz: 'Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o Fruto de teu ventre. De onde me vem esta honra, de vir a mim a Mãe de Meu Senhor?'" Lc 1,41-43
    De fato, por uma simples saudação de Nossa Senhora dá-se a unção do Santo Paráclito, e nesse caso, além de sobre a própria Santa Isabel, sobre São João Batista, como São Gabriel Arcanjo havia profetizado ao sacerdote Zacarias, seu pai: "Ele será para ti motivo de gozo e alegria, e muitos alegrar-se-ão com seu nascimento porque será grande diante do Senhor. Ele não beberá vinho nem cerveja, e desde o ventre de sua mãe será cheio do Espírito Santo." Lc 1,14-15
    Pois ao anunciar que ela conceberia do Espírito Santo, o Arcanjo São Gabriel não diz que Deus 'está' com ela, ou seja, um momentânea condição, mas que Deus 'é' com ela: "No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem que se chamava José, da casa de Davi, e o nome da virgem era Maria. Entrando, o anjo disse-lhe: 'Ave, cheia de Graça, o Senhor é contigo.'" Lc 1,26-28
    Mas, claro, quem primeiro soube que ela seria a Mãe do Salvador, além dela mesma, foi o Divino São José, e por intermédio de seu Anjo da Guarda, como o Evangelho segundo São Mateus narrou: "Eis como nasceu Jesus Cristo: Maria, Sua mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem, aconteceu que ela concebeu por virtude do Espírito Santo. José, seu esposo, que era justo, não querendo difamá-la, resolveu rejeitá-la secretamente. Enquanto assim pensava, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: 'José, filho de Davi, não temas receber Maria por esposa, pois Aquele que nela foi concebido vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um Filho, a Quem porás o Nome de Jesus, porque Ele salvará Seu povo de seus pecados.'" Mt 1,18-21
    O título de Mãe de Deus foi oficialmente reconhecido pela Igreja no ano de 431 de nossa era, no terceiro Concílio Ecumênico, o primeiro realizado em Éfeso, justamente a cidade onde Nossa Senhora viveu seus últimos anos em companhia de São João Apóstolo, e onde ele foi bispo. O Livro do Apocalipse de São João fala de retiro, talvez referindo-se à perseguição aos cristãos de Jerusalém (cf. At 8,1), que se iniciou após o martírio de Santo Estevão. Ademais, notemos nessa passagem que este Apóstolo não menciona seu santíssimo nome, como nunca fez seja em seu Evangelho, em suas Cartas ou neste Livro, e que só aí se fala na 'cabeça da Serpente' em toda Bíblia, após a menção do Livro de Gênesis, quando Deus disse da inimizade entre Maria e o Demônio (cf. Gn 3,15): "Mas à Mulher foram dadas duas asas de grande águia, a fim de voar para o deserto, para o lugar de seu retiro, onde é alimentada por um tempo, dois tempos e a metade de um tempo, fora do alcance da cabeça da Serpente." Ap 12,14
    Inscrevia-se, assim, neste Concílio, o primeiro Dogma Mariano, quando também brilhou para o mundo a inspiração de São Cirilo de Alexandria e foram decretadas as naturezas humana e divina de Jesus, que são inseparáveis. A esse respeito, o Evangelho segundo São João é determinante: "E o Verbo fez-Se carne..." Jo 1,14
    Foi, portanto, exclusivamente através da carne de Maria, que era da casa de Davi, que Deus Se fez carne. A Carta de São Paulo aos Romanos diz do Pai: "... acerca de Seu Filho Jesus Cristo, Nosso Senhor, descendente de Davi quanto à carne..." Rm 1,3
    E referindo-se a Jesus, o próprio São João Evangelista vai dizer: "... o Verbo era Deus." Jo 1,1
    Os opositores a esse Dogma diziam que Maria era apenas Mãe do Cristo, mas não Mãe de Deus. Como se pode negar, porém, por um instante sequer, a Divindade de Cristo? Como vimos acima, o Verbo é Deus, então Maria é Mãe do Verbo, logo, Mãe de Deus. Assim como era Virgem antes, durante e depois do parto. A pergunta é: se Deus respeitou sua virgindade antes do parto, por que não a preservaria depois? Ou não teria poder para tanto? Mais: o desrespeito a esse dogma não vem de uma mentalidade incapaz de enxergar a Graça de Deus na virgindade e na castidade?
    E como Mãe de Deus, ela também se tornou Mãe da Igreja, ou seja, Mãe dos seguidores de Jesus, como no Livro do Apocalipse registra São João as celestiais revelações que teve: "Cheio de raiva por causa da Mulher, o Dragão começou a combater o resto de seus filhos, aqueles que observam os Mandamentos de Deus e guardam o testemunho de Jesus." Ap 12,17
    Essa celestial maternidade já havia sido profetizada no Livro dos Salmos, inclusive indicando-a como Rainha, que seus prediletos filhos, os Santos e os Sacerdotes, reinariam sobre a Terra, e que seu nome jamais seria esquecido: "Vosso trono, ó Deus, é eterno. De equidade é Vosso cetro real. ... posta-se à Vossa direita a Rainha, ornada de ouro de Ofir. Ouve, filha, vê e presta atenção: esquece teu povo e a casa de teu pai. De tua beleza encantar-Se-á o Rei. Ele é Teu Senhor, rende-Lhe homenagens. Tomarão teus filhos o lugar de teus pais, tu estabelecê-lo-ás príncipes sobre toda Terra. Celebrarei teu nome através das gerações. E os povos louvá-te-ão eternamente." Sl 44,7.10b-12.17-18
    Ora, Nossa Mãe confirmou e replicou essa profecia, cujo cumprimento, pela devoção que tem espalhada pelo mundo, ninguém pode negar: "Por isto, desde agora todas gerações proclamá-me-ão bem-aventurada, porque em mim realizou maravilhas Aquele que é poderoso, e Cujo Nome é Santo." Lc 1,48a-19
    E o Livro do Profeta Miqueias previu a irmandade em Jesus nestes termos, inicialmente dizendo dos israelitas: "Por isso, Deus deixá-los-á, até o tempo em que der à luz aquela que há de dar à luz. Então o resto de seus irmãos voltará para junto dos filhos de Israel. Ele levantar-Se-á para apascentá-los com o poder do Senhor, com a majestade do Nome do Senhor, Seu Deus. Os Seus viverão em segurança, porque Ele será exaltado até os confins da Terra." Mq 5,2-3
    Ademais, desde Sua primeira Páscoa em vida pública, Nosso Senhor havia dito a Nicodemos, um notável fariseu, que para entrar no Céu o ser humano precisa nascer de novo: "Jesus replicou-lhe: 'Em Verdade, em Verdade, digo-te: quem não nascer de novo não poderá ver o Reino de Deus.' Nicodemos perguntou-Lhe: 'Como pode um homem renascer, sendo velho? Porventura pode tornar a entrar no seio de sua mãe e nascer pela segunda vez?' Respondeu Jesus: 'Em Verdade, em Verdade, digo-te: quem não renascer da Água e do Espírito não poderá entrar no Reino de Deus. Aquele que nasceu da carne é carne, e aquele que nasceu do Espírito é espírito.'" Jo 3,3-6


    E em Seus últimos instantes na Cruz, através de São João Evangelista determinou Jesus a essencial maternidade de Maria a todos Seus discípulos: "Quando Jesus viu Sua mãe, e junto a ela o discípulo que amava, disse à Sua mãe: 'Mulher, eis aí teu filho.' Depois disse ao discípulo: 'Eis aí tua mãe.'" Jo 19,26-27a
    Ora, a mãe carnal de São João Evangelista era Salomé, e ela igualmente assistia a crucificação: "Ali também havia algumas mulheres que de longe olhavam. Tinham seguido Jesus desde a Galileia para servi-Lo. Entre elas achavam-se Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu." Mt 27,55-56
    O Evangelho segundo São Marcos, que narrou a mesma cena, deu seu nome: "Ali também se achavam umas mulheres, observando de longe, entre as quais Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o Menor, e de José, e Salomé, que O tinham seguido e O haviam assistido quando Ele estava na Galileia." Mc 15,40-41a
    E o único que até então havia nascido do Espírito Santo e de Maria era o próprio Jesus: "Maria perguntou ao anjo: 'Como se fará isso, pois não conheço homem?' Respondeu-lhe o anjO: 'O Espírito Santo descerá sobre ti, e o poder do Altíssimo envolvê-te-á com Sua sombra. Por isso, o Ente Santo que de ti nascer será chamado Filho de Deus." Lc 1,34-35
    Mais uma vez, portanto, temos que benditos são aqueles gerados pelo Espírito de Deus, como apontou Jesus, e, parafraseando Santa Isabel, no ventre espiritual de Maria, quer dizer, na Igreja: "E exclamou em alta voz: 'Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o Fruto de teu ventre.'" Lc 1,42
    Foi exatamente isso que aconteceu com Apóstolos, discípulos e seguidores no Pentecostes, pois lá estava Nossa Mãe Celeste. Está no Livro dos Atos dos Apóstolos: "Voltaram eles para Jerusalém, então, do monte chamado das Oliveiras, que fica perto de Jerusalém, distante uma jornada de sábado. Tendo entrado no cenáculo, subiram ao quarto de cima, onde costumavam permanecer. Todos eles unanimemente perseveraram na oração, e com eles as mulheres, entre elas Maria, Mãe de Jesus, e os irmãos d'Ele. Chegando o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente, veio do céu um ruído, como se um impetuoso vento soprasse, e encheu toda casa onde se encontravam. Então lhes apareceu línguas como de fogo, que se repartiram e pousaram sobre cada um deles. Ficaram todos cheios do Espírito Santo e começaram a falar em línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem." At 1,12-13a.14;2,1-4
    E é isso que se dá pelo Sacramento da Crisma, inicialmente ministrado pelos Apóstolos e, depois deles, pelos Bispos da Igreja, como é até hoje: "Os Apóstolos que se achavam em Jerusalém, tendo ouvido que a Samaria recebera a Palavra de Deus, enviaram-lhe Pedro e João. Estes, assim que chegaram, fizeram oração pelos novos fiéis, a fim de receberem o Espírito Santo, visto que ainda não havia descido sobre nenhum deles, mas apenas tinham sido batizados em Nome do Senhor Jesus." At 8,14-16
    São João Evangelista, enfim, vai dizer de nossa adesão à Igreja, fundada por Jesus: "Mas a todos aqueles que O receberam, aos que creem em Seu Nome, deu-lhes o poder de tornarem-se filhos de Deus, os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas sim de Deus." Jo 1,12-13
    A Primeira Carta de São João resume: "Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo, nasceu de Deus." 1 Jo 5,1a
    Declara: "E Seus Mandamentos não são penosos, porque todo aquele que nasceu de Deus vence o mundo." 1 Jo 5,3b-4a
    E afirmou, como vimos, que a Igreja se compõe dos filhos de Maria, e por isso era ela o principal alvo do Demônio: "Cheio de raiva por causa da Mulher, o Dragão começou a combater o resto de seus filhos, aqueles que observam os Mandamentos de Deus e guardam o testemunho de Jesus." Ap 12,17
    No ventre de Maria, pois, onde Jesus, não gerado espiritualmente, nasceu da carne, nós, nascidos da carne, somos gerados espiritualmente. Assim é o projeto de Deus, como o Apóstolo dos Gentios diz: "Aqueles que Ele de antemão distinguiu, também os predestinou para serem conformes à imagem de Seu Filho, a fim de que Este seja o Primogênito entre uma multidão de irmãos." Rm 8,29
    A Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios disse mais: "Cristo ressuscitou dentre os mortos, como primícias dos que morreram!" 1 Cor 15,20
    A Carta de São Paulo aos Efésios fala, pelo mesmo sentido e valor, em adoção: "Em Seu amor, (Deus) predestinou-nos para sermos adotados como Seus filhos por Jesus Cristo, segundo o beneplácito de Sua livre vontade, para fazer resplandecer Sua maravilhosa Graça, que nos foi concedida por Ele no Bem-Amado." Ef 1,5-7
    Bem como fala do papel do Santo Paráclito, aqui aos cristãos da igreja de Roma: "Porquanto não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o Espírito de Adoção pelo qual clamamos: 'Aba! Pai!'" Rm 8,15
    Diz que ela só se completará com a Ressurreição da Carne, enquanto fala de toda criação: "Não só ela, mas também nós, que temos as primícias do Espírito, gememos em nós mesmos, aguardando a Adoção, a redenção de nosso corpo." Rm 8,23
    E apontando para o Sacrifício Pascal, isto é, a Comunhão Eucarística que é celebrada na Santa Missa e é a razão de ser da Igreja, seus seguidores dizem o mesmo na Carta aos Hebreus: "Aquele para Quem e por Quem todas coisas existem, desejando conduzir à Glória numerosos filhos, deliberou elevar à perfeição, pelo sofrimento, o Autor da Salvação deles, para que Santificador e santificados formem um só todo. Por isso, Jesus não hesita em chamá-los Seus irmãos..." Hb 2,10-11
    O Amado Discípulo vai no mesmo sentido, e através do Sacramento do Crisma confirma os verdadeiros fiéis: "Quanto a vós, a unção que d'Ele (Deus) recebestes permanece em vós. Se sabeis que Ele é justo, também sabei que todo aquele que pratica a justiça, d'Ele é nascido." 1 Jo 2,27.29
    Fala do amor a Deus que se expressa pelo amor à Igreja, e é a própria Unidade do Corpo de Cristo: "Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus, e todo que ama é nascido de Deus e conhece a Deus." 1 Jo 4,7
    Exaltando o Ministério do Espírito Santo, pois, São Paulo diz da Igreja: "De fato, se viverdes segundo a carne, haveis de morrer. Mas se pelo Espírito mortificardes as obras da carne, vivereis, pois todos que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus." Rm 8,13
    E deu mais detalhes, ainda que indiretos, desta nova gestação. Sem dúvida, se da costela de Adão surgiu Eva, da carne da Nova Eva surgiu o Novo Adão, e assim a nova humanidade: "Como está escrito: 'O primeiro homem, Adão, foi feito vivente alma (Gn 2,7)'. O Segundo Adão é vivificante Espírito. Mas não é o espiritual que vem primeiro, e sim o animal. O espiritual vem depois. O primeiro homem, tirado da terra, é terreno, o segundo veio do Céu. Qual o homem terreno, tais os homens terrenos, e qual o Homem Celestial, tais os homens celestiais. Assim como em nós reproduzimos as feições do homem terreno, precisamos reproduzir as feições do Homem Celestial." 1 Cor 15,45-49
    É evidente que Eva é a mãe da humanidade, como está no Livro de Gênesis: "Adão pôs à sua mulher o nome de Eva, porque ela era a mãe de todos viventes." Gn 3,20
    Mas mãe meramente carnal, como Jesus disse acima: "Aquele que nasceu da carne é carne, e aquele que nasceu do Espírito é espírito.'" Jo 3,6
    Com efeito, tempos depois o próprio Deus vai restringir Seu povo aos filhos de Raquel, esposa de Isaac, que também era prefigura de Maria, como falou através do Livro do Profeta Jeremias: "Eis o que diz o Senhor: 'Ouve-se em Ramá uma voz, lamentos e amargos soluços. É Raquel que chora seus filhos, recusando-se ser consolada porque já não existem.'" Jr 31,15
    Antes de Raquel, porém, Ele havia dito que Sara, mais luminosa prefigura da Santíssima Virgem porque mãe da promessa, seria mãe de nações, rainha de povos, ou seja, para muito além das fronteiras de Israel: "Disse Deus a Abraão: 'Não mais chamarás tua mulher Sarai, e sim Sara. Eu abençoá-la-ei e dela dá-te-ei um filho. Eu abençoá-la-ei e ela será a mãe de nações, dela sairão reis de povos.'" Gn 17,15-16
    De fato, comparando Sara e Agar, que geraram filhos de Abraão, na Carta de São Paulo aos Gálatas, citando o livro de Gênesis, ele diz-se filho de Sara, a matriarca do povo de Deus: "Como Isaac, irmãos, vós sois filhos da promessa. Como naquele tempo o filho da natureza perseguia o filho da promessa, o mesmo dá-se hoje. Que diz, porém, a Escritura? 'Lança fora a escrava e seu filho, porque o filho da escrava não será herdeiro com o filho da livre (Gn 21,10).' Pelo que, irmãos, não somos filhos da escrava, mas sim da que é livre." Gl 4,28-31
    E se sua teologia ainda não a relacionava com Maria, vai relacioná-la com a Jerusalém Celestial, ou seja, com a Igreja: "A Escritura diz que Abraão teve dois filhos: um da escrava e outro da livre. O da escrava, filho da natureza, e o da livre, filho da promessa. Nestes fatos há uma alegoria, visto que aquelas mulheres representam as duas Alianças... Mas a Jerusalém lá do alto é livre, e esta é nossa mãe..." Gl 4,22-24a.26
    Por isso, fala-se do Céu como as Núpcias do Cordeiro, pois como o Espírito Santo desposou Maria, assim Jesus desposará a Igreja: "Então veio um dos sete anjos que tinham as sete taças cheias dos sete últimos flagelos e me disse: 'Vem, e mostrá-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro.' Levou-me em espírito a um grande e alto monte e mostrou-me a Cidade Santa, Jerusalém, que descia do Céu, de junto de Deus..." Ap 21,9-10a
    Pois em Cristo São Paulo desdenha de qualquer outro rito, seja do judaísmo ou do paganismo: "Porque a circuncisão e a incircuncisão de nada valem, mas sim a nova criatura." Gl 6,15
    Finaliza: "Todos vós, que fostes batizados em Cristo, revestiste-vos de Cristo. Já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus. Ora, se sois de Cristo, então verdadeiramente sois a descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa." Gl 3,27-29
    E explica a razão de ser do Antigo Testamento: "Então que é a Lei? É um complemento ajuntado em vista das transgressões, até que viesse a descendência a quem fora feita a promessa." Gl 3,19a
    É esta gestação e parto, obras de Deus, que o salmista, falando pelo Cristo, exalta: "Sim, fostes Vós que Me tirastes das entranhas de Minha mãe e, seguro, fizestes-Me repousar em seu seio. Fui-Vos entregue desde Meu nascer, desde o ventre de Minha mãe Vós sois Meu Deus." Sl 21,9-11
    A Carta de São Tiago também falou deste renascer que se deu em sua geração, os primeiros rebentos da Igreja: "Toda boa dádiva e todo perfeito dom vêm de cima: descem do Pai das luzes, no Qual não há mudança, nem mesmo aparência de instabilidade. Por Sua vontade é que nos gerou pela Palavra da Verdade, a fim de que sejamos como que as primícias de Suas criaturas." Tg 1,17-18
     A Primeira Carta de São Pedro, do mesmo modo, citando um Salmo: "Como recém-nascidos, com ardor desejai o leite espiritual que vos fará crescer para a Salvação, se é que tendes saboreado quão suave é o Senhor (Sl 33,9)." 1 Pd 2,2-3
    Ademais, como rejeitar a maternidade de Maria se prontamente aceitamos a paternidade dos Padres, nossos Sacerdotes, como São Paulo reclama aos coríntios? "Com efeito, ainda que tivésseis dez mil mestres em Cristo, não tendes muitos pais. Ora, fui eu que em Cristo Jesus vos gerei pelo Evangelho." 1 Cor 4,15
    Ele pede: "Como amados filhos, pois, sede imitadores de Deus. Progredi na caridade segundo o exemplo de Cristo, que nos amou e por nós entregou-Se a Deus como oferenda e sacrifício de agradável odor." Ef 5,1-2


APRESENTAR JESUS AO MUNDO

     Temos, portanto, que a Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus foi a primeira festa mariana da Igreja em Roma, celebrada desde o século IV, antes do referido Concílio. Com justiça, devemos a Nossa Senhora a Encarnação do Cristo, porque, bem diferente de Eva que desobedeceu a Deus dando ouvido à Serpente, ao responder ao Arcanjo Gabriel aceitou submeter-se aos Seus desígnios: "Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo tua palavra." Lc 1,38
    Desígnios, aliás, nem sempre tão gloriosos, como um religioso previu durante a Apresentação do Menino Jesus no Templo de Jerusalém: "Simeão abençoou-Os e disse a Maria, Sua mãe: 'Eis que este Menino está destinado a ser causa de queda e de soerguimento para muitos homens em Israel, e a ser sinal que provocará contradições, a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações. E uma espada transpassará tua alma.'" Lc 2,34-35
    Contudo, mesmo ciente de todos percalços, a maior realização de Maria é apresentar Seu Filho, Nosso Salvador, ao mundo. E é isso o que ela vem fazendo desde o primeiro momento de Sua concepção, quando foi visitar Santa Isabel: "Naqueles dias, Maria levantou-se e foi às pressas às montanhas, a uma cidade de Judá. Entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel." Lc 1,39-40
    Não foi ela que 'precipitou' o 'início' da vida pública de Jesus, instando-O a transformar água em vinho nas bodas de Caná? "Como viesse a faltar vinho, a mãe de Jesus disse-Lhe: 'Eles já não têm vinho.' Respondeu-lhe Jesus: 'Mulher, que há entre Mim e ti? Minha hora ainda não chegou.' Disse, então, Sua mãe aos serventes: 'Fazei tudo que Ele vos disser.'" Jo 2,3-5
    Ora, aí refulgiu a Glória de Deus entre os homens: "Este foi o primeiro milagre de Jesus. Realizou-o em Caná da Galileia. Manifestou Sua Glória, e Seus discípulos creram n'Ele." Jo 2,11
    Como se nota, São João e São Lucas expressam 'mais evoluído' Catolicismo em relação a São Mateus e São Marcos. E não só por serem posteriores. João, sem dúvida, vê-se plenamente renascido de Maria, que ele viu coroada nos Céus (cf. Ao 12,1). São 15 anos em sua companhia, da Paixão do Senhor à Assunção de Nossa Senhora, vivendo a espiritualidade mariana, fato que evidentemente concorreu para tornar o Amado Discípulo mais teológico e mais místico. Levado à contemplação, ele meditou em profundidade sobre o silêncio e o sofrimento da Mãe de Deus, cujo nome ele sequer menciona, como dissemos.
    E o Amado Médico detectou o início da veneração mariana, registrando o Magnificat, a atenção de Nossa Senhora para com as palavras dos pastores de Belém, a Apresentação do Menino Jesus no Templo, o episódio da Páscoa aos 12 anos, no qual registra a Sagrada Família como composta apenas Jesus, Maria e José, ou seja, deixando evidente que Maria não teve nenhum outro filho. Ora, ele conseguiu essas informações junto à comunidade cristã, em ambientes marianos, que por sua vez as obtiveram de Maria e de seus parentes, e tal tradição é apenas mais um evidente sinal do pronto acolhimento dado a Jesus como o Messias. Também é patente que o terceiro Evangelho é o que, de longe, mais menções faz ao Espírito Santo, fato que explicita, para que sejamos verdadeiros filhos de Deus, o vínculo entre Nossa Mãe e o Santo Paráclito, fundante detalhe da Igreja.
     A Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses, pois, reverbera a autoridade da Barca de São Pedro: "Por conseguinte, desprezar estes preceitos é desprezar não a um homem, mas a Deus, que nos infundiu Seu Santo Espírito." 1 Ts 4,9
    Diz que só pelo Divino Paráclito entramos na Igreja: "É nele que vós também entrais conjuntamente, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a habitação de Deus." Ef 2,22
    Ele também diz Quem é que zelosamente vela por ela: "Ninguém jamais odiou sua própria carne. Ao contrário, alimenta-a e cerca-a de cuidados, como Cristo faz com Sua Igreja." Ef 5,29
    Ora, até mesmo Apócrifos indicam veneração à Maria, entre eles a história de São Joaquim e Santa Ana.
    Enfim, trazemos estas palavras do próprio Jesus à Nossa Senhora, que foram reveladas a Santa Brígida: "Tu és Minha Mãe, és a Rainha do Céu, és a Mãe da Misericórdia, o consolo das almas do Purgatório, a alegria dos que peregrinam pelo mundo. És a Soberana dos anjos, a mais excelente criatura diante de Deus." (Livro I, Capítulo XVI)
    Segundo os Mandamentos da Igreja, portanto, a Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus é um dos quatro dias de preceito no Brasil, junto à celebração da Imaculada Conceição de Maria, do Natal de Jesus e do Corpus Christi. E abre o calendário da Igreja de Todos os Santos, iniciando o ano litúrgico em louvação ao mais perfeito ser puramente humano gerado por Deus: Aquela que viveu toda vida guardando com perfeição a divina semelhança, pois foi 'concebida sem pecado'.

    Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores!