segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Negar-se a Si Mesmo


    O mais expressivo símbolo da negação de si mesmo é o Cristo crucificado. Também para denunciar a banalização da violência contra a vida, Ele entregou-Se à morte na Cruz, que para os romanos era humilhação e, para os judeus, maldição. Diz o Livro de Deuteronômio: "... pois aquele que é pendurado é objeto de divina maldição." Dt 21,23b
    Por Sua Ressurreição, porém, por mais difícil que seja acreditar, Ele provou que a vida não termina com a morte, e que viver em função da Salvação, própria e do próximo, é o grande sentido de estarmos aqui. É o que os seguidores da tradição de São Paulo pregam na Carta aos Hebreus: "Foi pela que Moisés, uma vez crescido, renunciou ser tido como filho da filha do faraó, preferindo participar da infeliz sorte do povo de Deus a fruir de culpáveis e passageiros prazeres." Hb 11,24-25
    Isso explica porque Nosso Senhor ensinava aos Apóstolos a adotarem Seu exemplo, no Evangelho segundo São Mateus: "Em seguida, Jesus disse a Seus discípulos: 'Se alguém quiser vir Comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-Me.'" Mt 16,24
    E Ele não o dizia apenas aos Apóstolos, como está no Evangelho segundo São Lucas: "Em seguida, dirigiu-Se a todos: 'Se alguém quer vir após Mim, renegue-se a si mesmo, cada dia tome sua cruz e siga-Me.'" Lc 9,23
    A Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios mostra que ele bem O entendeu: "Ninguém busque seu interesse, mas o do próximo. Fazei como eu: em todas circunstâncias procuro agradar a todos. Não busco meus próprios interesses, mas os interesses dos outros, para que todos sejam salvos." 1 Cor 10,24.33
    Pois ao entregar-Se, ou seja, negar-Se a Si mesmo, Jesus deu-nos a maior demonstração de caridade que se pode fazer nesta vida. A Carta de São Paulo aos Efésios recomenda: "Progredi na caridade segundo o exemplo de Cristo, que nos amou e por nós Se entregou a Deus..." Ef 5,2
    Citando o que Nosso Salvador sofreu em Nome do próprio Pai, que constava no Livro dos Salmos, a Carta de São Paulo aos Romanos ensina: "Nós, que somos os fortes, devemos suportar as fraquezas dos que são fracos, e não agir a nosso modo. Cada um de vós procure contentar o próximo, para seu bem e sua edificação. Cristo não agradou a Si mesmo. Ao contrário, como está escrito: 'Os insultos daqueles que Vos ultrajam recaíram sobre Mim (Sl 68,10).'" Rm 15,1-3
    Assim deve viver a Igreja: "Nenhum de nós vive para si, e ninguém morre para si. Se vivemos, vivemos para o Senhor; se morremos, morremos para o Senhor. Quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor." Rm 14,7-8
    Seus seguidores exortam, portanto, divulgando a Salvação por Sua Paixão: "Com perseverança corramos ao proposto combate, com o olhar fixo no Autor e Consumador de nossa fé, Jesus. Em vez do gozo que se Lhe oferecera, Ele suportou a Cruz e está sentado à direita do trono de Deus. Atentamente considerai, pois, Aquele que tantas contrariedades sofreu dos pecadores, e não vos deixeis abater pelo desânimo." Hb 12,1b-3
    Como Jesus mesmo ensinou, no Evangelho segundo São João, essa é a maior prova de amor: "Ninguém tem maior amor que aquele que dá sua vida por seus amigos." Jo 15,13
    Vale notar, entretanto, que Ele só Se entregou em sacrifício após ter certeza de que essa verdadeiramente era a vontade do Pai, pois assim rezou no Horto das Oliveiras: "Pai, se é de Teu agrado, afasta de Mim este cálice! Não se faça, todavia, Minha vontade, mas sim a Tua." Lc 22,42
    Ele buscou essa confirmação porque as circunstâncias poderiam ser apenas mais uma tentação do inimigo. A resposta de Deus foi sutil, mas muito clara, pois estava patente o cruel sofrimento que Lhe esperava: "Apareceu-Lhe, então, um anjo do Céu para confortá-Lo." Lc 22,43
    Ou seja, Seu Sacrifício haveria de dar-se exclusivamente pela vontade do Pai. A Carta de São Paulo aos Gálatas confirma: "... Jesus Cristo, que Se entregou por nossos pecados para libertar-nos da perversidade do mundo presente, segundo a vontade de Deus, Nosso Pai..." Gl 1,3-4
    E entregou-Se no preciso momento, pois rezou após dar as últimas instruções aos Apóstolos: "Jesus afirmou essas coisas e depois, levantando os olhos ao Céu, disse: 'Pai, é chegada a hora! Glorifica Teu Filho, para que Teu Filho glorifique a Ti. E para que, pelo poder que Lhe conferiste sobre toda criatura, Ele dê a Vida Eterna a todos aqueles que Lhe entregaste." Jo 17,1-2
    Pois como Redentor da humanidade, Ele veio para realizar o perfeito sacrifício, encerrando o tempo dos sacrifícios oferecidos pelos judeus: "Pelos pecados ofereceu Cristo um Único Sacrifício... Por uma só Oblação, Ele realizou a definitiva perfeição daqueles que recebem a santificação." Hb 10,12.14
    Ora, se o próprio Jesus não fez caso de Sua Onipotência, que tão importante obra haveríamos de realizar a ponto de cegamente apegarmo-nos a essa mundana vida? No Segundo Livro de Macabeus, a exortação da mãe que viria morrer em tortura sete filhos, por não aceitarem violar os preceitos do Antigo Testamento, já recomendava: "Mas o Criador do mundo, que formou o homem em sua origem e a todas coisas deu existência, restitui-vos-á, em Sua Misericórdia, tanto o espírito como a vida, se agora fizerdes pouco-caso de vós mesmos por amor às Suas leis." 2 Mc 7,23
    Desta forma, nosso duro entendimento precisa mesmo contemplar o brutal sacrifício de São João Batista e de Cristo para vir a acreditar na Vida Eterna, porque também precisamos penitenciar-nos, como Jesus disse em Sua primeira aparição aos Onze: "Abriu-lhes o espírito, então, para que compreendessem as Escrituras, dizendo: 'Assim é que está escrito: era necessário que Cristo padecesse, mas que ao terceiro dia ressurgisse dos mortos. E que em Seu Nome se pregasse a penitência e a remissão dos pecados a todas nações, começando por Jerusalém. Vós sois as testemunhas de tudo isso.'" Lc 24,45-48
    E até a análogos sacrifícios teriam que se entregar aqueles que se prontificam a segui-Lo, como aconteceu aos Apóstolos e tantos outros mártires. Ele expressamente asseverou a São Tiago Maior e São João Evangelista, em relato do Evangelho segundo São Marcos: "Vós bebereis o cálice que Eu devo beber, e sereis batizados no batismo em que Eu devo ser batizado." Mc 10,39b
    Terrível contrassenso, o Catolicismo seria abominado por aqueles que se julgam religiosos. Jesus advertiu, enquanto Se despedia de Seus seguidores: "Expulsá-vos-ão das sinagogas, e virá a hora em que todo aquele que vos tirar a vida julgará prestar culto a Deus." Jo 16,2
    Assim, mesmo que nossas impressões indiquem outra coisa, claro está que a verdadeira vida vai muito além da atual existência carnal, como o Apóstolo dos Gentios argumenta: "Se é só para esta vida que temos colocado nossa esperança em Cristo, somos, de todos homens, os mais dignos de lástima." 1 Cor 15,19
    Com efeito, havia mais uma revelação (cf. Dn 12,2) que Jesus veio confirmar: todos ressuscitarão, mas nem todos terão o mesmo destino. Ele falou, referindo-Se a Si mesmo: "Não vos maravilheis disso, porque vem a hora em que todos que se acham nos sepulcros sairão deles ao som de Sua voz: os que praticaram o bem irão para a Ressurreição da Vida, e aqueles que praticaram o mal ressuscitarão para serem condenados." Jo 5,28-29
    Tal afirmação leva a entender outra de Suas frases, como esta que tanto diz da imortalidade da alma quanto da Ressurreição da Carne: "Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Antes temei Aquele que pode precipitar a alma e o corpo na geena." Mt 10,28
    Ou ainda: "Pois aquele que quiser salvar sua vida, perdê-la-á. Mas o que perder sua vida por amor a Mim e ao Evangelho, salvá-la-á." Mc 8,35
    Para tanto, devemos buscar a mais pura inspiração do Espírito Santo, que é o Divino Guia de nossas vidas. São Paulo afirma: "De fato, se viverdes segundo a carne, haveis de morrer. Mas se pelo espírito mortificardes as obras da carne, vivereis, pois todos aqueles que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus." Rm 8,13-14
    Ele mesmo já se declarava morto para o mundo e para a Velha Aliança: "Na realidade, pela fé eu morri para a Lei, a fim de viver para Deus. Estou pregado à Cruz de Cristo." Gl 2,19


NEGAR-SE A SI MESMO NÃO É ENTERRAR OS TALENTOS

    Surge, porém, uma pergunta: e nossos talentos, dados pelo próprio Deus, assim estariam sendo anulados? 'Por certo que não', como São Paulo diria. Ele apenas quer que deles usemos para o bem maior do próximo. Aliás, além de deles pedir conta, como acontecerá no Dia do Juízo, Jesus revelou-Se bastante exigente quanto aos frutos que devemos apresentar-Lhe. Foi o que disse o Senhor na parábola do servo que enterrou o único talento que lhe havia sido entregue: "Mau e preguiçoso servo! Sabias que colho onde não semeei e que recolho onde não espalhei. Devias, pois, levar Meu dinheiro ao banco e, à Minha volta, Eu receberia com juros o que é Meu." Mt 25,26-27
    De fato, nossa vida social deve ser uma interação de serviços para a construção do Reino de Deus, como Jesus ensinou aos Apóstolos: "Pois eis que se pode dizer com toda Verdade: 'Um é o que semeia e outro é o que ceifa.' Enviei-vos a ceifar onde não tendes trabalhado. Outros trabalharam, e vós entrastes em seus trabalhos." Jo 4,37-38
    Porque o plano de Deus é dar mais de Seus dons àqueles dispostos a produzir mais frutos, como Nosso Senhor também contou na parábola do talentos, não por acaso uma de Suas últimas: "Tirai-lhe este talento e dai-o ao que tem dez. Dar-se-á ao que tem e terá em abundância. Mas ao que não tem, tirar-se-á até mesmo aquilo que julga ter." Mt 25,28-29
    Isso fica ainda mais evidente na parábola do fiel administrador, que São Pedro, nosso primeiro papa,  viria a ser: "O Senhor replicou: 'Qual é o sábio e fiel administrador que o Senhor estabelecerá sobre Seus operários, para a seu tempo dar-lhes sua medida de trigo? Feliz daquele servo que o Senhor assim achar procedendo quando vier! Em Verdade, digo-vos: confiá-lhe-á todos Seus bens." Lc 12,42-44
    São Paulo atestou a efetividade dessa promessa, ainda que difusa entre vários membros, na comunidade da cidade de Corinto: "Não cesso de agradecer a Deus por vós, pela Divina Graça que vos foi dada em Jesus Cristo. N'Ele fostes ricamente contemplados com todos dons, com os da Palavra e os da ciência, tão solidamente foi confirmado em vós o testemunho de Cristo. Assim, enquanto aguardais a manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo, não vos falta dom algum." 1 Cor 1,4-7
    E tais dons significam salvífica servidão, como foi a própria vida do Salvador: "Jesus, porém, chamou-os e disse-lhes: 'Sabeis que os chefes das nações as subjugam, e que os grandes as governam com autoridade. Não seja assim entre vós. Todo aquele que quiser tornar-se grande entre vós, faça-se vosso servo. E aquele que quiser tornar-se o primeiro entre vós, faça-se vosso escravo. Assim como o Filho do Homem veio, não para ser servido, mas para servir e dar Sua vida em resgate por uma multidão." Mt 20,25-28
    Pois devemos servir ao salvífico projeto de Deus, que se materializa por Sua Igreja, como São Paulo exortou. Aliás, notemos nesta frase que ninguém jamais recebeu nem receberá dom do Espírito Santo para atacar a Santa Igreja: "Assim, uma vez que aspirais aos dons espirituais, procurai tê-los em abundância para edificação da Igreja." 1 Cor 14,12
    Mais: negar-se a si mesmo pode até ser fácil se comparado a uma ainda mais ousada proposta, que Jesus fez aos que querem ser perfeitos: doar todos bens aos pobres e viver só para anunciar a Salvação, demonstrando total confiança na Divina Providência. Ele disse ao rico jovem: "Se queres ser perfeito, vai, vende teus bens, dá-os aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois vem e segue-Me!" Mt 19,21
    De fato, de que mais precisa quem já tem Deus? Nosso Senhor mesmo garantiu: "... aquele que vem a Mim não terá fome, e aquele que crê em Mim jamais terá sede." Jo 6,35
    Ou outra proposta igualmente difícil: quantos de nós somos capazes de amar nossos inimigos? Mas está no Sermão da Montanha: "Tendes ouvido o que foi dito: 'Amarás teu próximo e poderás odiar teu inimigo.' Eu, porém, digo-vos: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem." Mt 5,43-44
    Contudo, um pouco antes de sermos capazes de rezar pela Salvação dos inimigos, precisamos tratar de uma elementar questão: nossa atávica dificuldade de perdoar. E foi graças a pureza do Príncipe dos Apóstolos que esse assunto foi elucidado: "Então Pedro se aproximou d'Ele e disse: 'Senhor, quantas vezes devo perdoar meu irmão, quando ele pecar contra mim? Até sete vezes?' Respondeu Jesus: 'Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete.'" Mt 18,21-22
    E Ele ainda ensinou que esta é uma obrigação antes de qualquer oração, em casa ou na Igreja: "E quando vos puserdes de pé para orar, perdoai, se tiverdes algum ressentimento contra alguém, para que também Vosso Pai, que está nos Céus, perdoe vossos pecados." Mc 11,25
    Mas não só rezar, como também tomar a iniciativa em fazer as pazes, mesmo quando não temos culpa: "Se estás, portanto, para fazer tua oferta diante do altar, e lembrares que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa tua oferta diante do altar e primeiro vai reconciliar-te com teu irmão. Só então vem fazer tua oferta." Mt 5,23-24


A IMPRESCINDÍVEL AJUDA DO CÉU

    Produzir tão belos frutos, todavia, não é possível só por nossos esforços. Precisamos estar unidos a Jesus, que Se apresentou como essencial a nossas vidas, isto é, como Deus: "Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanecer em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto. Porque sem Mim nada podeis fazer." Jo 15,5
    E tal foi o exemplo de Maria Santíssima, por completo dispondo-se ao projeto de Deus anunciado pelo Arcanjo Gabriel, mesmo sem saber como se explicaria a São José: "Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo tua palavra." Lc 1,38
    É Deus Espírito Santo, portanto, que nos ajuda a vencer o pecado, como São Paulo leciona: "Outrossim, o Espírito vem em auxílio à nossa fraqueza..." Rm 8,26
    Com efeito, na noite da Santa Ceia, Jesus predisse sobre o Santo Paráclito: "E, quando Ele vier, convencerá o mundo a respeito do pecado, da justiça e do Juízo." Jo 16,8
    Só depois, e sempre com Sua ajuda, podemos produzir os frutos que o Senhor de nós deseja. São palavras de São Paulo: "... os frutos do Espírito Santo são caridade, alegria, Paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança." Gl 5,22-23
    Pois é o Divino Paráclito que distribui os divinos dons, como a própria fé: "A um é dada pelo Espírito uma palavra de Sabedoria; a outro, uma palavra de ciência, por esse mesmo Espírito; a outro, a fé, pelo mesmo Espírito; a outro, a Graça de curar doenças, no mesmo Espírito; a outro, o dom de milagres; a outro, a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos; a outro, a variedade de línguas; a outro, por fim, a interpretação das línguas. Mas um e o mesmo Espírito distribui todos estes dons, repartindo a cada um como Lhe apraz." 1 Cor 12,8-11
    Só através d'Ele podemos plenamente conhecer e viver o amor: "Porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi infundido." Rm 5,5
    E só por Ele podemos ser Igreja: "É n'Ele (Cristo) que todo edifício, harmonicamente disposto, se levanta até formar um Santo Templo no Senhor. É n'Ele que vós também entrais, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a habitação de Deus." Ef 2,21-22
    Ora, sequer podemos perceber Quem é Jesus sem Sua inspiração: "... ninguém pode dizer: Jesus é o Senhor, senão sob a ação do Espírito Santo." 1 Cor 12,3b
    Ademais, de nada vale negar-se a si mesmo se não tivermos do mais puro amor para oferecer: amor de Salvação. De sua grande santidade, São Paulo ainda nos deixou essa pérola: "Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine. Mesmo que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos mistérios e toda ciência, mesmo que tivesse toda fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, nada sou. Ainda que distribuísse todos meus bens em sustento dos pobres, e ainda que entregasse meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada valeria!" 1 Cor 13,1-3
    Carecemos, pois, do Espírito de Deus que nos aponta o caminho da santidade. Assim ele justificava seu empenho: "... exercendo a sagrada função do Evangelho de Deus. E isso para que os pagãos, santificados pelo Espírito Santo, sejam-Lhe uma agradável oferta." Rm 15,16
    Mesmo sendo ele ministro, a Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios admite nossa total dependência de Deus: "Não que sejamos capazes por nós mesmos de algum pensamento, como de nós mesmos. Nossa capacidade vem de Deus." 2 Cor 3,5
    A Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses aponta no Santo Paráclito toda autoridade da Igreja, defendendo seus Sacerdotes: "Por conseguinte, desprezar estes preceitos é desprezar não a um homem, mas a Deus, que nos infundiu Seu Santo Espírito." 1 Ts 4,8
    Ora, o próprio Jesus viveu em Comunhão com o Espírito Santo, e assim declarou o início de Sua Missão na sinagoga de Nazaré, lendo o Livro do Profeta Isaías: "O Espírito do Senhor está sobre Mim, porque Me ungiu. E enviou-Me para anunciar a Boa Nova aos pobres, para sarar os contritos de coração, para anunciar aos cativos a Redenção, aos cegos a restauração da vista, para pôr em liberdade os cativos, para publicar o ano da Graça do Senhor (Is 61,1-2)." Lc 4,18-19
    E negando-Se a Si mesmo, estritamente cumpria os planos de Deus, como disse aos judeus de Jerusalém: "Quando tiverdes levantado o Filho do Homem, então conhecereis QUEM SOU e que nada faço de Mim mesmo, mas falo do modo como o Pai Me ensinou." Jo 8,28
    Pois enquanto simples ser humano, Ele mesmo afirmou, nada podia: "De Mim mesmo não posso fazer coisa alguma." Jo 5,30a
    E tão perfeita é Sua Comunhão com o Pai, que até as mais modestas pessoas a percebiam, como o cego de nascença por Ele curado: "Se esse homem não fosse de Deus, não poderia fazer nada." Jo 9,33
    Com efeito, Ele desde o início havia afirmou a vontade do Pai: "Meu alimento é fazer a vontade d'Aquele que Me enviou e cumprir Sua obra." Jo 4,34
    Pregava, enfim, que fizéssemos o mesmo: "Assim vós, depois de terdes feito tudo que vos foi ordenado, também dizei: 'Somos inúteis servos, pois só fizemos o que devíamos fazer.'" Lc 17,10


ENTÃO: NEGAR-SE A SI MESMO OU NEGAR A CRISTO?

    O Cristo, portanto, mormente por Sua Redentora Paixão, é o único caminho para o Reino de Deus. Ele revelou-Se e, ao mesmo tempo, advertiu: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vem ao Pai senão por Mim." Jo 14,6
     Pois é a purificação e a força que emanam de Seu Sacrifício que nos faz produzir grandes frutos, renegando o egoísmo, o hedonismo e a preguiça. As visões do Livro do Apocalipse de São João deixaram-nos esta certeza: "Àquele que nos ama, que nos lavou de nossos pecados em Seu Sangue..." Ap 1,5
     Como poderíamos, pois, virar-Lhe as costas diante de tão cativante projeto? Ele foi assertivo: "Digo-vos: todo aquele que Me reconhecer diante dos homens, o Filho do Homem também o reconhecerá diante dos anjos de Deus. Mas quem Me negar diante dos homens, será negado diante dos anjos de Deus." Lc 12,8-9
    Diligentemente devemos guardar Sua Palavra, nosso grande tesouro, porque Ele garantiu: "Aqueles que recebem a semente em boa terra, escutam a Palavra, acolhem-na e dão fruto: trinta, sessenta e cem por um." Mc 4,20
    E para nossa própria felicidade, como vimos São Paulo dizer, a solução é deixar-nos conduzir exclusivamente por Seu Espírito. Este grande Santo segue exortando: "Digo, pois: deixai-vos conduzir pelo Espírito e não satisfareis os apetites da carne." Gl 5,16
    Assim é, conforme a Primeira Carta de São João, que recebemos a virtude da prudência: "Sabemos que aquele que nasceu de Deus não peca. Aquele que é gerado de Deus se acautela, e o Maligno não o toca." 1 Jo 5,18
    São João Batista, também dando exemplo de negação de si mesmo, disse de Jesus quando soube que Ele havia iniciado Seu Ministério: "Importa que Ele cresça e que eu diminua." Jo 3,30
    E exigia daqueles que vinham receber seu batismo: "Dai, pois, frutos de verdadeira penitência." Mt 3,8
    Magistralmente, e no mesmo sentido, São Paulo explica o real significado da Santa Missa: "Eu exorto-vos, pois, irmãos, pelas Misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em vivo, santo e agradável sacrifício a Deus. Este é vosso culto espiritual." Rm 12,1
    Pois essa é a verdadeira vida espiritual, e é assim que devemos viver. Ele diz: "De fato, Cristo morreu por todos para que os vivos não vivam mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou. Assim, doravante, a ninguém conhecemos conforme a natureza humana. E se uma vez conhecemos Cristo segundo a carne, agora já não O conhecemos assim. Portanto, se alguém está em Cristo, é uma nova criatura. O velho mundo desapareceu. Tudo agora é novo." 2 Cor 5,15-17
    Afinal, a promessa do Reino dos Céus não é a satisfação de vaidades, mas Deus vivendo em nós. Segue este Apóstolo: "E quando tudo Lhe estiver sujeito, então o próprio Filho também renderá homenagem Àquele que Lhe sujeitou todas coisas, a fim de que Deus seja tudo em todos." 1 Cor 15,28
    Por isso, por realizar a vontade de Deus e sentindo o vibrante pulsar da santidade em sua alma, ele cravou mais esta pérola: "Eu vivo, mas já não sou eu. É Cristo que vive em mim." Gl 2,20
    Assim, a Carta de São Paulo aos Filipenses assegura-nos: "Porque é Deus, segundo Seu beneplácito, Quem em vós realiza o querer e o executar." Fl 2,13
    Foi o que nos prometeu Jesus pelo Santíssimo Sacramento: uma Igreja Viva: "Assim como vive o Pai que Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, também viverá por Mim aquele que comer Minha Carne." Jo 6,57

    "Fazei de nós uma perfeita oferenda!"