quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Todos os Finados


    Como afirmou o o sacerdote Zacarias, pai de São João Batista, a Missão de Jesus é resgatar almas, evitando que sejam levadas pelo Mal maior: "... graças à ternura e Misericórdia de Nosso Deus, que do alto vai trazer-nos a visita do Sol nascente, que há de iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte, e dirigir nossos passos no caminho da Paz." Lc 1,79
    Jesus mesmo disse: "Eu sou a Luz do mundo. Aquele que Me segue não andará em trevas, mas terá a Luz da Vida." Jo 8,12
    E como prometeu aos Apóstolos, Ele concede Sua Paz às almas de Seus seguidores: "Deixo-vos a Paz, dou-vos Minha Paz. A Paz que vos dou não é a paz que o mundo dá. Não fiqueis perturbados nem tenhais medo." Jo 14,27
    A Luz da Vida e Sua Paz, portanto, são indeléveis sinais do Céus, da Vida Eterna: "Eu vim para que todos tenham Vida, e tenham-na em abundância." Jo 10,10
    E àqueles que guardam Sua Palavra e a , Ele garantiu que sem sobressaltos passariam dessa vida para a eternidade: "... quem ouve Minha Palavra, e crê n'Aquele que Me enviou, tem a Vida Eterna e não incorre na condenação, mas passou da morte para a Vida." Jo 5,24
    Disse-o ainda mais claro: "... se alguém guardar Minha Palavra, jamais verá a morte." Jo 8,51
    Essa perspectiva já se vislumbrava no Antigo Testamento, como vemos no livro da Sabedoria: "Mas as almas dos justos estão na mão de Deus, e nenhum tormento os tocará. Aparentemente estão mortos, aos olhos dos insensatos. Seu desenlace é julgado como uma desgraça e sua morte como uma destruição, quando na Verdade estão na Paz! Se aos olhos dos homens suportaram uma correção, a esperança deles era portadora de imortalidade, e por terem sofrido um pouco, receberão grandes bens, porque Deus, que os provou, os achou dignos de Si. Ele provou-os como ouro na fornalha, e acolheu-os como holocausto." Sb 3,1-6
    Pois a verdadeira morte é a eterna condenação, o que não ocorrerá aos que Lhe obedecem, como Jesus adverte no livro do Apocalipse: "Quem tiver ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: 'O vencedor não sofrerá dano algum da segunda morte.'" Ap 2,11
    Ora, Ele avisava com todas letras durante Sua vida pública: "Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Antes temei Àquele que pode precipitar a alma e o corpo na geena." Mt 10,28


A MORTE

    Como São Paulo ensinou aos romanos, a morte entrou no mundo pelo pecado, mas através de Jesus veio infinitamente mais: a Divina Graça: "Por isso, como por um só homem entrou no mundo o pecado, e pelo pecado a morte, assim a morte passou a todo gênero humano, porque todos pecaram... Mas o dom da Graça não se compara com o pecado. Pois se a falta de um só causou a morte de todos, com muito mais razão o dom de Deus e o benefício da Graça, obtida por um só homem, Jesus Cristo, foram copiosamente concedidos a todos. Assim como o pecado reinou para a morte, agora reina a Graça para a Vida Eterna, por meio de Jesus Cristo, Nosso Senhor." Rm 5,12.15.21
    Ora, em si mesmo o Batismo já significa a morte da carne: "Ou ignorais que todos que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados em Sua morte? Fomos, pois, sepultados com Ele em Sua morte pelo Batismo, para que, como Cristo ressurgiu dos mortos pela Glória do Pai, também nós vivamos uma nova vida." Rm 6,3-4
    Mas igualmente significa Ressurreição, como ele explicou aos colossenses: "Mortos com Ele no Batismo, com Ele também ressuscitastes por vossa fé no poder de Deus, que O ressuscitou dos mortos." Cl 1,12
    Pois pelo Batismo já recebemos o Espírito de Deus. Discorrendo sobre a infinita bondade de Deus, ele vai dizer a São Tito: "... Ele salvou-nos mediante o Batismo da regeneração e renovação, pelo Espírito Santo que em profusão nos foi concedido por meio de Cristo, Nosso Salvador..." Tt 3,5b-6
    Com efeito, "... as aspirações da carne levam à morte, e as aspirações do espírito levam à Vida e à Paz. Pois se viverdes segundo a carne, morrereis. Mas se pelo espírito matardes o carnal procedimento, então vivereis." Rm 8,6.13
    Assim, para que sejamos herdeiros do Reino dos Céus e não decaiamos da Graça, humildemente devemos abraçar a obediência a Deus: "Não sabeis que, quando vos ofereceis a alguém para obedecer-lhe, sois escravos daquele a quem obedeceis. Quer seja do pecado para a morte, quer da obediência para a justiça?" Rm 6,16
    E se a vida de um cristão parece muito cheia de restrições, ele vai dizer aos coríntios: "De fato, a tristeza segundo Deus produz um salutar arrependimento, do qual ninguém se lamentará, enquanto a tristeza do mundo produz a morte." 2 Cor 7,10
    Porque é através do sincero arrependimento que Jesus redime o mundo. Esse é o eloquente testemunho de São Pedro perante o Sinédrio, após ser preso com os Apóstolos: "Deus elevou-O pela mão direita como Príncipe e Salvador, a fim de dar a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados." At 5,31
    E só assim, através do ministério de Sua Igreja, somos realmente libertos: "Respondeu Jesus: 'Em Verdade, em Verdade, digo-vos: todo homem que se entrega ao pecado é seu escravo. Portanto, se o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres.'" Jo 8,34.36
    O arrependimento, pois, que se concretiza pelo cumprimento da penitência atribuída pelo Sacerdote durante o Sacramento da Confissão, é a primeira parte da doutrina da Boa Nova anunciada por Cristo: "Desde então Jesus começou a pregar: 'Arrependei-vos, pois o Reino dos Céus está próximo.'" Mt 4,17
    E como São Paulo afirma a São Timóteo, foi pelo anúncio do Evangelho que Ele destruiu a morte: "... Nosso Salvador Jesus Cristo, que destruiu a morte e suscitou a Vida e a imortalidade pelo Evangelho..." 2 Tm 1,10
    Ora, Jesus demonstrou que não está sujeito à morte: "O Pai ama-Me, porque dou Minha Vida para retomá-la. Ninguém a tira de Mim, mas dou-a de Mim mesmo porque tenho poder para dá-la, como tenho poder para reassumi-la. Tal é a ordem que recebi de Meu Pai." Jo 10,17-18
    E se o medo da morte pode escravizar-nos, como encorajamento temos Seu exemplo, que venceu mesmo vivendo carnalmente, resistindo ao pecado. Assim Ele destruiu a obra de Satanás, mostrando que também nós, com os auxílios de Deus, podemos vencer o pecado que leva à morte. Os seguidores da tradição de São Paulo dizem: "Se os filhos participam da natureza da carne e do sangue, Ele também participou, a fim de destruir pela morte aquele que tinha o império da morte, isto é, o Demônio, e libertar aqueles que, pelo medo da morte, estavam toda vida sujeitos a uma verdadeira escravidão." Hb 2,9.14-15
    A Paixão de Jesus, portanto, conforme a Antiga Aliança, também foi um sacrifício. E com ela, o Cristo expiou, de uma vez por todas, os pecados da humanidade: "Por isso, Ele é mediador do Novo Testamento. Por Sua morte expiou os pecados cometidos no decorrer do Primeiro Testamento, para que os eleitos recebam a eterna herança que lhes foi prometida." Hb 9,15
    E assim Ele nos revelou que o amor é o caminho da Vida Eterna. São João Evangelista escreveu essa simples frase, mas profundamente inspirada: "Nós sabemos que fomos trasladados da morte para a Vida, porque amamos nossos irmãos. Quem não ama, permanece na morte." 1 Jo 3,14
    De fato, ele também nos lembra dos mortais pecados, dos quais já devemos estar longe na hora de nossa passagem: "Há pecado que é para morte..." 1 Jo 5,16
    Embora nem todo pecado nos condene diretamente ao inferno: "... mas há pecado que não leva à morte." 1 Jo 5,17
    São Paulo, questionando a pregressa vida dos romanos e falando de incisivo modo, chega a constrangê-los: "Que frutos produzíeis, então? Frutos dos quais agora vos envergonhais! O fim desses frutos é a morte. Porque o salário do pecado é a morte, enquanto o dom de Deus é a Vida Eterna em Cristo Jesus, Nosso Senhor." Rm 6,20-21.23
    E inspirado pelo Espírito Consolador, ele faz esta revelação: "O último inimigo a derrotar será a morte..." 1 Cor 15,26
    Mas antes mesmo do cumprimento dos tempos, ele compraz-se com a Vitória de Cristo, citando o Antigo Testamento: "A morte foi tragada pela Vitória (Is 25,8). Onde está, ó morte, tua vitória? Onde está, ó morte, teu aguilhão (Os 13,14)?" 1 Cor 15,55
    De fato, na revelação que fez a São João, Jesus confirma o poder que Ele tem sobre a morte e o Purgatório: "Pois estive morto, e eis-Me de novo vivo pelos séculos dos séculos. Tenho as chaves da morte e da região dos mortos." Ap 1,18
    E que, por castigo, a morte não estará acessível aos que sofrerão a Grande Tribulação: "Naqueles dias, os homens buscarão a morte e não a conseguirão, desejarão morrer, e a morte fugirá deles." Ap 9,6
    Mas os que morrem em perfeita amizade com Cristo têm suas almas imediatamente levadas aos Céus: "Quando abriu o quinto selo, debaixo do altar vi as almas dos homens imolados por causa da Palavra de Deus e por causa do testemunho de que eram depositários. E clamavam em alta voz, dizendo: 'Até quando Tu, que és o Senhor, o Santo, o Verdadeiro, ficarás sem fazer justiça e sem vingar nosso sangue contra os habitantes da terra?' Então, a cada um deles foi dada uma branca veste, e foi-lhes dito que aguardassem ainda um pouco, até que se completasse o número dos companheiros de serviço e irmãos que com eles estavam para ser mortos." Ap 6,9-11
    Eles não temem o Juízo Final, pois são Santos e já experimentam o Reino de Deus: "Feliz e Santo é aquele que toma parte na primeira ressurreição! Sobre eles a segunda morte não tem poder, mas serão Sacerdotes de Deus e de Cristo: com Ele reinarão durante os mil anos." Ap 20,6
    A segunda morte, ou a geena de que Jesus fala, é o definitivo inferno, onde se fará sentir a ausência de Deus: "O mar restituiu os mortos que nele estavam. Do mesmo modo, a morte e a subterrânea morada. Cada um foi julgado segundo suas obras. A morte e a subterrânea morada foram lançadas no lago de fogo. A segunda morte é esta: o lago de fogo." Ap 20,13-14
    E ao fim de tudo, Deus recriará o Universo: "Vi, então, um novo Céu e uma nova Terra, pois o primeiro Céu e a primeira Terra desapareceram, e o mar já não existia. Ao mesmo tempo, ouvi do trono uma grande voz que dizia: 'Eis aqui o Tabernáculo de Deus com os homens. Habitará com eles e serão Seu povo, e Deus mesmo estará com eles. Enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição.'" Ap 21,1.3-4


AS ALMAS DO PURGATÓRIO

    Todavia, por enquanto devemos rezar por nós mesmos e pelas almas do Purgatório, pois, como São Pedro informa, todos nós vamos prestar "... conta Àquele que está pronto para julgar os vivos e os mortos. Pois para isto foi o Evangelho pregado também aos mortos. Para que, embora sejam condenados em sua humanidade de carne, vivam segundo Deus quanto ao espírito." 1 Pd 4,5-6
    Porque toda obra será provada, e assim toda vida que não se mostrar plenamente tocada pelo amor de Deus terá que ser purificada pelo fogo. São Paulo ensina: "... a obra de cada um aparecerá. O Dia do Julgamento demonstrá-lo-á, será descoberto pelo fogo. O fogo provará o que vale o trabalho de cada um: se a construção resistir, o construtor receberá a recompensa; se pegar fogo, arcará com os danos. Ele será salvo, porém de alguma maneira passando através do fogo." 1 Cor 3,11-15
    De fato, diferentemente do Juízo Final, o Juízo Particular dá-se imediatamente após a morte: "Como está determinado que os homens morram uma só vez, e logo em seguida vem o Juízo..." Hb 9,27
    E Jesus falou em duas oportunidades para que se receba o perdão, sinalizando que há dois Julgamentos, ao referir-Se ao grave pecado da blasfêmia, se não acompanhado do devido arrependimento. Aí não haverá automática Redenção, aquela que é exclusivamente dada pela Divina Misericórdia: "Todo aquele que tiver falado contra o Filho do Homem, será perdoado. Se, porém, falar contra o Espírito Santo, não alcançará perdão nem neste século nem no vindouro." Mt 12,32
    Mesmo os mortos, portanto, se n'Ele crerem, lá onde estiverem viverão, pois Ele é a própria Ressurreição, o poder de dar a Vida: "Eu sou a Ressurreição e a Vida. Aquele que crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá." Jo 11,25
    São Paulo diz: "Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos deste corpo para ir habitar junto ao Senhor. É também por isso que, vivos ou mortos, nos esforçamo por agradar-Lhe. Porque teremos de comparecer diante do tribunal de Cristo. Ali cada um receberá o que mereceu, conforme o bem ou o mal que tiver feito enquanto estava no corpo." 2 Cor 5,8-10
    Doutrinariamente, o rito de rezar pelos mortos já havia sido inspirado pelo Divino Paráclito antes da Vinda do Cristo. O livro de Macabeus, por flagrante incoerência rejeitado por alguns, registra: "Em seguida, fez uma coleta, enviando a Jerusalém cerca de dez mil dracmas, para que se oferecesse um sacrifício pelos pecados. Belo e santo modo de agir, decorrente de sua crença na Ressurreição, porque, se ele não julgasse que os mortos ressuscitariam, por eles teria sido vão e supérfluo rezar." 2 Mc 12,44-45
    E a Santa Igreja celebra a Santa Missa pelas almas do Purgatório desde o século V. Santo Isidoro de Sevilha, presidente de dois concílios da Igreja, registrou este culto no século VII. E em 998, Santo Odilo, abade beneditino, instituiu em todos conventos da Ordem o dia de 'Todas as Almas', sábia e espontaneamente já celebrado pelo povo no dia seguinte ao de 'Todos os Santos'.
    Em 1311, o Bispado de Roma incluiu no calendário litúrgico o 2 de novembro como dia de 'Todos os Finados', embora só em 1915 o Papa Bento XIV o tenha oficialmente decretado.

    "Concedei-lhes, ó Senhor, a Luz Eterna!"