quinta-feira, 21 de março de 2024

São Nicolau de Flüe


    Vivendo numa humilde cabana, e nela enfrentando todo rigor dos invernos suíços, dos 49 aos 70 anos São Nicolau de Flüe só se alimentou da Santa Eucaristia.
    Também chamado de Irmão Klaus, filho de camponeses, nasceu em 1417 em Sachseln, próximo a Lucerna, na região central da Suíça, e sempre foi muito obediente e amoroso. Precocemente amadurecido, por horas e horas entregava-se à oração e à contemplação. Aos 16 anos, admirando uma torre no Vale do rio Melch, teve a revelação de que sua vida seria uma solitária edificação, em busca das coisas do Céu.
    Aos 29 anos, foi convocado para combater as autoridades do cantão de Zurique, na Batalha de Ragaz, que tentavam separar-se da Liga Helvética. E aos 37 foi capitão de um batalhão de cem homens na Guerra de Thurgau, quando enfrentou invasores austríacos. Nessa ocasião, não permitiu que seus comandados pusessem fogo no Mosteiro de Santa Catarina de Alexandria, onde o inimigo estava refugiado, ato que mais tarde lhe deu o título de Santo Protetor do Mosteiro.


    Aos 30 anos, a pedido de seus pais, casou-se com Dorotea Wyss, com quem teve 10 filhos. Era muito dedicado pai e nunca perdeu de vista a formação espiritual dos filhos: dois deles foram governadores de cantões suíços e um terceiro foi estudar em Paris, onde se tornou Sacerdote e doutor em Teologia.
    Destes tempos, temos registros de que São Nicolau não dormia. Seu filho João de Flüe, que muitas vezes acompanhou suas vigílias, escreveu: "Meu pai sempre ia deitar-se na mesma hora que seus filhos e os domésticos, mas todas noites eu via-o novamente levantar-se e rezar em seu quarto até a manhã."



    Tinha grande devoção por Nossa Senhora e nunca abandonava o Rosário, nem mesmo durante o trabalho no campo. Era admirador do carisma de São Francisco de Assis, o fundador da mendicante ordem, a quem devotamente imitava abraçando a pobreza.


    Por sua afável personalidade, amado por seu povo, foi juiz e conselheiro do cantão de Unterwald, onde morava, e chegou a ser deputado na Dieta Federal de 1462. Mas nas várias vezes em que lhe foi oferecido o cargo de governador do cantão, ele recusou-o.
    E aos 49 anos, pediu permissão à esposa para partir, pois ardentemente queria terminar sua vida como um místico eremita, como sonhava desde adolescente. Ela, cristã de muitas virtudes, que já bem conhecia sua vocação, não lhe pôs obstáculos. Mais que isso, prometeu-lhe que criaria os filhos menores nos mais puros valores cristãos.
    Nosso Santo foi duramente criticado por todos irmãos e parentes, mas não desistiu. Vestiu uma túnica, tomou o Rosário, o cajado e partiu para o cantão da Basileia, afastando-se muito de sua terra natal, na tentativa de sufocar por completo a saudade que sentia dos filhos e da esposa. Porém, guiado pelo Espírito Santo, terminou voltando a localidade de Ranft, para uma desabitada propriedade da família, no vale do rio Melch, onde fez uma modestíssima cabana que ainda hoje pode ser vista, assim como o banco em que se deitava, no qual usava uma pedra como travesseiro.


    Após um jejum de 11 dias, pediu a visita de um padre, querendo sua orientação. Era o ano de 1488, o Sacerdote de Kerns, Oswald Isner, foi ao seu encontro e depois escreveu no livro da paróquia: "Quando Nicolau começou a abster-se de alimentos naturais, e assim havia passado onze dias, mandou procurar-me e secretamente perguntou-me se devia tomar algum alimento... Em seus membros não restava senão pouca carne, pois tudo estava dessecado até a pele. Quando vi, e compreendi que isso não podia provir senão da boa fonte do divino amor, aconselhei ao irmão Nicolau que persistisse na prova tão longamente quanto lhe fosse possível suportar sem perigo de morte... Foi o que ele fez: desde esse momento até sua morte - quer dizer, por volta de vinte anos e meio - continuou a abster-se de qualquer alimento corporal... Ele confessou-me que, quando assistia à Santa Missa e o padre comungava, recebia uma força que lhe permitia permanecer sem comer e sem beber, pois de outro modo não poderia resistir."
    Todo lugar ficou agitado com a presença de tão santa pessoa, e grandes multidões formavam-se para ir visitá-lo. Um magistrado local, desconfiado daqueles relatos, mandou que a cabana fosse vigiada dia e noite. Mas após 28 dias, constatando que, sem a ajuda divina, nenhum ser humano poderia sobreviver por tanto tempo sem sequer beber água, ordenou que a guarda fosse retirada.
    O Bispo de Ascalão, diante da repercussão dos fatos, foi visitá-lo, exigiu a obediência que lhe era devida e obrigou-o a comer pão e beber vinho. Ao tentar, porém, São Nicolau teve tão intensas convulsões que o bispo logo percebeu que aquele jejum era realmente a vontade de Deus.
    Sentiu-se, então, obrigado a registrar este testemunho: "Nicolau retirou-se para um ermo lugar chamado Ranft, no qual se conservou com a ajuda de Deus sem tomar qualquer alimento, ali ainda vivendo e desfrutando, até a data em que este documento é escrito, de todas suas faculdades, levando uma vida bastante santa, do que nós garantimos e afirmamos em toda verdade, por termos sido nós mesmos testemunhas."
    A inédia, porém, enquanto sinal de Deus não é uma novidade na Igreja. Em recentes tempos, como rápidos e acessíveis exemplos, tivemos os casos da mística Teresa Neumann e da Beata Alexandrina de Balazar, que a viveram por décadas. Ademais, aí temos mais uma prova da veracidade dos Evangelhos, quando dizem: "Em seguida, Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado pelo Demônio. Jejuou quarenta dias e quarenta noites." Mt 4,1-2a
    E o próprio Cristo disse de São João Batista: "Veio João. Ele não bebia e não comia..." Mt 11,18a
    O arquiduque da Áustria, ao tomar conhecimento de sua história, mandou que fosse construída uma capela de pedra, parede à parede com sua cabana, para que São Nicolau pudesse participar da Santa Missa sem ter que sair de seu regime de clausura.


    Mas ele não viveu apenas de retiro. Constantemente procurado pelo povo, com frequência saía para fazer pequenas pregações. Em 1473, aos 56 anos, inspirou e deu termos ao acordo de paz perpétua entre a Suíça e a Áustria.
    Em 1481, quando o cantão Unterwald quis separar-se dos cantões de Lucerna e de Zurique, ele passou toda uma noite escrevendo o projeto de constituição, que foi unanimemente aprovado, evitando a guerra civil e rearticulando a unidade entre os suíços. Por esse feito, é reconhecido como o 'Pai da Pátria'.
    Tinha o dom da profecia e predisse a heresia do protestantismo, que se daria no seguinte século: "... vão chegar infelizes tempos de revolta e de dissensões na Igreja. Ó meus filhos, não vos deixeis seduzir por nenhuma inovação! Uni-vos e mantende-vos firmes. Permanecei na mesma via, nos mesmos caminhos que nossos piedosos ancestrais, conservai e mantende o que nos foi ensinado. Assim é que resistireis aos ataques, aos furacões, às tempestades que com tanta violência se levantarão."
    Antes de morrer, por oito dias padeceu de grandes sofrimentos. E para enfrentá-los apenas pediu o Santíssimo Sacramento e a Unção dos enfermos. Morreu tendo ao lado toda sua família e parentes.
    Neste dia, todas casas e lojas do povo suíço fecharam as portas. Também já era muito venerado na Áustria, Alemanha, França e Holanda, de onde recebia peregrinos em busca de orações e aconselhamento. Sua prodigiosa vida em jejum por tantos anos atesta a plena validade da Palavra do Senhor sobre o Santíssimo Sacramento: "Pois Minha Carne é verdadeiramente uma comida e Meu Sangue, verdadeiramente uma bebida." Jo 6,55
    Seu corpo foi sepultado na Igreja da Peregrinação de Sachseln, no cantão de Obwalden, onde seu último manto, costurado por sua esposa, se encontra exposto.


    São Nicolau de Flüe, rogai por nós!