terça-feira, 31 de dezembro de 2024

São Silvestre


    São muitas as razões pelas quais a Igreja celebra a santidade do Papa São Silvestre I desde o ano de 336 de nossa era, apenas um ano após sua morte. Era a esse cristão que Constantino I ouvia, e é a ele que devemos o fato de este imperador ter publicado no ano de 314, poucos dias antes de São Silvestre ser eleito papa, o Édito de Milão, concedendo ao Catolicismo liberdade de culto em terras do Império Romano.
    Não se pode esquecer, porém, que para esse feito também contribuíram a influência de Santa Helena, mãe do imperador e de família fortemente cristã, e o sonho que ele próprio teve, na noite anterior a uma decisiva batalha em 312, quando viu uma Cruz na qual estava escrito: "Sob este símbolo vencerás." De fato, na manhã seguinte ele mandou que pintassem a Cruz nos escudos de seus soldados, e assim obteve uma grande vitória na Batalha de Ponte Milvio, uma das mais importantes sobre o Rio Tibre, localizada em Saxa Rubra, arredores de Roma.


    São Silvestre foi o paciente conversor desse imperador, que só em seus últimos dias pediu o Batismo. Não obstante, levou uma vida tão correta aos olhos de Deus, graças aos frequentes conselhos de sua mãe e de nosso Santo Papa, que também se tornou Santo. Foi igualmente por velada sugestão de São Silvestre que Constantino I convocou o Primeiro Concílio de Niceia, em 325, onde foi debatida e afastada a heresia do arianismo, entre outras.
    Sábio, nosso Santo tudo fazia com humilde discrição para não dar ocasião à discórdia. Soube ser o Papa dos primeiros anos da Igreja livre, após, como romano, por algumas décadas ter sido testemunha ocular de brutais perseguições e martírios. Ora, o próprio Pilatos, por força do paganismo que praticava, já usava de extrema violência para com os judeus. O Evangelho segundo São Lucas registrou: "Neste mesmo tempo, contavam alguns o que tinha acontecido a certos galileus, cujo sangue Pilatos misturara a seus sacrifícios." Lc 13,1
    Com efeito, São Silvestre havia convocado o Primeiro Sínodo de Arles, em 314, no qual se examinou e foi banida a heresia criada por Donato, chamada donatismo, que não admitia que a Igreja perdoasse pecados cometidos após o Batismo. Mas esse Sínodo terminou provocando uma das primeiras divisões da Igreja, levando São Silvestre a provocar Constantino para que convocasse o referido Concílio de Niceia, que seguiu debelando outras heresias.
    É de seu tempo, e com uma grande ajuda do imperador, a construção da primeira Basílica de São Pedro, no mesmo lugar da atual, no Monte Vaticano, onde o Príncipe dos Apóstolos foi crucificado, pois era lugar de um antigo cemitério pagão. Ainda de seu tempo é a construção da Basílica de São João de Latrão, a Catedral do Papa, e a Basílica de São Paulo (Extra-Muros), que também contaram com virtuosos auxílios de Constantino I.


    Entre outras coisas de grande valor, como a estátua de Roma Eterna, o imperador ainda doou o Palácio Lateranense para servir de moradia para o clero. Com todos esses monumentos, os cristãos saíram de pequenas e escondidas 'capelas' espalhadas por toda Roma, assim como das catacumbas, para abertamente viver a em edificações dignas de louvor a Deus.
    Apesar de a mãe do imperador ser católica, era São Silvestre quem pregava e dava teológicos embasamentos que cada vez mais convenciam Constantino I da Verdade da manifestação de Cristo, através da inspiração e do poder de oratória que lhe concedia o Espírito Santo, além de seu testemunho de vida, de evidente e tocante simplicidade.


    Teve um longo papado, de 21 anos, entrando para a História da Igreja como um homem de profunda espiritualidade e hábil conciliador, apesar de todos heréticos movimentos que surgiram durante os anos em que esteve na Cátedra de São Pedro.
    Foi sepultado numa basílica que passou a levar seu nome, construção iniciada por ele mesmo a partir da casa de uma família cristã, cujos subterrâneos foram escavados para abrigar um oratório devotado aos primeiros mártires da Igreja e usado por muitos cristãos que, às escondidas, aí se encontravam para reviver e atualizar a Paixão de Cristo, pelo ritual da Santa Missa. O primeiro altar dedicado ao nosso santo ainda pode ser visto.


    A atual construção é do Império Carolíngio, ou seja, do século IX, mas suas colunas são originais, do século V, quando foi concluída. Nela também foram depositados os restos mortais do venerado Papa São Martinho I, e foi concluída pelo padre São Carlos Borromeu, já no século XVI, que ativamente trabalhou em suas feitorias, melhoramentos e adornos.


    São Silvestre, rogai por nós!

Santa Catarina Labouré


    Freira vicentina, foi agraciada com cinco aparições da Virgem Maria, que aconteceram entre julho e dezembro de 1830, sendo a mais importante a de 27 de novembro, quando ela se apresentou como Nossa Senhora das Graças e mandou cunhar a medalha milagrosa, pela qual tem derramado grandes bênçãos aos que se mostram fiéis usuários.
    Zoe de Labouré, seu nome de Batismo, nasceu em 1806. Família de onze filhos, ainda criança se tornou órfã de mãe e, por inspiração do Espírito de Deus, adotou Nossa Senhora, que lhe foi de indizível valia. Aos 18 anos pediu ao pai para ser freira, mas ele não lhe permitiu, alegando que precisava de ajuda para criar seus irmãos. Aos 23 anos, após todos criados, ela voltou a insistir com o pai por sua vocação religiosa, e em abril de 1830, ao obter seu consentimento, entrou para a ordem fundada por São Vicente de Paulo, pois havia sonhado com ele, dizendo que Deus a queria trabalhando para ajudar os enfermos. Escolheu o nome de Catarina, e era exemplo de devoção e dedicação aos pacientes no hospital da congregação em Paris.
    As visões que tinha de São Vicente, porém, tornaram-se muito frequentes, e ela sentiu-se na obrigação de relatá-las ao confessor espiritual, que apenas lhe pedia que escrevesse todos detalhes. Então passou a ter visões de Jesus Eucarístico e, em seguida, de Cristo Rei, no início de junho do mesmo ano, o que deixou seu confessor em alerta.
    E na noite do dia 18 de julho de 1830, um anjo (seu Anjo da Guarda?) apareceu para conduzi-la à Capela do Convento, onde Nossa Mãe Celestial por ela esperava para uma aparição de mais de duas horas. Santa Catarina, ajoelhando-se aos seus pés e apoiando os braços ao seu colo, buscou os afagos daquela que havia adotado como mãe e recebeu a Consolação pela qual todas almas anseiam. Mas também ouviu que Deus queria encarregar-lhe de uma difícil missão, e iria demandar toda sua , sem hesitação.
    

    Entretanto, de tão impressionada com aquela aparição, Santa Catarina resolveu nada dizer a pessoa alguma, nem mesmo a seu confessor. E comedidamente aguardou a indicação de sua missão, confiante nas palavras de Nossa Senhora que lhe havia garantido: "Terás a proteção de Deus e de São Vicente, e meus olhos sempre estarão sobre ti."
    Sua incumbência finalmente foi revelada quando a Mãe do Salvador lhe apareceu em 27 de novembro de 1830. Nossa Santa assim escreveu em diário:

    "A Santíssima Virgem apareceu ao lado do altar, de pé sobre um globo, com o semblante de uma Senhora de indizível beleza; de veste branca, manto azul, tinha as mãos elevadas até à cintura e sustentava um globo figurando o mundo, encimado por uma cruzinha. A Senhora era toda rodeada de tal esplendor que era impossível fitá-la. O radiante rosto de celestial claridade conservava os olhos elevados ao Céu, como para oferecer o globo a Deus. A Santíssima Virgem baixou para mim os olhos e disse-me no íntimo de meu coração:
    'Este globo que vês representa o mundo inteiro... e cada pessoa em particular... Eis o símbolo das Graças que derramo sobre as pessoas que pedem.'
    Desapareceu, então, o globo que tinha nas mãos e, como se estas já não pudessem com o peso das Graças, voltaram-se para a Terra em amorosa atitude. Formou-se em volta da Santíssima Virgem um figura oval, na qual em letras de ouro se liam estas palavras que por cima cercavam a Senhora: 'Ó MARIA CONCEBIDA SEM PECADO, ROGAI POR NÓS QUE RECORREMOS A VÓS.'
    Ouvi, então, uma voz que me dizia:
    'Faça cunhar uma medalha por este modelo. Todas pessoas que a trouxerem receberão grandes Graças, sobretudo se a trouxerem no pescoço. As Graças serão abundantes, especialmente para aqueles que a usarem com confiança.'
    Então se virou o quadro, e no verso apareceu a letra M, monograma de Maria, com uma Cruz em cima, tendo um Terço na base; por baixo do M, os dois Corações, de Jesus e de Maria; o de Jesus, com uma coroa de espinhos e o de Maria atravessado por uma espada; uma coroa de doze estrelas contornava o quadro."

    Não era fácil tarefa. Onde cunharia medalhas? Quem a ajudaria? Seu confessor creria nela? E de imediato perguntou a Imaculada Virgem como poderia realizar sua missão, e ela simplesmente indicou-lhe o Padre Jean Marie Aladel.


    De fato, seu confessor ouviu-a com muita atenção, mas ainda passou dois anos observando seu comportamento para ter certeza de que se tratava de uma verdadeira aparição. Nesse período Santa Catarina manteve sua rotina, entregando-se com a costumeira dedicação às orações e ao trabalho, que, aliás, executou por 45 anos no mesmo hospital, desde que entrou no convento até o dia de sua morte em 1876, aos 70 anos.


    Uma vez cunhadas, através das medalhas realizavam-se muitíssimos milagres, que rapidamente as fizeram conhecidas e desejadas por toda população.
    Exceto ao confessor e a seu bispo, Santa Catarina nunca divulgou essas aparições. Elas fazem parte de uma importantíssima série que culminaria em Fátima, e inclui as Aparições de Quito, de Lourdes, de Salette e de Akita. De fato, a Santíssima Mãe avisou que se iniciavam 'difíceis tempos para a França e para o mundo', mas nossa Santa publicou-as apenas pouco antes de morrer, e por expressa autorização da própria Senhora Imaculada.
    Em 1947, Santa Catarina foi canonizada pelo Venerável Papa Pio XII, profícuo escritor e de heroicas virtudes.


    Ao ser beatificada em 1933, seu corpo foi exumado e encontrava-se absolutamente incorrupto, como ainda se vê em exposição na capela do convento, ao lado direito do Altar.


    Santa Catarina Labouré, rogai por nós!

segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

As Bem-Aventuranças


    No Sermão da Montanha, ainda no início de Sua Missão, Jesus apresentou o Caminho a ser seguido por quem não se ilude com esse mundo. E tudo que Ele recomenda é verdadeira caridade pela Salvação das almas, que é a essência de Sua Doutrina. Está no Evangelho segundo São Mateus, e no núcleo desse 'discurso da instauração do Reino de Deus', Ele fez a proclamação das bem-aventuranças: a síntese da felicidade maior.

    "Bem-aventurados os que têm um coração de pobre, porque deles é o Reino dos Céus!" Mt 5,3

    Seja em meio à pobreza ou à riqueza material, quem tem um humilde coração já vivencia o Reino de Deus. Reconhece suas próprias limitações e sabe que os bens materiais não levam a nenhum paraíso. Não pensa em si mesmo, mas procura ajudar onde pode, como pode e a quem pode. Entrega-se nas mãos de Deus e confia em Sua Providência. Ao calar, é capaz de ouvir mais e melhor. Ao sentir o que os outros sentem, torna-se mais próximo de todos. Quem tem coração de pobre é simples, e, por ater-se à essência das coisas, mais profundamente conhece-as, desliga-se de ilusões, e assim reage com maior resignação diante de dificuldades, aflições e tribulações. Está bem perto de Deus.

    "Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados!" Mt 5,4

    Chorar diante de uma grande contrariedade não é fraqueza. É sincera demonstração de sentimentos, aversão aos desenganos, natural lamentação de infortúnios. Destes Deus compadece-Se. Quem comedidamente sofre injustiças, sem se permitir perturbar a paz alheia, comove o Sofredor Coração de Jesus. Deus é Consolador, dá forças para enfrentar os mais angustiantes momentos, e recompensa com as maiores e mais verdadeiras alegrias que se pode experimentar. A ilusória e fútil felicidade é a causa das maiores tristezas, pois não sacia a alma e só aumenta o vazio espiritual, não raro levando ao desespero.

    "Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra!" Mt 5,5

    A mansidão permite conhecer mais claramente a Verdade, é reconfortante e perpetua a Paz de Cristo. À sua volta, o ambiente faz-se efetivamente presente, pois sem personalismos se tem melhor percepção da própria natureza e dos acontecimentos em curso. As obras de Deus só chegam plenamente aos sentidos através da porta da serenidade, e só por ela é possível a contemplação e a inspiração. A inquietude só causa ou aumenta as tensões. Jesus ofereceu Sua Paz para que nela vivamos. Com ela devemos tocar as pessoas por nossas palavras, nossos gestos, nosso trabalho. E nas situações em que afloram a aflição ou a violência, é quando se faz perceber a verdadeira mansidão. Mas ela não se confunde com a covardia, porque também sabe perceber a hora de reagir diante do intolerável.

    "Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados!" Mt 5,6

    Trabalhar pelo bem do próximo, não se deixar levar por rancor ou pessimismo e purificar o próprio coração são provas de , esperança e amor. Sutilmente, Deus vai enchendo as mãos e o coração de quem pede Seus socorros contra injustiças. A silente aversão ao mundo é uma sóbria e resistente atitude, virtude de fortaleza. Quem compactua com a corrupção, ou dela foge buscando falsos prazeres, está colocando sua esperança noutra fonte que não é Deus. Nunca encontrará a Paz. Suportar humilhação, e a aparente vitória do mal, é sinal da presença do Espírito Santo e a certeza do futuro triunfo. Por sua própria fraqueza, enquanto reação humana, ou por força de Deus, o mal sempre se destina à ruína.

    "Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão Misericórdia!" Mt 5,7

    Dados tão frequentes desacertos da natureza meramente carnal, por excelência a compaixão é a marca de Deus. Perceber e tratar a dor alheia com delicadeza e respeito, faz despertar o amor que se deve ao semelhante e a Deus. É impossível ser feliz virando o rosto aos que sofrem. O coração realmente misericordioso aflige-se até mesmo vendo a tristeza dos maus. A indiferença e o ódio, então, são perigosos venenos, podem matar; provocam o afastamento das pessoas e o vazio na alma, impossíveis de serem desfeitos sem o retorno à natural afeição, à solidariedade humana e ao bem querer. Quem não tem misericórdia, não encontra consolação, e sofre maiores dramas de consciência por só tardiamente vir a reconhecer o sofrimento dos outros.

    "Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus!" Mt 5,8

    A pureza, a gratuidade e as boas intenções são as autênticas expressões do amor. Não há como amar competindo, negociando, buscando vantagens, vivendo de aparências e de valores materiais. Não há como perceber o amor de Deus quando se cultua fugazes prazeres, guardando supostos tesouros, agindo por escusos interesses, sustentando embustes, colecionando 'glórias' de injustiça e ilusão, usando e menosprezando o próximo. As mãos limpas de quem trabalha e oferece do que é seu, o coração sem malícia, o corpo depurado de vícios e compulsões são a verdadeira beleza da alma, e a Paz que se pode viver na Terra. Assim se pode ver Deus em Suas obras e na pessoa dos outros, e na Vida Eterna vê-Lo face-a-face.

    "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus!" Mt 5,9

    Obter e trazer em si a Paz de Cristo pela vida a fora, é uma das maiores bençãos. Depois do amor, deve ser o maior objetivo do cristão, até mesmo uma obrigação, pois ela nos foi oferecida. Os ativisticamente combativos e rebeldes, na grande maioria das vezes, mais atrapalham que ajudam. Salvo raras exceções, pelo bem deve-se buscar as metas do bem. O mundo é carente de consolação e de reconciliação com Deus, e os pacificadores são Seus enviados para cumprir esse papel, para promover a fé, a esperança e o amor que levam ao Céu. Jesus deu-nos Sua Paz. Aqueles que a recebem, portanto, têm a Graça e o compromisso de partilhá-la. É através dessas pessoas que Deus quer fazer-Se conhecido.

    "Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus!" Mt 5,10

    Enquanto se multiplicam as iniquidades, os justos nadam contra a corrente defendendo os direitos dos mais sofridos e dos mais pobres. Enquanto o mundo insiste em ostentar suas efêmeras e vãs conquistas, centenas de milhões de pessoas são massacradas pela pobreza, pela enfermidade, pela fome, pela guerra e pela morte. Uma pequena parte faz festas com as riquezas da injustiça, enquanto a maioria esmola a saciação das mais elementares necessidades. As causas das maiores tribulações são sempre as mesmas: a falta de partilha, a usurpação e, mil vezes pior, a diabólica manipulação de direitos de desinformados e indefesos, orquestrada pelo Comunismo e suas muitas e sutis variantes, como o Socialismo. Quem levanta a voz contra essa vil insensibilidade, portanto, estará incomodando, e certamente será chamado de radical, sofrerá ridicularização e ameaças até que se cale ou morra.

    "Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, perseguirem e falsamente disserem todo mal contra vós por causa de Mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande vossa recompensa nos Céus, pois assim perseguiram os Profetas que vieram antes de vós." Mt 5,11-12

    Hoje, em vários segmentos sociais, falar de fé, de religião ou mesmo de Deus tornou-se sinônimo de ridículo. Tem-se como dever, em nome de uma suposta boa convivência, escolher em que ambiente falar sobre o bem-estar da alma. O mundo dos instantâneos prazeres nada quer ouvir sobre o verdadeiro amor, a adoração a Deus, a contemplação, a reflexão, o crescimento espiritual, a oração, a vigília, o jejum e outras penitências. Para muitos, os bens materiais são os mais claros sinais de felicidade. Humildade, resignação, tolerância, pacifismo, castidade, pregação de amor ao próximo, oferecer a vida para servir aos necessitados, enfim, parecem fraquezas, achaques emocionais, coisa de gente alienada ou que se 'acostumou com o sofrimento'. No máximo, alguns vão achar bonito 'tanta' dedicação, 'tanto' altruísmo, 'tanta' abnegação. Os mais amadurecidos, no entanto, já sabem: as verdadeiras alegrias e vitórias experimentam-se pelos afagos da presença de Deus.


JESUS É NOSSA BEM-AVENTURANÇA

    Em face da Vinda do Salvador, e de tantos e tão grandiosos milagres que fez, Ele deu-nos uma advertência quando foi interrogado pelos discípulos de São João Batista, conforme o Evangelho segundo São Lucas: "E João chamou dois de seus discípulos e enviou-os a Jesus, perguntando: 'És Tu Aquele que há de vir ou devemos esperar por outro?' Ora, naquele momento Jesus havia curado muitas pessoas de enfermidades, de doenças e de malignos espíritos, e dado a vista a muitos cegos. Respondeu-lhes Ele: 'Ide anunciar a João o que tendes visto e ouvido: os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos ficam limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, aos pobres é anunciado o Evangelho. E bem-aventurado é aquele para quem Eu não for ocasião de queda!'" Lc 7,19.21-23
    Ora, quantas pessoas, ao tempo do Antigo Testamento, desejaram ver e ouvir o Messias em Sua Vinda? Presenciar Sua derrama de Graças? Nosso Senhor mesmo vai dizer a Apóstolos, discípulos e seguidores: "Mas, quanto a vós, bem-aventurados vossos olhos, porque veem! Ditosos vossos ouvidos, porque ouvem! Eu declaro-vos, em Verdade: muitos Profetas e justos desejaram ver o que vedes e não viram, ouvir o que ouvis e não ouviram." Mt 13,16-17
    De fato, no Evangelho segundo São JoãoJesus foi bem explícito perante os judeus de Jerusalém: "Ele disse-lhes: 'Vós sois cá de baixo, Eu sou lá de cima. Vós sois deste mundo, Eu não sou deste mundo. Por isso, disse-vos: morrereis em vosso pecado. Porque se não crerdes que EU SOU, morrereis em vosso pecado.'" Jo 8,23-24
    Falava, portanto, de verdadeira e cristã perseverança na condução dos bens que Deus nos concede, pois sabia das contrariedades e, principalmente, das tentações que o cristão padece nesse mundo: "Quem é, pois, o fiel e prudente servo que o Senhor constituiu sobre os de Sua família, para no oportuno momento dar-lhes o alimento? Bem-aventurado aquele servo a quem Seu Senhor, na Sua volta, assim encontrar procedendo!" Mt 24,45-46
    Em outras palavras, falava de vigilância, prometendo o Eterno Banquete: "Bem-aventurados os servos a quem o Senhor achar vigiando, quando vier! Em Verdade, digo-vos: cingir-Se-á, fá-los-á sentar à mesa e servi-los-á." Lc 12,37
    No mesmo sentido, a a Primeira Carta de São Pedro vai dizer: "Caríssimos, não vos perturbeis no fogo da provação, como se vos acontecesse algo extraordinário. Pelo contrário, alegrai-vos em ser participantes dos sofrimentos de Cristo, para que possais alegrar-vos e exultar no Dia em que for manifestada Sua Glória. Se fordes ultrajados pelo Nome de Cristo, bem-aventurados sois vós, porque o Espírito de Glória, o Espírito de Deus repousa sobre vós." 1 Pd 4,12-14
    Quanto às nossas próprias faltas, que nos afastam de Deus, a Carta de São Paulo aos Romanos faz lembrar a importância da Confissão, invocando uma passagem do Livro dos Salmos: "Assim é que Davi proclama bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente das obras: 'Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades foram perdoadas, e cujos pecados foram cobertos! Bem-aventurado o homem ao qual o Senhor não imputou seu pecado (Sl 31,1s).'" Rm 4,6-7
    Na missão que a Igreja tem de pacificar o rebanho de Cristo, essa é a mais importante atribuição que Ele deu, e logo em Sua primeira aparição aos Apóstolos: "Depois dessas palavras, soprou sobre eles dizendo-lhes: 'Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, sê-lhes-ão perdoados. Àqueles a quem os retiverdes, sê-lhes-ão retidos.'" Jo 20,22-23
    Aliás, ser corrigido por Deus não é nenhuma desgraça. Ao contrário, como lemos no Livro de Jó, diz Elifaz de Temã, um de seus amigos: "Bem-aventurado o homem a quem Deus corrige! Não desprezes a lição do Todo-Poderoso, pois Ele fere e cuida. Se golpeia, Sua mão cura." Jó 5,17-18
    No lado oposto, o Livro do Eclesiástico diz daqueles que não se deixam enredar pela riqueza: "Bem-aventurado o rico que foi achado sem mácula, que não correu atrás do ouro, que não colocou sua esperança no dinheiro e nos tesouros!" Eclo 31,8
    E na certeza de que no ventre trazia o Redentor, Nossa Senhora bem sabia a indizível Graça que lhe foi concedida. Em visita a Santa Isabel, ela cantou o Magnificat, e a Igreja tratou de guardar a memória desse feito: "E Maria disse: 'Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta de alegria em Deus, Meu Salvador, porque olhou para Sua pobre serva. Por isto, desde agora, todas gerações proclamá-me-ão bem-aventurada, porque em mim realizou maravilhas Aquele que é poderoso, e Cujo Nome é Santo.'" Lc 1,46-49
    Com efeito, assim era uma profecia do Livro do Cântico dos Cânticos, quando o Amado, representando Deus, diz da Amada, que viria a ser a Santíssima Virgem, a Rainha entre as rainhas: "Há sessenta rainhas, oitenta concubinas e inumeráveis jovens mulheres. Uma, porém, é Minha pomba, uma só Minha perfeita. Ela é a única de sua mãe, a predileta daquela que a deu à luz. Ao vê-la, as donzelas proclamam-na bem-aventurada, rainhas e concubinas a louvam." Ct 6,8-9
    Santa Isabel, ademais, já a havia proclamado logo que recebeu sua saudação, pois só de ouvi-la ficou cheia do Espírito Santo. Ela e seu filho São João Batista, em seu ventre (cf. Lc 1,44): "Bem-aventurada és tu que creste, pois da parte do Senhor hão de cumprir-se as coisas que te foram ditas!" Lc 1,45
    Ora, o próprio Cristo, após a multiplicação dos pães e dos peixes, iria dizer à multidão às margens do Mar da Galileia: "A obra de Deus é esta: que creiais n'Aquele que Ele enviou." Jo 6,29
    E vai dizer especificamente de sua bem-aventurança, quando uma mulher assim a via tão somente por gerá-Lo e amamentá-Lo, o que não seria pouco, mas Ele vai corrigi-la, declarando que ela já o era por ouvir e praticar a Palavra de Deus: "Enquanto Ele assim falava, uma mulher levantou a voz do meio do povo e disse-Lhe: 'Bem-aventurado o ventre que Te trouxe, e os seios que Te amamentaram!' Mas Jesus replicou: 'Antes bem-aventurados aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a observam!'" Lc 11,27-28

    "Caminhamos na estrada de Jesus!"

domingo, 29 de dezembro de 2024

A Sagrada Família


JOSÉ E MARIA

    A Bíblia oferece belas imagens da Sagrada Família. Uma delas é descrita no Evangelho segundo São Mateus, quando o Anjo da Guarda de São José se encarregou de consolidar o Matrimônio entre ele e Nossa Senhora:

    "Eis como nasceu Jesus Cristo: Maria, Sua mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem, aconteceu que Ela concebeu por virtude do Espírito Santo.
    José, seu esposo, sendo justo e não querendo difamá-la, resolveu rejeitá-la secretamente. Enquanto assim pensava, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse:
   - José, filho de Davi, não temas receber Maria por esposa, pois Aquele que nela foi concebido vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um Filho, a Quem porás o Nome de Jesus, porque Ele salvará Seu povo de seus pecados.
    Tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que o Senhor falou pelo Profeta (Isaías): 'Eis que a Virgem conceberá e dará à luz um Filho, que Se chamará Emanuel (Is 7,14), que significa Deus Conosco.'
    Despertando, José fez como o anjo do Senhor lhe havia mandado e em sua casa recebeu sua esposa. E sem que ele a tivesse conhecido, ela deu à luz Seu Filho, que recebeu o Nome de Jesus."
                                               Mt 1,18-25


NATAL DE JESUS

    Outra cena de singular beleza é o Nascimento de Jesus, que o Evangelho segundo São Lucas assim narrou:

    "Naqueles tempos apareceu um decreto de César Augusto, ordenando o recenseamento de toda Terra. Este recenseamento foi feito antes do governo de Quirino na Síria. Todos iam alistar-se, cada um em sua cidade.
    José também subiu de Galileia, da cidade de Nazaré, a Judeia, à Cidade de Davi, chamada Belém, porque era da casa e família de Davi, para alistar-se com sua esposa Maria, que estava grávida.
    Ali estando eles, completaram-se os dias dela. E deu à luz Seu Filho primogênito, e, envolvendo-O em faixas, reclinou-O num presépio, porque na sala não havia lugar para eles.
    Nos arredores havia uns pastores, que nos campos vigiavam e guardavam seu rebanho durante as vigílias da noite. Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a Glória do Senhor refulgiu ao redor deles, e tiveram grande temor. O anjo disse-lhes:
    - Não temais, eis que vos anuncio uma Boa Nova que será alegria para todo povo: hoje vos nasceu, na Cidade de Davi, um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto servi-vos-á de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura.
    E subitamente ao anjo juntou-se uma multidão do Celeste Exército, que louvava a Deus e dizia:
    - Glória a Deus no mais alto dos CéusPaz na Terra aos homens, objetos da divina benevolência.
    Depois que os anjos os deixaram e voltaram para o Céu, falaram os pastores uns aos outros:
    - Vamos a Belém e vejamos o que se realizou, e o que nos manifestou o Senhor.
    Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o Menino deitado na manjedoura. Vendo-O, contaram o que se lhes havia dito a respeito deste Menino.
    Todos que os ouviam admiravam-se das coisas que contavam os pastores.
    Maria conservava todas estas palavras, meditando-as em seu coração.
    Voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora dito." 
                                                 Lc 2,1-20


A FUGA DE HERODES

   Na fuga para Egito, a Sagrada Família é vista em delicado momento, entre o ódio de reis. Mas não deixa de exprimir sua pujante espiritualidade, como São Mateus relata:

    "E eis que a Estrela, que tinham visto no Oriente, foi precedendo os magos até chegar sobre o lugar onde estava o Menino, e ali parou. A aparição daquela estrela encheu-os de profunda alegria.
    Entrando na casa, acharam o Menino com Maria, Sua mãe. Prostrando-se diante d'Ele, adoraram-nO. Depois, abrindo seus tesouros, como presente Lhe ofereceram ouro, incenso e mirra. Avisados em sonhos para não tornarem a Herodes, voltaram à sua terra por outro caminho.
    Depois de sua partida, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse-lhe:
    - Levanta-te, toma o Menino e Sua mãe e foge para Egito. Fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o Menino para matá-Lo.
    José levantou-se durante a noite, tomou o Menino e Sua mãe e partiu para Egito. Ali permaneceu até a morte de Herodes, para que se cumprisse o que o Senhor dissera pelo Profeta (Oseias): 'De Egito, Eu chamei Meu Filho' (Os 11,1).
    Vendo Herodes, então, que tinha sido enganado pelos magos, ficou muito irado e mandou massacrar em Belém e seus arredores todos meninos de dois anos para baixo, conforme o exato tempo que havia indagado dos magos. Assim se cumpriu o que foi dito pelo Profeta Jeremias: 'Em Ramá ouviu-se uma voz, choro e grandes lamentos. É Raquel a chorar seus filhos! Não quer consolação, porque já não existem (Jr 31,15)!'
    Com a morte de Herodes, o anjo do Senhor apareceu em sonhos a José, em Egito, e disse:
    - Levanta-te, toma o Menino e Sua mãe e retorna à terra de Israel, porque morreram aqueles que atentavam contra a vida do Menino.
    José levantou-se, tomou o Menino e Sua mãe e foi para a terra de Israel.
    Ao ouvir, porém, que Arquelau reinava em Judeia, em lugar de seu pai Herodes, não ousou ir para lá. Divinamente avisado em sonhos, retirou-se para a província de Galileia e veio habitar na cidade de Nazaré, para que se cumprisse o que foi dito pelos Profetas: 'Será chamado Nazareno'." 
                                                  Mt 2,9-23


APRESENTAÇÃO DO MENINO JESUS NO TEMPLO DE JERUSALÉM

    Complementarmente, se São Mateus não registra a passagem da Sagrada Família por Jerusalém para a Apresentação do Senhor, quando José e Maria, mesmo sob as ameaças de Herodes, fiel e corajosamente vão cumprir suas obrigações religiosas, São Lucas não registra a fuga para o Egito após a Apresentação, indicando apenas o retorno a Nazaré. Sem dúvida, outro luminoso momento:

    "Completados que foram os oito dias para ser circuncidado o Menino, foi-Lhe posto o Nome de Jesus, como Lhe tinha chamado o anjo antes de ser concebido no seio materno.
    Concluídos, segundo a Lei de Moisés (Lv 12,4), os dias da purificação de Sua mãe, levaram-nO a Jerusalém para apresentá-Lo ao Senhor, conforme o que está escrito na Lei do Senhor: 'Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor (Êx 13,2)'; e para oferecerem o sacrifício prescrito pela Lei do Senhor, um par de rolas ou dois pombinhos (Lv 12,8).
    Ora, havia em Jerusalém um homem chamado Simeão. Este homem, justo e piedoso, esperava a Consolação de Israel, e o Espírito Santo estava nele. Fora-lhe revelado pelo Espírito Santo que não morreria sem primeiro ver o Cristo do Senhor. Impelido pelo Espírito Santo, foi ao Templo. E tendo os pais apresentado o Menino Jesus, para a respeito d'Ele cumprirem os preceitos da Lei, tomou-O em seus braços e louvou a Deus nestes termos:
    - Agora, Senhor, deixai ir em Paz Vosso servo, segundo Vossa Palavra. Porque meus olhos viram Vossa Salvação que preparastes diante de todos povos, como Luz para iluminar as nações e para a Glória de Vosso povo de Israel.
    Seu pai e Sua mãe estavam admirados das coisas que d'Ele se diziam. Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe:
    - Eis que este Menino está destinado a ser causa de queda e de soerguimento para muitos homens em Israel, e a ser sinal que provocará contradições, a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações. E uma espada transpassará tua alma.
    Também havia uma Profetisa chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era de avançada idade. Depois de ter vivido sete anos com seu marido desde sua virgindade, ficara viúva, e agora com oitenta e quatro anos não se apartava do Templo, servindo a Deus noite e dia em jejuns e orações. Chegando ela à mesma hora, louvava a Deus e falava de Jesus a todos aqueles que em Jerusalém esperavam a libertação.
    Após terem observado tudo segundo a Lei do Senhor, voltaram para Galileia, à Sua cidade de Nazaré.
    O Menino ia crescendo e fortificava-Se: estava cheio de Sabedoria, e a Graça de Deus n'Ele repousava." 
                                                Lc 2,21-39


JESUS ENSINANDO NO TEMPLO AOS 12 ANOS DE IDADE

    Mais um memorável acontecimento na história da Sagrada Família é quando o Menino Jesus permanece em Jerusalém após o final da semana da Páscoa. Foi narrado por São Lucas:

    Tendo Ele atingido doze anos, subiram a Jerusalém, segundo o costume da festa. Acabados os dias da festa, quando voltavam, ficou o Menino Jesus em Jerusalém, sem que Seus pais o percebessem.
    Pensando que Ele estivesse com Seus companheiros de comitiva, andaram caminho de um dia e buscaram-nO entre os parentes e conhecidos. Mas não O encontrando, voltaram a Jerusalém, à procura d'Ele.
    Três dias depois acharam-nO no Templo, sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os. Todos que O ouviam estavam maravilhados com a Sabedoria de Suas respostas.
    Quando eles O viram, ficaram admirados. E Sua mãe disse-Lhe:
    - Meu filho, que nos fizeste?! Eis que Teu pai e eu andávamos à Tua procura, cheios de aflição.
    Respondeu-lhes Ele:
    - Por que Me procuráveis? Não sabíeis que devo estar na Casa de Meu Pai?
    Eles, porém, não compreenderam o que Ele lhes dissera. Em seguida, desceu com eles a Nazaré e era-lhes submisso.
    Sua mãe guardava todas estas coisas em seu coração.
    E Jesus crescia em estatura, em Sabedoria e Graça, diante de Deus e dos homens." 
                                               Lc 2,41-52


DETALHES

    Mesmo tendo morrido quando Jesus estava no início de Sua juventude, São José não foi esquecido pelo povo de Nazaré. Ao contrário, Jesus, ao iniciar Sua vida pública, ainda era associado a ele. O povo vai perguntar-se em Nazaré: "Não é Este o Filho do carpinteiro?" Mt 13,55a
    São Lucas é assertivo: "Quando Jesus começou Seu Ministério tinha cerca de trinta anos, e era tido por filho de José..." Lc 3,23a
    Tanto que dois Apóstolos, que eram daquela região, assim vão identificá-Lo no primeiro dia em que O encontraram: "Filipe encontra Natanael e diz-lhe: 'Achamos Aquele de Quem Moisés escreveu na Lei e que os Profetas anunciaram: é Jesus de Nazaré, filho de José." Jo 1,45
    Assim como São José, que era de Belém (cf. Lc 2,4), Nossa Senhora também era da tribo de Davi, como a Carta de São Paulo aos Romanos afirmou: "... acerca de Seu Filho Jesus Cristo, Nosso Senhor, descendente de Davi quanto à carne..." Rm 1,3
    E igualmente tinha parentes em Judeia, ainda que já em avançada idade, como era a mãe de São João Batista, nas palavras do Arcanjo São Gabriel: "'Isabel, tua parenta, também concebeu um filho em sua velhice. E já está no sexto mês aquela que é tida por estéril, porque para Deus nenhuma coisa é impossível.' Naqueles dias, Maria levantou-se e foi às pressas às montanhas, a uma cidade de Judá." Lc 1,36-37.39
    Mas foi na casa de familiares de São José que eles se alojaram durante o recenseamento, e aí Jesus nasceu, recebendo as visitas dos pastores e dos Santos Reis: "Entrando na casa, acharam o menino com Maria, Sua mãe." Mt 2,11a
    Na verdade, a casa estava cheia, e eles abrigaram-se no estábulo anexo à casa, que era firmada em uma rocha: "E deu à luz Seu filho Primogênito, e, envolvendo-O em faixas, reclinou-O num presépio, porque na sala não havia lugar para eles." Lc 2,7
    O Amado Médico mais uma vez vai dizê-lo, especificamente falando num cocho, quando os pastores de Belém chegaram para adorá-Lo: "Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o menino deitado na manjedoura." Lc 2,16
    Como o povo de Nazaré e de Galileia, São José e Nossa Senhora eram pobres, o que se atesta pelo valor das oferendas feitas no dia da Apresentação do Senhor. Quanto aos ricos presentes dados pelos Santos Reis, eram pertences de Jesus, e eles reservaram-nos para os custos da viagem e da permanência de alguns anos em Egito: "Concluídos, segundo a Lei de Moisés (Lv 12,4), os dias da purificação de Sua mãe, levaram-nO a Jerusalém para apresentá-Lo ao Senhor, conforme o que está escrito na Lei do Senhor: 'Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor (Ex 13,2)'; e para oferecerem o sacrifício, como prescrito pela Lei do Senhor, um par de rolas ou dois pombinhos (Lv 12,8)." Lc 2,22-24
    De fato, o Livro do Levítico prescrevia: "Cumpridos esses dias, por um filho ou por uma filha, apresentará ao sacerdote, à entrada da Tenda de Reunião, um cordeiro de um ano em holocausto, e um pombinho ou uma rola em sacrifícios pelo pecado. Se suas posses não lhe permitirem trazer um cordeiro, tomará duas rolas ou dois pombinhos, uma para o holocausto e outro para o sacrifício pelo pecado. O sacerdote fará por ela a expiação, e será purificada." Lv 12,6.8
    Depois da morte de São José, Jesus assumiu a carpintaria para sustentar Sua mãe, pois por essa profissão Ele foi reconhecido no início de Sua vida pública, como está no Evangelho segundo São Marcos: "Não é Ele o carpinteiro, o Filho de Maria?" Mc 6,3a
    Ora, é isso que manda o quarto dos Dez Mandamentos, como se lê no Livro de Êxodo, e Jesus não haveria de desrespeitá-lo: "Honra teu pai e tua mãe, para que teus dias se prolonguem sobre a terra que te dá o Senhor, Teu Deus." Êx 20,12
    Além de Judeia, Maria tinha parentes em Nazaré, como vemos no dia em que, aos 12 anos, Jesus permaneceu em Jerusalém depois da Páscoa, e Seus pais voltaram sem Ele: "Pensando que Ele estivesse com Seus companheiros de comitiva, andaram caminho de um dia e buscaram-nO entre os parentes e conhecidos." Lc 2,44
    Aliás, Maria escolheu morar em Nazaré exatamente porque aí estava a maior e mais carente parte de sua parentela, pois São Joaquim e Santa Ana a tiveram já em avançada idade e ela logo estaria sozinha. E foi aí que o Arcanjo Gabriel lhe fez a Anunciação: "No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade de Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem que se chamava José, da casa de Davi e o Nome da virgem era Maria." Lc 1,26-27
    São Mateus vai nomear os primos de Jesus, que chamava de irmãos conforme o costume judaico, pois não havia a palavra 'primo' em seu idioma: "Não são Seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas? E Suas irmãs não vivem todas entre nós?" Mt 13,55b-56a
    Pois Nossa Senhora tinha em Nazaré ao menos uma prima, também chamada de 'irmã' no Evangelho segundo São João, quando narra a cena da crucificação: "Junto à Cruz de Jesus estavam de pé Sua mãe, a irmã de Sua mãe, Maria, mulher de Cleófas, e Maria Madalena." Jo 19,25
    São Marcos, narrando a mesma cena, aponta essa prima como mãe de dois destes primos de Jesus: "Ali também se achavam umas mulheres, observando de longe, entre as quais Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o Menor, e de José..." Mc 15,40
    São Mateus faz o mesmo registro: "Entre elas achavam-se Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu." Mt 24,56
    Dois destes primos vão tornar-se Apóstolos de Jesus, e São Marcos diz que o nome do pai de São Tiago Menor é Alfeu, a forma em aramaico do grego Cleófas, como registrado por São João Evangelista (cf. Jo 19,25): "Escolheu estes Doze: Simão, a quem pôs o nome de Pedro; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, aos quais pôs o nome de Boanerges, que quer dizer Filhos do Trovão. Ele também escolheu André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu; Tadeu, Simão, o Zelota; e Judas Iscariotes, que O entregou." Mc 3,16-19
    E São Lucas, dando a mesma informação, aponta São Judas Tadeu, outro Apóstolo, como irmão de São Tiago Menor, que era o quarto dos 'irmãos' de Jesus na narrativa de São Mateus: "Simão, a quem deu o sobrenome de Pedro; André, seu irmão; Tiago, João, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu; Simão, chamado Zelota; Judas, irmão de Tiago; e Judas Iscariotes, aquele que foi o traidor." Lc 6,14-16
    Estes, aliás, começaram a seguir Jesus desde os primeiros dias, logo após a transformação da água em vinho, como São João Apóstolo narrou: "Depois disso, desceu para Cafarnaum, com Sua mãe, Seus irmãos e Seus discípulos. E ali só demoraram poucos dias." Jo 2,12
    Os demais também O seguiam de perto: "Jesus falava ainda à multidão, quando veio Sua mãe e Seus irmãos e esperavam do lado de fora a ocasião para falar-Lhe." Mt 12,46
    Mas nem todos Seus primos O acolheram. Pelo contrário, mesmo sabendo que Ele estava jurado de morte em Judeia, d'Ele debochavam: "Aproximava-se a festa dos judeus, chamada dos Tabernáculos. Seus irmãos disseram-Lhe: 'Parte daqui e vai para Judeia, a fim de que também Teus discípulos vejam as obras que fazes. Pois quem deseja ser conhecido em público não faz coisa alguma ocultamente. Já que fazes essas obras, revela-Te ao mundo.' Com efeito, nem mesmo Seus irmãos acreditavam n'Ele." Jo 7,2-5
    No primeiro retorno a Nazaré após iniciar Seu Ministério, Ele mesmo iria reclamar de Sua parentela: "Mas Jesus disse-lhes: 'Um Profeta só é desprezado em sua pátria, entre seus parentes e em sua própria casa.'" Mc 6,4
    Porque isso afetava Sua Missão: "Ali não pôde fazer milagre algum. Apenas curou alguns poucos enfermos, impondo-lhes as mãos. E admirou-Se da incredulidade deles." Mc 6,5-6a
    Sem dúvida, eles tinham-nO em conta de um louco: "Dirigiram-se, em seguida, a uma casa. Aí, de novo afluiu tanta gente que nem podiam tomar alimento. Quando os seus o souberam, saíram para retê-Lo, pois diziam: 'Ele enlouqueceu.'" Mc 3,20-21
    O episódio da Páscoa aos 12 anos, enfim, já mostrava que a Sagrada Família era composta apenas de Jesus, Maria e José, como vimos: "E Sua mãe disse-Lhe: 'Meu Filho, que nos fizeste?! Eis que Teu pai e eu andávamos à Tua procura, cheios de aflição" Lc 2,48
    Assim também a cena da crucificação, pois se Nossa Senhora tivesse outro filho além de Jesus não iria morar com São João Evangelista: "Junto à Cruz de Jesus estavam de pé Sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. Quando Jesus viu Sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à Sua mãe: 'Mulher, eis aí teu filho.' Depois disse ao discípulo: 'Eis aí tua mãe.' E dessa hora em diante o discípulo levou-a para sua casa." Jo 19,25-27
    Por fim, invocamos um antigo, respeitoso e doce costume de Nordeste de Brasil, onde o senhor e a senhora de quem não se sabe os nomes são carinhosamente chamados de 'Seu José' e 'Dona Maria', ao que prontamente atendem.



    Na Espanha, em Barcelona, uma monumental catedral é dedicada à Sagrada Família, um projeto do arquiteto Gaudi.


    E mais um dos grandes sinais de Deus, bem como do valor por Ele dado à Sagrada Família, está na preservação da Santa Casa de Nazaré, miraculosamente transladada por anjos pelos céus até Loreto, em Itália, ao fim do século XIII.


    Sagrada Família, rogai por nós!