quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Textos para Celular

 
Anuário de Leituras Bíblicas

Acesso: dizemasescrituras.blogspot.com

Os Milagres de Cristo


    Os milagres realizados por Jesus foram tão verazes e evidentes que, aparentemente, ocorreriam até mesmo sem Sua ciência, como que por mera propriedade de Sua natureza divina. Contudo, por Sua Onisciência, Ele sabia muito bem o que estava acontecendo, e consentia nessas Graças.
    No caso da mulher hemorroíssa, porém, esperando que ela testemunhasse a Graça alcançada, Jesus quis ver quem O havia tocado, não escondendo que d'Ele saía 'uma força' quando operava milagres. Deu-se em Cafarnaum, da leitura do Evangelho segundo São Lucas: "Ora, uma mulher que padecia de fluxo de sangue havia doze anos, e com médicos tinha gasto todos seus bens sem que nenhum a pudesse curar, aproximou-se d'Ele por trás e tocou-Lhe a orla do manto. E no mesmo instante parou-lhe o fluxo de sangue. Jesus perguntou: 'Quem Me tocou?' Como todos negassem, Pedro e os que estavam com Ele disseram: 'Mestre, a multidão aperta-Te por todos lados...' Jesus replicou: 'Alguém tocou-Me, porque percebi que de Mim saiu uma força!' A mulher viu-se descoberta e foi tremendo, e prostrou-se a Seus pés. E declarou diante de todo povo o motivo porque O havia tocado, e como logo ficara curada. Jesus disse-lhe: 'Minha filha, tua te salvou. Vai em Paz.'" Lc 8,43-48
    Mas essa mulher não foi a única que tentou alcançar uma Graça dessa maneira. O Amado Médico já havia registrado gente até de outro país, na Galileia mesmo, logo após Ele ter escolhido os Doze Apóstolos: "Descendo com eles, parou numa planície. Aí se achava um grande número de Seus discípulos e uma grande multidão de pessoas vindas da Judeia, de Jerusalém, da região marítima, de Tiro e Sidônia, que tinham vindo para ouvi-Lo e ser curadas de suas enfermidades. E os que eram atormentados dos imundos espíritos ficavam livres. Todo povo procurava tocá-Lo, pois d'Ele saía uma força que a todos curava." Lc 6,19
    O Evangelho segundo São Marcos fez outro registro de fato dado nas margens do Mar da Galileia, depois que Ele andou sobre as águas: "Navegaram para o outro lado e chegaram à região de Genesaré, onde aportaram. Assim que saíram da barca, o povo reconheceu-O. Percorrendo toda aquela região, começaram a levar, em leitos, os que padeciam de algum mal, para o lugar onde ouviam dizer que Ele Se encontrava. Onde quer que Ele entrasse, fosse nas aldeias ou nos povoados, ou nas cidades, punham os enfermos nas ruas e pediam-Lhe que ao menos deixassem tocar na orla de Suas vestes. E todos que tocavam em Jesus ficavam sãos." Mc 6,53-56
    Assim se explica porque Ele era seguido por multidões desde o início de Sua vida pública, como o Evangelho segundo São Mateus atesta: "Jesus percorria toda Galileia, ensinando em suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino, curando todas doenças e enfermidades entre o povo. Sua fama espalhou-se por toda Síria: traziam-lhe os doentes e os enfermos, os possessos, os lunáticos, os paralíticos. E Ele a todos curava. Grandes multidões acompanharam-no da Galileia, da Decápole, de Jerusalém, da Judeia e dos países do outro lado do Jordão." Mt 4,23-25
    Isso teve início ainda em Cafarnaum, para onde foi após deixar Nazaré (cf. Mt 4,13), e à frente da casa de São Pedro: "Pela tarde, apresentaram-Lhe muitos possessos de demônios. Com uma palavra Ele expulsou os espíritos, e curou todos enfermos." Mt 8,16
    E depois que daí partiu seguindo Sua Missão, já não podia entrar em cidades ou aldeias: "Ele retirou-Se dali, pregando em todas sinagogas e por toda Galileia, e expulsando demônios. D'Ele aproximou-se um leproso, suplicando-Lhe de joelhos: 'Se queres, podes limpar-me.' Jesus compadeceu-Se dele, estendeu a mão, tocou-o e disse-lhe: 'Eu quero, sê curado.' E imediatamente desapareceu dele a lepra, e foi purificado. Jesus despediu-o com esta severa admoestação: 'Vê que não o digas a ninguém. Mas vai, mostra-te ao sacerdote, e por tua purificação apresenta a oferenda prescrita por Moisés, para servir-lhe de testemunho.' Este homem, porém, logo que se foi, começou a propagar e divulgar o acontecido, de modo que publicamente Jesus não podia entrar numa cidade. Conservava-Se fora, em despovoados lugares, e de toda parte vinham ter com Ele." Mc 1,40-45
    Montanhas, montes e colinas eram estratégicos lugares, que ensejaram, numa das vezes, a segunda multiplicação de pães e peixes: "Jesus saiu daquela região e voltou para perto do mar da Galileia. Subiu a uma colina e ali Se sentou. Então numerosa multidão aproximou-se d'Ele, trazendo consigo mudos, cegos, coxos, aleijados e muitos outros enfermos. Puseram-nos aos Seus pés e Ele curou-os, de sorte que o povo estava admirado ante o espetáculo dos mudos que falavam, daqueles aleijados curados, de coxos que andavam, dos cegos que viam; e glorificavam ao Deus de Israel." Mt 15,29-31
    O Mar da Galileia também servia de defesa, e já após um breve retorno a Cafarnaum: "Jesus retirou-Se com Seus discípulos para o mar, e seguia-O uma grande multidão vinda da Galileia. E da Judeia, de Jerusalém, da Idumeia, do além-Jordão e dos arredores de Tiro e de Sidônia também veio a Ele uma grande multidão ao ouvir o que ele fazia. Ele ordenou a Seus discípulos que Lhe aprontassem uma barca, para que a multidão não O comprimisse. Curou a muitos, de modo que todos que padeciam de algum mal arrojavam-se a Ele para tocá-Lo." Mc 3,9-10
    Mas Seu Sagrado Coração não permitia esquivar-se, como desde a primeira vez que multiplicaria pães e peixes: "A essa notícia, Jesus partiu dali numa barca para retirar-Se a um deserto lugar, mas o povo soube e a multidão das cidades seguiu-O a pé. Quando desembarcou, vendo Jesus essa numerosa multidão, moveu-Se de compaixão para ela e curou seus doentes." Mt 14,13-14
    E essa foi uma constante, até quando começou a subir a Jerusalém pela última vez: "Após esses discursos, Jesus deixou a Galileia e veio para a Judeia, além do Jordão. Uma grande multidão seguiu-O, e Ele curou seus doentes." Mt 19,1-2
    Mesmo depois de realizar cura num sábado, que alguns líderes religiosos condenavam: "Os fariseus saíram dali e deliberaram sobre os meios de matá-Lo. Jesus soube disso e afastou-Se daquele lugar. Uma grande multidão seguiu-O, e Ele curou todos seus doentes. Apresentaram-Lhe, depois, um possesso cego e mudo. Jesus curou-o de tal modo que este falava e via. A multidão, admirada, dizia: 'Não será este o Filho de Davi?'" Mt 12,14-15.22-23
    Até em Sua terra, onde não foi acolhido em vida pública, Jesus era reconhecido como um realizador de desconcertantes milagres: "Foi para Sua cidade e ensinava na sinagoga, de modo que todos diziam admirados: 'De onde Lhe vem esta Sabedoria e esta miraculosa força?' E não sabiam o que d'Ele dizer. Disse-lhes, porém, Jesus: 'É só em sua pátria e em sua família que um Profeta é menosprezado.' E por causa da falta de confiança deles, ali operou poucos milagres." Mt 13,54.57-58


A INVEJA DOS 'RELIGIOSOS' E A DOS PAGÃOS

    Os prodígios de Jesus eram tão frequentes e impactantes que os fariseus, como vimos, se recorriam de supostas prescrições da Lei para acusá-Lo. Tudo por inveja de Sua autoridade e despeito de Sua modesta origem, mas Ele desmascarava-os e o povo embevecia-se com o triunfo da Verdade: "Jesus ensinava na sinagoga num sábado. Ali estava uma mulher que, havia dezoito anos, era possessa de um espírito que a detinha doente: andava curvada e absolutamente não podia erguer-se. Ao vê-la, Jesus chamou-a e disse-lhe: 'Estás livre de tua doença.' Impôs-lhe as mãos e no mesmo instante ela endireitou-se, glorificando a Deus. Mas o chefe da sinagoga, indignado de ver que Jesus curava no sábado, disse ao povo: 'São seis os dias em que se deve trabalhar. Vinde, pois, nestes dias para curar-vos, mas não em dia de sábado.' 'Hipócritas!', disse-lhes o Senhor. 'Não desamarra cada um de vós no sábado seu boi ou seu jumento da manjedoura, para levá-los a beber? Esta filha de Abraão, que Satanás paralisava há dezoito anos, não devia ser livre desta prisão, em dia de sábado?' Ao proferir estas palavras, todos Seus adversários encheram-se de confusão, ao passo que todo povo, à vista de todos milagres que Ele realizava, se entusiasmava." Lc 13,10-17
    Mas nem todos religiosos eram insensíveis às demonstrações de Seus poderes. No Evangelho segundo São João, um notável dos fariseus, que eram Seus principais opositores, logo na primeira Páscoa em vida pública reconheceu Suas maravilhas, assim como Sua divina origem: "Havia um homem entre os fariseus, chamado Nicodemos, príncipe dos judeus. Este foi ter com Jesus à noite, e disse-Lhe: 'Rabi, sabemos que és Mestre vindo de Deus, pois ninguém pode fazer esses milagres que fazes se Deus não estiver com ele.'" Jo 3,1-2
    A alguns religiosos, porém, por causa de suas tacanhas e materialistas visões, Jesus prometeu que não seria dado sinal algum a não ser Sua Ressurreição: "Então alguns escribas e fariseus tomaram a palavra: 'Mestre, quiséramos ver-Te fazer um milagre.' Respondeu-lhes Jesus: 'Esta adúltera e perversa geração pede um sinal, mas não lhe será dado outro sinal que aquele do Profeta Jonas: do mesmo modo que Jonas esteve três dias e três noites no ventre do peixe, assim o Filho do Homem ficará três dias e três noites no seio da terra.'" Mt 12,38-40
    Entretanto, até entre os soldados romanos Sua fama já arrebatava corações, pois viam Seus poderes como última esperança. Jesus ainda chegou a argumentar com um oficial que a Salvação é mais importante que a saúde do corpo, mas, diante do desespero deste pai, curou seu filho mesmo sem ir ao seu encontro: "Ele voltou, pois, a Caná da Galileia, onde transformara água em vinho. Havia então em Cafarnaum um oficial do rei, cujo filho estava doente. Ao ouvir que Jesus vinha da Judeia para a Galileia, foi a Ele e rogou-Lhe que descesse e curasse seu filho, que estava prestes a morrer. Disse-lhe Jesus: 'Se não virdes milagres e prodígios, não credes...' Pediu-Lhe o oficial: 'Senhor, desce antes que meu filho morra!' 'Vai', disse-lhe Jesus, 'teu filho está passando bem!' O homem acreditou na Palavra de Jesus e partiu. Enquanto ia descendo, os criados vieram-lhe ao encontro e disseram-lhe: 'Teu filho está passando bem.'" Jo 4,46-51
    E foi de um estrangeiro que Ele viu das maiores manifestações de fé: "Entrou Jesus em Cafarnaum. Um centurião veio a Ele e fez-lhe esta súplica: 'Senhor, meu servo está em casa, de cama, paralítico, e sofre muito.' Disse-lhe Jesus: 'Eu irei e curá-lo-ei.' Respondeu o centurião: 'Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha casa. Dizei uma só palavra e meu servo será curado. Pois eu também sou um subordinado, e tenho soldados às minhas ordens. Eu digo a um: Vai, e ele vai; a outro: Vem, e ele vem; e a meu servo: Faze isto, e ele faz...' Ouvindo isto, cheio de admiração, disse Jesus aos presentes: 'Em Verdade, digo-vos: não encontrei semelhante fé em ninguém de Israel.' Depois, dirigindo-Se ao centurião, disse: 'Vai, seja-te feito conforme a tua fé.' Na mesma hora, o servo ficou curado." Mt 8,5-10.13
    O próprio Herodes, apesar de seus poderes de rei, com a consciência pesada por ter ordenado a decapitação de São João Batista, tinha medo de Jesus: "O rei Herodes ouviu falar de Jesus, cujo Nome Se tornara célebre. Dizia-se: 'João Batista ressurgiu dos mortos, e por isso o poder de fazer milagres opera n'Ele.'" Mc 16,14


A REPERCUSSÃO EM JERUSALÉM

    As grandes festas judaicas em Jerusalém, por aqueles tempos, já não eram mais as mesmas sem Jesus. Tanto que, em Sua última Páscoa, sabendo que Ele era perseguido pelos religiosos, o povo perguntava-se se Ele viria ou não: "Estava próxima a Páscoa dos judeus, e muita gente de todo país subia a Jerusalém antes da Páscoa para purificar-se. Procuravam Jesus e falavam uns com os outros no Templo: 'Que vos parece? Achais que Ele não virá à festa?' Mas os sumos sacerdotes e os fariseus tinham dado ordem para que O denunciasse todo aquele que soubesse onde Ele estava, para prenderem-nO." Jo 11,55-57
    Realmente, desde a primeira Páscoa que lá esteve em Sua vida pública, o povo, por causa de Seus milagres, já O tinha em conta de um enviado de Deus: "Enquanto Jesus celebrava em Jerusalém a festa da Páscoa, muitos creram em Seu Nome, à vista dos milagres que fazia." Jo 2,23
    Sempre se criava uma grande expectativa a cada nova festa em Jerusalém, como na das Tendas: "Mas quando Seus irmãos tinham subido, então também subiu Ele à festa, não em público, mas ocultamente. Buscavam-nO os judeus durante a festa e perguntavam: 'Onde está Ele?' E na multidão só se discutia a Seu respeito. Uns diziam: 'É homem de bem.' Outros, porém, diziam: 'Não é! Ele seduz o povo.' Ninguém, contudo, ousava d'Ele livremente falar com medo dos judeus." Jo 7,10-13
    E Ele tinha que Se defender em públicos debates com os religiosos, como aquele sobre a cura do homem do tanque de Betesda, que estava paralítico havia trinta e oito anos. Era Sua segunda festa em Jerusalém, depois que iniciou Sua Missão: "Replicou Jesus: 'Fiz uma só obra, e todos vós maravilhais-vos! Moisés deu-vos a circuncisão, se bem que ela não é de Moisés, mas dos patriarcas, e até no sábado circuncidais um homem! Se um homem recebe a circuncisão em dia de sábado, e isso sem violar a Lei de Moisés, por que vos indignais Comigo, que tenho curado um homem em todo seu corpo em dia de sábado? Não julgueis pela aparência, mas julgai conforme a justiça.'" Jo 7,21-24
    Pois muita gente, profundamente impressionada com tantas maravilhas que via, ficava divagando sobre Sua Pessoa: "Muitos do povo, porém, creram n'Ele e perguntavam: 'Quando vier o Cristo, fará mais milagres que Este faz?'" Jo 7,31
    Mas não somente Jesus realizava milagres, como também Seus Apóstolos, após serem nominalmente por Ele chamados e investidos de autoridade. Mas só depois de um bom tempo de tê-los escolhido: "Reunindo Jesus os Doze Apóstolos, deu-lhes poder e autoridade sobre todos demônios, e para curar enfermidades. Enviou-os a pregar o Reino de Deus e a curar os enfermos. Partiram, pois, e percorriam as aldeias, pregando o Evangelho e fazendo curas por toda parte." Lc 9,1-2.6
    São Marcos também anotou, dizendo dos Doze após a visita com o Mestre a Nazaré: "Expeliam numerosos demônios, ungiam com óleo a muitos enfermos e curavam-nos." Mc 6,13
    Mesmo os 72 discípulos obtiveram tal missão, conforme São Lucas, mas estes só após o segundo anúncio de Sua Paixão, enquanto aos poucos se dirigiam a Jerusalém: "Em qualquer cidade em que entrardes e receberem-vos, comei o que se vos servir. Curai os enfermos que nela houver e dizei-lhes: 'O Reino de Deus está próximo.'" Lc 10,8-9
    E a multidão que se formou ao Seu redor pouco antes do episódio da multiplicação dos pães e dos peixes, além de querer ouvi-Lo, buscava-O com expectativa de curar seus enfermos: "Depois disso, Jesus atravessou o lago da Galileia, que é o de Tiberíades. Seguia-O uma grande multidão, porque via os milagres que fazia em beneficio dos enfermos. Jesus subiu a um monte e ali sentou-Se com Seus discípulos." Jo 6,1-3
    Mas muitos na multidão ainda O procuravam por razões materiais, como pelos pães e peixes que viram multiplicados, ou por curiosidades, como andar sobre as águas. De toda forma, Ele aproveitava para falar-lhes do Pão da Vida Eterna: "À vista desse milagre de Jesus (pães e peixes), aquela gente dizia: 'Este verdadeiramente é o Profeta que há de vir ao mundo.' Encontrando-O na outra margem do lago, perguntaram-Lhe: 'Mestre, quando chegaste aqui?' Respondeu-lhes Jesus: 'Em Verdade, em Verdade, digo-vos: buscais-Me, não porque vistes os milagres, mas porque comestes dos pães e ficastes fartos. Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que dura até a Vida Eterna, que o Filho do Homem vos dará. Pois n'Ele imprimiu Deus Pai Seu sinal.'" Jo 6,14.25-27
    Com efeito, isso havia sido previsto no Livro do Profeta Isaías: "Naquele tempo, o Rebento de Jessé, que Se ergue como um sinal para os povos, será procurado pelas nações e gloriosa será Sua morada." Is 11,10
    A ressurreição de São Lázaro também foi um grande acontecimento entre o povo de Israel, e motivou o que ficou conhecido como o Domingo de Ramos: "A multidão, pois, que se achava com Ele quando chamara Lázaro do sepulcro e o ressuscitara, aclamava-O. Por isso, o povo saía-Lhe ao encontro, porque tinha ouvido que Jesus fizera aquele milagre." Jo 12,17-18
    Mas para os líderes religiosos de Israel, a situação estaria fugindo ao controle depois desta ressurreição, que se deu ali tão perto da Cidade Santa. Temiam que os romanos vissem em Jesus o início de uma rebelião, da qual seriam cúmplices. E mais uma vez eram os milagres de Jesus que incendiavam a multidão: "Muitos dos judeus, que tinham vindo a Marta e Maria e viram o que Jesus fizera, creram n'Ele. Os pontífices e os fariseus convocaram o conselho e disseram: 'Que faremos? Esse homem multiplica os milagres. Se O deixarmos proceder assim, todos crerão n'Ele, e os romanos virão e arruinarão nossa cidade e toda nação.'" Jo 11,45.47-48
    Entretanto, mesmo entre os principais sacerdotes muitos já não tinham como não acolhê-Lo: "Embora tivesse feito tantos milagres na presença deles (dos judeus), não acreditavam n'Ele. Não obstante, muitos dos chefes também creram n'Ele, mas por causa dos fariseus não o manifestavam, para não serem expulsos da sinagoga." Jo 12,37.42
    Pode-se imaginar, assim, uma grande dúvida que havia muito pairava entre Seus mais ferrenhos inimigos: "Celebrava-se em Jerusalém a festa da Dedicação. Era inverno. Jesus passeava no Templo, no pórtico de Salomão. Os judeus rodearam-nO e perguntaram-Lhe: 'Até quando nos deixarás na incerteza? Se Tu és o Cristo, dize-nos claramente.'" Jo 10,22-24
    E na Páscoa em que foi crucificado, viu-se uma calorosa aclamação a Jesus também no Templo: "Quando Ele entrou em Jerusalém, alvoroçou-se toda cidade, perguntando: 'Quem é Este?' A multidão respondia: 'É Jesus, o Profeta de Nazaré da Galileia.' Os cegos e os coxos vieram a Ele no Templo e Ele curou-os, com grande indignação dos príncipes dos sacerdotes e dos escribas que assistiam a Seus milagres e ouviam os meninos gritar no Templo: 'Hosana ao filho de Davi!' Disseram-Lhe eles: 'Ouves o que dizem eles?' 'Perfeitamente', respondeu-lhes Jesus. 'Nunca lestes estas palavras: Da boca dos meninos e das crianças de peito tirastes Vosso louvor (Sl 8,3)?'" Mt 21,10-11.14-16
    Tantos foram Seus prodígios que São João Apóstolo se viu obrigado a registrar ao fim de seu Evangelho: "Fez Jesus, na presença de Seus discípulos, ainda muitos outros milagres que não estão escritos neste Livro. Jesus fez muitas outras coisas. Se fossem escritas uma por uma, penso que nem o mundo inteiro poderia conter os livros que se deveriam escrever." Jo 20,30;21,25
    A intenção de Jesus com esses milagres, porém, era demonstrar a divina origem de Seus ensinamentos. Tanto que, durante a festa das Tendas, Ele vai propôr no Templo a toda gente: "Se alguém quiser cumprir a vontade de Deus, distinguirá se Minha Doutrina é de Deus ou se falo de Mim mesmo." Jo 7,17
    Por isso, humildemente pediu aos judeus em Jerusalém na festa da Dedicação, quando eles já tinham pedras na mão para apedrejá-Lo: "Se Eu não faço as obras de Meu Pai, não Me creiais. Mas se as faço, e se não quiserdes crer em Mim, crede em Minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em Mim e Eu no Pai." Jo 10,37-38
    Pedido, aliás, que fez até mesmo a São Filipe Apóstolo, ao falar-lhe de Sua Comunhão com o Pai, após a Santa Ceia: "Crede-Me: estou no Pai, e o Pai em Mim. Crede-o ao menos por causa destas obras." Jo 14,11
    Com efeito, quando interrogado pela multidão ainda ao Mar da Galileia, Ele assim resumiu a Missão que Lhe foi dada pelo Pai: "Perguntaram-Lhe: 'Que faremos para praticar as obras de Deus?' Respondeu-lhes Jesus: 'A obra de Deus é esta: que creiais n'Aquele que Ele enviou.'" Jo 6,28-29
    O próprio São João Evangelista assim vai justificar os registros que fez de Seus milagres: "Mas estes foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e crendo tenhais a Vida em Seu Nome." Jo 20,31


O PODER DA IGREJA

    E mais uma vez, após ressuscitar, Jesus investiu Seus Apóstolos e discípulos com autoridade e poder. Essa é Sua força que permanece entre os homens para a edificação de Sua Igreja, que tem a notória função de confirmar Sua divindade. Ele disse aos Onze no Domingo da Ressurreição: "'Estes milagres acompanharão os que crerem: expulsarão demônios em Meu Nome, falarão novas línguas, manusearão serpentes e, se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal. Imporão as mãos aos enfermos e eles ficarão curados.' Os discípulos partiram e pregaram por toda parte. O Senhor cooperava com eles, e confirmava Sua Palavra com os milagres que a acompanhavam." Mc 16,17-18.20
    Com efeito, como Jesus mesmo afirmou quando foi reconhecido por São Pedro como o Messias, a Igreja é invencível: "As portas do inferno não prevalecerão contra ela." Mt 16,18b
    De maior importância, pois, é o poder de perdoar os pecados, que Ele exclusivamente deu a Seus Sacerdotes, Graça que nos é concedida pelo Sacramento da Reconciliação com Deus. Também foi instituído no Domingo da Ressurreição: "Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, sê-lhes-ão perdoados. Àqueles a quem os retiverdes, sê-lhes-ão retidos." Jo 20,22a-23
    Pois assim temos a Redenção, que é a Missão de Jesus, porque, segundo o sacerdote Zacarias, pai de São João Batista, Ele veio: "... para dar a Seu povo conhecer a Salvação, pelo perdão dos pecados." Lc 1,77
    De fato, Ele colocava o perdão dos pecados como muito mais importante que uma cura: "Alguns dias depois, Jesus novamente entrou em Cafarnaum e souberam que Ele estava em casa. Reuniu-se uma tal multidão, que não podiam encontrar lugar nem mesmo junto à porta. E Ele instruía-os. Trouxeram-Lhe um paralítico, carregado por quatro homens. Como não pudessem apresentar-Lho por causa da multidão, descobriram o teto acima do lugar onde Jesus Se achava e, por uma abertura, desceram o leito em que jazia o paralítico. Jesus, vendo-lhes a fé, disse ao paralítico: 'Filho, perdoados são-te os pecados.'" Mc 2,1-5
    E aí está o poder do Santíssimo Sacramento, pois é por Seu Sacrifício que nos é concedida a Redenção. Ele pronunciou durante sua instituição: "Tomou depois o cálice, rendeu graças e deu-lhO, dizendo: 'Dele bebei todos, porque isto é Meu Sangue, o Sangue da Nova Aliança, derramado por muitos homens em remissão dos pecados.'" Mt 26,27-28
    Bem como comungar dos celestiais e divinos bens, como Ele prometeu ainda na Galileia ao oferecer o Pão do Céu: "Quem come Minha Carne e bebe Meu Sangue tem a Vida Eterna. E Eu ressuscitá-lo-ei no Último Dia." Jo 6,54
    Nem toda manifestação de poder, contudo, tem por intenção fazer-nos participar do Reino de Deus. Satanás realiza espetáculos que enganam os olhos e a muitos afastam da Sã Doutrina, como o próprio Jesus avisou aos Apóstolos após o Domingo de Ramos: "Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas, que farão milagres a ponto de seduzir, se possível fosse, até mesmo os escolhidos." Mt 24,24
    De fato, falando de um tempo em que muitos abandonariam a fé, esse também é um aviso que lemos na Segunda Carta de São Paulo aos Tessalonicenses: "A manifestação do ímpio será acompanhada, graças ao poder de Satanás, de toda sorte de enganadores portentos, sinais e prodígios." 2 Ts 2,9
    Porque desde a prisão de Jesus pelos guardas do sumo sacerdote, Ele mesmo acusou: "Entretanto, Eu estava convosco todos dias no Templo e não estendestes as mãos contra Mim. Mas esta é vossa hora e do poder das trevas." Lc 22,53
    Nesse sentido, determinou como missão ao Último Apóstolo quando Lhe apareceu no Caminho de Damasco, falando sobre os pagãos: "... para abrir-lhes os olhos, a fim de que se convertam das trevas à Luz e do poder de Satanás a Deus..." At 26,18a
    Por isso, a Carta de São Paulo aos Colossenses admite nas primeiras linhas: "Ele (Deus) arrancou-nos do poder das trevas e introduziu-nos no Reino de Seu muito amado Filho..." Cl 1,13
    Apesar da ousadia de insurgir-se em combate contra o próprio Deus, porém, não resta dúvida que o poder do inimigo não prosperará, como as visões do Livro do Apocalipse de São João atestam. O Amado Discípulo disse dos inimigos de Deus que se reúnem: "Combaterão contra o Cordeiro, mas o Cordeiro vencê-los-á, porque é Senhor dos senhores e Rei dos reis." Ap 17,14a
    Absolutamente convicto, ao narrar a Final Batalha, São Paulo vai ser bem sucinto: "Então o tal ímpio se manifestará. Mas o Senhor Jesus destruí-lo-á com o sopro de Sua boca, e aniquilá-lo-á com o resplendor de Sua Vinda." 2 Ts 2,8
    Até lá, na Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, o Apóstolo dos Gentios assim descreve o poder da Igreja, que é o Reino de Sacerdotes, citando três de altas classes de anjos caídos: "Depois virá o fim, quando entregar o Reino a Deus, ao Pai, depois de haver destruído todo principado, toda potestade e toda dominação. Porque é necessário que Ele reine, até que ponha todos inimigos debaixo de Seus pés. O último inimigo a derrotar será a morte, porque Deus tudo sujeitou debaixo de Seus pés. E quando tudo Lhe estiver sujeito, então o próprio Filho também renderá homenagem Àquele que Lhe sujeitou todas coisas, a fim de que Deus seja tudo em todos." 1 Cor 15,24.26-28
    Ora, fazendo lembrar as trombetas que derrubaram as muralhas de Jericó (cf. Js 6,20), a Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios asseverava: "Não são carnais as armas com que lutamos. São poderosas, em Deus, capazes de arrasar fortificações. Nós aniquilamos todo raciocínio e todo orgulho que se levanta contra o conhecimento de Deus, e cativamos todo pensamento e reduzimo-lo à obediência a Cristo." 2 Cor 10,4-5
    Quanto aos Santos, cujas almas alcançam a santidade e são a verdadeira face da Igreja, Jesus prometeu-lhes, dirigindo-Se à igreja de Tiatira através de São João Apóstolo, grande poder ainda sobre este mundo: "Então ao vencedor, ao que praticar Minhas obras até o fim, lhe darei poder sobre as pagãs nações. Ele regê-las-á com cetro de ferro, como se quebra um vaso de argila, assim como Eu mesmo recebi o poder de Meu Pai. E dá-lhe-ei a Estrela da Manhã." Ap 2,26-28
    É nestes termos que se compreende estas Suas Palavras, em últimos diálogos com os Apóstolos antes de partirem para o Horto das Oliveiras, onde seria preso: "Em Verdade, em Verdade, digo-vos: aquele que crê em Mim, também fará as obras que Eu faço e ainda maiores que estas, porque vou para junto do Pai. E tudo que pedirdes ao Pai em Meu Nome, Eu farei, para que o Pai seja glorificado no Filho." Jo 14,12-13
    E assim São João Evangelista compreensivelmente se rejubila: "Àquele que nos ama, que em Seu Sangue nos lavou de nossos pecados e de nós fez um Reino de Sacerdotes para Deus e Seu Pai, Glória e poder pelos séculos dos séculos! Amém." Ap 1,5b-6

    "Salvador do mundo, salvai-nos, Vós que nos libertastes pela Cruz e Ressurreição."

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

São Nicolau Magno


    Para que se tenha ideia de sua importância para a Igreja, depois dele, que viveu no século IX, nenhum outro Papa recebeu o título de Magno.
    Nascido em Roma em 815, de nobre e influente família, seu pai era defensor romano. Foi educado no mosteiro beneditino de Latrão, e é tido pela Igreja e pela História como um personagem de conduta moralmente irretocável. Era um intransigente defensor da primazia do Bispado de Roma, fundado por São Pedro, e da autonomia da Igreja, que jamais pode submeter-se a qualquer mundano poder.
    Dedicadamente serviu à Cúria Romana por 15 anos, sendo indicado subdiácono pelo Papa Sérgio II, e diácono, pelo Papa Leão IV. Foi conselheiro do Papa Bento III e, após sua morte em 858, aclamado seu sucessor. Já então era muito estimado pelo francês Luís II, sacro imperador romano-germânico, que foi coroado pelas mãos do Papa Sérgio II.
    Mas desde a total derrocada de Roma como capital do Império, em 476, em contraposição à ascensão de Bizâncio, então chamada de Constantinopla, vez e outra viu-se fragilizada a unidade da Igreja, pois, entre líderes políticos e heresiarcas, muitos questionaram e até puseram em cheque a autoridade do Papa.
    Em 860, no Sínodo de Milão, São Nicolau viu-se na obrigação de convencer algumas autoridades eclesiásticas a reconhecer a supremacia do Bispado Roma. João, o Arcebispo de Ravena, Itália, ainda resistiu, e São Nicolau Magno teve que o obrigar, sob pena de excomunhão.
    Em 861, também fez Incmar, o Arcebispo de Reims, França, desistir de suas ideias de que a igreja naquele país tinha total poder sobre seus fiéis, ou seja, independente das diretrizes de Roma.
    O Bispo de Soissons, na França, aliado de Incmar, foi igualmente persuadido a reconhecer a autoridade de nosso Santo, enquanto Papa, como absoluto superior da Igreja. Em 865, no entanto, em mais uma rigorosa medida disciplinar, São Nicolau resolveu depô-lo, levando de volta a este posto o bispo Rothad II, que havia sido afastado por influência de Incmar.
    A influência de nosso Papa era da mesma forma luminosa entre nobres e reis. Em 863, por exemplo, com a ajuda de São Cirilo e São Metódio, missionários gregos, São Nicolau converteu Bóris, rei da Bulgária, que mais tarde abandonaria o poder para tornar-se monge e adotaria outro nome, Miguel. Décadas depois, seria reconhecido como São Miguel da Bulgária, e seu filho, que tinha sido enviado a Roma para maior aproximação diplomática e acabou recebendo de São Nicolau um valioso tesouro em Sabedoria, conselhos e sugestões de leis para bem governar, por muitos anos promoveu boas relações internacionais e a prosperidade entre seu povo.


CONTRA REIS E IMPERADORES

    Não bastantes os frequentes problemas no seio da Igreja, São Nicolau teve que enfrentar o próprio imperador bizantino Miguel III, o ébrio, que num convento queria internar suas filhas e sua mãe Teodora, mesmo contra suas vontades.
    Em 858, este imperador havia desposto Inácio, Patriarca de Constantinopla, posto equivalente ao Bispado, apesar de ele ser muito estimado por sua mãe, Teodora, uma autêntica devota cristã. Inácio entrara em conflito com o clero de Constantinopla, pois se posicionou contra vários religiosos que haviam apoiado uma massiva destruição de imagens. Para seu posto foi indicado Fócio, um erudito leigo que, graças às inspiradas missões de São Cirilo e São Metódio, havia ajudado o imperador a suplantar o crescimento do judaísmo em regiões hoje correspondentes a partes da Rússia e da Chéquia.
    Fócio foi elevado patriarca principalmente pelas manipulações de Bardas, irmão de Teodora, portanto tio do imperador Miguel III. Bardas estava enfurecido e envergonhado porque o Patriarca Inácio lhe havia repreendido e proibido de entrar na Catedral de Santa Sofia, em Constantinopla, por viver um incestuoso relacionamento com sua nora, Eudóxia, após ela ter enviuvado.
    Aí começava um lamentável capítulo que em 1054 culminaria no Cisma do Oriente, ou seja, a igreja local vai afastar-se de Roma e intitular-se 'ortodoxa'. Apesar de toda habilidade de São Nicolau, desses movimentos políticos que acintosamente afrontavam a Sã Doutrina, e assim o próprio Papa, surgiria a primeira das grandes rupturas: o Cisma de Fócio.
    São Nicolau Magno inicialmente enviou seus emissários para convencer Fócio a renunciar, e reconduzir Inácio ao Patriarcado, mas esses emissários, seduzidos pela riqueza e pelo poder de Constantinopla, terminaram aderindo às tresloucadas ideias do usurpador, verdadeiras heresias. Foi quando em 863, no Sínodo de Latrão, em Roma, após vários debates e unânime decisão, mais uma vez São Nicolau mostrou a virtude da fortaleza ao abertamente enfrentar o ébrio, mas poderoso imperador bizantino, e proclamou Inácio como o legítimo Patriarca de Constantinopla. Também declarou, nesta ocasião, a excomunhão dos emissários que haviam abraçado as heresias de Fócio.
    Noutra questão, ainda em 855, Lotário II, rei da região que equivale a atual Lorena, na França, havia abandonado a esposa para casar-se com a amante. Quando assumiu o papado, em 858, São Nicolau não reconheceu seu Matrimônio. Entretanto, em 862, bispos reunidos no Sínodo de Aachem, na atual Alemanha, validaram o 'novo' casamento do rei.
    Descontente, porém prudenteem julho 863 São Nicolau vai convocar o Sínodo de Metz, França, para tratar do assunto. Lotário II, de fato, sabendo que sua situação era insustentável, havia subvertido os legados papais com subornos e ameaças e conseguiu a confirmação de sua adúltera união, já reconhecida no Sínodo de Aachem. Com muitas razões para desconfiar, São Nicolau habilidosamente convocou um novo Sínodo de Metz, em outubro do mesmo ano, e nele o Sínodo de Aachem foi dissolvido, destituindo os 3 bispos que participaram dele e do de julho, em Metz, entre eles João de Ravena, aos quais ordenou penitência sob pena de excomunhão.
    Revoltado, o rei Lotário II pediu os auxílios de seu irmão Luís II, sacro imperador romano-germânico, e eles saíram em defesa dos bispos destituídos desafiando diretamente São Nicolau, usando seus exércitos para sitiar Roma e confinando o Papa na sede do pontificado. São Nicolau Magno, porém, corajosamente resistiu e não cedeu em nada, nem resposta lhes enviou. Ao fim de dois dias, sem nenhum apoio do povo cristãoo imperador e seu irmão caíram em si, suspenderam o cerco e retiraram suas tropas.
    Mas, por essa vitória, restou a São Nicolau um preço a pagar: teve que resistir aos provocativos e sistemáticos levantes de insatisfação dos membros da corte carolíngia, ou seja, francesa, que por espúrios interesses manifestamente visavam minar seu prestígio. Ao final de algum tempo, com serenidade e imbatíveis argumentos de fé e razão, São Nicolau Magno soube conquistar o apoio dos bispos de França e desarticular a querela. Prova disso é que pouco mais tarde nosso Papa organizaria a defesa de Roma contra a invasão dos sarracenos, vale dizer, muçulmanos, e para tanto conseguiria ajuda dos exércitos do próprio sacro imperador Luís II.


A QUESTÃO TEOLOGAL DO CISMA DO ORIENTE

    Apoiado pelo imperador bizantino e ignorando a ordem papal, Fócio manteve-se no Patriarcado de Constantinopla e em 867 'excomungou' São Nicolau, acusando-o de defender, como acreditava a grande maioria dos teólogos e bispos da Igreja, que o Espírito Santo procedia do Pai e do Filho. Para Fócio e alguns teólogos orientais, o Espírito Santo não procederia do Filho, mas apenas do Pai. Eles agarravam-se a uma fala de Jesus, no Evangelho segundo São João, que diz: "... o Espírito da Verdade, que procede do Pai..." Jo 15,26
    Mas imponderadamente não reconheciam palavras que antecediam a estas, ou seja, também de Jesus, neste mesmo versículo, que dizem: "Quando vier o Paráclito, que Eu vos enviarei da parte do Pai..." Idem
    E noutra passagem, igualmente disse aos Apóstolos: "Porque, se Eu não for, o Paráclito não virá a vós. Mas se Eu for, vo-Lo enviarei." Jo 16,7
    Ademais, o Espírito Santo é Deus, quer dizer, tem total autonomia. E assim, em verdade, não precisa ser enviado nem procede senão de Si mesmo. O que temos nestes versículos, portanto, são apenas termos para nossa mais fácil compreensão da Revelação, e não uma literal representação da divina realidade.
    De toda forma, essa era a subjacente, e que viria a ser ruinosa, Questão 'Filioque', termo que em latim quer dizer 'e (do) Filho'. Os argumentos iriam radicalizar-se, causando acirrado afastamento entre religiosos do Oriente e a Igreja, e, pouco mais de um século depois, consolidariam o Cisma do Oriente, dando origem à igreja ortodoxa.
    Para ainda mais agravar a situação, cedendo às seduções da corte local e arrogando-se maiores poderes por intenções notoriamente políticas, Fócio também declarou a independência do Patriarcado de Constantinopla frente à Igreja, atacando com malícia o ponto central de todo trabalho de São Nicolau Magno. Fócio nunca buscou, de fato, alguma Comunhão. Apenas perniciosamente arrancava para si, valendo-se de apoio político, uma considerável extensão do rebanho do Cristo.
    Contudo, Basílio I, o Macedônio, que em 866 assassinaria Miguel III, assumindo o poder do Império Bizantino, definitivamente afastou Fócio em 867, devolvendo a Inácio a sede do Patriarcado. Tal decisão foi ratificada no IV Concílio Ecumênico de Constantinopla, em 869, que foi convocado por São Nicolau, mas ao qual ele não chegou a estar presente, pois, extenuado pelo zelo da Igreja e por práticas de rigoroso ascetismo, veio a falecer.
    Uma frase sua, porém, repercute pelos séculos: "Desde o momento em que a religião cristã começou a espalhar-se, ela manteve-se imutável e incorruptamente ensinou em todo mundo as doutrinas que recebeu de uma vez por todas de seu patrono e fundador, São Pedro."
    Entre os Papas, São Nicolau Magno é considerado um dos mais vigorosos guardiões da Igreja na Idade Média. Com destemor e desvelo de si, defendeu a moralidadeas leis e as tradições da Igreja. Exemplo de vigilância também pela oração, de todo clero exigia séria, íntegra e inatacável conduta. Era muito amado pelas pessoas que o cercavam, e muito estimado por todos cidadãos de Roma.
    Pessoalmente era um asceta, vivia para a devoção e para rigorosas virtudes do auto-abandono. Reformou várias igrejas e fundou mosteiros e conventos. Era um grande incentivador da vida religiosa.
    Depois do Papa São Gelásio, que, da mesma forma, fervorosamente havia defendido a superioridade da Sé de Roma sobre os demais bispados pelo mundo, bem como sua autonomia frente a todos mundanos poderes, São Nicolau foi o principal articulador dessa causa, consolidando a autoridade da Cátedra de São Pedro e vedando por completo qualquer ingerência de imperadores, reis e qualquer temporal poder dentro da Igreja. Graças a Papas com ele, a Igreja só deve obediência a Deus.
    A bela e milenar igreja de Salve, em Lecce, no extremo leste da Itália, é dedicada a nosso grande Santo.


    São Nicolau Magno, rogai por nós!

terça-feira, 12 de novembro de 2024

A Comunhão dos Santos


     A Comunhão Eucarística, isto é, o Sacramento do Pão e do Vinho, verdadeiramente Corpo e Sangue de Cristo, simboliza, além de nossa perfeita união com Deus, nossa vida em plena união com nossos irmãos em Cristo. Assim formamos a Igreja, que vive três estágios: a Igreja itinerante, nós na Terra; a Igreja santificante, os mortos no Purgatório; e a Igreja glorificante, aqueles que já contemplam a face de Deus, junto a Seus anjos. No Evangelho segundo São JoãoJesus mesmo, referindo-Se a essa Comunhão, disse do Santíssimo Sacramento na sinagoga de Cafarnaum, dias depois de multiplicar pães e peixes: "Quem come Minha Carne e bebe Meu Sangue, permanece em Mim e Eu nele. Assim como vive o Pai que Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, assim aquele que comer Minha Carne também viverá por Mim." Jo 6,56-57
    Pois foi pela Igreja que Ele Se ofereceu em Sacrifício, para que pudéssemos comungar das coisas de Deus: santidade, eternidade e divindade. Está na Carta de São Paulo aos Efésios: "Maridos, amai vossas mulheres como Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela, para santificá-la, purificando-a pela Água do Batismo com a Palavra, para a Si mesmo apresentá-la toda gloriosa, sem mácula, sem ruga, sem qualquer outro defeito, mas santa e irrepreensível." Ef 5,25-27
    E é isso que a Igreja é: a Comunhão dos Santos. E Santos são os verdadeiros fiéis, todos eles, não apenas os canonizados, isto é, aqueles que a Igreja com certeza afirma que já estão nos Céus. E sem dúvida, são muitos. Em Jerusalém, falando à multidão depois do Domingo de Ramos, Jesus disse de Sua Paixão e da universalidade de Sua Missão: "E quando Eu for levantado da terra, a Mim atrairei todos homens." Jo 12,32
    Ele mencionou essa Comunhão em conversa com os Apóstolos depois da Santa Ceia, dizendo de Sua Ressurreição: "Naquele dia, conhecereis que estou em Meu Pai, vós em Mim e Eu em vós." Jo 14,20
    Nesse sentido, os seguidores da tradição de São Paulo ensinam na Carta aos Hebreus, discorrendo sobre Deus e Jesus: "Aquele para Quem e por Quem todas coisas existem, desejando conduzir à Glória numerosos filhos, deliberou elevar à perfeição, pelo sofrimento, o Autor da Salvação deles, para que Santificador e santificados formem um só todo. Por isso, Jesus não hesita em chamá-los Seus irmãos..." Hb 2,10-11
    Como a própria representação da Unidade entre os cristãos, a Igreja sempre respirou a Comunhão. Com os Apóstolos, enquanto ainda era um pequeno grupo, todos reuniam-se num mesmo lugar para comungar dos Sacramentos, pois àquele tempo eram celebrados conjuntamente o Arrependimento, o Batismo, a Unção dos Enfermos e a Ação de Graças através da Comunhão Eucarística. O Livro dos Atos dos Apóstolos registrou: "Perseveravam eles na Doutrina dos Apóstolos, na reunião em comum, na fração do pão e nas orações." At 2,42
    Por isso, tão frequentemente o Último Apóstolo exorta à Comunhão da , pois não há como nos tornarmos Igreja, que é o Corpo Místico de Cristo, sem que vivamos essa Unidade: "A uns Ele constituiu Apóstolos; a outros, profetas; a outros, evangelistas, pastores, doutores, para o aperfeiçoamento dos cristãos, para o desempenho da tarefa que visa à construção do Corpo de Cristo, até que todos tenhamos chegado à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, até atingirmos o estado de homem feito, a estatura da maturidade de Cristo." Ef 4,11
    Os carismas, portanto, são dádivas para que sirvamos à comunidade de fé, como lemos na Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios: "Há diversidade de dons, mas um só Espírito. Os ministérios são diversos, mas um só é o Senhor. A cada um é dada a manifestação do Espírito para comum proveito." 1 Cor 12,7
    E a finalidade última de nossas vocações é o fortalecimento da Igreja, que, depois da Hóstia Consagrada, é a segunda representação do Corpo Místico de Cristo. Por estas suas palavras, portanto, depreende-se que a ninguém foi dado dom do Espírito Santo para atacar a Igreja: "Assim, uma vez que aspirais aos dons espirituais, procurai tê-los em abundância para edificação da Igreja." 1 Cor 14,12
    Ele argumenta: "Porque, como o corpo é um todo tendo muitos membros, e todos membros do corpo, embora muitos, formam um só corpo, assim também é Cristo. Em um só Espírito fomos batizados todos nós, para formar um só Corpo, judeus ou gregos, escravos ou livres. E todos fomos impregnados do mesmo Espírito." 1 Cor 12,12-13
    E a Carta de São Paulo aos Colossenses, falando de Cristo, denuncia aqueles que se esquecem do Autor desta obra: o próprio Deus! "Ele é a Cabeça do Corpo, da Igreja. Desencaminham-se estas pessoas em suas próprias visões e, cheias do vão orgulho de seu materialista espírito, não se mantêm unidas à Cabeça, da qual todo o Corpo, pela união das junturas e articulações, se alimenta e cresce conforme um crescimento disposto por Deus." Cl 1,18;2,18b-19
    Assim, na Pessoa de Jesus e pela ação do Santo Paráclito é edificada a Igreja, conforme esse extrato de sua carta aos cristãos da cidade de Éfeso: "Consequentemente, já não sois hóspedes nem peregrinos, mas sois concidadãos dos Santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos Apóstolos e Profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus. É n'Ele que todo edifício, harmonicamente disposto, se levanta até formar um Templo Santo no Senhor. É n'Ele que vós também entrais, pelo Espírito, na estrutura do edifício que se torna a habitação de Deus." Ef 2,19-22
    Porque através do Sacramento do Batismo se inicia nossa nova vida espiritual, caminho a ser percorrido até o Dia da Ressurreição. Diz a Carta de São Paulo aos Filipenses: "Nós, porém, somos cidadãos dos Céus. É de lá que ansiosamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante a Seu Corpo Glorioso, em virtude do poder que tem de a Si sujeitar toda criatura." Fl 3,20-21
    Quanto à caridade, ou seja, a comunhão espiritual, o ser Igreja é a expressão maior do 'Amai-vos uns aos outros' (cf. Jo 15,12), que Jesus pregou. A Carta de São Paulo os Romanos adverte dessa unidade que formamos em Cristo: "Nenhum de nós vive para si, e ninguém morre para si. Se vivemos, vivemos para o Senhor; se morremos, morremos para o Senhor. Quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor." Rm 14,7-8
    Com absoluta pertinência, este Apóstolo via-nos como partes uns dos outros: "... para que não haja dissensões no Corpo, e que os membros tenham o mesmo cuidado uns para com os outros. Se um membro sofre, com ele padecem todos membros; e se um membro é tratado com carinho, por ele congratulam-se todos outros. Ora, vós sois o Corpo de Cristo, e cada um, de sua parte, é um de seus membros." 1 Cor 12,25-27
    E assim, desde os primeiros anos, até as propriedades eram partilhadas entre os fiéis. Era a comunhão de bens, que mais tarde foi adotada pelas leis civis que regulam o Matrimônio. São Lucas anotou: "A multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma. Ninguém dizia que eram suas as coisas que possuía, mas tudo era comum entre eles." At 4,32
    Os próprios Apóstolos, portanto, viviam em profunda comunhão espiritual entre si, e davam exemplo, como a Carta de São Paulo aos Gálatas atesta: "Reconhecendo a Graça que me foi dada, Tiago, Cefas e João, considerados as colunas da Igreja, deram-nos a mão, a mim e a Barnabé, como sinal de nossa recíproca comunhão. Assim ficou confirmado que nós iríamos aos pagãos, e eles, aos judeus." Gl 2,9
     Ora, ele combatia dissensões dentro da Igreja, como vemos nas palavras que endereçou aos cristãos da cidade de Corinto: "Fiel é Deus, por Quem fostes chamados à comunhão de Seu Filho Jesus Cristo, Nosso Senhor. Rogo-vos, irmãos, em Nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, que todos estejais em pleno acordo e que entre vós não haja divisões. Vivei em boa harmonia, no mesmo espírito e no mesmo sentimento." 1 Cor 1,9-10
    Ele tinha bem claro que esse é o projeto do Pai: "Ele manifestou-nos o misterioso desígnio de Sua vontade, que em Sua benevolência desde sempre formara, para realizá-lo na plenitude dos tempos - desígnio de em Cristo reunir todas coisas: as que estão nos Céus e as que estão na Terra." Ef 1,9-10
    Particularmente pedia pela fiel e total observância da Palavra de Deus para dirimir diferenças, como escreve aos da cidade de Colossos: "A Palavra de Cristo permaneça entre vós em toda sua riqueza, de sorte que possais mutuamente instruir-vos e exortar-vos com toda Sabedoria." Cl 3,16a
    E a Primeira Carta de São João diz da permanência do próprio Deus em nós, que possibilita a Comunhão dos Santos, pois Ele é sua essência: "Quem conhece a Deus, ouve-nos; quem não é de Deus, não nos ouve. É nisto que conhecemos o Espírito da Verdade e o espírito do erro. Se mutuamente nos amarmos, Deus permanece em nós e Seu amor em nós é perfeito. Nisto é que conhecemos que estamos n'Ele e Ele em nós: por Ele ter-nos dado Seu Espírito." 1 Jo 4,6.12b-13
    De fato, essa foi a promessa de Jesus nos últimos diálogos com os Apóstolos: "Se alguém Me ama, guardará Minha Palavra e Meu Pai amá-lo-á. E Nós viremos a ele e nele faremos Nossa morada." Jo 14,23
    O Último Apóstolo, pois, atestou o cumprimento desta promessa: "... é Cristo que vive em mim." Gl 2,20b
    São João Apóstolo também insistia nessa Unidade. Queria os fiéis em comunhão com os Apóstolos, Bispos, Presbíteros e Diáconos: "... o que vimos e ouvimos nós anunciamo-vos, para que vós também tenhais comunhão conosco. Ora, nossa comunhão é com o Pai e com Seu Filho Jesus Cristo." 1 Jo 1,3
    Ele repetia a importância da Comunhão dos Santos, vale dizer, entre todos fiéis: "Se, porém, andamos na Luz como Ele mesmo está na Luz, temos recíproca comunhão uns com os outros, e o Sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, purifica-nos de todo pecado." 1 Jo 1,7
    Até ia mais longe, estabelecendo uma prova: "É assim que conhecemos se estamos n'Ele: aquele que n'Ele afirma permanecer, também deve viver como Ele viveu." 1 Jo 2,5a-6
    A Segunda Carta de São Paulo a São Timóteo também defendia essa impreterível união através da Igreja: "... busca com empenho a justiça, a fé, a caridade, a Paz, em companhia daqueles que invocam o Senhor com pureza de coração." 2 Tm 2,22b
    E lembrando a iminência seja do Juízo Particular, seja do Juízo Final, os seguidores de sua tradição erroneamente não viam perdão para os dissidentes: "Não abandonemos nossa assembleia, como é costume de alguns, mas mutuamente admoestemo-nos, e tanto mais quando vedes aproximar-se o Grande Dia. Depois de termos recebido e conhecido a Verdade, se voluntariamente a abandonarmos, já não haverá sacrifício para expiar este pecado. Só teremos que esperar um tremendo Juízo e o ardente fogo, que há de devorar os rebeldes." Hb 10,25-27
    O próprio Apóstolo dos Gentios, em condenação a todo dissenso, pede constante renovação e santidade: "Portanto, eis o que digo e conjuro no Senhor: não persistais em viver como os pagãos, que andam à mercê de suas frívolas ideias. Têm o entendimento obscurecido. Sua ignorância e o endurecimento de seu coração mantêm-nos afastados da Vida de Deus. Indolentes, entregaram-se à dissolução, à apaixonada prática de toda espécie de impureza. Renovai sem cessar o sentimento de vossa alma, e revesti-vos do novo homem, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade." Ef 4,17-19.23-24
    Ele recomenda á igreja de Roma: "Nós, que somos os fortes, devemos suportar as fraquezas dos que são fracos, e não agir a nosso modo. Cada um de vós procure contentar o próximo, para seu bem e sua edificação." Rm 15,1-2
    De fato, essa é a marca da Igreja, como Jesus mesmo afirmou depois de anunciar Seu Mandamento, de amar-nos uns aos outros: "Nisto todos conhecerão que sois Meus discípulos, se vos amardes uns aos outros." Jo 13,35
    E assim prometeu, desde que realmente estejamos reunidos em Seu Nome, ser o Elo desta união. Foi enquanto Ele ensinava aos Apóstolos sobre as coisas da Igreja, no Evangelho segundo São Mateus: "Digo-vos ainda isto: se dois de vós se unirem sobre a Terra para pedir, seja o que for, consegui-lo-ão de Meu Pai que está nos Céus. Porque onde dois ou três estão reunidos em Meu Nome, aí estou Eu no meio deles." Mt 18,19-20
    Ora, a Carta de São Tiago, ao falar dos Sacramentos, não por acaso recomenda que apenas os Sacerdotes da Igreja sejam invocados para ministrá-los: "Está alguém enfermo? Chame os Sacerdotes da Igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo em Nome do Senhor." Tg 5,14
    No mesmo sentido, São Paulo veementemente repudia que os membros da Igreja se deixem instruir por pessoas estranhas: "No entanto, quando tendes contendas desse gênero, escolheis para juízes pessoas cuja opinião é tida em nada pela Igreja." 1 Cor 6,4
    Inspirado, ele sabia que esta unidade era obra do Espírito de Deus, cunhando uma frase que o Sacerdote repete no início da Santa Missa. É da Segunda Carta de São Paulo aos Coríntios: "A Graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós!" 2 Cor 13,13
    E que Cristo, Autor da fé (cf. Hb 12,1), jamais abandona Sua Igreja, como Ele mesmo garantiu pouco antes de Sua Ascensão: "Eis que convosco estou todos dias, até o fim do mundo.'" Mt 28,20b
    Assim também o Espírito Santo, igualmente por promessa Sua quando começou a despedir-Se dos Apóstolos: "E Eu rogarei ao Pai, e Ele dar-vos-á outro Paráclito, para que convosco fique eternamente." Jo 14,16
    É na comunhão do Espírito Santo, portanto, que intercedemos uns pelos outros. A Igreja glorificante, que já vê Deus face a face, não mais precisa de intercessão. Mas nós, que ainda estamos aqui, e as almas que estão purificando-se no Purgatório precisamos da intercessão uns dos outros e da dos Santos, os canonizados e os que estão nos Céus. Por isso, São Paulo rezava apontando os diferentes estágios da família de Deus: "Por esta causa dobro os joelhos em presença do Pai, ao Qual deve sua existência toda família no Céu e na Terra..." Ef 3,14-15
    E a Primeira Carta de São Paulo a São Timóteo recomendava essa atitude como larga e abrangente prática de piedade: "Antes de tudo, peço que se façam súplicas, orações, intercessões, ação de graças, por todas pessoas..." 1 Tm 2,1


    Aliás, com frequência ele referia-se à Igreja itinerante como os 'Santos', termo hoje restrito ao Papa e aos canonizados: "Com toda sorte de preces e súplicas, constantemente orai no Espírito. Prestai vigilante atenção neste ponto, intercedendo por todos santos." Ef 6,18
    Sabia que grandes Graças são alcançadas pelas intercessões: "... com a ajuda de vossas preces em nossa intenção. Assim, a Graça que alcançarmos pela intercessão de tantas pessoas será, para essas pessoas, motivo de ação de graças a nosso respeito." 2 Cor 1,11
    Por fim, fica a bela e reconfortante lembrança da Oração a Unidade feita por Jesus, momentos antes do início de Sua Paixão, pedindo ao Pai que a Igreja esteja sempre onde Ele estiver. É lá, junto a Ele, que estão os Santos canonizados, mas também os não canonizados, cuja história só Deus e pessoas mais próximas conheceram, assim como aqueles que já foram purificados no Purgatório. Eles 'não cessam de interceder por nós': "Pai, aqueles que Tu Me deste, quero que eles estejam Comigo, onde Eu estiver, para que contemplem a Glória que Me deste, pois Me amaste antes da criação do mundo." Jo 17,24
    Nós podemos confirmar o sucesso dessa oração de Jesus, bem como o reinado dos Santos, por causa da visão do cântico dos quatro seres e dos vinte e quatro anciãos (todos anjos!) ao Cordeiro de Deus, ou seja, a Nosso Senhor Jesus Cristo, anotada no Livro do Apocalipse de São João: "Tu és digno de receber o Livro e de abrir-lhe os selos, porque foste imolado, e com Teu Sangue adquiriste para Deus gente de toda tribo, língua, povo e nação. Deles fizeste para Nosso Deus um Reino de Sacerdotes. E eles reinarão sobre a Terra." Ap 5,9-10
    Ou seja, os Santos já estão reinando sobre este mundo, pois nos Céus não haverá pagãos, e Jesus prometeu à igreja de Tiatira, uma das sete da Ásia de então, através do Amado Discípulo ainda nas primeiras destas revelações: "Então ao vencedor, ao que praticar Minhas obras até o fim, lhe darei poder sobre as pagãs nações. Ele regê-las-á com cetro de ferro, como se quebra um vaso de argila, assim como Eu mesmo recebi o poder de Meu Pai." Ap 2,26-28a
    De fato, foi exatamente isso que São João Evangelista apontou como últimas visões, também explicando a condição dos que ainda estão no Purgatório: "Também vi tronos, sobre os quais se assentaram aqueles que receberam o poder de julgar: eram as almas dos que foram decapitados por causa do testemunho de Jesus e da Palavra de Deus, e todos aqueles que não tinham adorado a Fera ou sua imagem, que não tinham recebido seu sinal na fronte nem nas mãos. Eles viveram uma Nova Vida e com Cristo reinaram por mil anos. Os outros mortos não tornaram à vida até que se completassem os mil anos." Ap 20,4-5a
    Citando a Comunhão da Santíssima Trindade, Jesus mesmo explicou, ainda durante a despedida, como acontecia a intercessão feita pelos Santos da Igreja. Seus pedidos são feitos ao Pai, em Seu Nome, e pelo próprio Pai são atendidos: "Naquele dia pedireis em Meu Nome, e já não digo que rogarei ao Pai por vós. Pois o próprio Pai vos ama, porque vós Me amastes e crestes que saí de Deus." Jo 16,26-27
    E como Aquele que veio reunir até as ovelhas perdidas, não se pode duvidar do sucesso de Sua Missão. Referindo-Se aos pagãos ainda por serem convertidos, Ele abertamente disse aos fariseus em plena Cidade Santa: "Eu sou o Bom Pastor. Conheço Minhas ovelhas e Minhas ovelhas conhecem a Mim, como Meu Pai Me conhece e Eu conheço o Pai. Dou Minha Vida por Minhas ovelhas. Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco. Também preciso conduzi-las. Ouvirão Minha voz, e haverá um só rebanho e um só Pastor." Jo 10,14-16
    Porque, para que se realize esta comunhão espiritual, Ele derramou Sua Glória sobre a Igreja como prova de Sua passagem entre nós e do amor que o Pai nos tem. É parte de Sua Oração da Unidade: "Dei-lhes a Glória que Me deste, para que sejam Um, como Nós somos Um: Eu neles e Tu em Mim. Para que sejam perfeitos na unidade e o mundo reconheça que Me enviaste e os amaste, como amaste a Mim." Jo 17,22-23


    O Catecismo da Igreja Católica ensina:
    "Na Comunhão dos Santos, 'entre os fiéis já admitidos na posse da celeste pátria, os que expiam as faltas no purgatório e os que ainda peregrinam na Terra, certamente existe um laço de caridade e um amplo intercâmbio de todos bens (São Paulo VI, Indulgentiarum Doctrina).' Neste admirável intercâmbio, cada um beneficia-se da santidade dos outros, para muito além do prejuízo que o pecado de um possa ter causado aos outros. Assim, o recurso à Comunhão dos Santos permite ao contrito pecador ser purificado, mais cedo e mais eficazmente, das penas do pecado.
    Esses bens espirituais da Comunhão dos Santos também são chamados o tesouro da Igreja, 'que não é uma soma de bens, comparáveis às materiais riquezas acumuladas no decorrer dos séculos, mas é o infinito e inesgotável valor que junto a Deus têm as expiações e os méritos de Cristo, Nosso Senhor, oferecidos para que toda humanidade seja libertada do pecado e chegue à Comunhão com o Pai. É em Cristo, Nosso Redentor, que em abundância se encontram as satisfações e os méritos de Sua Redenção (Cf. Hb 9,11-28;7,23-25).'" CIC § 1475-1476

    "A todos saciai com Vossa Glória!"